Estratégias empresariais

Mudança de conceitos na advocacia exige cautela

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13 de janeiro de 2009, 9h43

O tema estratégia é, constantemente, objeto de artigos, cursos e livros. E na maioria das vezes, quem lê ou ouve sobre este assunto tem a impressão de que se trata de matéria abstrata, subjetiva e, principalmente, complexa. Uma explicação simples e de fácil compreensão sobre estratégia foi escrita por Jack Welch. “Estratégia significa fazer escolhas claras sobre como competir. Não se pode ser tudo para todos, não importa o tamanho do negócio ou a profundidade do seu bolso."

A atividade jurídica, embora extremamente dinâmica e competitiva, traz consigo regras próprias, o que nos faz afirmar que as estratégias empresariais, via de regra, somente se aplicam à advocacia após um trabalho de customização. Portanto, transportar conceitos e práticas de outros mercados para a advocacia demanda cautela e adaptações.

Urge salientar ainda que o processo de definição das estratégias não pode ser prejudicado pelo excesso de teorias, metodologias e pelas intermináveis reuniões internas. É muito importante evitar a concepção de uma estratégia complexa e que, certamente, produzirá dúvidas e divergências no futuro. O mesmo especialista é enfático ao afirmar: “Na hora da estratégia, pense menos e faça mais”.

Este breve texto apresenta, de forma clara e objetiva, uma adaptação dos três passos necessários à elaboração de uma estratégia, sugeridos por Jack Welch em seu livro “Paixão por Vencer” – Editora Campus e devidamente contextualizados e exemplificados de modo a serem utilizados em um escritório de advocacia.

Passo 1 – Vantagem Competitiva Sustentável

Definir uma estratégia está diretamente ligado a duas expressões: escolha e diferenciação. Não é possível investir em todas as frentes, alocar profissionais em todos os projetos. Faz-se necessário identificar um ponto e concentrar os esforços, criando assim uma vantagem competitiva sustentável.

Lembre-se da segunda parte da explicação sobre estratégia apresentada no início do texto: “Não se pode ser tudo para todos, não importa o tamanho do negócio ou a profundidade do seu bolso”.

Aplicar este conceito aos escritórios jurídicos equivale dizer que um escritório com estratégia não se apresenta como um prestador de serviço que faz de tudo (todos os ramos do Direito), para todo tipo de cliente (empresas de todos os portes e segmentos ou pessoas físicas), em todo o território nacional e, tudo isto, de forma preventiva e com atendimento personalizado. Portanto, é fundamental restringir o foco da atuação do escritório, seja na área de atuação, segmentos dos clientes ou área geográfica.

Michael Porter, o grande especialista em estratégia da Harvard Business School, considerado por muitos "o pai da estratégia", ao discorrer sobre a diferenciação fez o seguinte comentário: "As empresas devem tentar ser únicas. Os executivos precisam se perguntar: Como oferecer um valor exclusivo, que atenda a uma série de necessidades essenciais de um grupo de clientes importante?".

Diferente da tendência no mercado jurídico brasileiro, Porter não considera práticas como fusões ou terceirização dos serviços como estratégia, pois, a princípio, não determina a posição que o escritório ocupará com exclusividade.

Realizada a primeira etapa (definição), deve o escritório buscar diferenciar-se da concorrência por meio da inovação e criatividade. Ao analisar o segmento jurídico brasileiro constata-se que, qualquer que seja o posicionamento do escritório, existem muitos bons concorrentes oferecendo os mesmos serviços.

Sendo assim, não é possível ter vantagem competitiva sem inovação, novos serviços, novas metodologias de trabalho e, até mesmo, novas pessoas.  Contudo, precisaríamos de muitas outras linhas para descrever os passos que conduzem à inovação jurídica.

Passo 2 – Pessoas certas nas posições certas

Este segundo passo nos apresenta dois ensinamentos: (I) os profissionais que integram um escritório são diretamente responsáveis pelo seu desempenho; e (II) pessoalidade na prestação de serviços jurídicos.

A estratégia precisa corresponder às pessoas que compõe o escritório. Enquanto alguns advogados têm maior aptidão para trabalhos complexos e que demandam grandes estudos, outros preferem um volume maior de processos, muitas vezes associado com outras atividades administrativas. Um erro que pode ser fatal é atribuir a uma equipe um projeto que não esteja de acordo com seu perfil.

A advocacia sempre foi e sempre será uma atividade pessoal. Apesar do avanço da tecnologia, da transformação dos escritórios em verdadeiras marcas jurídicas e das novas formas de comunicação, o contato pessoal entre cliente e advogado ainda é insubstituível.

Na advocacia coorporativa, gosto da famosa expressão: “O advogado contrata o advogado”, que significa que a confiança da empresa-cliente é colocada sobre o advogado e não sobre o escritório que ele representa.

Passo 3 – Melhores práticas e melhoria contínua

A crescente profissionalização do mercado jurídico requer a utilização das melhores práticas em todas as áreas do escritório, sejam jurídicas ou não. Não basta ao escritório concentrar-se na busca do melhor Direito, conhecendo o que há de novo na doutrina, legislação e jurisprudência. Deve também focar no aperfeiçoamento permanente das atividades financeiras, tecnológicas e relacionadas às áreas administrativas, de marketing e de recursos humanos.

Existem muitos procedimentos administrativos internos que podem ser aprimorados, especialmente aqueles em que há interação com as ferramentas de tecnologia. São alguns deles: o cadastramento de um novo processo, a designação de um advogado responsável, a distribuição dos prazos, a comunicação com a área financeira, o controle das despesas do processo e o controle das horas despendidas. Muitas idéias, capazes de gerar diferenciais competitivos, já foram concebidas somente neste conjunto de procedimentos internos.

Modernamente, cresce nos escritórios a preocupação com a produtividade dos advogados, sendo este fator decisivo, especialmente quando se trata de profissionais alocados em carteiras com grandes volumes de processo. E somente a busca por novas metodologias e tecnologias aplicadas ao trabalho podem proporcionar aumento de produtividade e constância na qualidade.

Apenas por um instante, imagine a possibilidade de seu escritório não ser o único composto por grandes profissionais, com uma equipe qualificada, motivada e focada nos interesses dos clientes. Presuma a qualidade e eficiência dos concorrentes e, além de buscar aprimorar-se constantemente na técnica jurídica, invista tempo e recursos no aprimoramento administrativo, operacional e logístico do seu escritório.

Conclusão
Ter uma estratégia clara e definida deixou de ser facultativo para ser uma condição de sobrevivência. Caso seu escritório não tenha, faça. Se já possui, realize uma avaliação dos resultados e, se necessário, busque adaptá-la à nova dinâmica do mercado jurídico.

Apenas não se esqueça de que a continuidade é fundamental para uma estratégia de sucesso. Segundo Porter, "se não for algo que se faz constantemente, não é estratégia. Quando não se permanece buscando a mesma direção por dois ou três anos, ela não significa nada".

 

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    é advogado, especialista em marketing de serviços, consultor de escritórios, fundador do Jornal A Comarca do Mundo Jurídico, sócio da Marcka – Marketing e Recrutamento Jurídico e membro do CEAE.

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