Combate ao crime

Lei prevê instrumentos, mas não diz como usá-los

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11 de maio de 2009, 17h44

As leis brasileiras já preveem instrumentos de investigação para combater crimes complexos. Além da escuta telefônica, também há a delação premiada, ação controlada da Polícia e agentes infiltrados. Entretanto, as leis não trazem detalhes de como usar esses métodos. Fica a cargo do juiz aplicar e criar uma jurisprudência sobre o uso dos métodos. O corregedor-geral de Justiça, ministro Gilson Dipp, afirmou, durante seminário Crime organizado: mecanismos de combate e reflexos no Estado Democrático de Direito, no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, que o legislador, ao prever mas não detalhar o uso dos métodos de investigação, deixou para o juiz a insegurança de aplicá-los.

Para Dipp, embora a delação seja prevista em inúmeras leis, como a dos crimes hediondos, financeiros, lavagem de dinheiro e tóxicos, o modo de aplicá-la não foi especificado. Os juízes de primeira instância, constata, é que estão decidindo e criando jurisprudência sobre o assunto. No caso da delação de um corréu, por exemplo, diz Dipp, em geral, os juízes entendem que ela só pode ser feita com a concordância da defesa e Ministério Público.

Dipp entende que a delação é um instrumento que muda a concepção de pena, já que esta não é simplesmente a punição. Isso porque, dependendo das informações prestadas, o acusado pode ter benefícios. "Alguns dizem que visa premiar traição." Ele rebate o argumento. Em organização criminosa, diz, não há ética ou moral a ser defendida. O ministro lembrou que apenas a delação não basta para condenar outro acusado. É preciso combiná-la com outras provas.

O ministro também falou sobre a infiltração de agentes no crime. Apesar de também ser prevista em lei, não se sabe, diz o ministro, quanto tempo ela dura ou a forma de proteção ao policial infiltrado. Para Dipp, isso dificulta aplicação do instituto pelo juiz.

O mesmo foi constatado pelo presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Gilmar Mendes, que também participou do seminário nesta segunda-feira (11/5) no Rio de Janeiro. Falta lei, observa, para estabelecer os limites dos agentes de persecução penal. Para o ministro, o combate ao crime organizado deve ser feito sem que haja abuso das autoridades policiais ou do Judiciário e respeitando os direitos fundamentais previstos na Constituição. Para o ministro, uma atuação “harmônica” entre os Poderes Judiciário, Legislativo e Executivo poderá permitir o combate à criminalidade sem que seja necessário descumprir os direitos fundamentais.

Na semana passada, o Ministério Público Federal no Rio de Janeiro também abordou o tema. Na ocasião, o advogado criminalista Luiz Flávio Gomes chamou a atenção para o fato de a legislação brasileira dispor apenas cinco linhas para regulamentar o agente infiltrado. Há, segundo Gomes, uma carência legislativa sobre o assunto.

O mesmo vale para a delação premiada. Segundo o criminalista, falta lei regulamentando quem toma iniciativa no caso da delação, por exemplo. É preciso, diz, ajustar a legislação para poder investigar. “Não é só insegurança para o réu, mas para todos, juiz, MP e delegado.”

Organização criminosa

Um dos temas presente tanto no evento no MPF quanto no do TJ do Rio sobre crime organizado foi a falta de definição em lei do que seja uma organização criminosa. O ministro Dipp afirmou que há uma definição na Convenção de Palermo, vigente no Brasil. Dipp afirmou que a convenção tem força de lei. “Podemos usar as convenções internacionais”, diz. Para o ministro, a definição da convenção da ONU pode complementar o que a lei não disse.

Luiz Flávio Gomes também citou a convenção que define como organização criminosa um grupo de três ou mais pessoas, que se reúnem para cometer crimes com propósito de obter lucro. Mas, afirma, a convenção se refere a crimes transnacionais, o que pode vir a ser questionado quanto a aplicação em crimes que não sejam desse tipo.

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