Consultor Jurídico

Torre de babel judiciária está em vias de demolição

11 de maio de 2009, 12h16

Por Márcio Chaer

imprimir

Está em vias de demolição uma das mais antigas construções conhecidas: a torre de babel judiciária brasileira.

A diminuição, em 40%, do número de ações nas duas principais Cortes do país — o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça — não chamou muita atenção. Mas vai sacudir muitos costumes quando a correia de transmissão do
sistema chegar na primeira instância. A Justiça deixará de ser um esconderijo tranquilo para caloteiros e outros finórios.

As ferramentas da demolição chamam-se efeito vinculante, repercussão geral e a lei que breca recursos repetitivos. Em português claro: o julgamento de uma causa passa a valer para todos os casos iguais; o Supremo deixa de ser quarta
instância e escolhe as causas mais relevantes para julgar e oferecer como modelo a ser seguido. O STJ passa a desautorizar os sucessivos recursos quando já se sabe o desfecho do caso.

O vaticínio pode parecer otimismo de apostador. Mas o equacionamento do sistema é lógico demais para ser ignorado. Ao jogar luzes sobre temas e não apenas sobre os litígios, os juízes racionalizam a estrutura. O “Anuário da Justiça 2009”, que acaba de ser lançado pela ConJur Editorial, mostra que os estimados 60 milhões de processos que transitam pelas mãos dos juízes brasileiros resumem-se a 2.400 discussões. Resolvidas essas discussões, resolveram-se os 60 milhões de processos. É esse o espírito da coisa.

É claro que essa obra tem muitos engenheiros. O ministro Cesar Asfor Rocha, primeiro como corregedor do CNJ e agora como  presidente do STJ faz sua parte. Mas a turbina é Gilmar Mendes, formulador de soluções que esculpe há quinze anos e agora, como presidente do STF e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), tem a oportunidade de implementar.

Algumas fórmulas em curso são óbvias. Em vez de ganhar um número a cada movimentação, o processo vai nascer e morrer com a mesma designação. Mais que isso: a numeração nacional será unificada. O novo número informará de onde é o processo e qual a sua natureza. Permitirá estatísticas exatas e instantâneas para orientar o gerenciamento da parte dos tribunais. As partes serão cadastradas pelo CPF ou pelo CNPJ para acabar com o isolamento atual em que um estado, um tribunal ou ramo da Justiça nada sabe do que ocorre no vizinho. Em miúdos: será possível saber se algum dos litigantes está usando o Judiciário indevidamente.

No aspecto gerencial, o CNJ emerge como uma surpresa agradável para quem temia que o órgão se firmasse como uma delegacia policial para reprimir juízes. O Conselho está criando paradigmas administrativos para substituir a autonomia
perniciosa dos tribunais.

Aquele tipo de regrário em que cada dirigente — e juízes em geral são péssimos administradores — rege o tribunal como quer e tudo muda a cada gestão. Os feudos devem acabar. Depois de tantos anos de discursos vazios e adjetivos, o próprio Judiciário encontrou o seu caminho. Quem só reclamou até agora, tem a chance de ajudar
apoiando esse mutirão.

Clique aqui para comprar o Anuário.

[Artigo originalmente publicado na edição desta segunda-feira (11/5) do jornal O Globo]