Nepotismo no STF

Decisões mostram como Súmula Vinculante 13 será interpretada pela Justiça

Autor

  • Bruno Barata Magalhães

    é advogado consultor em Direito Administrativo e Eleitoral membro do Comitê de Jovens Advogados e do Fórum Latino Americano da International Bar Association e professor do Instituto de Pesquisas Aplicadas.

10 de janeiro de 2009, 4h27

A Súmula Vinculante 13, aprovada pelo Supremo Tribunal Federal, tornou-se a norma-símbolo do fim do nepotismo no país. Os precedentes inspiradores da edição da mencionada súmula foram a Ação Direta de Inconstitucionalidade 1521-4, o Mandado de Segurança 23.780-5, a Medida Cautelar em Ação Declaratória de Constitucionalidade 12 e o Recurso Extraordinário 579.951. A Ação Declaratória de Constitucionalidade 12 adveio da necessidade de exame da constitucionalidade da Resolução 7/2005 do Conselho Nacional de Justiça, que “disciplina o exercício de cargos, empregos e funções por parentes, cônjuges e companheiros de magistrados e de servidores investidos em cargos de direção e assessoramento, no âmbito dos órgãos do Poder Judiciário”.

A partir daquela data, a decisão do STF vinculou toda a administração pública no que se refere ao combate do favoritismo nas suas próprias estruturas.

O texto do verbete 13 assim dispõe: “A nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança ou, ainda, de função gratificada na administração pública direta e indireta em qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas, viola a Constituição Federal”.

O Ministério Público do estado do Rio de Janeiro ajuizou em 9 de dezembro de 2008 a Reclamação 7.317, em face do prefeito do município de Tanguá (RJ) cuja relatoria ficou sob a responsabilidade do ministro Carlos Britto.

O Parquet Fluminense, após denúncias a ele encaminhadas, constatou, em sede de Inquérito Civil Público, que o prefeito municipal possuía 13 parentes ocupando cargos em comissão na prefeitura, e a Vice-Prefeita possuía 6 parentes na mesma situação.

A fim de solucionar o problema, o Ministério Público propôs a celebração de Termo de Ajustamento de Conduta, conhecido como TAC. Nesse período, foi aprovada, pelo Pretório Excelso, a Súmula Vinculante 13. O Prefeito Municipal não celebrou o mencionado TAC, sob a alegação de que o verbete 13 autorizava a nomeação de parentes para cargos políticos.

O Ministério Público recomendou ao prefeito que exonerasse todos os parentes ocupantes de cargos comissionados ou funções de confiança que fossem ascendentes, descendentes, parentes colaterais até o terceiro grau ou afins, seus e da vice-prefeita.

Foram exonerados 22 servidores, porém mantidos quatro parentes no cargo de secretário municipal e outro em exercício de função de confiança.

Com fundamento no parágrafo 3º do artigo 103-A da Constituição da República, que prevê o ajuizamento de reclamação em face de ato administrativo ou decisão judicial que confronte os termos de determinada súmula vinculante, o Parquet do Estado do Rio de Janeiro recorreu ao Supremo Tribunal Federal, através da Reclamação 7.317, com o objetivo de, liminarmente, suspender os atos administrativos de nomeação dos parentes até o terceiro grau, conforme preceitua o verbete 13, a fim de afastar os parentes do Prefeito e da Vice-Prefeita de suas funções e, no mérito, declarar a nulidades dos referidos atos administrativos.

Com relação ao parente em exercício de função gratificada, se servidor efetivo for, não há incompatibilidade face aos efeitos gerados pela Súmula Vinculante 13, tendo em vista que, conforme o artigo 37, caput, V, as funções de confiança são exercidas exclusivamente por servidores ocupantes de cargo efetivo.

Assim é a própria interpretação do Conselho Nacional de Justiça, que dispõe no parágrafo 1º do artigo 2º da Resolução 7/2005:

Art. 2º — ………………………..

parágrafo1º Ficam excepcionadas, nas hipóteses dos incisos I, II e III deste artigo,as nomeações ou designações de servidores ocupantes de cargo de provimento efetivo das carreiras judiciárias, admitidos por concurso público, observada a compatibilidade do grau de escolaridade do cargo de origem, ou a compatibilidade da atividade que lhe seja afeta e a complexidade inerente ao cargo em comissão a ser exercido, além da qualificação profissional do servidor, vedada, em qualquer caso, a nomeação ou designação para servir subordinado ao magistrado ou servidor determinante da incompatibilidade (Grifos Nossos)”.

No mesmo sentido, aliás, é a norma do parágrafo 7º do artigo 355 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal:

Art. 355 — ………………………………

parágrafo 7º – Salvo se funcionário efetivo do Tribunal, não poderá ser nomeado para cargo em comissão, ou designado para função gratificada, cônjuge ou parente, em linha reta ou colateral, até terceiro grau, inclusive, de qualquer dos Ministros em atividade (Grifos Nossos)”.

Destarte, tanto o Conselho Nacional de Justiça quanto o próprio Supremo Tribunal Federal admitem a nomeação de parentes que sejam servidores efetivos em funções de confiança nos seus quadros.

No que se refere aos parentes ocupantes de cargo de Secretário Municipal, mister ressaltar que se trata de cargo de natureza política, portanto, caracterizado como agente político. Deve-se considerar a figura do secretário municipal como agente político nomeado. O professor Celso Antônio Bandeira de Mello leciona que “agentes políticos são os titulares dos cargos estruturais à organização política do País, isto é, são os ocupantes dos cargos que compõem o arcabouço constitucional do Estado e, portanto, o esquema fundamental do poder. Sua função é a de formadores da vontade superior do Estado".

Tal definição oferece suporte para a completa distinção entre servidor público e agente político. A figura do agente político pode ser eleito, como são, por exemplo, o presidente da República, os governadores, os prefeitos, os senadores, os deputados federais, os deputados estaduais ou os vereadores, ou nomeado, como são, por exemplo, os Ministros, os Secretários de Estado e os Secretários Municipais.

O Supremo Tribunal Federal já enfrentou a matéria no Recurso Extraordinário 579.951/RN, um dos precedentes para a edição da Súmula Vinculante 13, e no Agravo Regimental em Medida Cautelar em Reclamação 6.650-9/PR, cuja ementa ora se transcreve:

Agravo Regimental em Medida Cautelar em Reclamação. Nomeação de irmão de Governador de Estado. Cargo de Secretário de Estado. Nepotismo. Súmula Vinculante 13. Inaplicabilidade ao Caso. Cargo de Natureza Política. Agente Político. Entendimento Firmado no Julgamento do Recurso Extraordinário 579.951/RN. Ocorrência de Fumaça do Bom Direito (Grifos Nossos)”.

Por analogia, pode-se aplicar a decisão referente à possível incompatibilidade entre secretário de Estado e governador de Estado, proferida nos autos do Agravo Regimental em Medida Cautelar em Reclamação 6.650-9/PR, à esfera municipal.

Por todo o exposto, o secretário municipal, agente político nomeado, não gera incompatibilidade com o seu relativo, prefeito municipal, agente político eleito, face aos efeitos gerados pela Súmula Vinculante 13, devendo a Reclamação 7.317 ser julgada, seja em sede de medida liminar, seja no seu mérito, improcedente.

Em que pese o verbete 13 ter sido aprovado a fim de garantir a aplicação dos princípios administrativos insertos no artigo 37, caput, da Constituição Federal, sobretudo o da moralidade, os precedentes do próprio Supremo Tribunal Federal, bem como as disposições normativas do Conselho Nacional de Justiça e do Pretório Excelso, devem prevalecer face à interpretação do lacônico texto da citada súmula vinculante.

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    é advogado, consultor em Direito Administrativo e Eleitoral, membro do Comitê de Jovens Advogados e do Fórum Latino Americano da International Bar Association e professor do Instituto de Pesquisas Aplicadas.

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