Risco da atividade

TJ-MG suspende cobrança de hospital particular

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21 de janeiro de 2009, 13h42

Por causa da inércia do SUS (Sistema Único de Saúde), um enfermeiro da cidade de Uberlândia, Triângulo Mineiro, teve de recorrer à Justiça para se livrar de uma dívida de R$ 46 mil. Isso porque seu pai teve de ser internado num hospital particular por falha nos equipamento de cateterismo da rede pública. O pagamento foi suspenso pela 15ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Ainda cabe recurso da decisão.

De acordo com a Defensoria Pública do estado, no dia 17 de dezembro de 2005, o motorista sofreu um infarto do miocárdio. Ele foi conduzido para um posto de saúde, local em que seu filho é enfermeiro. Foi constatado que seria necessário fazer um cateterismo de urgência, mas soube-se que o aparelho do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Uberlândia, onde o procedimento poderia ser feito pelo SUS, estava quebrado. Houve ainda tentativa de fazer o cateterismo no Hospital Santa Catarina, outra instituição que atendia pelo SUS, mas ali o aparelho também estava com defeito.

A única providência tomada no posto de saúde foi a de inserir o nome do paciente na lista de espera do Hospital das Clínicas para uma vaga de internação, permanecendo o filho à espera de uma ligação para informação sobre a vaga. A ligação, no entanto, não ocorreu e o enfermeiro, diante da urgência do cateterismo em seu pai, encaminhou-o urgentemente ao Hospital Santa Genoveva.

Ao dar entrada no hospital privado, contudo, o paciente sofreu novo infarto. Ele foi entubado e conduzido à UTI. Como não seria mais possível fazer o cateterismo, diante do quadro agravado, o filho do paciente solicitou ao médico que o transferisse para o Hospital das Clínicas, onde seu nome já se encontrava na lista de espera. Motivo: não tinha condição financeira de fazer o pagamento das despesas do hospital privado.

Apesar desse apelo, o paciente permaneceu na UTI do Hospital Santa Genoveva por 11 dias, aguardando vaga na rede do SUS. Quando surgiu essa vaga, a transferência foi feita para o Hospital das Clínicas, onde o paciente permaneceu até o dia 4 de janeiro de 2006. Ele não resistiu e morreu.

As despesas com o tratamento no Hospital Santa Genoveva somaram R$ 46 mil. Após a morte do pai, o enfermeiro procurou a Secretaria de Saúde do município de Uberlândia, à qual entregou cópias dos documentos de internação no hospital privado, para averiguar a possibilidade de transferência do pagamento para o SUS.

Em julho de 2006, o Hospital Santa Genoveva ajuizou ação de cobrança contra o enfermeiro para que fosse condenado ao pagamento do valor atualizado de R$ 54, 3 mil. Alegou que "todos os meios para composição amigável foram tentados sem sucesso".

Contudo, a juíza Marli Rodrigues da Silva, da 10ª Vara Cível de Uberlândia, julgou improcedente o pedido do hospital. No recurso ao Tribunal de Justiça mineiro, a sentença foi mantida.

Segundo o desembargador Tibúrcio Marques, relator do recurso, "pela dinâmica dos fatos, pode ser verificado que o pai do enfermeiro iria apenas realizar um cateterismo". "Todavia diante da parada respiratória, o paciente recebeu os primeiros socorros e permaneceu internado devido à falta de vagas na rede pública".

O relator ressaltou que o próprio Hospital Santa Genoveva afirmou que não havia vagas nos hospitais públicos e que a família afirmou que não tinha dinheiro para pagar. "Tal alegação demonstra que o contrato foi celebrado com vício de vontade, já que o próprio hospital tinha ciência de que o apelado não queria e nem podia contratar, mas mesmo assim assinou os documentos para salvar a vida de um ente da família", destacou.

O desembargador acrescentou que o hospital, ao prestar serviços médicos, tem o dever de salvar vidas. "É inerente ao risco de sua atividade", concluiu, "que preste serviços a pessoas que não têm condições financeiras e que necessitem de tratamento de urgência". O voto do relator foi acompanhado pelos desembargadores Tiago Pinto e Maurílio Gabriel.

Processo: 1.0702.06.304306-2/001

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