Prescrição tributária

Justiça pode declarar prescrição intercorrente

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16 de junho de 2009, 6h01

O egrégio Superior Tribunal de Justiça é a última instância judicial para temas que não envolvem matéria jurídica constitucional, por se tratar de corte máxima infra-constitucional.

Os operadores de Direito se atualizam, no que se refere ao direito em movimento, através dos julgados daquela corte. A 1ª e a 2ª Turma da Corte Superior são competentes para o julgamento das ações envolvendo Direito Público e, quando reunidas, formam a 1ª Seção, que é responsável pela sedimentação da jurisprudência envolvendo os temas que lhes são peculiares.

Embora não tenham a força de uma Súmula Vinculante, algumas decisões da 1ª Seção envolvendo prescrição tributária vão certamente influenciar nas decisões a serem proferidas nos processos de execução fiscal em tramitação em todo o país, sejam os que estão tramitando na primeira instância — Justiça Federal ou fóruns estaduais — como na segunda instância, nos tribunais regionais federais ou nos tribunais de Justiça estaduais.

Daí a importância de examinar a prescrição tributária no STJ, que teve sedimentação jurisprudencial em algumas vertentes do tema.

“Dies a quo” na contagem da prescrição

A prescrição está no artigo 174 do CTN, que dispõe que a ação de cobrança do crédito tributário pelo o fisco prescreve em cinco anos, contado da data da sua constituição definitiva. Essa fixação do dies a quo, em regra geral remete às noções de lançamento do artigo 142 do CTN (2).

Pelo lançamento é que se inicia o processo de cobrança do tributo, mas não se constitui ainda o crédito tributário objeto dele. Tem-se o lançamento como definitivo quando sobre ele não paire mais dúvidas, e ele esteja imune a impugnação por parte do contribuinte e a revisão pela Administração.

O STJ, no que se refere ao “dies a quo”, assim decidiu:

“Em se tratando de tributo lançado por homologação, tendo o contribuinte declarado o débito através de Declaração de Contribuições de Tributos Federais (DCTF) e não pago o vencimento, considera-se desde logo constituído o crédito tributário, tornando-se dispensável a instauração de procedimento administrativo e respectiva notificação. Nessa hipótese, se o débito declarado somente pode ser exigido a partir do vencimento da obrigação, nesse momento é que começa a fluir o prazo prescricional.”

O mesmo entendimento da DCTF se aplica à GFIP, declaração que informa à Previdência e à Caixa Econômica Federal as informações quanto aos recolhimentos ao Fundo de Garantia por Tempo de Serviço.

Citação do devedor e a interrupção da prescrição

A citação por edital em execução fiscal interrompe prescrição. A 1ª Seção do STJ definiu que é possível interromper a prescrição por meio de citação por edital em ação de execução. O recurso especial do estado do Rio Grande do Sul foi levado à Seção seguindo a Lei dos Recursos Repetitivos, que entrou em vigor no segundo semestre do ano passado.

No STJ, o estado sustentou que a citação por edital seria instrumento hábil para a interrupção da prescrição. Assim, requereu o retorno dos autos à primeira instância, para o prosseguimento da execução. Segundo o relator, ministro Luiz Fux, predomina no STJ o entendimento de que a Lei de Execução Fiscal (LEF) prevê que, não se encontrando o devedor, seja feita a citação por edital, que tem o condão de interromper o lapso prescricional.

A decisão da Primeira Seção foi unânime e segue o rito da Lei 11.672/08, dos recursos repetitivos, medida destinada a agilizar a solução de milhares de recursos sobre esse tema.

Seguindo a lei, o julgado da 1ª Seção será aplicado automaticamente aos processos sobre a matéria, que estavam paralisados nos tribunais regionais federais e nos tribunais de Justiça de todo o país desde o encaminhamento do processo à 1ª Seção. Aos processos que já estão nos gabinetes dos ministros do STJ ou aguardando distribuição no tribunal o julgado também será aplicado imediatamente.


A interrupção pela citação do devedor face à Lei Complementar 118/05

A prescrição é interrompida pelo:

a) despacho do juiz que ordenou a citação;

b) protesto judicial;

c) ato que constitua em mora o devedor;

d) reconhecimento inequívoco por parte do devedor.

No caso da letra “a” retro, a previsão da legislação vale para as execuções com o despacho citatório depois da entrada em vigor da Lei Complementar 118/05. Para as execuções fiscais com despacho citatório anterior à vigência da LC 118/05, interrompe a prescrição somente a citação do devedor, inclusive por edital.

Importante essa alteração que, para fins de prescrição, cria a figura da execução fiscal velha (anterior à LC 118/05) e a nova. Na velha forma, a antiga prática de se “esconder” do oficial de justiça favorecia o executado. Tal prática é reprovável e, para fins de prescrição, acabou com o novo ordenamento.

Nesse caso o STJ decidiu que o texto da LC 118/05 vale apenas para as execuções fiscais despachadas após 9 de junho de 2005. Sempre que se deparar com execuções fiscais antigas — distribuídas e com despacho de citação ocorrido antes de 9 de junho de 2005 — é possível encontrar ocorrência de prescrição.

Suspensão da prescrição

No que se refere à Execução Fiscal há um aspecto interessante, encontrado no artigo 40 da Lei de Execuções Fiscais, em que temos uma suspensão da execução, quando não encontrado o devedor ou não encontrados bens suficientes para garanti-la. Essa suspensão, no entanto, não pode ser por tempo indeterminado; surge, então, a figura da prescrição intercorrente, na qual o prazo é quinquenal.

Deve-se ter cuidado ao examinar a prescrição, no que se refere à controvérsia entre a prática dos exequentes e a posição do STJ sobre a contagem desse prazo, pois a corte superior tem mantido a supremacia do CTN sobre a Lei de Execuções Fiscais, que prevê hipótese de suspensão da prescrição por 180 dias no momento em que inscrito o crédito em dívida ativa. Enquanto a fazenda pública sempre quis 180 dias de prazo para, contados da data da inscrição na dívida ativa, iniciar a contagem da prescrição, o Judiciário diz que esse prazo não existe, pois não consta do CTN.

A PGFN expediu Ato Declaratório 12, desistindo de discutir a suspensão in comento. E acrescentou: “Outrossim, não se deverá propor execução fiscal de débitos tributários prescritos mediante a desconsideração do prazo de suspensão previsto no artigo 2º, parágrafo 3º da Lei 6.830/1980”.

E as execuções fiscais em andamento? Por isso, os feitos executórios carecem ser examinados a luz dessa nova posição do órgão citado e da jurisprudência dominante no STJ. Muitos casos de prescrição, por certo, serão encontrados.

Suspensa a prescrição, quando findar o prazo da suspensão, recomeça a contar da data que ocorrera o início da suspensão — é diferente a interrupção. Os operadores do Direito, por certo, vão encontrar várias execuções fiscais (antigas) com possibilidade de encontrar a prescrição.

Prescrição intercorrente

Se o prazo prescricional não for interrompido por qualquer um dos motivos citados verificado o decurso do prazo de cinco anos, a prescrição pode ser reconhecida de ofício pelo julgador. A alteração foi feita no artigo 219, parágrafo 5º, do Código de Processo Civil, que diz: “O juiz pronunciará, de ofício, a prescrição”.

O impacto dessa nova norma sobre os milhões de feitos em andamento no Brasil, sendo mais da metade deles execuções fiscais, ainda não foi mensurado. Suspeito que nem os administradores públicos perceberam isso. Esperava-se um esvaziamento das prateleiras dos fóruns, pela aplicação imediata do novo texto. O próprio STJ já decidiu sobre sua aplicação imediata, verbis:


8. “Tratando-se de norma de natureza processual, tem aplicação imediata, alcançando inclusive os processos em curso, cabendo ao juiz da execução decidir a respeito da sua incidência, por analogia, à hipótese dos autos” (REsp nº. 814696/RS, 1ª Turma, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJ de 10/04/2006).

9. Execução fiscal paralisada há mais de 5 (cinco) anos. Prescrição intercorrente declarada.

10. Recurso não-provido.”

A prescrição intercorrente somente é verificada na hipótese de restar paralisado o feito, por mais de cinco anos, em decorrência da inércia do exequente — a fazenda pública — em proceder às medidas necessárias à obtenção de êxito no processo executivo.

No Direito Tributário, o instituto da prescrição é uma das formas de extinção do crédito tributário, modernizado com a lei já citada, que modificou o “modus operandi” da prescrição intercorrente, podendo o Juiz do feito decretá-la de ofício — pois nada justifica um processo arrastar-se por longo tempo até ter uma solução final ou a chamada eternização do tributo.

O tema já foi objeto de Súmula do colendo Superior Tribunal de Justiça, de número 314, que encerrou a discussão ao afirmar que: "Em execução fiscal, não localizados bens penhoráveis, suspende-se o processo por um ano, findo o qual inicia-se o prazo da prescrição quinquenal intercorrente."

Segundo o STJ, a partir da vigência da Lei 11.051/04, que acrescentou o parágrafo 4º ao artigo 40 da Lei 6.830/80, viabilizou-se a decretação de ofício da prescrição intercorrente por iniciativa judicial, condicionada, porém, à prévia oitiva da parte exequente para, querendo, arguir quaisquer causas suspensivas ou interruptivas do prazo prescricional. Por ser norma de natureza processual, sua aplicação é admitida aos processos em curso.

Utilizando-se da Lei dos Recursos Repetitivos, o STJ vai sedimentando sua jurisprudência e redefinindo os rumos dos processos de execução fiscal e criando condições para encurtar o prazo de tramitação dos mesmos que, segundo a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, tem a média de 12 anos para conclusão. Essa morosidade tende a diminuir com a aplicação da tese dos Recursos Repetitivos, sobre os temas já pacificados naquela Corte.

Os contribuintes precisam corrigir a rota dos feitos fiscais em curso, seja no Judiciário federal ou no estadual, mesmo se estiverem em andamento nas instâncias superiores, utilizando de seus direitos para interromper o curso das execuções fiscais ou quebrar a continuidade de quitação das parcelas mensais contidas nos planos de refinanciamento em curso, visando expurgar os valores prescritos.

Dada as alterações na legislação processual e as recentes mudanças no posicionamento do STJ, manifestada na atual jurisprudência, os operadores do Direito e gestores tributários devem estar atentos, examinando cada caso com a acuidade necessária, quando estiverem verificando a ocorrência da prescrição tributária.

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