Segunda leitura

Passos certos garantem sucesso na carreira jurídica

Autor

  • Vladimir Passos de Freitas

    é professor de Direito no PPGD (mestrado/doutorado) da Pontifícia Universidade Católica do Paraná pós-doutor pela FSP/USP mestre e doutor em Direito pela UFPR desembargador federal aposentado ex-presidente do Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Foi secretário Nacional de Justiça promotor de Justiça em SP e PR e presidente da International Association for Courts Administration (Iaca) da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) e do Instituto Brasileiro de Administração do Sistema Judiciário (Ibrajus).

10 de maio de 2009, 12h58

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Permitam-me contar, em poucas palavras, uma história de vida e dela tirar algumas conclusões. Refiro-me ao “Justice” (ministro) Stephen Breyer, da Suprema Corte dos Estados Unidos. Nascido em São Francisco em 1938, era oriundo da classe média. De seu pai, que era advogado, recebeu a lição de que as pessoas, trabalhando para o governo, podem melhorar a vida de seus semelhantes. De sua mãe, ativista política do Partido Democrata, aprendeu que melhor do que estudar era trabalhar duro e conhecer bem a realidade.

Graduado em Direito, exerceu cargos e funções públicas, como secretário na Suprema Corte, assistente especial do Promotor A. Cox no caso “Watergate”, membro do “Comitê Judiciário do Senado”, onde ficou de 1974 e 1975. Graças a suas posições equilibradas, mesmo sendo democrata fez bons amigos entre os Republicanos. Em meio a estas e outras atividades, foi Professor de Direito na famosa Harward Law School, entre 1967 e 1994.

Em 1980 foi indicado para ser juiz (equivalente a desembargador federal) da Corte Federal de Apelações do 1º Circuito (equivalente ao Tribunal Regional Federal), com sede em Boston, Massachusetts. No Tribunal tornou-se conhecido como um homem pragmático, politicamente do centro e conciliador de opiniões discordantes.

Assim seguiu sua vida. O ano de 1993 não foi dos melhores para Breyer. Ao dirigir-se de bicicleta para o tribunal, foi atropelado por um carro e hospitalizado. Uma semana mais tarde, ainda ferido, foi chamado a Washington para uma entrevista com, nada menos, que o presidente Bill Clinton. Sondado para ser nomeado ministro da Corte Suprema, Breyer viu seu sonho ruir, face a uma acusação de que não teria pago a previdência de uma empregada doméstica.

Clinton indicou Ruth Bader Ginsburg, também juíza de Tribunal Federal em Washington, DC, que foi a segunda mulher na Corte. Breyer compareceu à posse e retornou às suas atividades em Boston. Em abril de 1994 nova vaga se abre na Corte. Procurado pela mídia, em entrevista, Breyer respondeu que ter seu nome lembrado já era uma honra. E nada mais disse.

Porém o presidente Clinton já tinha outros nomes em mente. O senador George Mitchell, o secretário do Interior Bruce Babbitt e o juiz de Tribunal Federal Richard Arnold, este seu amigo pessoal. Mas, Mitchell afirmou que pretendia continuar no Senado, Babbitt foi bombardeado pelos Republicanos com acusações diversas e Arnold foi atingido por um linfoma. Depois de 33 dias de embaraçosa expectativa, Clinton indicou Stephen Breyer ao Senado. As oposições foram poucas e ele foi empossado em 16 de maio.

Vejamos as conclusões que podem ser extraídas desta história de vida, referida na obra The Supreme Court Yearbook, Kenneth Jost, CQ, 1994, p. 1-18. E logo para começar, com a observação de que, no Brasil, salvo honrosas exceções (v.g. Roberto Rosas, Pedro Lessa, o Marshal Brasileiro, Horizonte Ed.,1985.), pouco se escreve sobre os nossos grandes juízes, advogados e outros operadores jurídicos.

A influência da família na formação de Breyer foi essencial. De seu pai herdou o espírito público e de sua mãe o determinismo, o sentido prático da vida. Se, ao contrário, tivesse ouvido lições de pessimismo, provavelmente seria um a mais a reclamar de tudo e a não resolver nada. Ao contrário, perseguiu seus objetivos com persistência e equilíbrio.

Os relacionamentos cultivados ao longo de sua vida, foram essenciais para o sucesso. Sendo um conciliador e pessoa preocupada com realizações, ao ser cogitado para a Suprema Corte poucas vozes, contra ele, se levantaram. E sem ressonância.

A simplicidade certamente o ajudou também. Em 1993 foi atropelado quando, de bicicleta, se dirigia ao trabalho. Um homem, juiz de Tribunal Federal, que se dispõe a usar a bicicleta, mostra ser despojado de vaidades, vontade de aproximar-se da comunidade, desejo de ver, sentir, a cidade em que vive. É um traço marcante e positivo de personalidade.

A resiliência, ou seja, a capacidade de reagir bem a frustrações, também ficou evidente quando ele, rejeitado por Clinton em 1993, foi assistir a posse de sua colega Ginburg´s na Suprema Corte. Se a sua reação fosse de revolta, ódio, certamente, não seria lembrado na vaga que se sucedeu.

Estas conclusões parecem simples, evidentes mesmo. Mas, na vida diária, nem sempre são observadas. Muitas vezes sem perceber e até mesmo sem maldade, envolvem-se os profissionais do Direito em querelas inúteis, em conflitos desnecessários. E põem a perder uma carreira, uma vida. Exemplos não faltam e colhidos da vida real. É o caso de um jovem juiz que, aprovado em concurso, passa a exigir tratamento formal e distante de seus colegas de Faculdade. Um jovem Promotor que, embalado no desejo de reformar o mundo em três meses, lança, inadvertidamente, pessoas ao banco dos réus. Um advogado que, no ardor da defesa, se envolve em discussão feroz com o defensor da parte contrária, resultando em representações recíprocas e, posteriormente, longa perda de tempo e energia.

E, a finalizar, cabe o registro da importância de escrevermos sobre os nossos grandes vultos da área jurídica. Passar os bons exemplos às presentes e futuras gerações. Evitar que o tempo apague da memória a atuação daqueles que engrandeceram, em variadas funções, a Justiça brasileira. Passar a lição de que passos certos podem significar sucesso na carreira e, mais do que isto, felicidade.

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