Direito verdadeiro

Direito é mais prudente do que Ciência

Autor

19 de janeiro de 2009, 8h10

“Jesus mesmo reconheceu a necessidade da legislação e do Estado… Tudo se pede e tudo se espera do Estado; ou seja, do direito, mas não porque o Estado e direito sejam a mesma coisa, senão porque o direito é o único instrumento do qual, em última análise, o Estado pode servir-se” [i].

Não se negue que Adolfo Hitler fez o que fez dentro de um cenário jurídico que ideologicamente lhe amparou e que, como efeito disto, o fenômeno denominado de pós-positivismo que adveio da segunda guerra mundial não foi capaz de evitar novos episódios de genocídio igualmente legitimados pelo direito das gentes que legitima a luta contra o terrorismo legitimando o terror e que, ainda hoje, queda impassível diante do sacrifício fatal de tantas pessoas inocentes na terra Santa onde Cristo pregou o amor e a compaixão tendo sido ele, o próprio Cristo, ali condenado e crucificado — conforme o direito da época — em julgamento que lhe fez a maior vítima da injustiça humana.

Eis o teatro da eterna contradição da criatura humana.

O sistema jurídico que flagra e encarcera o delinqüente de menor vulto – recebendo propina, por exemplo – não é capaz de flagrar e encarcerar o delinqüente de maior vulto que vence socialmente por efeitos do desvio de recursos do povo, que manipula, e da máquina pública, que controla.

A dimensão do homem encarcerado em condições indignas é tão complexa que anuvia o juízo como prelúdio da boa-fé e da paz social, a ponto de nos tornar indignados – todos nos – como encarcerados dentro de nossa própria estupidez e insegurança.

É que nos sentimos protegidos e paradoxalmente livres quando dentro de cercas elétricas, ou seja, dentro de nossa própria segregação de consciência.

Pior. Não somos capazes de acreditar na re-socialização dos condenados. Para nós eles nunca serão generosos nem devotos como nós pensamos que o somos… Eles, os condenados, são eternos canalhas, nós sempre honestos.

Ainda pior. Não nos apercebemos de que nossa arrogância é uma ilusão de poder. Pois, assim como é possível o canalha encarcerado se envergonhar dessa condição, de igual modo, com a mesma intensidade, é também possível que o homem que se considera honesto e que se deixa exageradamente envaidecer pela prepotência perca, sem que disso nunca se aperceba, tal condição de honesto.

Daí porque a inolvidável lição de Cristo quando foi capaz de perdoar um ladrão que lhe clamou misericórdia.

Neste sentido, o crucifixo que se vê em posição de destaque nos Tribunais tem o significado de dizer que não se pode julgar quando se pratica os atos do condenado. Atire a primeira pedra, esta foi a expressão emblemática de Jesus.

É por isto que, por exemplo, o Tribunal quando corta na carne seu próprio nepotismo está querendo dizer, com essa digna atitude, que tem idoneidade moral para julgar outros gestores públicos que adotam tal prática.

A questão, ademais, atual do nosso sistema prisional é tão grave – insisto nesse ponto – que a saída de um delinqüente da prisão pode significar, e significa, na imensa maioria dos casos, o início de outra modalidade de prisão, que é a prisão social do preconceito.

Isto é tão forte que a mente do delinqüente liberto já não distingue mais a prisão física de uma cela da prisão social decorrente do abismo de oportunidades para se regenerar.

E o resultado como todos constatamos é que o delinqüente volta inexoravelmente a delinqüir tal sua condição praticamente igual à de um doente mental, como se fundamentaria na teoria de Cesare Lombroso.

O que fazer, então? Mantê-lo encarcerado perpetuamente? Não, ninguém em sã consciência concorda com isto. Eis o dilema…

Eis, destarte, o que a longa experiência de Evandro Lins e Silva nos legou: jamais se viu alguém sair de um cárcere melhor do que quando entrou, provando que o encarceramento do homem não o melhora, nem o aperfeiçoa, nem corrige a falha cometida, nem o limpa de sua culpa para um retorno à vida da sociedade que ele perturbou com sua conduta delituosa.


Afigura-se por demais importante, nesta senda, a postura do advogado que exerce constitucionalmente função essencial à Justiça. Vide art. 133, da CF.

Tal função é por vezes inglória e incompreendida por vários segmentos da Sociedade. O médico socorre seu paciente e cuida de seu corpo. O advogado socorre seu cliente e cuida de seu espírito.

A grandiosidade do advogado consiste em estar sempre ao lado do seu cliente independentemente das mais intensas adversidades.

Sua honestidade se revela quando ele faz a interpretação da lei e do direito (este é diferente daquela) por um juízo de otimização e não por um juízo de oportunidades para proteger interesses escusos.

Como defensor do réu, tem o advogado igual prerrogativa de paridade de armas do Ministério Público. Ambos interpretam e aplicam o direito que tem o juiz como seu intérprete autêntico (Kelsen) porque decide o processo, ou seja, produz norma jurídica individual ou processual.

O advogado, portanto, do mesmo modo como o juiz, não busca necessariamente a verdade, mas a idéia que ele tem dessa verdade. Neste sentido, sua defesa tem um caráter que também é político, ou seja, por ele – o direito postulado – o advogado procura convencer o juiz de ser, este direito, o mais correto.

É por isto que há, no processo, uma verdade formal que é processual e uma verdade material que é fática. Foi por isto que o saudoso Evandro Lins pontuou que o juiz, quando julga, assim o faz muito mais diante dos fatos como lhe chegaram às mãos e diante do que efetivamente resultou comprovado do que propriamente diante do que sua consciência determinaria em sentido adverso.

O Supremo Tribunal Federal, de igual modo, ao interpretar e aplicar o direito assim o faz ciente de que não existe o direito verdadeiro. Pois é inútil buscar-se a verdade dos fatos. O que se busca é a verdade que se imagina ser a mais correta. Sua interpretação do direito nem sempre é a melhor tecnicamente, mas é a última, ou seja, é a última palavra. Não se busca, ali, o direito na rua, mas, sim, o direito na lei. A primazia do que ali se julga não condiz com a atuação de legislador positivo. Condiz, sim, quando muito, com a postura de legislar negativamente, ou seja, no caso de julgar a inconstitucionalidade de lei ou de ato normativo federal ou estadual.

Portanto, o direito está positivado num texto que condensa um enunciado legal. Quando o juiz o interpreta, vê, nele – o texto – os elementos do dever ser, ou seja, do seu mundo de valores morais, e os associa a outros elementos do ser, isto é, do seu mundo dos fatos reais, e assim, ao final, produz uma solução jurídica que, a rigor, nada mais é senão a produção da norma jurídica para o caso concreto interpretado.

Interpretar o direito é, portanto, compreender o significado da norma jurídica. Eros Grau, assim, ensina: “O interprete desvencilha a norma de seu invólucro (o texto); neste sentido, ele produz a norma”.

Como se vê, o interprete não descreve a realidade, mas descreve seu modo de ver a realidade. Foi certamente por isto que o poeta Fernando Pessoa, com singular sabedoria, descortinou que a idéia do mundo não é minha, o que é minha é a idéia que eu tenho do mundo.

Digo isto para dizer, enfim, que assim como não há uma reprodução de Nossa Senhora de Fátima unicamente correta, pois todas podem o ser, não há, de igual modo, uma só interpretação do direito como unicamente perfeita.

Repito, portanto. Os ministros do Supremo Tribunal Federal não são necessariamente os que melhor interpretam o direito, mas são, efetivamente, os que interpretam por último. Ou seja, são eles que dizem, no mundo do ser, como o direito deve ser.

Neste sentido, todos somos operadores do direito, todos o interpretamos. Quem interpreta o direito não produz a verdade em si, mas, reproduz a imagem do que imagina ser a verdade.

A imagem artística de Nossa Senhora de Fátima, por exemplo, é a interpretação daquilo que o artista, que a reproduziu, imagina como ela deve ser. Cada artista tem sua peculiar interpretação daquilo que produz. E nós, assim, acreditamos que Nossa Senhora de Fátima deva ser sempre daquele jeito que nos acostumamos a vê-la, ou seja, do modo como interpretada pelos artistas.


O povo é o construtor da lei – é o que nos ensina Rosemiro Leal.[ii] Ninguém será obrigado a fazer ou a deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei – é o princípio da legalidade inserto no inciso II, art. 5o, da CF.

Note-se que a CF disse “em virtude de lei” e não em virtude de decisão judicial. É que esta tem eficácia, em regra, no caso concreto, entre partes, e aquela tem eficácia genérica e abstrata.

Note-se, ainda, que o juiz quando interpreta e aplica o texto de lei cria, enfim, a norma jurídica para o caso que solucionou. É evidente que o juiz não pode julgar como escravo absoluto da lei, ou seja, como, por exemplo, “boca da lei” (Kelsen). Ele pode, sim, ampliar sua interpretação, mas sempre conforme a lei. Nunca contra esta nem fora de seus comandos vinculativos, sob pena de agredir o devido processo legal (art. 5o, LIV, CF – princípio da proporcionalidade), isto é, sob pena de legislar positivamente além do que a lei diz, que tem o povo como seu construtor (art. 2o, CF – princípio da Separação dos Poderes).

Toda ciência, como se vê, tem seus dogmas. O direito penal tem os seus.

Nada mais atual, portanto, a propósito, o trecho que a seguir destaco, escrito em 1764, pelo jovem Cesare Beccaria, aos vinte e seis anos de idade, no delicioso livro “Dos delitos e das penas”, na página 72:[iii]

“Um dos maiores freios dos delitos não é a crueldade das penas, mas sua infalibilidade e, como conseqüência, a vigilância dos magistrados e a severidade de um juiz inexorável que, para ser uma virtude útil, deve ser acompanhada de uma legislação branda. A certeza de um castigo, mesmo moderado, sempre causará mais intensa impressão do que o temor de outro mais severo, unido à esperança da impunidade, pois os males, mesmos os menores, quando certos, sempre surpreendem os espíritos humanos, enquanto a esperança, dom celestial que freqüentemente tudo supre em nós, afasta a idéia de males piores, principalmente quando a impunidade, outorgada muitas vezes pela avareza e pela fraqueza, fortalece-lhe a força…”.

Penso, assim, que o Poder Público no Brasil de um modo geral, diante da evidente ineficiência para conter os grandes delitos e a onda de violência caminha para infligir, notadamente à classe média, um poder de polícia assustador que, mediante pesadas multas, por exemplo, tenta coibir condutas proporcionalmente menores – do cotidiano, do dia-a-dia – como forma de subjugar a grande massa de pessoas honestas.

Refiro-me, é claro, às multas dos censores de trânsito que não disfarçam o viés de tributação ilegal transbordando para o que o povo chama “indústria das multas” que é absurdamente desproporcional, pois, duvido muito, que, depois dessa vultosa receita arbitrária, os índices de acidentes tenham diminuído, razoavelmente, como era de se esperar.

Refiro-me, ainda, ao bafômetro da chamada lei seca que é, também, absurdamente desproporcional quando flagra quem ingeriu uma cerveja e não é capaz de flagrar quem fez uso de modo contumaz de cocaína ou de maconha, por exemplo.

Há evidenciar, com efeito, não a atuação dos minimalistas que querem abolir o direito penal e não a pregação dos punitivistas que pensam a lei severa como único modo da salvação nacional, mas, sim, a defesa dos garantistas e do próprio direito penal proporcional, para os quais quem comete o crime deve passar pelo crivo da investigação, do processo, da condenação e do cumprimento da pena, tudo, sob fiel observância dos direitos fundamentais.

Eis, a propósito, a oportuna lição de Luis Carlos dos Santos Gonçalves: [iv]

“A precariedade das instalações penitenciárias brasileiras, a mantença de presos em locais inadequados e desrespeitadores da dignidade da pessoa humana, a incapacidade gerencial do Estado, o crime organizado e o cometimento de outros delitos de dentro de presídios, estes elementos formam um caldo de cultura que vê no uso das sanções penais um mal em si mesmo, desnecessário e incompatível com o Estado Democrático de Direito”.

“Se há, como política de Estado, a intenção de evitar ao máximo a adoção da pena privativa de liberdade, substituindo-a por penas de outra natureza, essa política pode ser implementada na construção dos tipos incriminadores e suas sanções. Ela só não pode se estender às hipóteses nas quais, expressamente, a Constituição dispõe de forma contrária, como faz no racismo – exigindo a pena de reclusão – ou na proteção das crianças e adolescentes contra a violência e exploração sexual, na qual exige punição severa. Além disso, tais possibilidades não podem olvidar a proteção suficiente aos bens jurídicos, cerne dos mandados de criminalização”.


Insisto. A meu ver, não há prosperar a intervenção mínima ou a intervenção máxima. Há prevalecer, sim, a idéia da proporcionalidade do Direito Penal, em si, que, neste sentido, deve se adequar não só aos mecanismos de defesa dos direitos fundamentais, mas aos mandados constitucionais de criminalização inseridos tanto na seara dos direitos fundamentais como em trechos esparsos que devem ser observados como garantia da proteção de todos indistintamente.

É claro que se a própria Sociedade faz vista grossa diante de certos tipos de delitos, estes devem ser abolidos, não só por isto, mas, sobretudo, quando desconformes com os novos ditames constitucionais, pois a Constituição não se interpreta em face de leis infraconstitucionais, estas, porém, é que se interpretam sob os auspícios daquela.

E não se diga, assim, que o caos do sistema penitenciário brasileiro, por exemplo, e de resto tudo o de mais patológico e paradoxal em nosso Estado Democrático de Direito decorreu da falta de leis como se estas, por mero paralogismo, tivessem o condão de sanar todas as nossas adversidades.

Os mandados constitucionais de criminalização confirmam, destarte, os fundamentos do Estado Democrático de Direito que se escuda, de sua vez, na supremacia da ordem constitucional e na separação dos poderes.

O Estado tem o monopólio da força policial que pode, até, em caráter excepcional, utilizar-se de necessária violência para contrapor injusta agressão. Permite-se, contudo, que o próprio indivíduo, como vítima ou não, prenda em flagrante seu agressor. É por isto que o indivíduo pode, por exemplo, utilizar-se de meios ou instrumentos para proteger-se. Eis, portanto, o espaço geopolítico que permite o avanço, hoje tão vertiginoso, da segurança privada, ou seja, de milícias particulares controladas, em tese, sob os olhos do Estado, em defesa dos que têm condições financeiras para usá-las a seu dispor.

Hans Kelsen leciona que Direto e Estado são palavras que se confundem. O Estado não existe sem a força cogente do Direito. Neste sentido, para Norberto Bobbio, o Direito e o Poder são suas faces de uma mesma moeda. Ou seja, quando o direito perde força fica desacreditado, quando, por outro lado, fica proeminente diz-se que resulta no despotismo.

Daí o pensamento do grande Voltaire: “o abuso que atinge a um, ameaça a todos”.

E assim, a preleção de Rudolf Von Ihering:

“Já não é simplesmente o judeu que exige sua libra de carne; encarna a própria lei de Veneza que comparece às barras do Tribunal. Se o seu direito e o de Veneza são uma e a mesma coisa; com o esbulho do primeiro, o último desmorona…”.

Insisto, também. A outorga da prisão cautelar ou processual de alguém deve ser exceção e não regra. Ela não pode ter o condão, por exemplo, de antecipar o que supostamente redundará decidido na sentença definitiva de mérito. Tanto que, como pontuou o ministro Celso de Mello, a prisão cautelar não é pena.

Nesta senda, a meu ver, a questão da liberdade provisória diz respeito unicamente à ordem processual de modo que a determinação de prisão cautelar – seja preventiva, seja temporária – em caráter sempre excepcional, impõe-se não pela gravidade do fato delituoso em si, da sua hediondez ressalvada em lei específica, ou do seu clamor social, mas, tão-só, pelos aspectos de natureza eminentemente processuais que podem valer, assim, para as mais diversas modalidades delituosas punidas, em regra, com reclusão, desde que, como preceituam os artigos 312, do CPP, e 1o, da Lei 7960/89, notadamente, diante dos requisitos de garantia da ordem pública, da conveniência da instrução criminal ou da aplicação da lei penal…

É por isto que nenhuma lei, em si, pode, isoladamente, tal como, por exemplo, a do estatuto do desarmamento (que neste ponto foi julgada inconstitucional pelo STF) e a dos crimes hediondos (que neste ponto foi revogada), proibir a concessão da liberdade provisória.

A Constituição, contudo, pode, e assim o fez, por exemplo, com relação à proibição de fiança para os crimes considerados hediondos.


E nisto não há nenhum paradoxo. Pois, cabe unicamente ao juiz, em tal hipótese, quando não pressentir os requisitos do artigo 312, do CPP, decidir pela concessão, conforme as circunstâncias, da liberdade provisória sem fiança, decidindo, assim, em perfeita harmonia com a dicção do inciso LXVI, do artigo 5o, da CF, que prevê: “ninguém será levado à prisão ou nela mantido quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança”.

Trago a lume, em mais, no que diz respeito à prisão em flagrante, a judiciosa manifestação do advogado Tales Castelo Branco: [v]

“É prisão porque restringe a liberdade humana; é penal porque foi realizada na área penal; é cautelar porque expressa uma precaução, uma cautela do Estado para evitar o perecimento de seus interesses; e é administrativa porque foi lavrada fora da esfera processual, estando, portanto, pelo menos no momento de sua realização, expressando o exercício da atividade administrativa do Estado…”.

A propósito, tem o Ministério Público função institucional de promover privativamente a ação penal. Se não o fizer no prazo legal, cabe ação penal privada subsidiária da pública. Penso que a ação penal tem ares de subjetividade, daí a opinião do delito que, em tese, é do Ministério Público.

Quanto ao inquérito policial, por outro lado, tem índole da objetividade, ou seja, não busca a verdade plena (que deve ser obtida no processo, entre partes), mas a verdade não temerária que é material e que se sustenta em dados fáticos, como, por exemplo, um indício comprovado por laudo pericial.

É por esse caráter objetivo do inquérito policial que não se observa, no seu âmbito, o contraditório, o que não significa, contudo, que não se deva observar, nele, o inquérito, o princípio da ampla defesa.

É por isto que o juiz tem, agora, a partir de tendência que se confirmou na Lei 11.690/08 – para contrariedade do Ministério Público – uma vigorosa supervisão no âmbito da investigação criminal notadamente nos casos de cautelares deferidas de modo a proteger, assim, com mais rigor, os direitos fundamentais.

Ou seja, o juiz formata sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos quando da investigação criminal, com a ressalva, assim, das provas cautelares, não repetíveis e antecipadas.

Neste sentido, o juiz pode aceitar as provas colhidas na fase policial, desde que lícitas e desde que sejam incontroversas, isto é, não tendo sido impugnadas pelas partes.

Portanto, o juiz, agora, mais do que antes, tal o vigor do novo artigo 156, do CPP, tem o poder-dever de determinar, no curso da instrução, ou antes de proferir sentença, a realização de diligência para dirimir dúvidas sobre ponto relevante, de modo que, por isto, é claro que o juiz tem a obrigação de ler e conhecer detidamente o inquérito pois este, como peça informativa, traz, em seu bojo, elementos probatórios que podem desanuviar dúvidas.

Como se vê, com o advento da Constituição de 1988, o Direito Constitucional Penal adquiriu novos horizontes para desconstituir, por exemplo, a tese de que quanto menor o numero de crimes e de penas, maior a tutela das liberdades públicas.

As sanções penais devem subsistir, sim, não propriamente como o ultimo dos recursos, mas como instrumento constitucional de proteção de bens jurídicos. Daí a proposta da tese garantista e do direito penal proporcional justo que mais se harmoniza com o Estado Democrático de Direito.

O Direito existe em função da sociedade e não esta em função daquele.

Enfim, a criatura humana, em sua mais pura essência, é libertária e capitalista.

É libertária quando não aceita pacificamente ser subjugado em sua dignidade. Isto é tão forte que, hoje, o objetivo primordial de nossa República, é preservar a dignidade da pessoa humana. O homem é livre para pensar, para se reunir, para criar… O socialismo totalitário fracassou, por exemplo, não somente porque se revelou incapaz de gerar riqueza e prosperidade, mas, principalmente, porque desrespeitou essa tão sublime condição humana de ser tratado com dignidade.


O homem é capitalista quando protege sua propriedade de modo que, agindo assim, termina protegendo legitimamente o próprio sistema de mercado, o trabalho, e a mais valia. Deste modo, como diz Carlos Alberto Sardenberg: “quanto mais capitalismo melhor, quanto mais mercado livre melhor”.

O capitalismo, como diz Ferreira Gullar[vi], não foi inventado pelo homem. Também não foi criado por Deus. Dizem que é fenômeno do Diabo. Na verdade, emergiu da natureza humana. O socialismo, de sua vez, é, sim, inventado pelos homens para corrigir o capitalismo e para nela introduzir a justiça. Isto foi uma revolução, cuja teoria não se equacionou com a pratica.

Chegou-se a dizer, no momento mais agudo da atual crise financeira mundial, que a falência do banco americano Lehman Brothers estava para o capitalismo assim como a queda do muro de Berlim esteve para o socialismo.

Não é verdade. Depois de necessários reajustes a grande economia globalizada voltará a crescer, agora, sim, com índices menos surreais.

Se o entrave político brasileiro diz respeito, como muito se diz na mídia, ao atual governo petista do aparelhamento ideológico, houve, também, o governo psdebista do fisiologismo tecnocrata. Ou não?

Portanto, se, no governo passado, não houve, em tese, os militantes do diletantismo querendo se dar bem na vida – como agora os há – houve, sim, os tecnocratas especialistas em grandes negócios com a rés pública. Ou não?

O que é melhor e o que é pior para nós pobres mortais?

Sinceramente não sei.

Sei apenas que não suportaria outra vez ver meu direito de manifestação tolhido. Sei apenas que a cidadania brasileira não suporta tantos desmandos e tanta corrupção.

Declinei, aqui, tudo isto para concluir, ao final, que o Direito é muito mais prudência do que ciência, tanto que se diz jurisprudência e não jurisciência.

Notas e referências:


[i] Carnelutti, Francesco. As misérias do processo penal. Campinas-SP: Russel Editores, 2008, Pág. 85.

[ii] Leal, Rosemiro Pereira. Relativização Inconstitucional da Coisa Julgada. Belo Horizonte: Del Rey. 2005. pag. 87 e segts.

[iii] Dos delitos e das penas. Cesare Beccaria. Tradução de J. Cretella Jr. e Agnes Cretella. 3a edição. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006.

[iv] Gonçalves, Luiz Carlos dos Santos. Mandados Expressos de Criminalização e a Proteção de Direitos Fundamentais. Belo Horizonte: Editora Fórum, 2007, pág. 107/108 e 181.

[v] Castelo Branco, Tales. Da Prisão em Flagrante. São Paulo: Saraiva, 1988, pág. 31.

[vi] Vide site: http://arquivoetc.blogspot.com/2009/01/ganncia-do-bem-ferreira-gullar.html, acessado em 13.01. 09, com a publicação do artigo “A ganância do bem”, de Ferreira Gullar.

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!