Direito relativo

Sigilo bancário não impede fiscalização tributária

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27 de junho de 2009, 6h45

Os direitos fundamentais surgiram de forma sistemática como uma forma de limitação do poder estatal, necessária ao desenvolvimento de uma sociedade burguesa, a partir do século XVIII.

Concebidos à luz do jusnaturalismo, os direitos fundamentais foram vistos, durante certo tempo, com um certo fetichismo, que tentava identificar tais prerrogativas como inerentes à condição humana e, portanto, intocáveis. O pragmatismo que se seguiu nos séculos seguintes, porém, veio a dar uma nova nuance à temática, identificando pontos em que a relativização dos direitos fundamentais mostrava-se necessária para não causar maior dano à sociedade e ao Estado, evitando, dessa forma, abusos.

Discute-se, aqui, em suma, a possibilidade de relativização do direito ao sigilo bancário em hipóteses previstas pelo legislador. Dentro dessa ótica, cabe aqui a discussão sobre a existência de reserva jurisdicional em relação ao sigilo de dados, em especial os bancários.

Ponto nodal da investigação sobre o tema certamente reside em saber até que ponto podem os direitos fundamentais individuais impedir o funcionamento de mecanismos estatais que atuam em prol do resguardo de direitos fundamentais coletivos como a segurança.

Caso se conclua pela possibilidade de se modular tais direitos, cabe ainda arguir se existem parâmetros objetivos para definir a dinâmica dos direitos fundamentais no que tange à sua flexibilização.

Na prática, já encontramos inúmeros atos normativos já editados sob a égide da Constituição de 1988 e que permitem o acesso de órgãos de fiscalização a dados bancários independentemente da intervenção judicial, restringindo, dessa forma, o direito fundamental à intimidade. Há que se arguir, então, a legitimidade de tais atos.

Destacamos, dentre as normas dessa natureza, aquelas que estipulam a possibilidade de a administração tributária determinar unilateralmente a quebra de um sigilo constitucionalmente garantido.

Teoria Geral dos Direitos Fundamentais
Os direitos e garantias individuais ganharam cada vez mais espaço, desde as revoluções burguesas do século XVIII. O movimento renascentista, marcado pela transição do Feudalismo para o Capitalismo, nos séculos XIV a XVI, deixou as raízes para o Humanismo, movimento que contestou a Igreja, trazendo o ser humano como o centro do universo, razão primeira de todas as coisas. Essa mudança de foco trouxe consequências para a relação entre os soberanos e súditos, que deixou de ser fundamentada por fatores religiosos para evoluir numa concepção contratualista.

Nessa concepção contratualista, o indivíduo é visto como algo que precede o Estado, ao qual passa a aderir por conveniência. Assim, a submissão à vontade Estatal é vista como um mal necessário a que se submete o ser humano em troca de conveniências. Essa ideia gera duas consequências. Em primeiro lugar, cria o embasamento teórico para reivindicar prestações positivas do Estado como forma de contraprestação à sua submissão. Em segundo lugar, gera a ideia de que existem direitos pré-existentes ao Estado, inerentes à condição humana e, portanto, indisponíveis.

Dois pensadores revolucionaram a concepção de Estado e merecem destaque dentro da teoria dos direitos fundamentais. Um deles é Jean-Jacques Rousseau, teórico do Iluminismo francês do século XVIII, que, com suas ideias, lançadas em “O Contrato Social”, influenciou de forma decisiva a Revolução Francesa. O outro iluminista, autor da obra “Segundo Tratado sobre o Governo Civil”, foi John Locke, que defendia abertamente a limitação dos poderes estatais em face dos direitos naturais do homem. Locke tornou-se peça decisiva nas revoluções americana, inglesa e francesa.

Essas ideias liberais motivaram a positivação dos Direitos Fundamentais. A descrição sistemática dos direitos fundamentais veio com as declarações de direitos. Em 1776 foi editada a Declaração de Direito da Virgínia da Virgínia e, posteriormente, com a edição da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, em 1789.

Assim, o art. XVI da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, trazendo um freio ao poder absolutista do Estado, trouxe a previsão de que “qualquer sociedade na qual a garantia dos direitos não está em segurança, nem a separação dos poderes determinada, não tem Constituição”.

Em muitas análises histórico-constitucionais as revoluções burguesas são vistas como paradigmas de libertação do povo contra a opressão do Estado.

Observando esse fenômeno sob a ótica do materialismo histórico, porém, podemos encarar a evolução da teoria dos direitos fundamentais como uma forma de legitimar a substituição do primeiro opressor, o Estado, por outro opressor, o capital.

Durante o sistema feudal a figura do Estado, fortemente marcada por uma estrutura militar organizada, era a que preponderava dentro da dinâmica social.

Com o desenvolvimento do comércio, com a estruturação do capital e das atividades financeiras, bem como com o desenvolvimento tecnológico da manufatura, a possibilidade de acumular capital, agregando-se valor a um insumo por meio do trabalho, mostrou ser o principal fator de poder. Os burgos aparecem então como centros de liberdade, aonde pessoas sem nobreza, mas com espírito empreendedor, podiam se tornar donos dos meios de produção.

Na França essa condição econômica da recente classe burguesa é inserida dentro de um quadro totalmente favorável a uma revolução voltada à substituição da ditadura estatal para uma ditadura da burguesia. Uma crise na produção agrícola deixava as grandes massas populares sem alimentos básicos como o pão preto. O Estado francês realizava crescentes incrementos na carga tributária, gerados em virtude do patrocínio da guerra travada na América contra os ingleses e pelos altos gastos da nobreza e do Clero, que era sustentado pela máquina estatal.

Intelectualmente, afloram pensamentos liberais como os de John Locke, complementados pela teoria contratualista de Jean-Jacques Rousseau e pela tripartição de poderes de Montesquieu, o que estimulava a revolta do iminente Terceiro Estado (força política que emergia à época e que iria se rebelar contra o Primeiro Estado, representado pelo Clero, e o Segundo Estado, composto pela nobreza), idealizado na obra de Emmanuel Joseph Sieyès[1].

A junção de todos esses fatores fez eclodir a revolução que certamente mudou o rumo da História, representando a total decadência do sistema feudal e inaugurando um novo Estado, burguês e liberal, adaptado ao desenvolvimento do novo modelo econômico: o capitalismo.

Na Constituição do Brasil, de 1988, verificou-se a positivação dos direitos e garantias fundamentais, que podem ser encontrados em seu Título II (arts. 5º a 17).

Apesar de parecerem sinônimos, os termos “direito” e “garantia”, que aparecem no referido título, não se confundem. Direito é o objeto, aquilo que é diretamente conferido ao indivíduo, uma espécie de bem a ele pertencente, enquanto garantia é o mecanismo que busca proteger tais direitos. Assim, costuma-se dizer que os direitos se declaram (caráter declaratório), enquanto as garantias se estabelecem (caráter instrumental). Dessa maneira, procura a Constituição estabelecer uma série de valores indispensáveis ao bem estar de todos. Os principais direitos e garantias fundamentais são divididos em individuais, coletivos, sociais, de nacionalidade e políticos.

Os direitos fundamentais são formados por normas-princípio e por normas-regra (ou normas-disposição). As normas-princípio possuem um maior grau de abstração, veiculando um conceito aberto, passível de complementação futura. O devido processo legal, por exemplo, é um princípio previsto no art. 5º da Constituição Federal e que engloba uma enorme amplitude de conceitos e consequências. As normas-regra, por sua vez, são mais concretas, aplicáveis a uma determinada hipótese. São destacadas por seu conteúdo prático, como a que encontramos no art. 5º, XII, e que será objeto de nosso estudo, que dispõe que é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas.

Titularidade
No que tange à titularidade dos direitos fundamentais, há de se asseverar que os direitos fundamentais, ao contrário do que possa aparecer, não se destinam unicamente às pessoas físicas, razão pela qual se pode até mesmo dizer que transcendem à mera designação de direitos humanos.

Alguns direitos se ligam exclusivamente às pessoas físicas, como os relativos à prisão, ao direito de locomoção, ao exercício de direitos políticos etc.

Outros, por sua vez, se destinam claramente a pessoas jurídicas, como as disposições acerca das associações. Até mesmo as pessoas jurídicas de direito público podem vir a titularizar direitos fundamentais. Isso ocorrerá quando elas estão em pé de igualdade com os particulares, participando, por exemplo, de uma demanda judicial movida contra um particular. Nesse caso, as garantias publicistas do processo serão plenamente resguardadas ao Poder Público.

Os estrangeiros também podem ser listados como titulares de direitos fundamentas, principalmente no que se refere a elementos de nacionalidade e a proteções relacionadas à extradição. Além disso, também serão detentores, no território nacional, dos direitos inerentes aos brasileiros, desde que não sejam exclusivos, como, por exemplo, a vedação absoluta à extradição.

Apesar de o caput do art. 5º da Constituição Federal se referir especificamente aos “estrangeiros residentes no país”, deve-se levar em conta que todos os estrangeiros que estejam em nosso país serão protegidos, independentemente de seu local de domicílio.

Entende-se que, nesse ponto, a vontade da lei não ficou bem delineada no dispositivo constitucional. É que limitar a titularidade dos direitos fundamentais seguindo critérios de domicílio vai de encontro ao seu caráter “jusnaturalista”, que leva a uma concepção de direitos inerentes à condição humana. Seria uma insanidade imaginar que um estrangeiro de férias no país não possuísse direitos fundamentais como a vida, a propriedade etc.

No que toca à titularidade dos direitos fundamentais, cabe destaque a existência das relações especiais de sujeição, que inserem o indivíduo em uma esfera especial em relação aos demais, sujeitando a um regime jurídico que exclui de sua titularidade certos direitos fundamentais. São exemplos os militares e os presidiários, que deixam de titularizar certos direitos, como a liberdade de expressão e a de locomoção, em virtude da peculiar situação em que se encontram.[2]

Os estatutos que vierem a excluir da incidência de certos direitos fundamentais aqueles que estão sujeitos a uma relação especial de sujeição devem respeitar a proporcionalidade, evitando excluir direitos que não se mostrem relacionados o regime jurídico de seu titular. Dessa forma, mostra-se incabível excluir a totalidade dos direitos fundamentais, ainda que se trate de pessoa sujeita a uma relação especial de sujeição. O preso, por exemplo, apesar de não possuir o direito de locomover-se, continua a possuir, de forma totalmente incólume, o direito à vida e todos os seus consectários.

Sob o ponto de vista passivo, é pacífico o posicionamento no sentido de que o Estado é o grande destinatário da norma, ou seja, que os direitos fundamentais são essencialmente destinados a limitar e orientar o campo de atuação estatal. Isso decorre da própria dinâmica de criação desses direitos, originados dentro de um contexto de abusos estatais sistemáticos.

A evolução da teoria dos direitos fundamentais provocou, por outro lado, a consagração dos direitos que podem ser exigidos tanto da figura estatal quanto do particular. Em suma, constata-se que os direitos fundamentais podem vir a regular relações eminentemente privadas. A tal fenômeno denomina-se efeito externo ou eficácia horizontal dos direitos fundamentais.

Assim, podemos distinguir no texto constitucional a existência de três tipos de direitos fundamentais. O primeiro grupo seria formado por normas que, como os direitos políticos, envolve necessariamente a atuação do Estado. O segundo grupo, porém, é composto por normas diretamente voltadas aos particulares, como os direitos trabalhistas, por exemplo. Por fim, um terceiro grupo poderia ser formado por regras que podem ser contrapostas à figura estatal ou serem utilizadas perante particulares. Seria o caso do devido processo legal, por exemplo, que já foi utilizado em face de ato privado de exclusão de sociedade privada. Dentre diversos julgamentos realizados no âmbito do Supremo Tribunal Federal se destaca o do RE 201.819/RJ, Rel. para o acórdão Min. Gilmar Mendes[3], do qual se extrai o seguinte trecho:

“(…)I. EFICÁCIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NAS RELAÇÕES PRIVADAS. As violações a direitos fundamentais não ocorrem somente no âmbito das relações entre o cidadão e o Estado, mas igualmente nas relações travadas entre pessoas físicas e jurídicas de direito privado. Assim, os direitos fundamentais assegurados pela Constituição vinculam diretamente não apenas os poderes públicos, estando direcionados também à proteção dos particulares em face dos poderes privados.

II. OS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS COMO LIMITES À AUTONOMIA PRIVADA DAS ASSOCIAÇÕES. A ordem jurídico-constitucional brasileira não conferiu a qualquer associação civil a possibilidade de agir à revelia dos princípios inscritos nas leis e, em especial, dos postulados que têm por fundamento direto o próprio texto da Constituição da República, notadamente em tema de proteção às liberdades e garantias fundamentais. O espaço de autonomia privada garantido pela Constituição às associações não está imune à incidência dos princípios constitucionais que asseguram o respeito aos direitos fundamentais de seus associados. A autonomia privada, que encontra claras limitações de ordem jurídica, não pode ser exercida em detrimento ou com desrespeito aos direitos e garantias de terceiros, especialmente aqueles positivados em sede constitucional, pois a autonomia da vontade não confere aos particulares, no domínio de sua incidência e atuação, o poder de transgredir ou de ignorar as restrições postas e definidas pela própria Constituição, cuja eficácia e força normativa também se impõem, aos particulares, no âmbito de suas relações privadas, em tema de liberdades fundamentais. (…)” (grifo nosso)

Dessa forma, deixam os direitos fundamentais de se relacionarem estritamente à relação desigual entre indivíduo e Estado para se mostrarem como direitos inerentes a qualquer relação intersubjetiva.

Gerações
Os direitos fundamentais podem ser classificados em diversas gerações, que expressam cronologicamente a evolução na incorporação desses direitos. Apesar da grande divulgação que o termo geração possui, sua impropriedade se mostra latente pelo fato de passar a ideia de sucessão, ou seja, a de que uma nova geração substitui a geração pretérita. O termo dimensão, nesse sentido, seria o mais apropriado, já que não pressupõe o abandono de um grupo de direitos pela evolução dos direitos fundamentais. Assim, podemos utilizar tanto o termo geração, mais consagrado, quanto o termo dimensão, tecnicamente mais apropriado.

Os primeiros a surgirem foram os relacionados às liberdades básicas, como o direito à vida e o direito de ir e vir, que são os direitos de primeira geração, ou de primeira dimensão. Os direitos de primeira geração exigem atitudes negativas do Estado, um não-fazer, uma abstenção (status negativus). Fala-se, então, em absenteísmo estatal, já que o respeito de tais direitos volta-se apenas a evitar o abuso do poder estatal, não requerendo a execução de políticas públicas. Não se pode, por exemplo, punir um criminoso com a pena de morte porque estaria sendo ferido o direito básico da vida. Esses direitos são os direitos civis e políticos.

Logo após esse primeiro movimento, com a emergência de revoltas sociais dos trabalhadores, ocorridas no período da Revolução Industrial, surgiram os direitos sociais, econômicos e culturais, que são os direitos de segunda geração, ou de segunda dimensão. Tais direitos, ao contrário dos primeiros, exigem uma prestação positiva do Estado, um fazer, uma ação.

Por fim, com o fortalecimento das instituições democráticas e da sociedade, sugiram os direitos relativos a um meio ambiente equilibrado, à qualidade de vida, à paz e a outros interesses difusos que são os de terceira geração, ou seja, direitos pertencentes à sociedade como um todo (direitos coletivos em sentido lato). O ministro Carlos Velloso divide os direitos de terceira geração em dois grupos. O primeiro grupo, aplicável no plano internacional, compreende o direito ao desenvolvimento e a uma nova ordem econômica mundial, direito ao patrimônio comum da humanidade e direito à paz. No plano interno, são citados interesses difusos e coletivos, como, por exemplo, o direito ao meio ambiente.[4]

Para fins didáticos, as três gerações de direitos e garantias fundamentais podem ser relacionadas, respectivamente, com os três direitos reivindicados pela Revolução Francesa: liberdade (1ª geração), igualdade (2ª geração) e fraternidade (3° geração).[5]

Hoje já se fala em direitos de quarta e de quinta geração, mas não temos unanimidade conceitual. Para alguns, os direitos de quarta geração seriam aqueles relacionados à engenharia genética e seus avanços. Para outros, esses direitos seriam os direitos nascidos com a globalização. Por fim, cogita-se que os direitos de quarta geração seriam direitos republicanos, que traduzem a capacidade de o indivíduo atuar de forma ativa na construção das políticas públicas, por meio, por exemplo, dos conselhos.

Características
Os direitos fundamentais possuem certas peculiaridades, como as que veremos passamos a estudar.

Primeiramente, cumpre destacar a inalienabilidade, segundo a qual os direitos fundamentais são instransferíveis, inegociáveis. A ideia de inalienabilidade deriva, de certa forma, da concepção jusnaturalista dos direitos fundamentais. A concebermos a ideia de que os direitos fundamentais derivam da própria natureza humana, chegamos à conclusão de que não é possível que nenhum ser humano seja privado de tais prerrogativas. Dessa forma, enquanto direito natural, um direito fundamentais não estaria à disposição seja do legislador, seja do seu próprio titular.

A ideia de direito natural é alvo de muitas críticas, principalmente decorrentes do fato de os direitos fundamentais decorrerem, em verdade, de uma sequência de revoluções sociais que, de certo modo, são muito recentes se comparadas à história da humanidade. Dessa forma, verifica-se que tais direitos são uma construção histórica que dependeu do legislador positivo, e não da ordem natural das coisas[6].

Ademais, sob o ponto de vista objetivo, os direitos fundamentais não deixam de ser exigíveis em virtude do decurso do tempo, o que demonstra que são também imprescritíveis.

A irrenunciabilidade, terceira característica que merece destaque, impõe a impossibilidade de se abdicar totalmente de um direito fundamental. O titular do direito pode até mesmo optar por não exercer parcialmente o direito, mas nunca poderá existir uma renúncia total. Sendo assim, a eutanásia, mesmo que reivindicada pelo paciente, não poderia ser exercida, pois significa a renúncia total ao direito à vida, eminentemente fundamental.

Característica das mais importantes para nosso estudo é a da relatividade. Os direitos fundamentais são passíveis de limitação. Não é possível cogitar-se da existência de direitos fundamentais absolutos. Na hipótese de conflitos, os direitos fundamentais podem vir a ser reduzidos segundo critérios de proporcionalidade e de razoabilidade.

A característica da historicidade demonstra que os direitos fundamentais nascem a partir de uma evolução histórica do Direito, reconhecendo-se cada vez mais novas ordens de características inerentes à natureza humana e que imprescindem de proteção constitucional.

Não existe a possibilidade de os direitos fundamentais serem desrespeitados, deixando o Poder Público de reconhecer sua imperatividade. A isso denomina-se inviolabilidade.

A universalidade significa que os direitos fundamentais alcançam todos, sem levar em conta fatores discriminatórios.

A característica da efetividade destaca a importância de o Poder Público lutar para que esses direitos se tornem cada vez mais efetivos.

Além disso, destaca-se a interdependência dos direitos fundamentais. Assim, tais direitos formam uma malha completamente interligada de direitos que se unem na proteção de bens jurídicos muitas vezes comuns.

Por fim, cumpre citar a complementaridade, segundo a qual, não é possível interpretar isoladamente os direitos fundamentais. Eles precisam ser entendidos, dessa forma, dentro de sua completude.

Relativização dos Direitos Fundamentais
Os direitos humanos devem ser encarados de forma sistemática, formando uma rede de proteção dos indivíduos e que, portanto, exige como caracter essencial a completude desse sistema. Essa conclusão, porém, não pode levar a uma conclusão que reconheça caráter absoluto a tais liberdades públicas.

Sendo assim, impossível cogitar-se da existência de direitos absolutos ao ponto de amparar, por exemplo, a prática de atividades ilícitas.

Os direitos fundamentais servem à limitação da atividade estatal em prol da sociedade. Quando os direitos fundamentais servem de escudo a práticas ilícitas, essa lógica é invertida, posto que passa a limitar o Estado em contraposição a interesses da própria sociedade, que vê no Estado policial a garantia da paz social.

Nesse sentido, afirma Alexandre de Moraes[7]:

Os direitos humanos fundamentais, dentre eles os direitos e garantias individuais e coletivos consagrados no art. 5º da Constituição Federal, não podem ser utilizados como um verdadeiro escudo protetivo da prática de atividades ilícitas, tampouco como argumento para afastamento ou diminuição da responsabilidade civil ou penal por atos criminosos, sob pena de total consagração ao desrespeito a um verdadeiro Estado de Direito.

Aponta, ainda, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, que em seu art. 29 afirma:

1. Toda pessoa tem deveres para com a comunidade, em que o livre e pleno desenvolvimento de sua personalidade é possível.

2. No exercício de seus direitos e liberdades, toda pessoa estará sujeita apenas às limitações determinadas pela lei, exclusivamente com o fim de assegurar o devido reconhecimento e respeito dos direitos e liberdades de outrem e de satisfazer às justas exigências da moral, da ordem pública e do bem-estar de uma sociedade democrática.

3. Esses direitos e liberdades não podem, em hipótese alguma, ser exercidos contrariamente aos propósitos e princípios das Nações Unidas.

Passaremos a analisar, dentro da teoria dos direitos fundamentais, quais são as hipóteses em que é possível relativizar o âmbito de proteção de tais direitos e quais os parâmetros que devem ser seguidos.

Relativização na Hipótese de Colisão de Direitos
Em muitas ocasiões concretas será possível verificar-se a existência de conflitos entre direitos fundamentais. Hipótese clássica é aquela que se refere ao conflito entre o direito de informação e o direito à intimidade. Teria o jornalista, com base no direito de informação contido no art. 5º, XIV, da Constituição Federal, o direito de invadir a privacidade de uma pessoa, ferindo, assim, seu direito de intimidade (art. 5º, X, da CF)?

A resposta para tais indagações passa necessariamente pela realização, pelos operadores do direito em geral, de um juízo de ponderação. Essa análise, porém, não é pré-estabelecida de forma objetiva, ou seja, não existem fórmulas prévias a orientar qual direito deve prevalecer na situação concreta. Muitas vezes a ponderação entre direitos de mesma natureza pode surtir efeitos diversos, dependendo de uma série de fatores envolvidos.

Por exemplo, a divulgação da imagem de uma pessoa não ocorrer sem sua autorização quando envolver interesses comerciais. Por outro lado, se estiver em jogo a atividade jornalística, há uma redução do direito de imagem em prol do direito de informação. O direito de informação, porém, pode deixar de preponderar se não estivermos tratando de uma pessoa pública e a imagem for divulgada em close. Outras perguntas precisam ser feitas, tais como: a divulgação foi realizada de modo a provocar danos morais ou materiais ao indivíduo? A imagem foi obtida em um local público? Houve consentimento da pessoa fotografada ou filmada? Agentes públicos têm uma redução no seu direito de intimidade quando no exercício de sua função, em virtude do princípio da publicidade?

Todos esses questionamentos são trazidos à tona quando, por exemplo, um jornalista vem a divulgar imagens da tela do computador de ministros do Supremo Tribunal Federal tiradas em plena sessão de votação[8]. Qual direito deve prevalecer?

Cabe lembrar, também a título exemplificativo, um de seus casos mais conhecidos a Suprema Corte Brasileira, da ADI 319-QO/DF, Rel. Min. Moreira Alves, no qual se definiu ser compatível com a Constituição a definição de limites aos reajustes das mensalidades das escolas particulares. Nesse caso, houve uma ponderação da livre iniciativa e do princípio da liberdade de concorrência em prol da defesa do consumidor e da redução de desigualdades.[9]

A primeira baliza a ser estudada é o respeito ao princípio da proporcionalidade e da razoabilidade. Tal parâmetro impõe a observância dos princípios da proporcionalidade em sentido estrito (que prevê a impossibilidade de se gerar um dano maior do que o benefício auferido), da adequação e da necessidade.

A necessidade de aplicação dessas balizas pode ser verificada não apenas na atividade jurisdicional, mas também pelo próprio legislador, que deve observar a proporcionalidade quando vier a concretizar em regras (funcionais) os diversos princípios (abstratos) inseridos no rol de direitos e garantias fundamentais.

Nessa atividade o intérprete da Constituição deve cuidar para evitar o sacrifício total de um dos direitos em conflito. Trata-se da observância do princípio hermenêutico da concordância prática ou da harmonização, segundo o qual o intérprete deve buscar uma solução que não venha a restringir de forma absoluta um direito ou garantia fundamental. Dessa forma, a redução do âmbito de proteção de um determinado direito fundamental não pode levar a uma redução que não respeite o que se convencionou chamar “núcleo essencial”[10] do direito, que é a uma espécie de esfera mínima de proteção do direito que, se invadida, desnatura a sua própria concepção.

Há que se asseverar, mais uma vez, que o estudo da melhor forma de harmonização dos direitos fundamentais há de passar, necessariamente pelo estudo do caso concreto. Não é possível, assim, estabelecer hierarquia entre direitos fundamentais com a finalidade de criar regras pré-estabelecidas de solução dos conflitos, ainda que apenas aparentes. A estipulação de valores diferenciados para os direitos fundamentais levaria a um paradoxo. Isso, porque teria como pressuposto a aceitação de que existem direitos mais fundamentais que outros, o que é incoerente.

A ideia de direitos fundamentais deriva, necessariamente, de uma concepção de direito natural, que identifica na prerrogativa algo inerente à condição humana. Sendo assim, não é possível imaginar que alguns direitos sejam dispensáveis, já que, em tese, são direitos sem os quais o indivíduo é privado de caracteres próprios da personalidade. Se fundamentais, portanto, não podem sê-lo em graduação.

Apesar disso, é possível perceber uma tendência de hierarquização tanto sob o ponto de vista doutrinário, quanto do ponto de vista constitucional. Doutrinariamente, temos o posicionamento de Alexandre de Moraes, por exemplo, para quem “o direito à vida é o mais fundamental de todos os direitos, já que se constitui em pré-requisito á existência e exercício de todos os demais direitos.[11]

No texto constitucional, por sua vez, temos o exemplo trazido pela Emenda Constitucional 45/04, que deu a seguinte redação ao art. 93, IX, da Constituição Federal:

“todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação

Nesse caso temos uma interpretação autêntica, feita pelo próprio texto normativo, que já traz uma fórmula para a solução de conflitos entre o direito de intimidade e o interesse público à informação no âmbito da atuação judicial.

Esse tipo de ponderação de valores fundamentais, além de ser feita, diante do caso concreto, pelo Poder Judiciário, pode ser predisposta em texto normativo, em caráter abstrato, por meio da atividade legislativa.

Uma forma de resolver conflitos de direitos fundamentais é estabelecer o âmbito de proteção do direito, estabelecendo, dessa forma, as hipóteses em que ele não estará abrangido[12]. Imaginemos que tal atividade resultaria na definição do raio de ação do direito fundamental.

De pronto é possível estabelecer um parâmetro de não-abrangência do direito fundamental, que corresponde à ilicitude. Assim, apesar de a Constituição Federal preceituar a existência da liberdade profissional, não é possível suscitar tal prerrogativa para o exercício do ofício de “traficante de drogas”, dado que resulta em prática ilícita.

Em outras hipóteses, a determinação do âmbito de proteção visa a não anular outro preceito constitucional. Dessa forma, ao estabelecermos que o direito de ir, vir e permanecer com seus bens no território nacional não importa em imunidade tributária, estamos evitando a completa caducidade do imposto de importação. Estar-se-ia, na hipótese, definindo quais são os limites implícitos do direito de locomoção.

A definição do âmbito normativo do direito fundamental passaria pela diferenciação do que é modalidade inespecífica de exercício do direito e o que é modalidade específica. A forma inespecífica e irrelevante corresponderia à aferição da possibilidade de se exercer o direito fundamental de uma outra forma. Por exemplo, poderíamos perguntar se o direito de locomoção inclui o direito de trafegar por uma determinada calçada, quando é possível chegar ao destino caminhando por outro passeio público. Fica claro que o direito fundamental não chegaria a esse ponto[13].

Possibilidade de Limitação de Direitos Fundamentais
Os direitos e garantias fundamentais jamais podem ser aplicados em contraposição ao objetivo para o qual foram criados ou de forma a gerar mais lesão do que proteção a bens jurídicos protegidos pelo Direito Público ou Privado. Levando em conta tais aspectos, tanto a doutrina quanto a jurisprudência geraram posicionamentos homogêneos, no sentido de que é ínsito ao sistema de proteção das liberdades públicas o caráter relativo de tais limitações à atuação estatal.

A possibilidade de relativização dos direitos fundamentais é também reconhecida no âmbito do Supremo Tribunal Federal, que assim se pronunciou no MS 23.452/RJ[14], do qual se extrai o seguinte trecho:

“(…)OS DIREITOS E GARANTIAS INDIVIDUAIS NÃO TÊM CARÁTER ABSOLUTO.

Não há, no sistema constitucional brasileiro, direitos ou garantias que se revistam de caráter absoluto, mesmo porque razões de relevante interesse público ou exigências derivadas do princípio de convivência das liberdades legitimam, ainda que excepcionalmente, a adoção, por parte dos órgãos estatais, de medidas restritivas das prerrogativas individuais ou coletivas, desde que respeitados os termos estabelecidos pela própria Constituição.

O estatuto constitucional das liberdades públicas, ao delinear o regime jurídico a que estas estão sujeitas – e considerado o substrato ético que as informa – permite que sobre elas incidam limitações de ordem jurídica, destinadas, de um lado, a proteger a integridade do interesse social e, de outro, a assegurar a coexistência harmoniosa das liberdades, pois nenhum direito ou garantia pode ser exercido em detrimento da ordem pública ou com desrespeito aos direitos e garantias de terceiros.(…)” (grifo nosso)

Isso demonstra, portanto, a total impossibilidade de se reconhecer um caráter absoluto aos direitos fundamentais. Essa conclusão é reforçada pelo fato de que mesmo os direitos considerados de 1ª geração, aqueles que foram precipuamente reconhecidos no século XVII, no âmbito da revolução burguesa, considerados inerentes à condição humana, podem vir a ser restringidos. Para tanto é necessário definir-se quais são os limites imanentes ao núcleo de direitos ali protegidos, ou seja, quais são os valores efetivamente alcançados pela garantia fundamental. Definindo-se esses limites será possível efetuar uma conformação do direito analisado, evitando, por exemplo, que uma liberdade resulte, por conta da falta de limites, em um abuso de prerrogativas.

A Justiça Federal[15], em decisão proferida em julho de 2007, por exemplo, reconheceu a possibilidade de restringir-se o acesso público a uma praia localizada no Balneário Camboriú/SC, onde a prática de naturismo é prevista em legislação municipal. Entendeu-se que a Câmara de Vereadores estava corretamente restringindo o direito de ir e vir em prol de outros valores, tais como a liberdade de opinião e o direito das minorias.

É de se questionar, portanto, o seguinte. Se até mesmo o Poder Legislativo Municipal, afeto quase que exclusivamente a questões de interesse local, pode legislar a ponto de restringir um direito fundamental, o que se dirá de uma legislação emanada do legislativo da União que venha a restringir o sigilo bancário em prol do interesse público de combate à sonegação? A União, nessa situação, apenas estaria exercendo sua competência constitucional de fiscalização de operações financeiras (art. 21, VIII, da CF) e de identificação das atividades econômicas do contribuinte (art. 145, § 1º, da CF).

Essa ideia de relativização torna-se mais robusta a partir do momento em que paramos de imaginar o sistema constitucional de proteção do indivíduo como algo taxativo, limitado, estático. É necessário imaginar que outros direitos fundamentais também surgem ao longo da história e almejam participar dessa sistemática de proteção. Não existe, como se pode perceber, uma reserva constitucional ao poder de restrição dos direitos individuais. Isso, porque, conforme a dicção do parágrafo 2° do art. 5° da Constituição Federal, os direitos e garantias expressos na Carta não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte. Ora, se atos de estatura infraconstitucional podem estabelecer direitos e garantias fundamentais, o mesmo há que se afirmar no que se refere à estipulação de restrições a tais direitos, tendo em vista que em vários casos as esferas de proteção se tangenciam.

Não há que se alegar, por outro lado, para burlar a conclusão lógica acima, que os direitos fundamentais previstos na Constituição Federal estariam regidos por uma suposta reserva constitucional, enquanto os previstos em leis ou tratados internacionais poderiam sofrer uma conformação pelo legislador ordinário. É que a ideia de hierarquia entre os direitos fundamentais é uma incongruência. Isso, porque contradiz a própria origem dos direitos fundamentais, jusnaturalista, que identifica nos direitos fundamentais elementos essenciais à própria condição humana, razão pela qual não podem ser excluídos por opção política do Estado.

Se fundamentais, esses direitos não podem sê-lo em graduação. A estipulação de hierarquia em tema de direitos fundamentais não atende à necessidade nítida de avaliar as hipóteses de conflito caso a caso. Criam-se, nesse caso, fórmulas pré-concebidas que muitas vezes advogam contra a finalidade primeira do sistema de garantias.

Quando o legislador constituinte quis estabelecer uma reserva constitucional à capacidade de restrição de direitos fundamentais, ele o fez expressamente, como é possível perceber da leitura do parágrafo 2° do art. 12 da CF, que limita a atuação do legislador ordinário no seu papel de restringir a igualdade entre brasileiros natos e naturalizados. Diz o dispositivo que “a lei não poderá estabelecer distinção entre brasileiros natos e naturalizados, salvo nos casos previstos nesta Constituição”.

Dessa forma, há que se admitir a possibilidade de restrição dos direitos e garantias fundamentais com base tanto na Constituição quanto na lei. É o que Gilmar Ferreira Mendes denomina restrição imediata e restrição mediata. A primeira consiste na hipótese de restrição prevista expressamente no texto constitucional, enquanto a segunda representa a possibilidade de restrição por meio da legislação ordinária com fundamento imediato na própria Constituição.[16]

Ainda de acordo com Gilmar Ferreira Mendes, pode-se dizer que a relação entre proteção e restrição do direito fundamental pressupõe uma sistemática tríplice que envolve espécies de direitos fundamentais: direitos sujeitos à reserva legal simples, à reserva legal qualificada, ou direitos fundamentais sem expressa previsão de reserva legal.[17]

Os direitos fundamentais com reserva legal simples ou simples restrição legal são aqueles em relação aos quais a Constituição traz, previamente, a possibilidade de restrição do direito fundamental por meio de lei, sem, porém, determinar os limites da atuação legal. É o caso, por exemplo, do direito de locomoção, definido no art. 5º, XV, da Constituição Federal, que dispõe que “é livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens”.

Por outro lado, podemos encontrar os direitos fundamentais sujeitos à reserva legal qualificada ou restrição legal qualificada, que são aqueles em que o texto constitucional prevê a restrição do direito por norma infraconstitucional, mas não concedeu total discricionariedade ao legislador ordinário. Sendo assim, o legislador constituinte deixa, desde logo, os parâmetros para que sejam alcançados os objetivos da norma. Exemplo desse tipo de direito fundamental é encontrado no art. 5º, XII, da Constituição Federal, que estipula as condições numerus clausus para que seja prevista em lei a possibilidade de restrição ao sigilo das comunicações telefônicas.

Vejamos, porém, que, no que tange ao art. 5º, XII, da CF, tais condicionantes apenas se referem à possibilidade de restrição do sigilo das comunicações telefônicas, e não em relação aos demais sigilos. Tal discrimen facilmente pode ser aferido da leitura do dispositivo, que determina ser “inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal”.

Verifica-se, por fim, a existência, em nosso sistema constitucional, de direitos fundamentais sem expressa previsão de reserva legal, nos quais não há previsão no corpo do dispositivo para a atuação restritiva da lei. Em princípio, a doutrina verifica a possibilidade de o legislador restringir tais direitos, em busca da proteção de outros bens com ele conflitantes ou que possuam igual ou maior estatura.

Em nosso sistema constitucional, porém, preceitua o professor Gilmar Mendes[18] que a atividade legislativa nas hipóteses de direitos sem expressa previsão de reserva legal “estaria facilitada pela cláusula de reserva legal subsidiária contida no art. 5º, II, da Constituição”.

Dessa forma, ao elevar a lei à forma primeira de manifestação da essência do Estado Democrático de Direito, a Constituição permite, em nossa ordem constitucional, a utilização do princípio da legalidade como forma de limitação dos direitos fundamentais sem expressa previsão de reserva legal, desde que respeitada a ideia de proteção do núcleo essencial.

Essa restrição deve, ainda, ser feita em estrita observância ao princípio da proporcionalidade, de tal forma que se respeite o que se convencionou denominar “limites dos limites”.

Um exemplo nítido de restrição de direito fundamental sem previsão de reserva legal refere-se ao sigilo de correspondência. No julgamento do HC 70.814/SP[19], admitiu-se, ainda que de forma excepcional, que a administração penitenciária, com base em razões de segurança pública, de disciplina prisional ou de preservação da ordem pública, realizasse a interceptação de correspondência remetida pelos sentenciados, respeitados os ditames do art. 41, parágrafo único, da Lei 7.210/84. Entendeu-se, na hipótese, que a proteção da inviolabilidade do sigilo epistolar não pode resultar na proteção de práticas ilícitas.

Sigilo Bancário e suas Hipóteses de Restrição
Após analisar a teoria dos direitos fundamentais, cumpre aplicar ao sigilo bancário as hipóteses de relativização, de modo a se estabelecer de forma objetiva o alcance dessa prerrogativa.

O desenvolvimento dos sistemas bancários informatizados transformou a análise das movimentações bancárias em uma ferramenta imprescindível ao combate de atividades ilícitas.

Dessa forma, é missão do Direito Constitucional estabelecer um caminho seguro à relativização dessa proteção, evitando que impere o arbítrio, apto a justificar abusos.

Vejamos no que consiste essa proteção e de que forma os dados bancários podem ser acessados na órbita de um Estado de Direito.

Distinção entre Quebra e Transferência de Sigilo Bancário
Aspecto muito importante e que precisa ser analisado é a distinção entre a quebra de sigilo, ocasião na qual os dados antes protegidos em virtude do direito de intimidade são tornados públicos, e a transferência de sigilo, em que os dados continuam excluídos do acesso público.

O melhor exemplo disso pode ser encontrado no próprio âmbito do Poder Judiciário. Recentemente, por ocasião da 43º sessão do Conselho Nacional de Justiça, foi assinado um convênio pela então presidente do Conselho, ministra Ellen Gracie, e pelo secretário da Receita Federal do Brasil, que permite o acesso eletrônico dos juízes ao banco de dados nos quais constam dados fiscais de todos os contribuintes. O sistema, denominado INFOJUD, pode ser acessado por qualquer juiz que possua um nome de usuário e uma senha.

Pergunta-se: O sigilo fiscal é excluído do sigilo de dados do art. 5º da CF? Esse sigilo é absoluto? Somente poderia ser quebrado por decisão judicial? A inserção de um login e de uma senha por parte do juiz configuram uma decisão judicial?

Por óbvio que a resposta às perguntas acima é negativa.

No caso do INFOJUD, diferentemente da hipótese de acesso da administração tributária às informações bancárias, nem mesmo a edição de lei em sentido estrito foi necessária. Bastou a assinatura de um convênio. E a resposta para tal atitude pode ser encontrada nas palavras da ministra Ellen Gracie, que assim se pronunciou em notícia divulgada no sítio do Supremo Tribunal Federal[20].

A ministra explicou que só terá acesso às informações protegidas por sigilo o próprio magistrado requisitante, que deverá se identificar com senha e assinatura eletrônica. Não se trata, assim, de uma quebra de sigilo, mas da transferência de sigilo da Receita para o Poder Judiciário. “Só poderá fazer a própria requisição o mesmo magistrado que jurisdicione o feito”, disse a presidente do Conselho. “Esse instrumento será uma ferramenta importante para a agilização do nosso trabalho”, concluiu Ellen Gracie.

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No caso de transferência de informações entre as autoridades ficais, encontramos até mesmo uma previsão constitucional no art. 37, XXII, da Constituição Federal, que assim dispõe:

as administrações tributárias da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, atividades essenciais ao funcionamento do Estado, exercidas por servidores de carreiras específicas, terão recursos prioritários para a realização de suas atividades e atuarão de forma integrada, inclusive com o compartilhamento de cadastros e de informações fiscais, na forma da lei ou convênio.”

Dessa forma, na transferência de dados é preservada a garantida da intimidade (art. 5º, X, da Constituição Federal), porque os dados, mesmo depois de repassados à administração tributária, permanecem protegidos, sem possibilidade de divulgação, sob pena de responsabilidade do agente público responsável. Não se trata, assim, de ato de governo, mas sim de atividade típica do Estado, que é realizada por agentes públicos que ingressaram por meio de concurso público e não por ocupantes de cargos políticos comprometidos com determinada corrente partidária.

Poder-se-ia dizer, então, que o direito de intimidade dos contribuintes está plenamente protegido quando transferido para a administração tributária. Isso, porque há regras claras que impõem dever de sigilo aos agentes públicos como, por exemplo, o art. 198 do Código Tributário Nacional[21] e o art. 132, IX, da Lei 8.112/90[22].

Esse entendimento já foi consagrado remotamente pela Suprema Corte desde o julgamento do RMS 15.925/GB[23], em 1966, no qual estabeleceu o relator que:

“(…) Não há perigo de devassa ou quebra de sigilo bancário, porquanto, como assinala o parecer, os Agentes Fiscais do Imposto de Renda são obrigados ao sigilo (art. 201 – D. nº 47.373/59), sob pena de responsabilidade.”

Em legislação mais específica, que trataremos a seguir, especialmente aplicável ao sigilo bancário, encontramos essa mesmo previsão, determinando a responsabilidade do agente que venha a tornar pública a informação sigilosa a que tem acesso.

Cabe acrescentar que há outros casos em que os dados bancários são transferidos a terceiros. É o caso, por exemplo, de funcionários ou gerentes da instituição financeira, que têm constante acesso a todas as informações bancárias de seus clientes. O direito de intimidade, no caso, não é afetado, tendo em vista que tais informações são gerenciadas de maneira a manter o seu sigilo, sob pena de responsabilização do agente que venha a divulgar tais dados.

Posição do Supremo Tribunal Federal acerca da restrição do sigilo bancário
Passamos nesse ponto a uma análise da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal acerca da relativização do sigilo bancário. Verificaremos quais são as possibilidades de quebra desse sigilo, bem como as novas tendências que se revelam quanto às situações de limitação do direito previstas em lei.

Inicialmente, verificamos que há uma forte tendência de se frisar o caráter relativo dos direitos e garantias fundamentais. Dessa forma, mostrar-se-ia perfeitamente possível a restrição dos direitos fundamentais, ainda que não exista previsão expressa no texto constitucional.

A nosso ver, essa possibilidade deriva da aplicação do princípio hermenêutico da harmonização (ou da concordância prática). O aplicador do direito, verificando a existência de dois ou mais direitos em conflito, deve adotar um posicionamento que evite o sacrifício total de um dos direitos em conflito.

Dentro dessa ótica, o Poder Judiciário pode determinar a redução da liberdade de crença para fazer preponderar o direito à vida em hipótese de autorização de transfusão de sangue, mesmo que contrariamente aos dogmas religiosos do paciente. Não há necessidade de lei para tanto, isso decorre da própria atividade judiciária, que vem a sopesar dos interesses em conflito, adequando os valores ao caso concreto.

Em relação à possibilidade de o Ministério Público determinar a quebra de sigilo, verifica-se que a discussão gira em torno da existência de previsão, dentre as disposições constitucionais relativas às funções institucionais do parquet, de quebra de sigilo bancário sem a intervenção do Poder Judiciário.

No MS 21.729/DF[24], discutiu-se a possibilidade de o Ministério Público ter acesso a informações bancárias quando estejam envolvidas verbas públicas. Em expressa referência à possibilidade de relativização dos direitos fundamentais frente ao interesse público, aduz o relator para o acórdão, ministro Néri da Silveira, o seguinte:

“(…) se se trata de operação em que há dinheiro público, a publicidade deve ser nota característica dessa operação. Não há razão, portanto, para o Banco não dizer quem são os beneficiários por esses empréstimos. Se o Governo Federal está atuando, por intermédio do Banco do Brasil, na execução de um plano de amparo a um setor de produção, compreendo que, acerca dessas operações do Banco, com recursos do Tesouro Nacional, não pode lograr procedência a negativa de informações, com a invocação do sigilo bancário.”

No caso, portanto, verificou-se a limitação da inviolabilidade do sigilo pelo fato de tratar-se de dinheiro público, interesse público, portanto. Essa linha argumentativa reforça a ideia de que a administração tributária deve ter acesso às informações bancárias, tendo em vista que a receita tributária sonegada também é dinheiro público desviado de sua destinação primária. Ademais, as prerrogativas conferidas às autoridades fazendárias pela própria Constituição Federal e pela legislação não deixam dúvida de que se trata de nítido interesse público a ser gerido. A mesma lógica aplicada aos créditos subsidiados que são desviados pode, dessa forma, incidir sobre os tributos, que configuram orçamento público. Proíbe-se, assim, que os bancos sirvam de amparo a práticas ilícitas, tais quais a sonegação fiscal.

Apesar de o precedente supracitado indiretamente tratar do tema abordado no presente trabalho, reconhece o Sr. ministro Néri da Silveira, em seu voto, que a questão não envolve em profundidade o tema relativo ao sigilo bancário. Diz o relator o seguinte: “Para dirimir a controvérsia, com a devida vênia, não vejo necessidade de examinar, em profundidade, o problema do sigilo bancário e da extensão de sua proteção”.

O precedente supracitado, porém, mostra-se excepcional. De uma forma geral, a quebra de sigilo é apenas requerida pelo Ministério Público, cabendo ao Poder Judiciário deferir ou indeferir o requerimento. Esse quadro foi o demonstrado no julgamento da PET 2.790-AgR/RS[25], Relator Ministro Nelson Jobim. No RE 215.301/CE[26] o entendimento foi ainda mais taxativo. Dada a clareza da ementa do referido julgado, pedimos vênia para fazer a seguinte transcrição:

CONSTITUCIONAL. MINISTÉRIO PÚBLICO. SIGILO BANCÁRIO: QUEBRA. C.F., art. 129, VIII. I. – A norma inscrita no inc. VIII, do art. 129, da C.F., não autoriza ao Ministério Público, sem a interferência da autoridade judiciária, quebrar o sigilo bancário de alguém. Se se tem presente que o sigilo bancário é espécie de direito à privacidade, que a C.F. consagra, art. 5º, X, somente autorização expressa da Constituição legitimaria o Ministério Público a promover, diretamente e sem a intervenção da autoridade judiciária, a quebra do sigilo bancário de qualquer pessoa. II. – R.E. não conhecido.

Assim, em relação à possibilidade de acesso a informações sigilosas por parte do Ministério Público, o que temos é uma questão ainda controversa, que requer um pronunciamento definitivo por parte do Poder Judiciário. Doutrinariamente, destaca-se o posicionamento de Alexandre de Moraes, favorável ao acesso do Ministério Público a informações sigilosas, que teria amparo no art. 8º, § 2º, da Lei Complementar nº 75/1993 (que dispõe sobre atribuições e o estatuto do Ministério Público da União) e no art. 80 da Lei nº 8.625/1993 (Lei Orgânica Nacional do Ministério Público)[27].

Em que pese o entendimento de Alexandre de Moraes, inegável que, ainda que de fato existisse autorização legal para o acesso do Ministério Público às informações sigilosas, a Lei Complementar 105/01, em seu art. 10 deixou claro que não é admitida nenhuma forma de acesso a dados bancários além daquelas por ela previstas. Como veremos mais à frente, essa disposição taxativa redundaria na revogação tácita de quaisquer disposições em contrário.

No que toca às Comissões Parlamentares de Inquérito, cumpre observar o que discutido no MS 23.851/DF[28]. Entendeu o Supremo Tribunal Federal, na hipótese, que a quebra de sigilo determinada por órgão legislativo não pode ser utilizada como instrumento de devassa indiscriminada. Dessa forma, o direito à intimidade somente poderia ser suprimido por deliberação de comissão parlamentar de inquérito baseada em fundamentação contemporânea.

O Banco Central do Brasil segundo o entendimento da Suprema Corte, expresso no julgamento do RE 461.366/DF[29], não poderia ter acesso a dados bancários sem autorização judicial. Assim a ementa desse julgado.

SIGILO DE DADOS – ATUAÇÃO FISCALIZADORA DO BANCO CENTRAL – AFASTAMENTO – INVIABILIDADE. A atuação fiscalizadora do Banco Central do Brasil não encerra a possibilidade de, no campo administrativo, alcançar dados bancários de correntistas, afastando o sigilo previsto no inciso XII do artigo 5º da Constituição Federal.

Por fim, cabe ainda o registro de que a lei pode trazer outras hipóteses de superação da barreira da inviolabilidade dos sigilos. No julgamento do RE 219.780/PE[30], ficou definido que normas infraconstitucionais podem excepcionar a regra do sigilo, respeitada a razoabilidade. Transcrevemos a ementa do referido julgado.

CONSTITUCIONAL. SIGILO BANCÁRIO: QUEBRA. ADMINISTRADORA DE CARTÕES DE CRÉDITO. CF, art. 5º, X. I. – Se é certo que o sigilo bancário, que é espécie de direito à privacidade, que a Constituição protege art. 5º, X não é um direito absoluto, que deve ceder diante do interesse público, do interesse social e do interesse da Justiça, certo é, também, que ele há de ceder na forma e com observância de procedimento estabelecido em lei e com respeito ao princípio da razoabilidade. No caso, a questão foi posta, pela recorrente, sob o ponto de vista puramente constitucional, certo, entretanto, que a disposição constitucional é garantidora do direito, estando as exceções na norma infraconstitucional. II. – R.E. não conhecido.

Nesse mesmo julgado foi elaborado julgamento dos mais coerentes em relação ao sigilo bancário. Entendeu o Sr. ministro Nelson Jobim que o inciso XII do art. 5º da Constituição Federal apenas se refere à comunicação dos dados. Assim, os dados bancários não seriam, por si só, sigilosos. O sigilo referir-se-ia à comunicação desses dados. Isso justificaria a possibilidade de interceptação telefônica, que é a única que não deixa vestígios. Segue o voto em que tal discussão é posta.

O SR. MINISTRO NELSON JOBIM – Sr. Presidente, a minha dificuldade é que, normalmente, alguns fundamental o sigilo bancário no inciso XII do art. 5º, da Constituição; não avanço por essa tese. Agora, chama-me a atenção a leitura feita por alguns de certas decisões que têm sido tomadas. Diz o inciso:

“XII – é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal;”

Passa-se, aqui, que o inciso XII não está tornando inviolável o dado da correspondência, da comunicação, do telegrama. Ele está proibindo a interceptação da comunicação de dados, não dos resultados. Essa é a razão pela qual a única interceptação que se permite é a telefônica, pois é a única a não deixar vestígios, ao passo que nas comunicações por correspondência, telegráfica e de dados é proibida a interceptação porque os dados remanescem; eles não são rigorosamente sigilosos, dependem da interpretação infraconstitucional para poderem ser abertos. O que é vedado de forma absoluta é a interceptação da comunicação da correspondência, do telegrama. Por que a Constituição permitiu a interceptação da comunicação telefônica? Para manter os dados, já que é a única em que, esgotando-se a comunicação, desaparecem os dados. Nas demais, não se permite porque os dados remanescem, ficam no computador, nas correspondência etc.

Não conheço do recurso.

Esse posicionamento também encontra amparo doutrinário, que vamos aqui inserir, tendo em vista o contexto da discussão. Ressaltando o fato de tratar-se de sigilo apenas da comunicação dos dados, e não dos dados em si, assim pronuncia-se Tércio Sampaio Ferraz Júnior[31]:

“A interpretação faz sentido. O sigilo, no inciso XII do art. 5º está referido à comunicação, no interesse da defesa da privacidade. Isto é feito, no texto, em dois blocos: a Constituição fala em sigilo “da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas”. Note-se, para a caracterização dos blocos, que a conjunção e une correspondência com telegrafia, segue-se uma vírgula e depois, a conjunção de dados com comunicações telefônicas. Há uma simetria nos dois blocos. Obviamente o que se regula é a comunicação por correspondência e telegrafia, comunicação de dados e telefônica. O que fere a liberdade de omitir pensamento é, pois, entrar na comunicação alheia, fazendo com que o que devia ficar entre sujeitos que se comunicam privadamente passe ilegitimamente ao domínio de um terceiro. Se alguém elabora para si um cadastro sobre certas pessoas, com informações marcadas por avaliações negativas, e o torna público, poderá estar cometendo difamação, mas não quebra sigilo de dados. Se estes dados, armazenados eletronicamente, são transmitidos, privadamente, a um parceiro, em relações mercadológicas, para defesa do mercado, também não estará havendo quebra de sigilo. Mas se alguém entra nesta transmissão, como um terceiro que nada tem a ver com a relação comunicativa, ou por ato próprio ou porque uma das partes lhe cede o acesso indevidamente, estará violado o sigilo de dados.

A distinção é decisiva: o objeto protegido no direito à inviolabilidade do sigilo não são os dados em si, mas a sua comunicação restringida (liberdade de negação). A troca de informações (comunicação) privativa é que não pode ser violada por sujeito estranho à comunicação. Doutro modo, se alguém, não por razões profissionais, ficasse sabendo legitimamente de dados incriminadores relativos a uma pessoa, ficaria impedido de cumprir o seu dever de denunciá-los!” (com grifos no original)

O mesmo autor, no que toca ao sigilo bancário, especifica[32]:

Assim, por exemplo, solicitar os juiz que permita à autoridade acesso à movimentação bancária de alguém não significa pedir para interceptar suas ordens ao banco (sigilo de comunicação) mas acesso a dados armazenados (sigilo de informação).

No sentido da proteção à transmissão dos dados podemos ainda destacar o pensamento de Manoel Gonçalves Ferreira Filho, que preceitua[33]:

Correlativo à liberdade de expressão de pensamento é o direito de escolher o destinatário da transmissão. Para tanto é necessário assegurar o sigilo das comunicações que não se dirigem ao público em geral, mas a pessoa ou pessoas certas e determinadas. Daí assegurar a Constituição a inviolabilidade das comunicações de pensamento que não visam a público indeterminado, seja por meio de cartas, seja através do telefone, do telégrafo ou por qualquer técnica que se inventar.

O papel da lei no processo de relativização do sigilo bancário também foi destacado em diversos outros precedentes, como o MS 27.091/DF[34] e a AC 1.928[35]. Na referida ação cautelar, frisou o Sr. ministro Gilmar Mendes que o sigilo de dados não é um direito absoluto, sendo que a quebra das informações “deve ocorrer com observância de procedimento estabelecido em lei e com respeito ao princípio da razoabilidade, a fim de permitir maior controle sobre eventuais abusos”.

Fazendo um apanhado do que tem decidido o Supremo Tribunal Federal, podemos concluir pela existência de três possibilidades de quebra de sigilo bancário: determinação judicial, deliberação de comissão parlamentar de inquérito e existência de previsão legal.

No que tange à autorização legislativa de acesso aos dados bancários, merece destaque a Lei Complementar 105/01, que autoriza o acesso aos dados bancários por meio de processo administrativo.

Cabe o registro de que o tema relativo à possibilidade de estipulação legal de hipóteses de quebra de sigilo será retomado pelo Supremo Tribunal Federal quando do julgamento da ADI 2.386/DF, de relatoria do Sr. ministro Menezes de Direito, no qual se discute a constitucionalidade da referida lei, que admite o acesso de dados bancários por parte da administração tributária.

Formas de Acesso aos Dados Bancários
A discussão aqui travada traz à tona o que disposto na Lei Complementar 105/01, que em seus arts. 3º, 4º, 5º e 6º define as hipóteses de acesso às informações bancárias. Essa norma passou a ser tema obrigatório quando se discute o sigilo bancário no Brasil. Com ela, buscou-se sintetizar todas as hipóteses de acesso às informações bancárias, regulando desde o acesso pelo fisco até o acesso por meio de ordem judicial.

A lei complementar em tela começa por estabelecer, em seu art. 1º, parágrafo 3º, quais são os casos em que não se verifica a proteção do sigilo bancário. Essa hipóteses não podem ser consideradas taxativas, tendo em vista os chamados “limites naturais” do sigilo, que consiste nas hipóteses decorrentes da “vontade do titular do segredo ou da natureza das operações bancárias ou, ainda, das regras do Direito Civil”, como explica Roberto Massao Chinen[36].

São hipóteses excluídas do sigilo:

I – a troca de informações entre instituições financeiras, para fins cadastrais, inclusive por intermédio de centrais de risco, observadas as normas baixadas pelo Conselho Monetário Nacional e pelo Banco Central do Brasil;

II – o fornecimento de informações constantes de cadastro de emitentes de cheques sem provisão de fundos e de devedores inadimplentes, a entidades de proteção ao crédito, observadas as normas baixadas pelo Conselho Monetário Nacional e pelo Banco Central do Brasil;

III – o fornecimento das informações de que trata o § 2o do art. 11 da Lei no 9.311, de 24 de outubro de 1996;

IV – a comunicação, às autoridades competentes, da prática de ilícitos penais ou administrativos, abrangendo o fornecimento de informações sobre operações que envolvam recursos provenientes de qualquer prática criminosa;

V – a revelação de informações sigilosas com o consentimento expresso dos interessados;

VI – a prestação de informações nos termos e condições estabelecidos nos artigos 2o, 3o, 4o, 5o, 6o, 7o e 9 desta Lei Complementar.

O art. 3º da lei dispõe sobre o acesso às informações bancárias por meio de ordem judicial. Assim é redigido o dispositivo:

Art. 3o Serão prestadas pelo Banco Central do Brasil, pela Comissão de Valores Mobiliários e pelas instituições financeiras as informações ordenadas pelo Poder Judiciário, preservado o seu caráter sigiloso mediante acesso restrito às partes, que delas não poderão servir-se para fins estranhos à lide.

§ 1o Dependem de prévia autorização do Poder Judiciário a prestação de informações e o fornecimento de documentos sigilosos solicitados por comissão de inquérito administrativo destinada a apurar responsabilidade de servidor público por infração praticada no exercício de suas atribuições, ou que tenha relação com as atribuições do cargo em que se encontre investido.

§ 2o Nas hipóteses do § 1o, o requerimento de quebra de sigilo independe da existência de processo judicial em curso.

§ 3o Além dos casos previstos neste artigo o Banco Central do Brasil e a Comissão de Valores Mobiliários fornecerão à Advocacia-Geral da União as informações e os documentos necessários à defesa da União nas ações em que seja parte.

Como se percebe, é mantido o caráter sigiloso da informação, que só pode ser acessada pelas partes, devendo ser utilizada exclusivamente na lide.

A segunda hipótese de quebra de sigilo diz respeito às informações solicitadas pelo Poder Legislativo. Nesse ponto verifica-se que a norma foi mais abrangente do que os entendimentos jurisprudenciais, já que, além do requerimento da comissões parlamentares de inquérito, permite que as informações sejam solicitadas também pelo Plenário das Casas Legislativas. Há, porém, uma distinção de tratamento em relação às CPI, que podem obter as informações e documentos sigilosos diretamente das instituições financeiras. Vejamos o que disposto no art. 4º da legislação em destaque.

Art. 4o O Banco Central do Brasil e a Comissão de Valores Mobiliários, nas áreas de suas atribuições, e as instituições financeiras fornecerão ao Poder Legislativo Federal as informações e os documentos sigilosos que, fundamentadamente, se fizerem necessários ao exercício de suas respectivas competências constitucionais e legais.

§ 1o As comissões parlamentares de inquérito, no exercício de sua competência constitucional e legal de ampla investigação, obterão as informações e documentos sigilosos de que necessitarem, diretamente das instituições financeiras, ou por intermédio do Banco Central do Brasil ou da Comissão de Valores Mobiliários.

§ 2o As solicitações de que trata este artigo deverão ser previamente aprovadas pelo Plenário da Câmara dos Deputados, do Senado Federal, ou do plenário de suas respectivas comissões parlamentares de inquérito.

A terceira hipótese de acesso aos dados bancários, prevista nos arts. 5º e 6º da referida lei, visa a auxiliar a fiscalização realizada pela administração tributária. Essa talvez seja a única hipótese na qual há, presumidamente, o interesse público, já que se volta sempre ao combate da sonegação.

O art. 5º define o caso de comunicação espontânea ao fisco (obligation de communication spontanée), que se restringe ao montante global das movimentações financeiras. O art. 6º permite o acesso ao dados bancários quando instaurado pelo fisco um procedimento administrativo. Cuida-se, na hipótese, do direito de informação do fisco (droit de communication), que alcança as esferas federal, estadual, distrital e municipal. A redação do dispositivo deixou claro que não é exigida a instauração de processo judicial, bastando que exista um processo administrativo fiscal.

Essa dupla via de fiscalização também é prevista em outros sistemas de fiscalização, como o adotado pela administração tributária francesa[37].

Acrescente-se que, como se percebe da leitura dos arts. 5º, § 5º, e 6º, parágrafo único, é ressaltada a manutenção do caráter sigiloso da informação.

Vejamos a redação dos referidos dispositivos.

Art. 5o O Poder Executivo disciplinará, inclusive quanto à periodicidade e aos limites de valor, os critérios segundo os quais as instituições financeiras informarão à administração tributária da União, as operações financeiras efetuadas pelos usuários de seus serviços.

§ 1o Consideram-se operações financeiras, para os efeitos deste artigo:

I – depósitos à vista e a prazo, inclusive em conta de poupança;

II – pagamentos efetuados em moeda corrente ou em cheques;

III – emissão de ordens de crédito ou documentos assemelhados;

IV – resgates em contas de depósitos à vista ou a prazo, inclusive de poupança;

V – contratos de mútuo;

VI – descontos de duplicatas, notas promissórias e outros títulos de crédito;

VII – aquisições e vendas de títulos de renda fixa ou variável;

VIII – aplicações em fundos de investimentos;

IX – aquisições de moeda estrangeira;

X – conversões de moeda estrangeira em moeda nacional;

XI – transferências de moeda e outros valores para o exterior;

XII – operações com ouro, ativo financeiro;

XIII – operações com cartão de crédito;

XIV – operações de arrendamento mercantil; e

XV – quaisquer outras operações de natureza semelhante que venham a ser autorizadas pelo Banco Central do Brasil, Comissão de Valores Mobiliários ou outro órgão competente.

§ 2o As informações transferidas na forma do caput deste artigo restringir-se-ão a informes relacionados com a identificação dos titulares das operações e os montantes globais mensalmente movimentados, vedada a inserção de qualquer elemento que permita identificar a sua origem ou a natureza dos gastos a partir deles efetuados.

§ 3o Não se incluem entre as informações de que trata este artigo as operações financeiras efetuadas pelas administrações direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

§ 4o Recebidas as informações de que trata este artigo, se detectados indícios de falhas, incorreções ou omissões, ou de cometimento de ilícito fiscal, a autoridade interessada poderá requisitar as informações e os documentos de que necessitar, bem como realizar fiscalização ou auditoria para a adequada apuração dos fatos.

§ 5o As informações a que refere este artigo serão conservadas sob sigilo fiscal, na forma da legislação em vigor.

Art. 6o As autoridades e os agentes fiscais tributários da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios somente poderão examinar documentos, livros e registros de instituições financeiras, inclusive os referentes a contas de depósitos e aplicações financeiras, quando houver processo administrativo instaurado ou procedimento fiscal em curso e tais exames sejam considerados indispensáveis pela autoridade administrativa competente.

Parágrafo único. O resultado dos exames, as informações e os documentos a que se refere este artigo serão conservados em sigilo, observada a legislação tributária.

A Lei Complementar 105/01 estabelece, dessa forma, três hipóteses de quebra do sigilo bancário, que coincide com a conclusão dada pela jurisprudência. São elas: ordem judicial (art. 3º), por deliberação do Poder Legislativo (art. 4º) e por disciplina do Poder Executivo, em prol da administração tributária (art. 5º).

O rol acima enumerado mostra-se taxativo, já que o art. 10 da Lei estabelece ser tipificada como crime qualquer outra forma de quebra de sigilo. Diz o artigo:

Art. 10. A quebra de sigilo, fora das hipóteses autorizadas nesta Lei Complementar, constitui crime e sujeita os responsáveis à pena de reclusão, de um a quatro anos, e multa, aplicando-se, no que couber, o Código Penal, sem prejuízo de outras sanções cabíveis.

Parágrafo único. Incorre nas mesmas penas quem omitir, retardar injustificadamente ou prestar falsamente as informações requeridas nos termos desta Lei Complementar.

Cai por terra, dessa forma, a tentativa de conferir ao Ministério Público o poder de acessar, sem o intermédio do Poder Judiciário, as informações amparadas pelo sigilo bancário.

Adequação Constitucional da Lei Complementar 105/01
Passamos, nesse ponto, a analisar a constitucionalidade do que disposto na Lei Complementar 105/01, que tanta controvérsia tem gerado.

A inviolabilidade dos sigilos está descrita no art. 5º, XII, da Constituição Federal, que preceitua:

“é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal”.

Partindo da análise realizada no tópico anterior, no sentido de que tal dispositivo volta-se a amparar as comunicações, e não os dados em si, podemos concluir que o sigilo bancário não está diretamente relacionado a tal disposição.

O sigilo bancário volta-se à proteção dos dados que estão sob a tutela da instituição financeira. Seria um consectário da intimidade e da vida privada (art. 5º, X, da CF), já que as movimentações financeiras são aptas a expor o quotidiano do seu titular.

Nesse sentido explica Christiano Wolney[38]:

Isto posto, evidenciam-se as semelhanças e diferenças entre o “sigilo de dados” e o sigilo bancário. O “sigilo de dados” tem como bem jurídico tutelado a comunicação privativa e o sigilo bancário tem como bem jurídico tutelado a vida privada e a intimidade. Ambos têm como fundamento lógico-jurídico a liberdade, sendo que o “sigilo de dados” é conteúdo estrutural da liberdade espelhada na comunicação privativa dos dados e o sigilo bancário é conteúdo estrutural do direito à vida privada ou intimidade. O sigilo de dados é garantia constitucional expressa, o sigilo bancário, dada à sua característica de acessoriedade a um direito fundamental (direito à intimidade e direito à vida privada) e à sua procedência lógica de um princípio constitucional (liberdade), é garantia constitucional decorrente, conforme aplicação do § 2º, art. 5º da Constituição Federal de 1988.

Segundo essa conclusão, que nos parece ser a mais coerente, sob o ponto de vista da lógica jurídica, o sigilo bancário não teria assento constitucional, senão pela aplicação do parágrafo 2º, art. 5º, da CF, que permite o reconhecimento de outros direitos fundamentais, decorrentes do regime adotado. Para efeito do presente estudo, porém, levaremos em conta o sigilo bancário sob a ótica da inviolabilidade da intimidade (art. 5º, X, da CF). Fazemos, porém, a ressalva de a jurisprudência pátria parece identificar a proteção com o dever de sigilo (art. 5º, XI, da CF).

Levando em conta que as informações bancárias são mantidas em segredo, de forma a proteger a intimidade do titular da conta corrente, chegamos à conclusão de que o acesso ao montante global das movimentações, sem discriminação pormenorizada, é apta a impedir uma indevida e desnecessária invasão da intimidade e da vida privada.

Essa foi a preocupação da Lei Complementar 105/01, que determina em seu art. 5º, parágrafo 2º:

§ 2o As informações transferidas na forma do caput deste artigo restringir-se-ão a informes relacionados com a identificação dos titulares das operações e os montantes globais mensalmente movimentados, vedada a inserção de qualquer elemento que permita identificar a sua origem ou a natureza dos gastos a partir deles efetuados.

Nesse sentido, também, a previsão do Decreto 4.489/02:

Art. 2º  As informações de que trata este Decreto, referentes às operações financeiras descritas no § 1º do art. 5º da Lei Complementar nº 105, de 2001, serão prestadas, continuamente, em arquivos digitais, de acordo com as especificações definidas pela Secretaria da Receita Federal, e restringir-se-ão a informes relacionados com a identificação dos titulares das operações e com os montantes globais mensalmente movimentados, relativos a cada usuário, vedada a inserção de qualquer elemento que permita identificar a sua origem ou a natureza dos gastos efetuados.

Como se percebe, a transferência de informações bancárias ao fisco é autorizada apenas no que tange ao montante global, sem que exista a possibilidade de identificar detalhes dos gastos feitos pelos titulares das operações. Dessa forma, fica resguardado o direito de intimidade, ante a objetividade da informação.

Esse posicionamento é exposto por Roberto Massao Chinen que expõe o pensamento de Oswaldo Othon de Pontes Saraiva Filho, no sentido de que “só excepcionalmente as informações e documentos bancários, relativos a meros números, a contabilidade fria, poderia revelar alguma relação com a vida privada do contribuinte”[39].

Em sentido contrário encontramos Christiano Mendes Wolney Valente que entende que o montante global também é passível de expor de forma intensa a intimidade do seu titular[40].

Um ponto que merece análise é o da inexistência de reserva jurisidicional no que toca ao sigilo bancário. É indiscutível o reconhecimento jurisprudencial da inexistência de reserva jurisdicional em tema relativo ao acesso aos dados bancários. Os casos em que é indispensável a atuação do Poder Judiciário para a restrição de direitos fundamentais estão descritos expressamente no texto constitucional e se referem basicamente a três hipóteses: violação de domicílio, interceptação telefônica e prisão (excetuadas as hipóteses de flagrante delito e de transgressão militar).

Nesse sentido, vale conferir o decidido no MS 23.480/RJ[41], rel. min. Sepúlveda Pertence, do qual se extrai o seguinte trecho:

“(…)2. Quebra ou transferência de sigilos bancário, fiscal e de registros telefônicos que, ainda quando se admita, em tese, susceptível de ser objeto de decreto de CPI – porque não coberta pela reserva absoluta de jurisdição que resguarda outras garantias constitucionais -, há de ser adequadamente fundamentada: aplicação no exercício pela CPI dos poderes instrutórios das autoridades judiciárias da exigência de motivação do art. 93, IX, da Constituição da República.(…)” (grifo nosso)

Ressalte-se, também, as considerações trazidas pelo Ministro Celso de Mello no julgamento do MS 23.452/RJ[42], que bem explicitam os casos em que incide a reserva jurisdicional:

“(…)O postulado da reserva constitucional de jurisdição importa em submeter, à esfera única de decisão dos magistrados, a prática de determinados atos cuja realização, por efeito de explícita determinação constante do próprio texto da Carta Política, somente pode emanar do juiz, e não de terceiros, inclusive daqueles a quem se haja eventualmente atribuído o exercício de “poderes de investigação próprios das autoridades judiciais”. A cláusula constitucional da reserva de jurisdição – que incide sobre determinadas matérias, como a busca domiciliar (CF, art. 5º, XI), a interceptação telefônica (CF, art. 5º, XII) e a decretação da prisão de qualquer pessoa, ressalvada a hipótese de flagrância (CF, art. 5º, LXI) – traduz a noção de que, nesses temas específicos, assiste ao Poder Judiciário, não apenas o direito de proferir a última palavra, mas, sobretudo, a prerrogativa de dizer, desde logo, a primeira palavra, excluindo-se, desse modo, por força e autoridade do que dispõe a própria Constituição, a possibilidade do exercício de iguais atribuições, por parte de quaisquer outros órgãos ou autoridades do Estado. Doutrina.(…) “ (grifo nosso)

No voto do exmo. ministro Celso de Mello, relator, encontra-se explícita a diferença entre a interceptação telefônica e o sigilo de dados telefônicos. São abordados, ainda, temas relacionados à possibilidade de limitação de liberdades públicas em prol do interesse da sociedade. Vejamos um trecho brilhante desse precedente:

“(…)Torna-se essencial enfatizar, neste ponto, uma vez mais, não obstante a posição eminente que as liberdades públicas assumem em nosso sistema constitucional, que não devem elas – considerado o substrato ético que as informa – “proteger abusos nem acoberta violações”, eis que o direito e garantias individuais expõem-se a naturais restrições devidas “do princípio de convivência das liberdades, pelo qual nenhuma delas pode ser exercida de modo danoso á ordem pública e ás liberdades alheias“ (ADA PELLEGRINI GRINOVER, “Liberdades Públicas e Processo Penal” p. 251, 2ª ed., 1982 , RT; LUIS FRANCISCO TORQUATO AVOLIO, “Provas Ilícitas”, p. 152, item n. 5.1, 1995, RT; EDOARDO GIANNOTTI , “A Tutela Constitucional da Intimidade”, p. 89, 1987, Forense) .

Bem por isso, cumpre reconhecer, como precedentemente já acentuado, que o direito ao sigilo, como qualquer outra liberdade pública, não tem caráter absoluto (RTJ 157/44, Rel. Min. FRANCISCO REZEK ), sofrendo, em consequência, limitações de ordem ético-jurídica, destinadas, essencialmente, de um lado, a proteger a integridade do interesse social e, de outro, a assegurar a coexistência harmoniosa das liberdades, “car la vie sociale exclut la possibilité de libertés sans frontières“ ( JEAN RIVERO , “Les Libertés Publiques”, vol. 1/166-175, 1973, Presses Universitaires de France ).

É certo que a garantia constitucional instituída no art. 5ª, XII, da Carta Política objetiva preservar a inviolabilidade do sigilo “das comunicações telefônicas”, não havendo , no preceito normativo em questão (inciso XII), qualquer referência ao tema da “disclousure” dos registros telefônicos .

Cabe traçar aqui, por necessário, uma distinção entre a interceptação (“escuta”) das comunicações telefônicas, inteiramente submetida ao princípio constitucional da reserva de jurisdição (CF, art. 5º, XII) de um lado , e a quebra do sigilo dos dados (registro) telefônicos, de outro, cuja tutela deriva da cláusula de proteção á intimidade inscrita no artigo 5º, X, da Carta Política .”

Ainda sobre essa distinção entre as diferentes hipóteses do art. 5º, XII, podemos citar o pronunciamento do ministro Francisco Rezek, que assim se pronunciou nos autos do MS 21.729/DF[43]:

“(…)Numa reflexão extra-legal, observo que a vida financeira das empresas e das pessoas naturais não teria mesmo por que enclausurar-se ao conhecimento da autoridade legítima – não a Justiça tão-só, mas também o parlamento, o Ministério Público, a administração executiva, já que esta última reclama, pela voz da autoridade fiscal, o inteiro conhecimento do patrimônio, dos rendimentos, dos créditos e débitos até mesmo do mais discreto dos contribuintes assalariados. Não sei a que espécie de interesse serviria a mística do sigilo bancário, a menos que se presumam falsos os dados em registro numa dessas duas órbitas, ou em ambas, e por isso não coincidentes o cadastro fiscal e o cadastro bancário das pessoas e empresas.

Ainda sob o enfoque metajurídico, haveria de perguntar-se por quê não quis o constituinte, seguido pelo legislador complementar (e vozes ilustres neste plenário, a quem rendo homenagem, estimam que quiseram ambos), dar ao cadastro bancário proteção igual à das comunicações telefônicas, só devassáveis mediante endosso judiciário à autoridade executiva investigante. Quer parecer-me, desde logo, que a comunicação telefônica cobre nas mais das vezes aquela estrita privacidade pessoal de cuja importância já falara o inciso X (do art. 5º da Constituição) do rol das garantias, distinguindo-se nesse ponto da relação contábil entre uma casa bancária e seus clientes.(…)”(grifo nosso)

Nesse mesmo sentido, encontramos pronunciamentos até mesmo pré-constitucionais, como o do RE 71.640/BA[44], rel. min. Djaci Falcão.

A corroborar com a tese que estabelece uma distinção entre a interceptação telefônica e as demais hipóteses de proteção de dados, encontramos o magistério de Tércio Sampaio Ferraz Júnior[45]:

Conquanto haja quem caminhe para uma interpretação literal deste texto, não nos parece razoável aceita-la na sua inteira singeleza. Note-se, antes de mais nada, que dos quatro meios de comunicação ali mencionados – correspondência, telegrafia, dados, telefonia, só o último se caracteriza por sua intantaneidade. Isto é, a comunicação telefônica só é enquanto ocorre. Encerrada, não deixa vestígios no que se refere ao relato das mensagens e aos sujeitos comunicadores. E apenas possível, a posteriori, verificar qual unidade telefônica ligou para outra. A gravação de conversas telefônicas por meio chamado “grampeamento” é, pois, uma forma sub-reptícia de violação do direito ao sigilo da comunicação mas, ao mesmo tempo, é a única forma tecnicamente conhecida de preservar a ação comunicativa. Por isso, no interesse público (investigação criminal ou instrução processual penal), é o único meio de comunicação que exigiu, do constituinte, uma ressalva expressa. Os outros três não sofreram semelhante ressalva porque, no interesse público, é possível realizar investigações e obter provas com base em vestígios que a comunicação deixa: a carta guardada, o testemunho de quem leu o nome do endereçado e do remetente, ou de quem viu a destruição do documento, o que vale também para telegrama, para o telex, para o telefax, para a recepção da mensagem de um computador para outro etc.

Como isso é tecnicamente possível, o constituinte não permitiu absolutamente a entrada de terceiros, ainda que em nome do interesse público, na comunicação.

Esta proibição, porém, não significa que, no interesse público, não se possa ter acesso – a posteriori – à identificação dos sujeitos e ao relato das mensagens comunicadas. Por exemplo, o que se veda é uma autorização judicial para interceptar correspondência, mas não para requerer busca e apreensão de documentos. Esta observação nos coloca, pois, claramente que a questão de saber quais elementos de uma mensagem podem ser fiscalizados não se confunde com a questão de saber se e quando uma autoridade pode entrar no processo comunicativo entre dois sujeitos. São coisas distintas que devem ser examinadas distintamente.

Cabe nota de que esse posicionamento conflita com a entendimento de Alexandre de Moraes, que defende a “impossibilidade de quebra do sigilo bancário por requisição fiscal de informações bancárias, havendo necessidade de intervenção judicial”[46]. Para fundamentar seu posicionamento, porém, indica precedentes jurisprudenciais remotamente datados (1997 e 1995) e que, portanto, não abordaram a questão à luz da autorização do legislador ordinário constante da Lei Complementar 105/01.

Também se verifica tendência contraposta no voto do ministro Marco Aurélio, no julgamento da Pet 577-QO/DF, do qual destacamos o seguinte trecho[47]:

No texto, vejo o emprego de dois conectivos “e” a revelar que temos, na verdade, não quatro casos, mas apenas dois: o primeiro, abrangendo a “correspondência” e as “comunicações telegráficas”: “é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas”; o segundo, a envolver “dados” e “comunicações telefônicas”. Se estou certo neste enfoque, rechaço a possibilidade de se ter o sigilo relativo a “dados” como inafastável. O sigilo, a meu ver, pode ser afastado mediante a aplicação do que se contém na parte final do preceito, conforme a expressão: “salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal.”

Forçoso concluir que esse último posicionamento não foi aceito pela Corte, dado que é assente ao preceituar que o sigilo de dados não está sujeito à reserva jurisdicional, aceitando, por exemplo, a sua quebra por deliberação de CPI.

Se analisarmos bem a questão, perceberemos que a possibilidade de a administração tributária ter acesso a informações bancárias dos contribuintes é até mesmo uma questão de bom senso. Anualmente, todas as pessoas físicas e jurídicas são obrigadas a enviar ao banco de dados da Receita Federal do Brasil informações relativas às operações bancárias realizadas ao longo do ano (investimentos em fundos de investimentos, investimentos em poupança, empréstimos, saldo e conta-corrente), para efeito de fiscalização relativa ao Imposto de Renda. Por óbvio que não há que se alegar serem inconstitucionais tais práticas, por ferirem o direito ao sigilo bancário. Restringir tal praxe seria inviabilizar a fiscalização por parte da administração tributária.

A fiscalização realizada pelo Fisco há de incluir a acesso ao montante patrimonial e às atividades econômicas dos contribuintes, razão pela qual não há que se suscitar serem ofensivas à vontade do constituinte, que reconheceu serem essas nítidas prerrogativas fazendárias.

Essas conclusões são reforçadas pelo caráter instrumental da proteção das comunicações de dados. Sobre o caráter instrumental da inviolabilidade dos sigilos escreveu Christiano Mendes Wolney Valente[48]:

“(…) Com efeito, o sigilo em si não é direito, mas sim a faculdade atribuída a um sujeito para o exercício de um determinado direito. Trata-se de um acessório que tem origem no bem jurídico tutelado, ganhando status de direito somente quando da existência deste. Portanto o sigilo de dados previsto no art. 5º, XII da Constituição Federal de 1988 somente o é enquanto os dados se referirem a informações sobre a vida privada ou a intimidade das pessoas. (…)”

Tendo em vista o caráter instrumental, é nítido que a inviolabilidade dos sigilos implica em uma garantia que se destina à proteção de direito de estatura constitucional que é a intimidade. Trata-se, ainda, de uma garantia institucional, já que consiste, por si só, em um bem jurídico fundamental essencial para a preservação de diversos valores tidos por essenciais.

Se o sigilo é justificado pelo direito à intimidade, é necessário definir o âmbito de proteção do preceito instituído pelo art. 5º, X, da CF.

A pergunta que se faz é a seguinte: o direito de intimidade inclui a prática de atividades ilícitas?

Imaginemos uma câmera de um circuito interno de TV na entrada de um motel. As imagens feitas pelo sistema de segurança, em respeito à intimidade, à vida privada, à honra e à imagem dos clientes do estabelecimento, não podem ser divulgadas. Se, porém, um crime for cometido nesse estabelecimento, surge o interesse público à informação, apto a justificar a divulgação das imagens em todos os meios de comunicação. Isso, porque, havendo interesse público, restringe-se o âmbito de proteção amparado exclusivamente no interesse privado.

A respeito da impossibilidade de se acobertar informações relativas a negócios ilícitos, asseverou Aliomar Baleeiro, em sua obra Direito Tributário Brasileiro, Ed. Forense, 10ª edição, 1992, pág. 620:

“Não se conceberia que o advogado e o padre, p. ex., fossem compelidos a devassar confidências recebidas em função de sua atividade, quando outras leis os garantem em função dessa atividade, contra delações a que os obrigarem, e até os punem se as fizerem (Cód. Penal, art. 154).

Não é porém, o caso dos banqueiros, p. ex., que não estão adstritos às mesmas regras éticas e jurídicas do sigilo. Em princípio só devem aceitar e ser procurados para negócios lícitos e confessáveis. Diversa é a situação do advogado, do médico e do padre, cujo dever profissional lhes não tranca os ouvidos a todos os desvios de procedimento ético ou jurfdico, às vezes conhecidos somente da consciência dos confitentes.”;

Nesse sentido, levando em conta que a proteção do art. 5º, XII, da CF diz respeito apenas à informação em trânsito, cumpre destacar que as informações bancárias são protegidas enquanto caracteres da intimidade, inseridos em nossa órbita constitucional pelo art. 5º, X, da CF. No julgamento do HC 87.341/PR[49], asseverando a prevalência do interesse público sobre o direito de intimidade em sentido lato, asseverou o ministro relator, Eros Grau, que:

“(…)

1. Paciente denunciado por falsidade ideológica, consubstanciada em exigir quantia em dinheiro para inserir falsa informação de excesso de contingente em certificado de dispensa de incorporação. Gravação clandestina realizada pelo alistando, a pedido de emissora de televisão, que levou as imagens ao ar em todo o território nacional por meio de conhecido programa jornalístico. O conteúdo da reportagem representou notitia criminis, compelindo as autoridades ao exercício do dever-poder de investigar, sob pena de prevaricação.

(…)

3. A questão posta não é de inviolabilidade das comunicações e sim da proteção da privacidade e da própria honra, que não constitui direito absoluto, devendo ceder em prol do interesse público.”

No mesmo sentido, relativizando a intimidade em hipótese investigação quanto a fatos ilícitos, ressaltamos o que decidido no HC 79.285, de relatoria do ministro Moreira Alves[50].

Sendo assim, podemos concluir que o direito de intimidade não é apto a omitir informações relativas a atos ilícitos. Ademais, a motivação da Lei Complementar 105/01, ao instituir o procedimento necessário ao acesso às informações bancárias, outra coisa não fez senão limitar a intimidade e seus consectários em prol do interesse público, como é o caso do combate à sonegação.

Além disso, não há quebra de sigilo se, apesar do acesso á informação, permanecem os dados bancários protegidos contra o acesso indevido.

Para se ter uma ideia da naturalidade com que é encarado o acesso a informações bancárias, desde que mantido seu caráter sigiloso, basta lembrar que os funcionários das instituições financeiras possuem a todo tempo acesso a essas informações, mas ninguém argúi que se configure, na hipótese, uma violação ao direito de sigilo.

A preocupação com o caráter sigiloso foi uma constante na legislação, que prevê a punição daquele que divulgar indevidamente as informações obtidas com base na previsão legal. Nesse sentido o art. 11 da Lei Complementar 105/01:

Art. 11. O servidor público que utilizar ou viabilizar a utilização de qualquer informação obtida em decorrência da quebra de sigilo de que trata esta Lei Complementar responde pessoal e diretamente pelos danos decorrentes, sem prejuízo da responsabilidade objetiva da entidade pública, quando comprovado que o servidor agiu de acordo com orientação oficial.

Ainda com relação ao caráter sigiloso das informações obtidas, consta do Decreto 3.724/01:

Art. 8º  O servidor que utilizar ou viabilizar a utilização de qualquer informação obtida nos termos deste Decreto, em finalidade ou hipótese diversa da prevista em lei, regulamento ou ato administrativo, será responsabilizado administrativamente por descumprimento do dever funcional de observar normas legais ou regulamentares, de que trata o art. 116, inciso III, da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990, se o fato não configurar infração mais grave, sem prejuízo de sua responsabilização em ação regressiva própria e da responsabilidade penal cabível.

Art. 9º  O servidor que divulgar, revelar ou facilitar a divulgação ou revelação de qualquer informação de que trata este Decreto, constante de sistemas informatizados, arquivos de documentos ou autos de processos protegidos por sigilo fiscal, com infração ao disposto no art. 198 da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 (Código Tributário Nacional), ou no art. 116, inciso VIII, da Lei nº 8.112, de 1990, ficará sujeito à penalidade de demissão, prevista no art. 132, inciso IX, da citada Lei nº 8.112, sem prejuízo das sanções civis e penais cabíveis.

Art. 10.  O servidor que permitir ou facilitar, mediante atribuição, fornecimento ou empréstimo de senha ou qualquer outra forma, o acesso de pessoas não autorizadas a sistemas de informações, banco de dados, arquivos ou a autos de processos que contenham informações mencionadas neste Decreto, será responsabilizado administrativamente, nos termos da legislação específica, sem prejuízo das sanções civis e penais cabíveis.

Parágrafo único.  O disposto neste artigo também se aplica no caso de o servidor utilizar-se, indevidamente, do acesso restrito.

Art. 11.  Configura infração do servidor aos deveres funcionais de exercer com zelo e dedicação as atribuições do cargo e de observar normas legais e regulamentares, nos termos do art. 116, incisos I e III, da Lei nº 8.112, de 1990, sem prejuízo da responsabilidade penal e civil cabível, na forma dos arts. 121 a 125 da daquela Lei, se o fato não configurar infração mais grave:

I – não proceder com o devido cuidado na guarda e utilização de sua senha ou emprestá-la a outro servidor, ainda que habilitado;

II – acessar imotivadamente sistemas informatizados da Secretaria da Receita Federal, arquivos de documentos ou autos de processos, que contenham informações protegidas por sigilo fiscal.

Art. 12.  O sujeito passivo que se considerar prejudicado por uso indevido das informações requisitadas, nos termos deste Decreto, ou por abuso da autoridade requisitante, poderá dirigir representação ao Corregedor-Geral da Secretaria da Receita Federal, com vistas à apuração do fato e, se for o caso, à aplicação de penalidades cabíveis ao servidor responsável pela infração.

Previsão semelhante é encontrada no Decreto 4.489/02, arts. 9, 10, 11 e 12, que pode ser aliado ao art. 198 do Código Tributário Nacional e o art. 132, IX, da Lei 8.112/90.

Assim, mantida o caráter sigiloso da informação, não há que se falar em incompatibilidade das referidas disposições com o que contido no art. 5º, XII, da CF.

Continuando na análise da constitucionalidade das disposições legais, deve ser ressaltado que, no que toca os princípios do devido processo legal processual (art. 5º, LV, da CF) e da Inafastabilidade da Jurisdição (art. 5º, XXXV, da CF) também se mostra impecável a legislação. Em primeiro lugar, porque o acesso às informações é realizado por meio de processo administrativo ou judicial, no qual as garantias do contraditório e da ampla defesa são plenamente respeitadas. Em segundo lugar, porque qualquer abuso de poder ou ilegalidade que venha a ser verificado durante o procedimento fiscal pode ser levado à apreciação do Poder Judiciário por meio de mandado de segurança ou qualquer outro meio processual cabível.

Por fim, a conclusão pela constitucionalidade do preceito legal em tela passa pela aferição do respeito aos limites imanentes dos direitos fundamentais, também chamados “limites dos limites”. Gilmar Ferreira Mendes, Inocêncio Mártires Coelho e Paulo Gustavo Gonet Branco identificam como limites dos limites a proteção do núcleo essencial, o princípio da proporcionalidade e a proibição de restrições casuísticas.[51]

Como já vimos, por meio da atividade legislativa é possível restringir-se o âmbito de aplicação dos direitos fundamentais desde que não se atinja o seu “núcleo essencial”. Atingido o núcleo essencial, restará desconfigurado o direito fundamental.

A proteção ao núcleo essencial do direito é um limite imanente que deixa nítida a ideia de que a atividade restritiva do Estado deve buscar não desnaturar o próprio direito fundamental.

Definir o núcleo essencial de um direito fundamental não se mostra, definitivamente, uma tarefa das mais fáceis. Para os adeptos da teoria absoluta, esse núcleo seria um valor invariável, independente da situação concreta de conflito que se lhe apresente. Aqueles que optam por uma teoria relativa para a definição desse núcleo estabelecem a possibilidade de se adequar o núcleo essencial à hipótese de conflito caso a caso[52]. Essa segunda teoria parece estar umbilicalmente ligada à ideia de proporcionalidade e razoabilidade, que evitaria abusos do direito.

Ainda em relação ao núcleo essencial, cabe o registro de que é possível estabelecer outras duas posições doutrinárias controvertidas. A teoria subjetiva visa à proteção contra a extinção do direito subjetivo. Para a teoria objetiva, é garantida a intangibilidade do direito objetivo[53].

O princípio da proporcionalidade (ou da proibição do excesso – Ubermassverbot): engloba a análise de três elementos fundamentais, que são a adequação ou (uso do meio capaz de atingir os fins colimados – Geeignetheit), a necessidade (utilização apenas do meio necessário ao alcance das finalidades – Erforderlichkeit) e a proporcionalidade em sentido estrito (o meio escolhido deve ser o mais vantajoso – Verhältnismässigkeitsprinzip).

O controle de constitucionalidade de normas com base nesse princípio visa a evitar o abuso do poder legislativo, verificando a compatibilidade da lei, editada segundo o poder de conformação, com a os fins previstos na constituição.[54] Nesse sentido, até mesmo a omissão legislativa poderia configurar um abuso desse poder.

O estudo acerca da proporcionalidade da norma, afirma Gilmar Ferreira Mendes em sua obra Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade[55], referência nesse tema, não há de centrar-se no mérito do ato legislativo ou na vontade do legislador, matéria afeta ao Poder Legislativo. Caberá, porém, ao Judiciário, discutir a liberdade discricionária outorgada ao legislador e os limites dessa liberdade.

A proporcionalidade não deve ser aferida apenas pelo Poder Judiciário, já que nem todos os aspectos aplicáveis a cada hipótese estão previamente definidos nos textos legislativos. Principalmente no que toca aos preceitos legais com alto grau de abstração, nos quais a administração pública e o Poder Judiciário irão, no caso concreto, apresentar soluções imediatas, deve haver um segundo controle de proporcionalidade, no caso concreto, denominado duplo controle de proporcionalidade.[56]

Ademais, o exame da proporcionalidade deve mostrar-se excepcional, de modo que seja aferido se não havia outro meio capaz de produzir os mesmos efeitos, proceder a uma excessiva restrição dos direitos fundamentais.

Na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, a obediência à proporcionalidade e à razoabilidade foi identificada com o conteúdo do art. 5º, LIV, da CF, consubstanciando o chamado devido processo legal substantivo (substantive due processo of law). Nesse sentido afirma o ministro Carlos Velloso na ADI 1.511-MC[57]:

Abrindo o debate, deixo expresso que a Constituição de 1988 consagra o devido processo legal nos seus dois aspectos, substantivo e processual, nos incisos LIV e LV, do art. 5º, respectivamente. (…) Due process of law, com conteúdo substantivo — substantive due process — constitui limite ao Legislativo, no sentido de que as leis devem ser elaboradas com justiça, devem ser dotadas de razoabilidade (reasonableness) e de racionalidade (rationality), devem guardar, segundo W. Holmes, um real e substancial nexo com o objetivo que se quer atingir.

Em terceiro lugar, dentro da ótica dos limites imanentes, temos a proibição de relações casuísticas, que se mostra intimamente ligada ao princípio da isonomia, dado que impede que a atividade de restrição dos direitos fundamentais venha a configurar um instrumento de arbitrariedade do Estado.

As leis restritivas devem, assim, ser abstratas e genéricas, sob pena de configurar-se verdadeiro ato administrativo, ainda que formalizado por meio de lei em sentido formal. Há que se aferir se a lei, quando aplicada, vem a atingir a todos, independentemente de a redação dada pelo legislador utilizar-se de termos genéricos[58].

Passamos nesse ponto a analisar o tratamento dado ao sigilo bancário pela Lei Complementar 105/01.

O núcleo essencial do direito fundamental é resguardado pelo fato de que, mesmo após ser determinado o acesso à informação, ainda é preservado o seu caráter sigilo. Assim, não há uma exclusão total da proteção dada à informação. A restrição somente é feita na parte realmente essencial ao resguardo do interesse público.

Em relação à proporcionalidade, temos que o respeito aos preceitos de necessidade e adequação, são legitimadores da atuação restritiva do legislador, dado que configurariam elementos delineadores do núcleo essencial a ser preservado. Dessa forma, evitar-se-ia o abuso do poder de conformação, que poderia resultar na inconstitucionalidade por excesso do Poder Legislativo.

A necessidade da transferência de dados assenta-se em duas razões. Primeiramente, há que se ressaltar que a maioria dos fenômenos relevantes a título de fato gerador de tributo gera efeitos financeiros que podem facilmente ser fiscalizados por meio de operações bancárias. Além disso, obrigar o Fisco a solicitar autorização judicial para ter acesso a tais dados geraria uma demanda judicial enorme, que sobrecarregaria os Tribunais.

Por outro lado, a adequação do acesso aos dados pelos Poderes Legislativo e Executivo, sem necessidade de autorização judicial, permite o exercício da função típica de fiscalização sem que haja uma submissão prévia ao crivo do Poder Judiciário.

Ao se identificar as movimentações bancárias em seu montante global da pessoa que está sendo investigada é possível verificar, de pronto, a existência de irregularidades, já que a atividade bancária se mostra essencial, no atual estágio econômico, em qualquer atividade lícita ou ilícita.

Ademais, em relação ao Poder Executivo, a atividade fiscalizadora é facilmente justificada a partir da leitura do parágrafo 1º do art. 145 da Constituição Federal[59], que define claramente o dever de a administração tributária identificar as atividades econômicas do contribuinte, o que será legítimo se respeitado o núcleo essencial dos direitos fundamentais descritos no texto fundamental.

O indício de que a proporcionalidade em sentido estrito é observada pela referida norma refere-se ao fato de que não são repassadas à administração tributárias as informações pessoais sobre o titular das informações bancárias, limitando-se a norma a prescrever a indicação dos montantes globais mensalmente movimentados.

Não interessa à administração tributária saber de que forma foi gasto o dinheiro do contribuinte. Não quer saber se foi utilizado em um cinema, um restaurante ou para a compra de um carregamento de entorpecente.

O Fisco apenas pretende saber se houve movimentação financeira e qual foi o seu montante. Essa informação não é apta a ferir de forma desproporcional e desnecessária o círculo do sigilo bancário.

Podemos distinguir quatro círculos que envolvem o indivíduo em seu convívio social: o público, o da privacidade, o da intimidade e o do segredo[60].

O círculo público diz respeito ao aspecto individual que é compartilhado com a sociedade. O círculo da privacidade refere-se àquilo que somente se compartilha com algumas pessoas, em relação às quais há uma relação de confiança. O círculo da intimidade, mais estreito, refere-se à parte mais individual do ser humano, relativo aos sentimentos, às angústias, às opções sentimentais, bem como ao direito de estar só. Nesse círculo nem mesmo os mais próximos podem adentrar sem consentimento. Por fim, consta o segredo, que inclui aquilo que se pretende manter a salvo de todos, mesmo daqueles em relação aos quais é dado interferir em nossa intimidade.

Em nossa ordem constitucional a intimidade e a privacidade estariam positivadas no art. 5º, X, e o segredo no art. 5º, XII, da Carta.

Aplicando essa teoria à quebra de sigilo nas hipóteses legais, poderíamos dizer que o acesso ao montante global, sem especificações das movimentações permite que, de forma cirúrgica, seja invadido, por necessário, o círculo do segredo, sem que, desnecessariamente, sejam violados os círculos da intimidade e da privacidade.

Sendo assim, o princípio da proporcionalidade é plenamente respeitado pela legislação que determina a quebra do sigilo bancário, tendo em vista que é adequada e necessária à atuação Estatal e resulta em uma intervenção mínima no sigilo de dados do contribuinte.

Quanto à proibição de estabelecer distinções casuísticas, podemos perceber que o texto da norma é genérico e não tende estabelecer, mesmo quando aplicada a um caso concreto, tratamento diferenciado em relação aos contribuintes ou correntistas.

Os direitos fundamentais surgem no constitucionalismo moderno como uma forma de preparação do Estado para o desenvolvimento de um modelo econômico emergente: o capitalismo.

O liberalismo político garantiria o grau de independência necessário para que a burguesia pudesse substituir os instrumentos de poder, fazendo com que a força do capital fosse a medida de todas as coisas. Esse liberalismo extremo, sintetizado na doutrina do laissez faire, laissez aller, laissez passer, mostrou-se extremamente nocivo, já que a mão invisível do mercado não tinha a real capacidade de regular os mercados, o que gerou um estado ainda mais desigual do que aquele fundado no sistema feudal.

O que se verificou no século XIX, como as revoluções sociais e o desenvolvimento do comunismou foi uma contrarreforma, uma reação ao liberalismo extremo.

A teoria dos direitos fundamentais, especialmente no que toca às liberdades públicas, possui cunho eminentemente individualista e tende a restrigir o Poder Estatal. O medo do Estado absolutista, permanentemente estimulado pelos detentores do capital, acabou por gerar o dogma dos direitos fundametais como direitos naturais, quase que elevados à condição divina. Utilizando-se de um termo tipicamente comunista, podemos dizer que houve um verdadeiro fetichismo em relação aos direitos fundamentais, que torna sempre antipopular qualquer discussão sobre a relativização dessas prerrogativas.

O desenvolvimento da teoria dos direitos fundamentais, porém, veio a, paulatinamente, desconstruir o caráter absoluto dos direitos fundamentais. Eles passaram a ser encarados como um meio, e não um fim em si próprios. Dessa forma, somente se justifica a proteção dos direitos fundamentais enquanto não venham a gerar mais transtornos do que benefícios à sociedade.

Dentre os bens protegidos pelos direitos fundamentais encontra-se o sigilo bancário. Em nosso sistema constitucional, costuma-se identificar o sigilo dos dados bancários com o que previsto no art. 5º, XII, da Constituição Federal, que estabelece o sigilo da comunicação de dados. Se esse for o parâmetro adota, não há outra conclusão plausível, senão a de que é possível a restrição dessa prerrogativa independentemente de autorização judicial, tendo em vista que a intervenção do Poder Judiciário somente é exigida em relação às comunicações telefônicas.

Por outro lado, mais correto seria relacionar o que disposto no art. 5º, XII, da Constituição Federal com os dados em trânsito, que compõem uma comunicação. Dessa forma, o sigilo bancário mostra-se corolário do direito à proteção da intimidade e da vida privada, positivado no art. 5º, X.

Nessa hipótese, também se configura a possibilidade de acesso aos dados, já que não há que se alegar intimidade no que toca a atividades ilícitas. O interesse público fica configurado quando por algum indício um correntista é investigado por desviar dinheiro público, lavar dinheiro, sonegar etc.

Dessa forma, estabelecendo-se parâmetros para a solução desse nítido caso de conflito de direitos fundamentais, há que se concluir pela possibilidade de acesso aos dados bancários, ainda que não haja uma autorização judicial. Perguntar-se-ia, porém, se a autorização do Poder Judiciário não seria necessária para evitar abusos. Essa pergunta é respondida com a simples afirmativa de que há regramento legal para tanto, que estabelece toda uma malha de proteção daquele que, porventura, venha a ter sua esfera de intimidade invadida.

A Lei Complementar 105/01 veio para dirimir quaisquer dúvida sobre possibilidade de o Poder Público ter acesso às informações relativas a movimentações financeiras, sempre que estiver envolvido o interesse público. Nesse sentido, de forma totalmente independente, identifica três agentes autorizados, um em cada esfera de poder.

A hipótese de acesso dos dados pelo Poder Judiciário talvez seja a mais pacífica, já que aos juízes é dado, enquanto aplicadores do Direito, exercer juízo de ponderação entre os direitos fundamentais, conciliando interesses diametralmente opostos. Cabe ao Judiciário, porém, resistir à tentação de chamar a si a exclusividade no trato do tema, já que esse tipo de pensamento parte do pressuposto de que os demais Poderes são vocacionados à corrupção ou à utilização do poder estatal em prol de interesses escusos.

Há que se ter em mente que o princípio da inafastabilidade da jurisdição, também elevado à estatura de direito fundamental em nosso sistema constitucional, possibilita um efetivo controle, preventivo e repressivo no que toca ao abuso de prerrogativas estatais.

O mais importante é que o acesso às informações bancárias ocorra por meio de procedimento oficial, que possibilite o contraditório e a ampla defesa. A delimitação legal de um rol taxativo de mecanismos de acesso às informações bancárias é apto a evitar que sejam criados mecanismos de fiscalização secretos, que não se coadunam com a atual fase da democracia moderna.

Há que se lembrar que a principal característica de um paraíso fiscal é a existência de sigilo fiscal absoluto. Nesse caso, o sigilo bancário deixar de ser uma proteção contra o Estado para se tornar uma proteção à corrupção e à lavagem de dinheiro.

Nesse sentido é que ressoam as célebres palavras de Marie-Jeanne Roland de la Platiere, mais conhecida como Madame Roland, que fora membro da facção girondina durante a Revolução Francesa, marco histórico dos direitos fundamentais. Antes de morrer decapitada na gilhotina, brada Madame Roland: “Liberdade, oh, liberdade, quantos crimes são cometidos em seu nome!”


[1] A obra prima de Emmanuel Joseph Sieyès, “O que é o Terceiro Estado?” (“Qu’est-ce que le tiers état?), publicada às vésperas da Revolução Francesa, serviu de base teórica à revolução e definiu importantes aspectos constitucionais, como o conceito de poder constituinte.

[2] Sobre o tema, vide MENDES, Gilmar Ferreira, COELHO, Inocêncio Mártires, BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 281-283.

[3] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Matéria constitucional. Direitos fundamentais. Eficácia nas relações privadas. RE nº 201.819. Relator par o acórdão Ministro Gilmar Mendes. Brasília, DF, 11 de outubro de 2005.

[4] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Matéria constitucional. Direitos fundamentais. Regulamentação. ADI nº 1.480. Relator Ministro Celso de Mello. Brasília, DF, 04 de setembro de 1997.

[5] Karl Marx, na obra “Manuscritos Econômico-Filosóficos”, esclarece que “o conceito de direitos do homem só foi adotado no mundo cristão no último século (XVIII). Não como uma ideia inerente ao homem; ao contrário, foi conquistada na luta contra as tradições históricas em que o homem foi educado até agora. Consequentemente, os direitos do homem também não são nenhum dote da história passada, nenhuma dádiva da Natureza, mas o prêmio da luta contra o inesperado do nascimento e contra os privilégios, que a história até agora transmitiu de geração em geração. São os resultados da cultura e só pode possuí-los quem os mereceu e ganhou.” (MARX, Karl. Manuscritos Econômico-Filosóficos. Tradução de Alex Martins. São Paulo: Editora Martin Claret, 2005.)

[6] A reforçar tal ideia escreveu Bobbio que “direitos que foram declarados absolutos no final do século XVIII, como a propriedade sacre et inviolable, foram submetidos a radicais limitações nas declarações contemporâneas; direitos que as declarações do século XVIII nem sequer mencionavam, como os direitos sociais, são agora proclamados com grande ostentação nas recentes declarações. Não é difícil prever que, no futuro, poderão emergir novas pretensões que no momento nem sequer podemos imaginar… o que prova que não existem direitos fundamentais por natureza”. BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos. Trad. Carlos Nelson Coutinho. São Paulo: Ed. Campus, 1992, p. 18-19. Apud RAMOS, André de Carvalho. Teoria geral dos direitos humanos na ordem internacional. Rio de Janeiro: Renovar, 2005. p. 24.

[7] MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. São Paulo: Editora Atlas, 2006. 19ª Ed. p. 27.

[8] Referimo-nos ao fato amplamente divulgado em agosto de 2007, ocasião na qual foram divulgadas mensagens trocadas pelos Ministros do Supremo Tribunal Federal durante a sessão de julgamento na qual se discutia o recebimento da denúncia contra envolvidos no esquema denominado “mensalão”.

[9] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Matéria constitucional. Direitos fundamentais. Limites. ADI nº 319-QO. Relator Ministro Moreira Alves. Brasília, DF, 03 de março de 1993.

[10] A concepção de um núcleo essencial, no que toca aos direitos fundamentais, pode ser encontrada na obra “Curso de Direito Constitucional” (MENDES, Gilmar Ferreira, COELHO, Inocêncio Mártires, BRANCO, op. cit, p. 235), que destaca que “(…) há que se respeitar o núcleo essencial do direito, não se legitimando a criação de condições desarrazoadas ou que tornem impraticável o direito previsto pelo constituinte”.

[11] MORAES, op. cit., p. 188.

[12] Sobre o tema, vide MENDES, Gilmar Ferreira, COELHO, Inocêncio Mártires, BRANCO, Paulo Gustavo Gonet, op. cit., p. 278-279.

[13] Cabe aqui a transcrição do seguinte trecho da obra Curso de Direito Constitucional (MENDES, Gilmar Ferreira, COELHO, Inocêncio Mártires, BRANCO, Paulo Gustavo Gonet, op. cit., p. 280):

“Gavara de Cara noticia outra abordagem, mais estrita, da questão dos limites implícitos de conteúdo dos direitos fudndamentais. Relata que, para Friederich Muller, o âmbito normativo do direito fundamental se define pelo que é específico do direito considerado. As modalidades inespecíficas de exercício de um direito fundamental não pertenceriam ao seu âmbito normativo. No intento de apurar-se uma modalidade de exercício é específica, parte da distinção entre o que é exercício de um direito fundamental e o que é circunstância acidental do exercício de um direito fundamental. Assim, qualifica uma ação como inespecífica e irrelevante para o direito fundamental se há a possibilidade de se exercer o direito fundamental em outro lugar, em outro tempo ou mediante outra classe de ação. Dessa maneira, não haveria direito de liberdade artística que protegesse o pintor que resolvesse desenvolver a sua arte num movimentado cruzamento de ruas. Essa conduta não seria modalidade específica protegida pelo direito fundamental. A crítica a essa posição lembra que, a ser seguida pontualmente, pode vir a acontecer que nada sobeje de específico de um direito fundamental.”

[14] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Matéria constitucional. Direitos fundamentais. Relatividade. MS nº 23.452. Relator Ministro Celso de Mello. Brasília, DF, 16 de setembro de 1999.

[15] BRASIL. Justiça Federal de Santa Catarina, 2ª Vara federal de Itajaí. Matéria constitucional. Direitos fundamentais. Restrição. Ação Civil Pública nº 2007.72.08.002118-0. Juiz Vilian Bollmann. Itajaí, SC, 19 de julho de 2007.

[16] MENDES, Gilmar Ferreira. Hermenêutica Constitucional e direitos fundamentais. Brasília: Brasília Jurídica, 2000. p. 227 e 228.

[17] MENDES, Gilmar Ferreira, COELHO, Inocêncio Mártires, BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. , op. cit., p. 296-304.

[18] MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos fundamentais e controle de constitucionalidade: estudos de direito constitucional. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 40.

[19] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Matéria Constitucional. Sigilo de correspondência. Presidiário. Habeas Corpus nº 70.814. Brasília, DF, 1º de março de 1994.

[20] Supremo Tribunal Federal. Convênio entre CNJ e Receita Federal permite acesso da Justiça a dados sigilosos por meio eletrônico. Disponível em < http://www.stf.gov.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=70371&caixaBusca=N>. Acesso em 1º de agosto de 2008.

[21] Art. 198 do CTN. “Sem prejuízo do disposto na legislação criminal, é vedada a divulgação, por parte da Fazenda Pública ou de seus servidores, de informação obtida em razão do ofício sobre a situação econômica ou financeira do sujeito passivo ou de terceiros e sobre a natureza e o estado de seus negócios ou atividades.”

[22] Art. 132 da Lei 8.112/90: “A demissão será aplicada nos seguintes casos:

IX – revelação de segredo do qual se apropriou em razão do cargo;”

[23] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Matéria constitucional. Sigilo bancário. Acesso por agentes fiscais. RMS nº 15.925. Relator Ministro Gonçalves de Oliveira. Brasília, DF, 20 de maio de 1966.

[24] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Matéria Constitucional. Sigilo bancário. Acesso de dados pelo Ministério Público. Mandado de Segurança nº 21.729. Relator para o acórdão: Ministro Néri da Silveira. Brasília, DF, 05 de outubro de 1995.

[25] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Matéria constitucional. Sigilo bancário. Quebra por iniciativa do Ministério Público. Petição nº 2.790. Relator: Ministro Nelson Jobim. Brasília, DF, 29 de outubro de 2002.

[26] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Matéria constitucional. Sigilo bancário. Quebra por iniciativa do Ministério Público. Recurso Extraordinário nº 215.301. Relator Ministro Carlos Velloso. Brasília, DF, 13 de abril de 1999.

[27] MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. São Paulo: Editora Atlas, 2006. 19ª Ed. p. 63-64.

[28] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Matéria constitucional. Sigilo bancário. Quebra por ato de comissão parlamentar de inquérito. Mandado de Segurança nº 23.851. Relator: Ministro Celso de Mello. Brasília, DF, 26 de setembro de 2001.

[29] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Matéria constitucional. Sigilo bancário. Quebra por ato do Banco Central do Brasil. Recurso extraordinário nº 461.366. Relator: Ministro Marco Aurélio. Brasília, DF, 03 de agosto de 2007.

[30] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Matéria constitucional. Sigilo bancário. Inexistência de proteção absoluta. RE nº 219.780. Relator: Ministro Carlos Velloso. Brasília, DF, 13 de abril de 1999.

[31] FERRAZ JÚNIOR, Tércio Sampaio. Sigilo de dados: o direito à privacidade e os limites a função fiscalizadora do Estado. Disponível em: http://www.agu.gov.br/ce/EdEspecialNascional/EdEspecial_Doutrina_Tarcio.htm.. Acesso em 10/02/2001. Apud VALENTE, Christiano Mendes Wolney. Sigilo Bancário, obtenção de informações pela Administração Tributária Federal. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2006. p. 84-85.

[32] FERRAZ JÚNIOR, op. cit., Apud VALENTE, op. cit. p. 89.

[33] FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Comentários à Constituição brasileira de 1988. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 37.

[34] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Matéria Constitucional. Sigilo bancário. Relativização. Mandado de Segurança 27.091. Relator: Ministro Gilmar Mendes. Brasília, DF, 04 de janeiro de 2008.

[35] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Matéria Constitucional. Sigilo bancário. Relativização. Ação Cautelar 1.928. Relator na Presidência: Ministro Gilmar Mendes. Brasília, DF, 07 de janeiro de 2008.

[36] CHINEN, Roberto Massao. Sigilo bancário e o fisco. Curitiba: Juruá, 2005. p. 78.

[37] CHINEN, Roberto Massao. Sigilo bancário e o fisco. Curitiba: Juruá, 2005. p. 79.

[38] VALENTE, op. cit., p. 107.

[39] CHINEN, op. cit, p. 82.

[40] Christiano Mendes Wolney. Sigilo Bancário, obtenção de informações pela Administração Tributária Federal. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2006. p. 183.

[41] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Matéria constitucional. Inviolabilidade de sigilos. Reserva absoluta de jurisdição. Mandado de Segurança nº 23.480. Relator Ministro Sepúlveda Pertence. Brasília, DF, 04 de maio de 2000.

[42] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Matéria constitucional. Direitos fundamentais. Relatividade. MS nº 23.452. Relator Ministro Celso de Mello. Brasília, DF, 16 de setembro de 1999.

[43] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Matéria Constitucional. Sigilo bancário. Acesso de dados pelo Ministério Público. Mandado de Segurança nº 21.729. Relator para o acórdão: Ministro Néri da Silveira. Brasília, DF, 05 de outubro de 1995.

[44] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Matéria constitucional. Direitos Fundamentais. Restrição. Recurso Extraordinário 71.640. Relator Ministro Djaci Falcão. Brasília, DF, 17 de setembro de 1971.

[45] FERRAZ JÚNIOR, op. cit. Apud VALENTE, op. cit. p. 88-89.

[46] MORAES, op. cit., p. 62.

[47] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Matéria constitucional. Sigilo bancário. Requisição de informações. Petição nº 577. Relator Ministro Carlos Velloso. Brasília, DF, 25 de março de 1992.

[48] VALENTE, Christiano Mendes Wolney. Sigilo Bancário, obtenção de informações pela Administração Tributária Federal. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2006. p 82.

[49] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Matéria constitucional. Direito de intimidade. Atividade ilícita. Habeas Corpus nº 87.341. Relator Ministro Eros Grau. Brasília, DF, 07 de fevereiro de 2006.

[50] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Matéria constitucional. Direito de intimidade. Atividade ilícita. Habeas Corpus nº 79.285. Relator Ministro Moreira Alves. Brasília, DF, 31 de agosto de 1999.

[51] MENDES, Gilmar Ferreira, COELHO, Inocêncio Mártires, BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 304.

[52] MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos fundamentais e controle de constitucionalidade: estudos de direito constitucional. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 43.

[53] Ibidem, p. 45.

[54] Ibidem, p. 46.

[55] Ibidem, p. 46-47.

[56] Ibidem, p. 70.

[57] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Matéria Constitucional. Princípio da devido processo legal substantivo. Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.511-MC. Relator Ministro Carlos Velloso. Brasília, DF, 16 de outubro de 1996.

[58] Ibidem, p. 74.

[59] Art. 145, § 1º, da CF: Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte.

[60] FOLMANN, Melissa. Sigilo Bancário e Fiscal. 2ª ed. Curitiba: Juruá, 2003. p. 46-50.

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