Contas de campanha

Prefeito de Cuiabá defende suas contas de campanha

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13 de janeiro de 2009, 6h20

O prefeito reeleito de Cuiabá, Wilson Santos (PSDB), entrou com recurso no Tribunal Regional Eleitoral de Mato Grosso para esclarecer os itens que resultaram na recusa da prestação de contas de sua campanha eleitoral. A desaprovação das contas, como prevê a Lei 11.300/06 não impede a posse do prefeito, por isso Santos assumiu a prefeitura no início deste mês.

Ao analisar a prestação de contas, o juiz eleitoral Luiz Carlos da Costa sustentou que o artigo 1º, parágrafo IV da Resolução 22.715 do TSE, dispõe que a arrecadação de recursos e gastos dos candidatos e comitês só podem ser feitos após a abertura de conta bancária específica para a movimentação financeira da campanha. De acordo com o juiz, Santos recebeu duas doações antes de ter a conta, “um defeito irremediável”.

O chefe da equipe jurídica da campanha, o procurador geral do município José Antônio Rosa, que voltou ao seu cargo público em 4 de dezembro, aponta que em 12 de dezembro a equipe entrou com recurso no TRE esclarecendo os motivos da desaprovação. Segundo ele, “as doações referidas são de mão-de-obra e a legislação restringe as doações financeiras”. Ele sustenta que a lei permite a captação após a homologação da candidatura. A de Santos foi feita em 5 de julho, e as doações de mão-de-obra, de duas pessoas engajadas na campanha, aconteceram em 15 de julho.

De acordo com a decisão de primeira instância, o candidato utilizou verba própria de R$ 100 mil na campanha, mas no registro de candidatura há declaração de R$ 70 mil em caixa e mil em conta corrente. Na prestação de contas, o prefeito sustenta que os R$ 30 mil vieram de um empréstimo tomado.

O juiz entendeu que a utilização desse valor demorou três meses, o que para ele “não é muito usual: emprestar para guardar, em espécie”. Rosa esclarece “não tem nada de errado em ficar com dinheiro parado. O candidato não tem que responder por isso”.

O terceiro motivo que levou o juiz a recusar a prestação de contas foi a apresentação de um recibo rasurado: “no espaço destinado ao nome do doador, nota-se que aquilo que estava foi apagado com corretivo líquido”, anotou o juiz. Ele entende que documentos oficiais não podem ter borrões, emendas ou rasura conforme prevê o artigo 3º da Resolução 22.715 do TSE .

No recurso apresentado no TRE, a defesa esclarece que o recibo rasurado, foi um equívoco de um dos contadores, mas sustenta que não houve intenão de fraude. O recurso aguarda julgamento no Tribunal Regional Eleitoral de Mato Grosso.

Leia a decisão

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Eleitoral de Mato Grosso
Cartório da 39ª Zona Eleitoral de Cuiabá
Autos nº 309/08
Prestação de contas – 2008.
Autor: Wilson Pereira dos Santos
 

WILSON PEREIRA DOS SANTOS apresentou as contas relativas às eleições municipais de Cuiabá, Mato Grosso, na qual concorreu ao cargo de prefeito.

Juntou os documentos de fls. 2/281.
Admitido o processamento a fls. 282.
Prestação retificadora a fls. 287/378.
Na decisão de fls. 381 admiti a juntada de documentos.
Juntou os documentos de fls. 384/617.
Relatório preliminar a fls. 618/619 e verso.
Manifestação do autor a fls. 625/636, com os documentos de fls. 637/745.
Prestação de contas retificadora a fls. 746/837, com os documentos de fls. 838/841. Relatório conclusivo de prestação de contas a fls. 842/843 pela aprovação com ressalvas.
Manifestação do autor a fls. 849.
Prestação retificadora a fls. 850/900.
Novo relatório conclusivo a fls. 90.
Parecer do Ministério Público a fls. 902.
É uma síntese do necessário.

A prestação de contas não se limita a um simples protocolo necessário para obtenção do diploma eleitoral. Não é isso. É algo muito diferente e essencial à própria subsistência do estado democrático de direito. A boa prestação de contas se apresenta como um passo a mais na caminhada que começa bem antes das campanhas eleitorais, com a escolha na convenção, até o término do mandato. Dentre esses dois pontos, no mínimo, não há espaços para tergiversação, desculpas, desvios, senões etc. A fiscalização da prestação de contas não se exaure na análise na forma contábil.

É preciso deixar muito claro, se acaso não já estivesse, que a prestação de contas é um ato único, que admite pequenas correções ou retificações decorrentes de equívocos plenamente compreensíveis. Não é, decididamente, um prestando.

As contas apresentam defeitos irremediáveis. Os recibos eleitorais 45.000080022 (fls. 273), 45.000080023 (fls. 266) e 45.000080024 (fls. 269) foram emitidos em 15 de julho, antes da abertura da conta bancária específica, 18 de julho (fls. 96). Justifica que “é fato que não houve premeditação por parte desta equipe em arrecadar quaisquer tipos de doações de forma intempestiva, burlando assim, a legislação que disciplina a matéria (…) mesmo se considerar a arrecadação extemporânea, analisando o demonstrativo de receitas e despesas (DRD), podemos verificar que o valor de R$ 9.100,00 (nove mil e cem reais) arrecadado antes da data de 18 de outubro (sic), representa muito pouco em relação ao montante da receita estimada em dinheiro, que se globaliza em R$ 1.487.545,29 (hum milhão, quatrocentos e oitenta e sete mil, quinhentos e quarenta e cinco reais e vinte e nove centavos), ou seja, 0,61% (zero vírgula sessenta e um por cento), pouco mais que 1/2 % (meio por cento) do valor total da receita estimável em dinheiro”, (fls. 628/629).

No entanto, a justificativa não afasta, não pode afastar, a incidência do disposto no art.1º, IV da Res. TSE nº 22.715, que dispõe “sob pena de desaprovação das contas, a arrecadação de recursos e a realização de gastos por candidatos e comitês financeiros, ainda que estimáveis em dinheiro, só poderão ocorrer após observância dos seguintes requisitos: (…) IV – abertura de conta bancária específica para a movimentação financeira de campanha, salvo para os candidatos a vice-prefeito”. A regra é cogente e não permite abrandamento, fundado no valor da arrecadação. Não há contemporização possível.

A desaprovação das contas é a conseqüência única possível para o candidato que arrecada antes da abertura de conta bancária específica. Não se aplica, em relação às normas concernentes à arrecadação e à utilização de recursos na campanha eleitoral, o princípio da insignificância, uma vez que, “quem é fiel no pouco, também é fiel no muito; e quem é injusto no pouco, também é injusto no muito”, (Lucas, 16, 10).

O candidato utilizou, na campanha, recurso próprio, em espécie, no valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais), conforme está no demonstrativo de receitas e despesas, fls. 16 e no recibo eleitoral (fls. 257). Todavia, no registro de candidatura, há a declaração de existência de R$ 70.000,00 (setenta mil reais) em caixa e R$ 1.083,19 (mil, oitenta e três reais e dezenove centavos) em conta corrente. Explica: “estamos encaminhando anexo cópia autenticada do cheque nº 585.656, no valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), comprovando o empréstimo tomado pelo candidato Wilson Pereira dos Santos, junto ao Sr. Osvaldo Roberto Sobrinho, em julho do corrente exercício, que adicionados aos R$ 70.000,00 (setenta mil reais) justifica-se o depósito de R$ 100.000,00 (cem mil reais) em sua conta campanha”, (fls. 627). O depósito “em conta corrente em dinheiro” se deu em 1º de outubro (fls. 257) e o empréstimo, em espécie, tomado em 4 de julho (fls. 661/662). A utilização do dinheiro demorou, praticamente, três meses, o que não é muito usual: emprestar para guardar, em espécie.

A questão é que à essa circunstância, soma-se o fato que o recibo eleitoral nº 45000390357 (fls. 257) legitimador da arrecadação está com rasura, suficiente para comprometer a sua validade. No espaço destinado ao nome do doador, nota-se que aquilo que estava foi apagado com o uso de corretivo líquido. O art. 3º da Res. TSE nº 22.715 preceitua que “os recibos eleitorais são documentos oficiais que viabilizam e tornam legítima a arrecadação de recursos para a campanha, imprescindíveis seja qual for a natureza do recurso, ainda que do próprio candidato, não se eximindo desta obrigação aquele que, por qualquer motivo,não disponha dos recibos”. Documento oficial. Não se admite, mormente, na sua parte substancial, borrões, emendas ou rasuras.

Por fim, não vejo outra interpretação desses dispositivos legais que “preserve o interesse público de lisura eleitoral”, (Lei Complementar nº. 64/96, art. 23).
Estas as razões por que, em desconformidade com o parecer do Ministério Público, desaprovo as contas.

Proceda-se à intimação do candidato.
Remeta-se cópia de todo o processo ao Ministério Público Eleitoral para os fins previstos no art. 22 da Lei Complementar nº 64/90 (Lei nº 9.504/97, art. 22, § 4º).
Transitada em julgado e feitas as comunicações necessárias, arquivem-se.
P.R.I.C.

Cuiabá, 9 de dezembro de 2008.

Luiz Carlos da Costa
Juiz Eleitoral

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