Solução privada

Justiça mantém decisões arbitrais, diz estudo

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30 de junho de 2009, 21h10

A Justiça tem mantido as sentenças dadas por tribunais arbitrais. Só não o faz quando as decisões estão incorretas e merecem reparos. A conclusão se baseia em uma pesquisa feita pelo Comitê Brasileiro de Arbitragem e pela Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas, a GVlaw, divulgada nesta terça-feira (30/6) pelo jornal Valor Econômico.

O levantamento, que começou em 2006 com a promulgação da Lei de Arbitragem — a Lei 9.307/96 — e terminou em dezembro do ano passado, mostra que, nos 790 processos que discutiram cláusulas arbitrais encontrados nos tribunais federais e estaduais, apenas 33 contestaram a validade da sentença arbitral. Desse total, a Justiça considerou nulas apenas 14 decisões, o que comprova a legitimidade da arbitragem perante o Judiciário.

Leia a reportagem, assinada pela jornalista Zínia Baeta

Judiciário dá aval ao uso da arbitragem, revela pesquisa

Discussões entre pessoas físicas e causas com valores inferiores a R$ 10 mil. O que poderia ser o perfil do dia a dia de qualquer juizado especial do país envolve, na verdade, demandas relacionadas à arbitragem levadas ao Poder Judiciário durante os últimos 12 anos. Desde que a Lei de Arbitragem entrou em vigor, em novembro de 1996, poucos foram os casos em que as partes pediram que a Justiça anulasse decisões arbitrais. E mesmo quando isso ocorreu, foram invalidadas apenas sentenças em que uma das partes – a maioria pessoas físicas – tenha sido, de alguma forma, pressionada a assinar um contrato com uma cláusula prevendo o uso da arbitragem para a solução de conflitos. Em casos assim, a parte abriu mão de submeter possíveis conflitos à Justiça por imaginar, por exemplo, estar fechando um acordo perante o Judiciário. As situações relatadas fazem parte de um estudo inédito realizado pelo Comitê Brasileiro de Arbitragem (CBar) em parceria com a Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

Por quase dois anos, pesquisadores das duas entidades levantaram 790 acórdãos dos tribunais brasileiros – da Justiça estadual e federais e das cortes superiores – com o objetivo de avaliar de que forma o Judiciário decide as ações relacionadas à arbitragem: se tem dado respaldo ou não à aplicação do método extrajudicial de solução de conflitos. Desse total, foram excluídas 112 decisões do Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO), em razão das peculiaridades do uso da arbitragem no Estado por conta de um convênio com a seccional local da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-GO) que vigorou até 2008.

As conclusões da primeira parte do estudo são positivas para os entusiastas da arbitragem. Primeiramente porque demonstra que o Judiciário tem aplicado exatamente o que está na Lei de Arbitragem para anular sentenças arbitrais – em situações em que o compromisso arbitral é nulo ou a sentença foi proferida por quem não poderia ser árbitro, por exemplo. Outra conclusão é a de que a arbitragem vai muito bem para as relações entre as empresas – poucos foram os pedidos de anulação de sentenças arbitrais feitos por pessoas jurídicas. "As empresas sabem que o cumprimento da sentença faz parte da regra do jogo", afirma a advogada e uma das coordenadoras científicas da pesquisa pela FGV, Selma Lemes. Segundo ela, os casos levados à Justiça foram aqueles em que a arbitragem não foi devidamente aplicada.

Na primeira amostra da pesquisa, das 678 decisões colhidas entre novembro de 1996 e fevereiro de 2008 nos sites dos tribunais – exceto no Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), onde o trabalho se estendeu até dezembro de 2007 -, foram selecionadas 90 nas quais se discutiu a anulação da sentença arbitral. Dessas, apenas 33 tratavam diretamente da validade da sentença arbitral e tiveram o mérito do pedido julgado. A advogada do L.O Baptista e presidente do Comitê Brasileiro de Arbitragem, Adriana Braghetta, afirma que, desse universo de decisões, em 19 delas as sentenças arbitrais foram mantidas pelo Judiciário. "Nesses casos, os laudos foram mantidos, pois existiam cláusulas compromissórias e os procedimentos foram adequados", afirma. Nos demais processos, 14 sentenças arbitrais foram julgadas inválidas pela Justiça, "de forma extremamente técnica", avalia Adriana. "Em geral, existia algum vício de consentimento da parte", diz. Um dos princípios da arbitragem é o de que o uso do método de resolução de conflitos extrajudicial, em substituição ao Judiciário, seja sempre de livre escolha das partes, sob o risco de anulação.

Outra constatação do levantamento é a grande presença de pessoas físicas nos processos analisados. Nas 14 decisões em que houve anulação da sentença arbitral, a metade envolvia pessoas físicas. E em 71% do total, uma das partes era uma pessoa física. Segundo o levantamento, em 80% da situações – ou em 11 casos -, os valores envolvidos estão abaixo de R$ 10 mil. Segundo o professor da FGV, Paulo Eduardo Alves da Silva, e o diretor do CBar, Rafael Francisco Alves, há indícios de que parte dos pedidos de anulação envolviam irregularidades praticadas por câmaras arbitrais inidôneas – as chamadas câmaras "de fachada". Em um dos processos levantados pela pesquisa, por exemplo, a autora da ação pedia para anular a sentença arbitral alegando que foi coagida a assinar um acordo reconhecendo um débito existente perante uma das rés. Segundo ela, o pacto arbitral só foi assinado porque ela foi levada a acreditar que estava na presença de juízes togados. Para os pesquisadores, em situações como essa, o entendimento do Judiciário só contribui para a correta aplicação e fortalecimento da arbitragem.

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