Importada do exterior

AGU defende constitucionalidade da patente pipeline

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20 de julho de 2009, 12h00

Nas últimas semanas, o Supremo Tribunal Federal tem recebido inúmeros pedidos de entidades que querem atuar como amicus curiae na ação que questiona a constitucionalidade do sistema pipeline de patente. O sistema, previsto na Lei 9.279/96 (Lei de Propriedade Intelectual), permitiu que patentes já obtidas em outros países pudessem ser revalidadas no Brasil. A Advocacia-Geral da União se manifestou, em parecer, a favor da constitucionalidade dos artigos 230 e 231 da lei. A relatora da ADI é a ministra Cármen Lúcia.

A Procuradoria-Geral da República, com base em representação da Federação Nacional dos Farmacêuticos (Fenafar) e da Rede Brasileira pela Integração dos Povos (Rebrip), propôs Ação Direta de Inconstitucionalidade, com pedido de liminar, sustentando que o sistema pipeline tornou patenteável o que já estava em domínio público. “Uma vez disponibilizado o conhecimento por meio da disponibilização do invento ou da publicação do depósito dos pedidos de patentes no exterior, não pode o Poder Legislativo brasileiro autorizar a concessão de patente nacional cujo efeito seria retirar dos brasileiros conhecimento já existente no domínio público, restringindo o livre acesso ao bem já disponível e violando os preceitos constitucionais”, alega a PGR.

Para defender a lei, a AGU citou o professor Gomes Canotilho. “Não se mostra possível fazer referência a domínio público no que tange a direito que nunca pôde ser exercido. Isso porque, antes do advento da Lei 9.279/96, não se admitia a proteção patentária das substâncias, matérias ou produtos objeto do sistema pipeline”, diz o parecer da AGU.

A Advocacia-Geral sustenta que o sistema pipeline leva em conta a concessão da patente no exterior. “Em que pese o fato de o exame substantivo das patentes pipeline não ser feitos nos exatos termos da legislação pátria, percebe-se, no caso em tela, que houve a observância de um devido processo legal no país em que foi feito o primeiro depósito.” Para a AGU, a patente pipeline foi uma medida transitório adequada, “pois procurou minimizar os danos presentes de uma violação inconstitucional dos direitos de propriedade intelectual dos inventores de substâncias, matérias ou produtos, cuja proteção patentária fora deferida no passado”.

Saúde e patente
Na representação que fundamenta a ADI da PGR, a Fenafar e a Rebrip afirmam que o sistema pipeline impede que a sociedade brasileira tenha acesso a remédios com custo menor. “Dentre os 17 medicamentos antiretrovirais fornecidos gratuitamente pelo Programa Nacional de DST/Aids do Ministério da Saúde, oito não são protegidos por patentes e por isso são produzidos por laboratórios públicos e nacionais privados. Os demais são patenteados ou sujeitos à proteção patentária e, por isso, são importados de empresas farmacêuticas transnacionais”, dizem. Alguns desses remédios, segundo as entidades, foram protegidos por meio do sistema pipeline.

Para as entidades, o custo dessa proteção é alto demais. “Tais medicamentos não mais puderam ser produzidos pelos laboratórios nacionais, que até então vinham contribuindo sobremaneira para política de acesso universal ao oferecer produtos a preços mais baixos do que aqueles oferecidos pelas empresas multinacionais.”

Ao pedir a inconstitucionalidade da ADI, a PGR argumenta que o sistema viola acordos internacionais sobre propriedade intelectual assinados pelo Brasil. “O pipeline contraria os dispositivos previstos pelo Acordo Trips da OMC, contraria a Convenção da União de Paris (CPU) e o Tratado de Cooperação em Matéria de Patentes (PCT)”, completa a Fenafar.

A federação reclama que a concessão de patentes sob o sistema pipeline dispensa requisitos tradicionais de patenteabilidade como novidade, atividade inventiva e aplicação industrial. “Houve um tratamento desigual entre depósitos feitos por nacionais e depósitos feitos por estrangeiros, violando o princípio constitucional da isonomia”, escreveu. 

Efeitos da decisão
O especialista Eduardo Câmara, sócio do escritório Dannemann Siemsen, entende ser constitucional a patente pipeline. Para ele, há três possíveis decisões do Supremo. Um é considerar o sistema constitucional. Caso os ministros entendam pela inconstitucionalidade da patente pipeline, pode ser que todas as patentes concedidas por esse sistema sejam anuladas ou que a decisão valha apenas para os pedidos que ainda estão analisados.

Pelo sistema pipeline, os interessados em revalidar patente obtida no exterior no Brasil tinham um ano após a publicação da lei para depositar o pedido no país. De acordo com o especialista, o prazo para a validade da patente é o remanescente da proteção concedida no exterior limitado a 20 anos do depósito ocorrido no Brasil.

Em parecer, a AGU se manifestou sobre os efeitos de uma eventual decisão que entenda ser inconstitucional a patente pipeline. “Mais de mil pedidos de patente foram depositados no Brasil com base no mencionado artigo 230, sendo que alguns deles poderiam se enquadrar no caso do artigo 70.8 do Acordo Trips, atendendo possivelmente o requisito da novidade”, disse. Para a AGU, caso os efeitos de uma decisão pela inconstitucionalidade atinjam patentes já concedidas, pode acarretar um “inadimplemento do Brasil no plano internacional”.

Clique aqui para ler parecer da AGU.

ADI 4.234

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