Execuções caducas

Mutirão contra cobranças prescritas limparia Justiça

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21 de julho de 2009, 6h42

Foi noticiado que o Conselho Nacional de Justiça, em parceria com a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional e os Tribunais Regionais Federais, elaboram estudo para identificar processos de execução fiscal que poderiam ser extintos, porque já estão prescritos ou remidos (perdoados).

A medida faz parte da meta 2 do planejamento estratégico do CNJ para reduzir o volume processual na área de execução fiscal. As estratégias de redução da carga processual foram discutidas pelo secretário-geral do CNJ, Rubens Curado, o procurador-geral da Fazenda Nacional, Luis Inácio Lucena Adams, representantes dos TRF’s e procuradores da Advocacia-Geral da União.

Ressalte-se que não se trata somente da existência de processos de execução fiscal com débitos prescritos ou remidos. Nas cobranças das contribuições previdenciárias há também os caducados pela Súmula Vinculante 8 do STF, que julgou que “são inconstitucionais os parágrafo único do artigo 5º do Decreto-lei 1.569/77 e os artigos 45 e 46 da Lei 8.212/91, que tratam de prescrição e decadência de crédito tributário”.

O excesso de processos de execução fiscal, no âmbito federal, é um dos entraves ao bom andamento dos feitos, principalmente nas varas especializadas da Justiça Federal, chegando a mais de 30 mil processos em algumas varas.

Pela estimativa da PGFN um processo de execução fiscal demora, em média, 12 anos para a consecução de seu objetivo. Nesse lapso temporal têm ocorrido alterações na legislação e mudança na jurisprudência, principalmente no STJ, que deram novo entendimento a prescrição, de modo diferente de quando os feitos fiscais mais antigos foram distribuídos.

Veja-se algumas dessas alterações:

1) Suspensão de 180 dias após a inscrição na dívida ativa

A controvérsia entre a prática da PGFN e a posição do STJ sobre a contagem desse prazo deixou de existir, pois a Corte Superior tem mantido a supremacia do Código Tributário Nacional sobre a Lei de Execuções Fiscais, que prevê hipótese de suspensão da prescrição por 180 dias no momento em que inscrito o crédito em dívida ativa (1). Enquanto a Fazenda Pública sempre utilizou os 180 dias de suspensão do prazo prescricional para iniciar a contagem da prescrição, o Judiciário diz que esse prazo não existe, pois não consta do CTN.

A PGFN expediu Ato Declaratório 12 (2) desistindo de discutir a suspensão in comento. E acrescentou: “Outrossim, não se deverá propor execução fiscal de débitos tributários prescritos mediante a desconsideração do prazo de suspensão previsto no artigo 2º, parágrafo 3º da Lei 6.830/1980”.

E as execuções fiscais em andamento? Por isso, os feitos executórios carecem ser examinados a luz dessa nova posição do órgão citado e da jurisprudência dominante no STJ. Muitos casos de prescrição, por certo, serão encontrados.

2) Início da prescrição

No Direito Tributário, a prescrição ocorre em cinco anos. O seu marco inicial é a data de constituição definitiva do crédito tributário, com a notificação regular do lançamento.

É certo que, se houver recurso administrativo por parte do devedor, o prazo não começa a correr até a notificação da decisão definitiva. Está aí o dies a quo para iniciar a contagem da prescrição. O ofício enviado pelo fisco comunicando a decisão definitiva — normalmente vem com Documento de Arrecadação de Receitas Federais (DARF) de cobrança em anexo —, e dando prazo de 30 dias para pagamento, sob pena de inscrição em dívida ativa. Aí começa a contagem. Não basta iniciar a contagem pela data da inscrição na dívida ativa, que consta no Processo de Execução Fiscal (Certidão de Dívida Ativa).

É preciso questionar o devedor se houve impugnação e, em caso positivo, encontrar a notificação da decisão definitiva da mesma.


No caso de Declaração de Débitos e Créditos Tributários Federais (DCTF) entregue, com tributo e/ou contribuição não recolhido, a entrega da Declaração já é o lançamento, iniciando-se de pronto a contagem do prazo prescricional. É a posição firmada pelo STJ (3):

1. Prevalece nesta Corte entendimento no sentido de que, em se tratando de tributo sujeito ao lançamento por homologação, se o contribuinte declara o débito e não efetua o pagamento no vencimento, constitui-se a partir daí o crédito tributário, começando a correr o prazo qüinqüenal de prescrição. Precedentes.

Igual entendimento já foi manifestado pelo Judiciário para as Guias de Recolhimento do FGTS e Informações à Previdência Social (GFIP).

Consequentemente, muitos processos executivos em andamento podem, sim, conter vícios nas Certidões de Dívida Ativa que os embasaram, principalmente a prescrição.

3) Interrupção da prescrição

Uma das condições para que a prescrição seja interrompida é o despacho do juiz que ordenou a citação — para as execuções iniciadas depois da entrada em vigor da Lei Complementar 118/05; para as anteriores, somente a citação do devedor.

Importante essa alteração que, para fins de prescrição, cria a figura da execução fiscal velha — antes da LC 118/05 — e a nova. Na velha, a antiga prática de se “esconder” do oficial de Justiça favorecia o executado. Tal prática é reprovável e, para fins de prescrição, acabou, com o novo ordenamento. E o STJ decidiu que o novo texto vale apenas para as execuções fiscais distribuídas após 9 de junho de 2005 (4). Sempre que se deparar com execuções fiscais antigas — distribuídas antes de 9 de junho de 2005 —, é possível encontrar ocorrência de prescrição.

4) Prescrição intercorrente

A prescrição intercorrente somente é verificada na hipótese de restar paralisado o feito, por mais de cinco anos, em decorrência da inércia do exequente — a Fazenda pública — em proceder às medidas necessárias à obtenção de êxito no processo executivo.

O tema já foi objeto de Súmula do colendo Superior Tribunal de Justiça, de número 314, que encerrou a discussão ao afirmar que:

Em execução fiscal, não localizados bens penhoráveis, suspende-se o processo por um ano, findo o qual inicia-se o prazo da prescrição qüinqüenal intercorrente.

Aliás, a expectativa inicial era que ocorreria um “boom” de arquivamentos de feitos, logicamente após os exames, as análises, as constatações da ocorrência das inércias de cada caso por mais de cinco anos e as decisões judiciais findando os processos, fazendo com que as prateleiras dos fóruns esvaziassem, tornando o Judiciário desafogado das ações que não teriam condições de prosseguir, aproveitando a prerrogativa da decretação de ofício da prescrição intercorrente, inserido no mundo jurídico após a vigência da então nova lei.

Os tribunais logo assimilaram o neófito dispositivo, como vemos na ementa colecionada (5):

I – Com a entrada em vigor da Lei n° 11.051/2004, que acrescentou o § 4° ao art. 40 da Lei n° 6.830/80, viabilizada está à possibilidade da decretação de ofício da prescrição intercorrente por iniciativa judicial.

II. Entretanto, nem mesmo a falta de intimação pessoal da exeqüente da decisão que determinou o arquivamento dos autos é motivo para modificar aquele entendimento, pois, arquivado provisoriamente o feito por mais de 15 (quinze) anos, sem o menor indício da localização de bens penhoráveis do devedor, e limitando-se a exeqüente em justificar suas razões em meras questões processuais, não demonstra, com fatos concretos, a viabilidade dessa execução.

III – É certo que não houve intimação da decisão de arquivamento, mas não menos certo é que, ad aventum, poderia e deveria ter apresentado, com as razões recursais, fatos concretos que pudessem levar o magistrado a quo e este Tribunal a afastar a prescrição ora questionada com regular processamento do feito. Se assim não fez, com certeza não os tem e não os apresentará em primeiro grau de jurisdição. Portanto, devolver os autos para o cumprimento dessa formalidade processual implica apenas em retardar e onerar a prestação jurisdicional.


IV. A prescrição qüinqüenal restou caracterizada, pois, discutindo-se créditos de 1983 e 1985, distribuída à ação em 11/10/1988, arquivada provisoriamente em 10/04/1991, foi desarquivada em 04/10/2006, com vista para a Fazenda Nacional nem 05/10/2006 (art. 25 da Lei nº. 6.830/80) e sentenciada em 09/05/2007.

V – Apelação não provida.

Em decorrência da atualização tanto na legislação como na jurisprudência, muitos executivos fiscais estão com seus valores prescritos, caducados ou remidos. É salutar a posição tomada pelo CNJ visando sanear o estoque de processos em andamento, principalmente pelos “gargalos” que vêm ocorrendo nos Tribunais Regionais Federais.

Promover um mutirão no Judiciário, em todos os seus níveis, para que se eliminem processos alcançados pela prescrição, pela prescrição intercorrente, pela remissão da Lei 11.941/09, além dos caducados pela Súmula Vinculante 8 do STF, uma vez que podem ser reconhecidas de ofício em todos os tipos de execução, tanto as federais, estaduais ou municipais, inclusive as de autarquias.

Somente com o esvaziamento das “prateleiras” dos fóruns é que se tornarão mais ágeis as execuções fiscais. Como consequência, os eficientes e zelosos funcionários do Judiciário, assim como os juízes certamente, com menos processos em tramitação, terão condições de movimentarem e despacharem os feitos remanescentes num menor lapso de tempo, obtendo a celeridade processual — tão almejada pela sociedade —, que mudará o conceito, de lentidão, para prontidão do Judiciário.

NOTAS:

(1) Art. 2º, § 3º, da Lei 6.830/1980 (LEF).

(2) AD 12 – Nas ações ou incidentes judiciais que visem ao reconhecimento de que a norma contida no artigo 2º, parágrafo 3º da Lei 6.830/80, segundo a qual a inscrição em dívida ativa suspende a prescrição por 180 dias ou até a distribuição da execução fiscal, se anterior àquele prazo, aplica-se tão-somente às dívidas de natureza não-tributária, porque a prescrição das dívidas tributárias regula-se por lei complementar, no caso o artigo 174 do CTN. Outrossim, não se deverá propor execução fiscal de débitos tributários prescritos mediante a desconsideração do prazo de suspensão previsto no artigo 2º, parágrafo 3º da Lei 6.830/80.

(3) AgRg no REsp 1005012 / SC.

(4) AgRg no Ag 907938 / SP

“4. Nesse sentido, tem-se que a alteração consubstanciada pela Lei Complementar 118, de 9 de fevereiro de 2005, ao art. 174 do CTN, para atribuir ao despacho do juiz que ordenar a citação o efeito interruptivo da prescrição, deveria ser aplicada imediatamente aos processos em curso, razão pela qual a data da propositura da ação poderá ser-lhe anterior. Entretanto, deve-se ressaltar que, nessas hipóteses, a data do despacho que ordenar a citação deve ser posterior à lei em questão, sob pena de retroação.”

(5) AC 2007.01.00.052722-6/MT; APELAÇÃO CIVEL, TRF-1ª Região.

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