Responsabilidade objetiva

É inépta a denúncia que não individualiza condutas

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17 de fevereiro de 2009, 6h11

O fato de uma pessoa pertencer à diretoria de uma empresa não significa que ela participou do crime ali cometido. A denúncia deve individualizar a conduta de cada suspeito, sob pena de tornar-se inépta. Com esse entendimento, a 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, concedeu Habeas Corpus para considerar inépta denúncia do Ministério Público Federal contra diretores de uma instituição de ensino do interior paulista e anular todos os atos posteriores. Eles eram acusados de crime tributário.

Os diretores foram denunciados por omitir informações e fraudar a fiscalização da Receita Federal. Por meio de seus representantes, Fernando da Nóbrega Cunha e Alberto Zacharias Toron, eles alegam que a denúncia não individualiza a conduta de cada um dos acusados. Portanto, o direito à ampla defesa estaria prejudicado.

No HC, os advogados pedem que seja anulada a Ação Penal, pois existe um vício do MPF em não apontar os crimes cometidos pelos envolvidos na ação, causando constrangimento aos diretores da escola. O Tribunal Regional Federal da 3ª região negou o mesmo pedido.

A relatora do caso no STJ, desembargadora convocada do Tribunal de Justiça de Mina Gerais Jane Silva, em seu voto, afirma que os acusados foram denunciados pela prática de crime contra a ordem tributária apenas por pertencerem ao quadro social de uma empresa atuada pela Receita Federal, sem que se especificasse a sua efetiva contribuição para o crime. A desembargadora ressaltou que a abertura do inquérito só seria possível se o MPF apresentasse elementos que apontem a participação das pessoas.

Na decisão, Jane Silva critica a maneira com que o MPF ofereceu a denúncia. “Ocorrida a autuação, sem qualquer investigação prévia e mesmo sem se saber como atribuir especificamente a cada um dos denunciados o ato com que contribuiu para o resultado danoso, todos os integrantes da sociedade em questão foram denunciados, somente por integrarem a diretoria, mediante a presunção de que, dada a atribuição de cada um deles no contrato social, eles deveriam saber o que ocorria na empresa, portanto não poderiam estar alheios à conduta criminosa”, afirmou.

A desembargadora justifica a decisão apoiando-se no artigo 29 do Código Penal, que diz que a pena será dada na medida da culpabilidade do envolvido no crime. Para ela, o crime pode ser desdobrado em várias ações, e se não houver uma delimitação deles, fica impossível tanto a defesa dos envolvidos como a apuração do fato criminoso. “Admite-se a denúncia geral, mas repudia-se a denúncia genérica. Na primeira atribui-se um determinado ato criminoso a todos os denunciados, por tê-lo praticado em conjunto; na segunda, mostra-se que ocorreram ações que levaram ao resultado delituoso, atribuindo-o a todos os diretores, sem estabelecer a correspondência concreta entre aquele e as ações de cada um dos que as produziram, impedindo-lhes a defesa, fulminando a denúncia da inépcia formal”, escreveu em seu voto.

A denúncia foi mal construída, de acordo com a desembargadora. Segundo ela, o capítulo intitulado “Individualização das condutas dos denunciados” apenas aponta o cargo de cada um dos envolvidos e a forma como atuavam dentro da escola, sem mostrar nenhum crime cometido por eles.

“Entendemos estar configurada a inépcia formal da denúncia, impossibilitando a defesa efetiva dos pacientes, evidenciando que a peça vestibular está a consagrar a responsabilidade objetiva, repudiada pelo nosso Direito Penal. Podem efetivamente ser todos os pacientes responsáveis pela conduta criminosa, mas há necessidade do devido detalhamento de suas ações individuais ou coletivas para tal nefasto resultado”, concluiu.

Clique aqui para ler o acórdão.

Habeas Corpus 115.244

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