Debate público

Remédios não credenciados motivam audiência no STF

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4 de maio de 2009, 17h54

Muitos cidadãos buscam garantir na Justiça o acesso a medicamentos e outras prestações de saúde prescritas por médicos credenciados junto ao SUS, mas ainda não registrados na Anvisa. O presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Gilmar Mendes, afirmou que foi essa situação que motivou a realização da audiência pública sobre o tema na Corte.

O diretor-presidente da Anvisa, Dirceu Raposo de Mello, explicou os critérios para que um medicamento seja registrado pela entidade e todo o processo necessário para tanto. No caso de medicamentos inovadores, o diretor da Anvisa  explicou que a entrada de produtos novos no mercado é massiva e tem uma velocidade de inovação muito rápida. Ele defendeu um olhar mais detalhado sobre a sua incorporação do remédio, observando o uso racional dos produtos.

O coordenador da Comissão de Incorporação de Tecnologia do Ministério da Saúde, Claudio Maierovitch Pessanha Henrique, afirmou que o desafio atual da comissão é “inverter o enfoque tradicional na adoção de novas tecnologias”.

Segundo ele, 86% das propostas de incorporação de tecnologias submetidas ao Ministério da Saúde são de indústrias, a maior parte sobre medicamento. Daí a necessidade, diz, de se subordinar a análise desses produtos ao interesse público, e não ao interesse de terceiros no fornecimento de medicamentos e de tecnologias desenvolvidos pelas empresas. “O grande desafio colocado a gestores públicos é criar instrumentos para identificar técnicas científicas mais duradouras”, afirma.

Para o presidente do Conselho Nacional dos Procuradores-Gerais de Justiça do Ministério Público dos Estados e da União, Leonardo Bandarra, atendimentos individuais caros prejudicam a assistência universalizada de populações vítimas de doenças endêmicas como hanseníase, malária e tuberculose.

Bandarra propôs que os juízes admitam o fornecimento de remédios experimentais somente quando suas pesquisas já estiverem adiantadas e obedeçam às regras legais. Laboratórios que usam seres humanos como cobaias, defende, devem continuar dando assistência a eles quando concluída a pesquisa, sem que esse ônus recaia sobre o Poder Público.

Um dos poucos pontos de consenso em relação ao SUS é o sucesso da política de distribuição de remédios contra o vírus da AIDS. No entanto, muitos portadores do vírus só conseguem o medicamento com a intervenção da Justiça. Na audiência, o fundador do grupo Hipupiara Integração e Vida, Luiz Alberto Simões Volpe, disse que está vivo até hoje porque já recorreu diversas vezes ao Judiciário para garantir os medicamentos e ter acesso integral ao tratamento contra a AIDS.

O fundador da entidade pediu equilíbrio aos ministros do STF ao julgarem a questão da integralidade do fornecimento de remédios. Luiz Alberto Simões Volpe defende que os medicamentos experimentais devem continuar sendo custeados pelos laboratórios responsáveis pelos estudos. Disse ainda que os medicamentos não licitados e que não fazem parte da lista do SUS, mas são certificados internacionalmente, devem ser disponibilizados administrativamente sem necessidade de intervenção judicial.

Controle específico
O representante da Secretaria de Saúde do estado de São Paulo, Paulo Marcelo Gehm Hoff, disse que o órgão realiza um programa que discute com especialistas da área o uso do remédio e requer um determinado nível de evidência para adoção do medicamento. “É obrigação atender às necessidades de saúde da população, mas estado não é farmácia e o tratamento deve ser um atendimento integral”, disse Gehm Hoff ao defender um controle bem determinado para o uso de medicações.

Ele comparou os números do programa realizado em São Paulo com os gastos gerados por determinações judiciais no estado. Segundo ele, em 2008, o programa gastou R$ 1,125 bilhão para atender 450 mil pessoas, enquanto os recursos com determinações judiciais foi de R$ 350 milhões para atender 33 mil pessoas. Isso significa que o custo médio no programa por paciente gira em torno de R$ 2.500 por ano, enquanto o gasto gerado por decisões judiciais é de R$ 10.600 por paciente/ano. Ou seja, quanto mais o Estado puder se antecipar e evitar ações na Justiça, melhor para os cofres públicos.

O representante da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, Paulo Dornelles Picon, propôs a construção de uma nova forma de avaliação criteriosa de medicamentos e tratamentos, com a criação de centros de medicinas regionais que aplicariam a chamada “medicina baseada em evidência”.

Esses centros, que já vem sendo implantado no Rio Grande do Sul, funcionariam com a presença de um fórum deliberativo composto pelas várias instâncias representativas da sociedade civil organizada, dos usuários, do governo, das áreas da Justiça, entre outros. “É uma proposta inovadora, que talvez possa dirimir questões que estão na Justiça, a incorporação de tratamentos médicos e a qualificação e a assistência [aos usuários do SUS]”, afirmou. 

Administração judicial
“A intervenção judicial é um dos óbices a que o estado do Rio Grande do Sul cumpra regularmente suas obrigações de fornecimento de medicamentos na via administrativa”, disse a procuradora do Rio Grande do Sul, Janaína Barbier Gonçalves. Ela propôs que só seja permitido o acesso a medicamento pela via judicial quando o produto for registrado na Anvisa e que, fora da lista do SUS ou com registro na Anvisa, só se determine o fornecimento em casos muito excepcionais e somente em sentença final.

Dados da Secretaria de Saúde do Rio Grande do Sul mostram que, atualmente, 41% do orçamento daquele órgão são gastos com a política de assistência farmacêutica. De acordo com os dados apresentados pela procuradora do Estado, 87.966 pacientes são atendidos pela via administrativa e 20.497 pela via judicial. “Portanto, 18,92% da assistência farmacêutica do estado estão sendo administrados pelo Judiciário”, observou.

Em 2008, a secretaria aumentou em 40% a aquisição de medicamentos pela via administrativa. Mas, na prática, diz a procuradora, isso não significou diminuição no número de ações judiciais. Houve um crescimento de 16% de 2007 para 2008. A procuradora ressaltou que 66% dos medicamentos excepcionais fornecidos por via judicial não atendem aos protocolos clínicos e às diretrizes terapêuticas do Ministério da Saúde. *Com informações da Assessoria de Imprensa do Supremo Tribunal Federal.

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