Laços de família

Transbrasil pede destituição de síndico no STF

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11 de julho de 2009, 7h03

Agente privado em função pública está sujeito às regras que vedam o nepotismo na administração pública? A resposta a esta questão poderá ser dada no julgamento de Reclamação apresentada pela Transbrasil no Supremo Tribunal Federal. A ação contesta decisão do juiz Clóvis Ricardo de Toledo Júnior, da 19ª Vara Cível de São Paulo, que nomeou e manteve nos cargos de administradores da massa falida da empresa os advogados Alfredo Luiz Kugelmas e seu genro Gustavo Henrique Sauer de Arruda Pinto. Além dos dois, Alexandra Kugelmas de Arruda Pinto, filha de Alfredo e mulher de Gustavo, foi nomeada advogada da massa falida.

As alegações da Transbrasil são de descumprimento da Súmula Vinculante 13 do STF, que proíbe nepotismo em funções públicas, e de que a nova Lei de Falências (Lei 11.101/05) não prevê a nomeação de mais de um administrador para os bens das falidas. Kugelmas, administrador de cinco em cada dez processos de recuperação em São Paulo, é sogro de Gustavo Pinto. Os advogados da Transbrasil pedem o afastamento de ambos do caso ou, como alternativa, a nomeação de um terceiro síndico que os fiscalize.

A empresa já havia tentado destituir os advogados do comando dos negócios da companhia no ano passado. O pedido foi ajuizado em dezembro e motivou o juiz da 19ª Vara a pedir a manifestação das partes contrárias em fevereiro. Somente no fim de março, os advogados contra-argumentaram, “o que bem demonstra a desídia dos síndicos no cumprimento dos prazos processuais e o prejuízo ao bom andamento do processo falimentar e seus incidentes”, dizem os advogados Roberto Teixeira e Cristiano Zanin Martins, autores da Reclamação. 

O pedido feito em 2008 teve o aval do Ministério Público, que também requereu a destituição de Kugelmas e Gustavo Pinto pelos mesmos motivos e por permitir “a dilapidação do patrimônio da falida em inúmeras ações trabalhistas, observando, ao final, que um deles já foi apenado pela prática de atos desidiosos praticados na qualidade de administrador”. Em sua defesa, o advogado Gustavo Pinto argumentou que, entre dezembro de 2004 e fevereiro de 2007, a quebra da empresa esteve suspensa e, por isso, a perda de patrimônio nesse período foi de responsabilidade da própria companhia aérea.

Porém, segundo a Promotoria de Falências da Capital de São Paulo, a omissão dos administradores continuou depois desse período. Prazos judiciais foram perdidos e bens foram vendidos a preços irrisórios sem que houvesse qualquer manifestação dos advogados, segundo o MP. Gustavo Pinto e Kugelmas, segundo apontou o Ministério Público estadual, sequer se dispuseram a pedir a execução de uma sentença favorável à Transbrasil, que quitaria todas as dívidas da empresa para com os credores. Em 2007, uma ação de reparação devido a cobranças de títulos já pagos contra a General Eletric Capital Corporation terminou com sentença condenatória à GE. “A indenização daí advinda certamente será suficiente para a quitação de todo o passivo da massa, pois, condenada foi GE ao pagamento de todos os prejuízos causados à falida, em razão do protesto de títulos já pagos”, relata o parecer do MP. O caso já motivou um pedido de inquérito judicial da promotoria por crime falimentar.

O protesto indevido de títulos pela GE foi, inclusive, o motivo que levou à declaração da falência da Transbrasil em 2000. A falência foi decretada pelo Tribunal de Justiça paulista ao julgar a Apelação Cível 232.140-4/0-00. O Judiciário chegou a reconhecer que os títulos já estavam pagos na Ação de Rito Ordinário 2001.015569-7, julgada procedente pela 22ª Vara Cível da capital, mas os desembargadores mantiveram a quebra. No último levantamento sobre a situação financeira da companhia, há seis anos, a empresa devia ao todo cerca de R$ 1,5 bilhão.

Só para se ter uma ideia, além da Transbrasil, Kugelmas também foi nomeado síndico das massas falidas das companhias aéreas VarigLog, BRA e Vasp, além da Parmalat e da Bombril. Ele é administrador em 50% das recuperações judiciais abertas em São Paulo, como lembram os advogados da Transbrasil ao citar a notícia “O advogado Alfredo Kugelmas é o rei do mercado de falências em São Paulo”, publicada pela ConJur em 1º de fevereiro. Já Gustavo Pinto foi o administrador dos bens da falida Fazendas Reunidas Boi Gordo, conforme processo 583.00.2002.171131-3.

“Não é a condição de genro do doutor Alfredo Luiz Kugelmas que justificou a nomeação de dois síndicos, mas a competência de ambos os experts”, disse o juiz Clóvis Ricardo de Toledo Júnior ao indeferir o pedido de destituição dos síndicos feito pela Transbrasil. “Cristiano Zanin Martins, subscritor de todas as petições de interesse da falida, é genro do doutor Roberto Teixeira e não há e não pode haver qualquer prática de nepotismo nisso, já que o doutor Cristiano possui competência suficiente para justificar o seu trabalho”, disse o juiz, citando os dois advogados da empresa.

Além do parentesco entre os dois síndicos, a Transbrasil protesta ainda contra a nomeação da mulher de Gustavo Pinto e filha de Alfredo Kugelmas, Alexandra Kugelmas de Arruda Pinto, como advogada da massa falida. “Alfredo Luiz Kugelmas e seus familiares estão monopolizando a função pública de síndico/administrador judicial na Comarca da Capital e também na Grande São Paulo — ao menos nos casos mais atrativos”, acusam os representantes da Transbrasil.

Os advogados listam 13 recuperações em que Kugelmas aparece como administrador, comissário ou síndico na Justiça paulista. Entre elas está o Grupo Tecnossistemi/Eudósia, formado por subsidiárias da Telecom Itália abertas no Brasil para a instalação de redes GSM. O grupo responde por fraude a credores. A lista inclui Bombril, Grupo Garavelo, Comercial Importadora Benjamin, Gallus Agropecuária, Glasslite S/A Indústria de Plásticos, Hexabanco, Enco Zolcksak Equipamentos Industriais, Baralt Veículos, Eldorado Indústrias Plásticas, Picolli Indústria e Comércio, Antonini S/A Indústria de Equipamentos Rodoviários e Iderol S/A Equipamentos Rodoviários.

Segundo reportagem publicada pela ConJur em fevereiro, o advogado e economista Alfredo Luiz Kugelmas chega a ganhar, em média, R$ 50 mil mensais por processo. Para cuidar da administração da Bombril, ele recebe cerca de R$ 25 mil por mês. Para cuidar da recuperação judicial da Parmalat, que tramita na 1ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais de São Paulo, ele recebe R$ 50 mil mensais. Recentemente, Kugelmas foi nomeado administrador judicial da Variglog pelo juiz José Paulo Camargo Magano por um salário mensal de R$ 75 mil, quantia que deveria servir para remunerar também outros três profissionais nomeados na mesma ocasião, mas Magano foi afastado do caso pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, por meio de uma exceção de suspeição, e o juiz que o substituiu resolveu encerrar o processo e, consequentemente, a participação de Kugelmas. O advogado também já foi condenado pela Comissão de Valores Mobiliários em 2006 por ter omitido informações a respeito da empresa Ideral.

Clique aqui para ler a Reclamação.

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