Justiça em Números

Judiciário já julga mais processos do que recebe

Autor

  • Gilmar Mendes

    é presidente do Supremo Tribunal Federal e do Conselho Nacional de Justiça; professor de Direito Constitucional nos cursos de graduação e pós-graduação da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília-UnB; mestre em Direito pela Universidade de Brasília - UnB (1988); mestre e doutor em Direito pela Universidade de Münster da República Federal da Alemanha - RFA (1989 e 1990); membro fundador do Instituto Brasiliense de Direito Público – IDP; membro do Conselho Assessor do “Anuario Iberoamericano de Justicia Constitucional” – Centro de Estudios Políticos y Constitucionales - Madri Espanha; membro da Academia Brasileira de Letras Jurídicas; e membro da Academia Internacional de Direito e Economia – AIDE.

21 de junho de 2009, 12h23

Há séculos se reproduz que o Judiciário brasileiro é lento, caro e pouco transparente. Repetido à exaustão, esse clichê está perto de alcançar o “turning point”, a virada.
Transparece do “Justiça em Números” — publicação que reúne os indicadores relativos ao desempenho dos órgãos do Judiciário nacional, disponível no sítio eletrônico do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) — que houve acréscimo no número de processos novos no Judiciário, mas houve ainda maior incremento na produtividade.

Os órgãos de segunda instância reduziram suas taxas de congestionamento. Isso significa que os tribunais têm superado o número de casos novos e conseguido atacar o passivo, que em geral concentra processos mais complexos. É relevante, por exemplo, que os tribunais de Justiça tenham reduzido, entre 2004 e 2008, de 52,8% para 42,5% sua taxa de congestionamento, sobretudo considerando que a carga de trabalho de cada magistrado subiu de 1.441 para 2.066 processos por ano.

Atualmente, o desafio concentra-se, especialmente, em auxiliar o primeiro grau, para que o grande esforço realizado pela magistratura nacional passe a se refletir na redução do estoque de processos. O Poder Judiciário toma para si, hoje, a responsabilidade pelo aprimoramento dos mecanismos capazes de agilizar a prestação jurisdicional. E o faz de forma concertada e planejada, com objetivos eleitos de forma conjunta por todos os tribunais brasileiros e com o norte voltado para a redução das desigualdades existentes entre os segmentos da Justiça.

É compromisso dos atuais gestores a busca de um padrão nacional de serviço público judiciário. Hoje a produção dos órgãos judicantes deve ser divulgada mensalmente pelos tribunais nos seus sítios da internet, conforme definido em normativo do CNJ.
Todos são chamados a assumir a gestão de suas unidades judiciárias e a propor soluções responsáveis para os problemas que enfrentam. Consolida-se a imagem do magistrado proativo e criativo, que persegue resultados projetados e renovados periodicamente e que se orienta pelos princípios constitucionais da duração razoável do processo, transparência, publicidade e do acesso à Justiça.

O cumprimento, antes do prazo, por alguns tribunais, da meta nº 2, estabelecida no 2º Encontro Nacional do Judiciário, pela qual até o final deste ano devem ser julgados todos os processos distribuídos até dezembro de 2005, é prova de que a atitude pragmática já é realidade e produz excelentes resultados.
Mecanismos de racionalização em diversos tribunais ilustram esse movimento. São mutirões de julgamentos, de conciliações e de verificação das execuções penais, mudanças da forma de trabalho nos cartórios, reestruturação de varas, especialização e eliminação de procedimentos obsoletos, entre outras medidas. As mais recentes reformas processuais civis e penais proporcionadas pelo Poder Legislativo encontraram no Judiciário terreno fértil e já produzem inequívocos resultados.

Trabalhar com metas e introduzir a cultura de resultados é fundamental para a modernização e a eficiência da Justiça brasileira. O plano estratégico construído em conjunto por todos os tribunais sistematizou e colheu o compromisso com objetivos comuns, que passam ao largo do mero expansionismo da estrutura física ou do quadro de pessoal. Na contramão dessa mentalidade estão as medidas que enxergam o Judiciário como um poder nacional.

Ações relacionadas ao projeto Justiça Integrada e ao programa Integrar preconizam o compartilhamento de instalações e de pessoal entre os diversos segmentos da Justiça, na busca de maior capilaridade no acesso e da troca de experiências e de soluções práticas entre Justiça estadual, Federal, do Trabalho, Militar e Eleitoral. Dentre os desafios, está o de modificar o quadro de judicialização excessiva. Os bem-sucedidos movimentos de conciliação têm provado como é falsa a percepção de que só com sentença se resolvem conflitos. A intervenção jurisdicional por sentença deve ser a última, não a primeira alternativa.

Enfim, o Judiciário já iguala o número de casos julgados ao número de processos que ingressaram na Justiça, cerca de 25 milhões no ano de 2008. Isso é fruto do esforço de cada um dos servidores e magistrados brasileiros. O problema reside no estoque a ser vencido. O desafio é enorme, mas não andamos à deriva: sabemos onde estamos e aonde queremos ir. É somente um passo a mais para quem demonstra que pode ultrapassar montanhas.

Artigo originalmente publicado na seção Tendências e Debates do jornal Folha de S. Paulo, neste domingo (21/6).

Autores

  • é presidente do Supremo Tribunal Federal e do Conselho Nacional de Justiça; professor de Direito Constitucional nos cursos de graduação e pós-graduação da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília-UnB; mestre em Direito pela Universidade de Brasília - UnB (1988); mestre e doutor em Direito pela Universidade de Münster, da República Federal da Alemanha - RFA (1989 e 1990); membro fundador do Instituto Brasiliense de Direito Público – IDP; membro do Conselho Assessor do “Anuario Iberoamericano de Justicia Constitucional” – Centro de Estudios Políticos y Constitucionales - Madri, Espanha; membro da Academia Brasileira de Letras Jurídicas; e membro da Academia Internacional de Direito e Economia – AIDE.

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