Norma revogada

TJ-MG extingue ação com base na Lei de Imprensa

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13 de maio de 2009, 16h55

Com base na decisão do Supremo Tribunal Federal, que no último dia 30 de abril revogou a Lei de Imprensa (Lei 5.250/67), a 13ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais extinguiu um processo que apresentava fundamentação baseada na norma. Os ministros do Supremo, ao analisar os seus dispositivos, concluíram que ela não foi recepcionada pela Constituição Federal, que implementou a nova ordem democrática. Com isso, a lei foi totalmente excluída do ordenamento jurídico.

No caso de Minas Gerais, o processo foi ajuizado em 2002 por um político contra o jornal Campo das Vertentes, de Barbacena. Segundo ele, reportagem publicada desferiu ataques contra a sua família e contra ele. Na ação, o político pediu que o jornal fosse impedido de circular, com base na Lei de Imprensa.

Em agosto de 2008, a juíza Liliane Rossi dos Santos Oliveira, da 3ª Vara Cível de Barbacena, negou o pedido. Para ela, as provas trazidas ao processo eram insuficientes para impedir a circulação do jornal. O político recorreu ao Tribunal de Justiça, mas os desembargadores Luiz Carlos Gomes da Mata (relator), Cláudia Maia e Alberto Henrique determinaram a extinção do processo.

O relator citou a decisão do STF, que revogou a norma, e destacou que “senão com base na Lei de Imprensa, o impedimento de circulação de um periódico e a exigência de formalidades para a publicação e circulação de livros, jornais ou quaisquer outros periódicos não tinha qualquer previsão em lei”, observou.

“Revogada a Lei de Imprensa, até que outra venha a ser editada, não é juridicamente possível o pedido fundado em suas disposições, mesmo porque incidem as disposições do artigo 5º, inciso II e do artigo 220, caput, e parágrafo 1º, da Constituição Federal, para impedir a restrição de informação que não esteja de acordo com o texto constitucional”, concluiu o relator.

Reportagem da revista Consultor Jurídico, à época que a lei foi revogada, apontou que a decisão do STF foi apenas o primeiro ato de um debate que promete render muito mais nos tribunais inferiores e fóruns do país. É que como os ministros não declararam expressamente o que deve acontecer com as ações judiciais contra jornais e jornalistas que têm base na lei excluída do ordenamento jurídico, fica a cargo dos juízes decidir o que fazer.

Agora, há dois cenários possíveis em relação ao trâmite das ações. Primeiro: até mesmo nos processos baseados exclusivamente na Lei de Imprensa, os juízes podem fazê-los continuar tramitando com base em dispositivos correlatos do Código Penal, Código Civil ou mesmo em regras constitucionais. Segundo cenário: o juiz arquiva o processo, por entender que o dispositivo apontado deixou de existir em 1988, com a promulgação da Constituição.

“Existe o princípio de que a parte deve dar os fatos e o juiz procede ao enquadramento desses fatos. Assim, não estaria prejudicado o andamento das ações”, afirmou na ocasião o ministro Marco Aurélio à revista ConJur. Para ele, o andamento das ações não deve ser prejudicado.

O advogado Marcelo Nobre, conselheiro do Conselho Nacional de Justiça e estudioso da Lei de Imprensa, corroborou o argumento de que se pode reclassificar a ação, mas alertou que certamente haverá juízes que não decidirão dessa maneira. “Da mesma forma, magistrados podem entender que esse processo tem de ser arquivado, já que sua base de fundamentação é uma lei que não mais existe”, afirma.

O deputado federal Miro Teixeira (PDT-RJ), autor da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental que fez o STF derrubar a lei, também falou com a ConJur. Segundo ele, o destino das ações baseadas exclusivamente na Lei de Imprensa não pode ser outro, senão o arquivo. “Não há alternativa”, disse na ocasião.

Balizas processuais

Com a revogação da lei, há outras questões que serão decididas caso a caso pelos juízes. A questão do direito de resposta é a mais candente delas. No final do julgamento que revogou a lei, o presidente do Supremo, ministro Gilmar Mendes, chamou a atenção para o fato. Ele reclamou que o tribunal está jogando fora uma regulamentação razoável e deferindo ao juiz regular, caso a caso, o direito de resposta. “Isso não é bom nem para as empresas, nem para os cidadãos”, disse. “Eles podem entrar em uma selva hermenêutica.”

O decano do Supremo, ministro Celso de Mello, votou em outro sentido. Para ele, o direito de resposta é bem garantido no inciso V do artigo 5º da Constituição: “É assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além de indenização por dano material, moral ou à imagem”. E a decisão da corte não impede que o legislador regulamente o assunto em uma nova lei.

De qualquer maneira, com a decisão do Supremo, os juízes singulares é que decidirão como será o direito de resposta. A regulação prevista na Lei de Imprensa deixou de existir junto com a regra. “Há certas regras contidas na Lei de Imprensa que não são previstas nas normas gerais. Nesse ponto, a revogação da lei na íntegra não é benéfica”, afirmou Marcelo Nobre.

Para o ministro Marco Aurélio, único que votou pela rejeição total da ação, não é bom o fato de que “passaremos a ter conflitos de interesse resolvidos com critério de plantão, estabelecido pelo julgador”.

Outras questões como os efeitos da decisão nas condenações já sofridas por jornalistas, em processos com base na Lei de Imprensa, poderão ser discutidas mais adiante. O Supremo pode até mesmo discutir a modulação dos efeitos da decisão em possíveis Embargos de Declaração. Por enquanto, contudo, diversos casos serão definidos individualmente pelos juízes.

“Esse julgamento é um convite para a imprensa fazer um processo responsável de autorregulação, como ocorre em muitos países”, afirmou o ministro Gilmar Mendes ao concluir o julgamento no dia 30 de abril.

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