Quinto constitucional

Presidente da AMB defende fim do quinto constitucional

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9 de maio de 2009, 7h41

Mais de 20 anos depois da promulgação da Constituição Federal, o quinto constitucional ainda provoca polêmicas. Magistrados de todo o país, reunidos em evento em Brasília, criticaram mais uma vez o dispositivo. O presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros, Mozart Valadares, disse que não há benefício aos tribunais. “Não conseguimos identificar um colegiado que tenha se tornado mais transparente ou oxigenado por causa do quinto”. A afirmação é tão subjetiva quanto impossível de ser averiguada, mas integra a argumentação de boa parcela da magistratura que abomna o quinto.

A AMB realizou, nesta semana, o seminário A Participação do Executivo na Composição dos Tribunais. Perguntado se a defesa do fim do quinto não era uma maneira de dar mais poderes aos juízes, Valadares criticou a postura da OAB em defesa do quinto. “O discurso da OAB é levado para o campo do corporativismo”, afirmou.

O evento  serviu de plataforma para juízes concursados levantarem a discussão da validade do mecanismo criado pelo presidente Getúlio Vargas em 1934. Pouco antes do painel sobre o quinto, o presidente da AMB disse à revista Consultor Jurídico que a escolha dos indicados do quinto constitucional pelo chefe do Executivo prejudica os tribunais. “O MP e a OAB participam da nomeação, mas a escolha é do Executivo, que decide por conveniência. Isso fragiliza os tribunais”, afirmou Mozart Valadares.

Pesquisa

O presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Gilmar Mendes, criticou a forma como a OAB tem feito suas escolhas para cumprir o que determina a Constituição. “Quando vejo a OAB sempre com dedo em riste para as outras instituições, me pergunto por que não olham para seus próprios problemas. Há pessoas que nunca passaram em concurso para juiz e agora aparecem em listas de indicação para desembargador”, afirmou o presidente do STF.

Gilmar Mendes, no entanto, não é contra o instituto do quinto constitucional: "É uma boa fórmula brasileira que permite a pluralidade no Poder Judiciário", disse ele em pesquisa feita pelo Anuário da Justiça. Para o presidente do Supremo o que pode ser discutido é a forma como os advogados são escolhidos. "Os tribunais estão colocando em xeque a escolha, como aconteceu na crise aberta no STJ e no Tribunal de Justiça de São Paulo. É momento de refletir", disse ele.

Em palestra no evento da AMB, a cientista política Maria Tereza Sadek, da Universidade de São Pauloa citou os números da pesquisa do Anuário: 64% dos entrevistados foram a favor da manutenção do quinto constitucional, 8% se manifestaram contra o dispositivo constitucional e 24% não responderam a questão. Foram ouvidos 89 ministros do Supremo Tribunal Federal e dos tribunais superiores de Justiça, do Trabalho, Eleitoral e Militar.

Origem

Mais conceituada pesquisadora do Judiciário, Maria Tereza Sadek fez um histórico da criação do quinto. Ela criticou a origem do quinto, instituído por Getúlio Vargas. “O quinto nasceu de um estado corporativo e antiliberal. Sequer cabia a idéia de maioria e minoria”, afirmou. “É curioso que um instrumento criado por uma Constituição antiliberal tenha se mantido em todas as outras”, completou.

A professora da USP disse que a nomeação do quinto é uma prerrogativa “válida somente para um grupo, em detrimento da maioria”. “Basta ser amigo do rei”, disparou. Um dos argumentos de quem defende o quinto é a “abertura” provocada nos tribunais, uma vez que o mecanismo obriga o ingresso de membros de outras carreiras. Para Sadek, isso não significa, necessariamente, mais democracia nas cortes. “A democracia é quando os tribunais abrem suas portas e prestam contas, e não se há egressos de outra carreira”.

Na Câmara, tramita a Proposta de Emenda à Constituição 262 para acabar com o quinto constitucional. Apresentada em junho do ano passado, a PEC do deputado Neilton Mulim (PR-RJ) sustenta que o dispositivo é ultrapassado e incompatível com os princípios da Constituição de 1988. “O Estado não aceita mais a manutenção do quinto constitucional, que não encontra mais fundamento histórico ou ideológico, exigindo-se sua extirpação, de forma a garantir um modelo ideal de divisão dos poderes da República”, escreveu o deputado na justificativa da PEC.

A proposta está estacionada desde julho de 2008 na Comissão de Constituição e Justiça, à espera do relatório do deputado Marcelo Itagiba (PMDB-RJ).

Direito de defesa

A missão de defender o quinto ficou a cargo do conselheiro da Ordem dos Advogados do Brasil, Marcos Vinícius Furtado Coelho. O advogado rebateu as críticas dos defensores do ingresso somente por concurso público, como acontece com as vagas dos juízes de carreira. “O concurso público não mede o senso crítico, e sim a capacidade de decorar. E nem por isso vamos acabar com o concurso. A mesma coisa vale para o quinto: há reparos, mas nem por isso vamos extingui-lo”, defendeu.

Uma crítica recorrente no evento da AMB foi o poder de influência do Executivo nas nomeações do quinto constitucional. O representante da OAB disse que o problema é maior na escolha de ministros do Supremo Tribunal Federal – questão deixada de lado nas discussões. “A crítica de intervenção do Executivo vale com muito mais força no Supremo do que para o quinto”. Por fim, Coelho disse que a harmonia dos três poderes é clausula pétrea da Constituição e, por isso, “tirar esse poder do Executivo é inconstitucional”.

Mudanças

No Ministério Público, que também se beneficia do quinto, a defesa do mecanismo é um pouco mais comedida. O presidente da Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp), José Carlos Cosenzo, defendeu mudanças no mecanismo. “Nossa proposta é que a vaga do MP deveria ser por mandato e a escolha seja por eleição direta da classe e sem influência do Executivo”, defendeu. “Seria uma forma de estampar a democracia”, concluiu o presidente da Conamp.

Em tom conciliador, o deputado Antonio Carlos Biscaia (PT-RJ), promotor de carreira e ex-procurador-geral do Rio de Janeiro, defendeu o quinto – mas sem deixar de criticá-lo. “Confesso que, quando eu era promotor, eu era algoz do quinto, porque o MP do Rio era enfraquecido”, afirmou. “Mas, hoje refleti e tenho uma posição favorável e de crítica”, completou. Biscaia defendeu mudanças no quinto constitucional. “Todo poder emana do povo e isso justifica o quinto. A crítica tem que ser sobre o processo de escolha”, sustentou.

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