Testemunhas de fora

Réus do mensalão insistem em oitivas no exterior

Autor

16 de fevereiro de 2009, 21h06

A defesa de Kátia Rabello e José Roberto Salgado, ex-diretores do Banco Rural acusados de gestão fraudulenta e evasão de divisas no processo do mensalão, insistiu no pedido para que sejam ouvidas quatro testemunhas no exterior: uma nas Bahamas e três em Portugal. O ministro José Dirceu e o publicitário Marcos Valério Fernandes de Souza também insistiram na oitiva de testemunhas de defesa que residem fora do país.

Os réus se manifestaram na ação penal após o despacho do ministro Joaquim Barbosa, do Supremo Tribunal Federal, publicado na última quinta-feira (12/2). O despacho de Barbosa (leia abaixo) foi baseado na Lei 11.900/09, que mudou o Código de Processo Penal. Segundo a regra, “as cartas rogatórias só serão expedidas se demonstrada previamente a sua imprescindibilidade, arcando a parte requerente com os custos de envio.”

O ministro calculou que seriam gastos mais de R$ 19 milhões para a tradução de três cartas rogatórias — já que as de Portugal não precisam ser traduzidas — porque “o acesso ao inteiro teor dos autos deve ser garantido, para permitir a melhor colheita das provas, sob o crivo do contraditório”. Barbosa deu, então, prazo de cinco dias para que os réus demonstrassem a necessidade de ouvir as testemunhas apontadas, a colaboração que poderão prestar e a disposição em pagar as passagens de ida e volta para elas.

Na petição protocolada nesta segunda-feira (16/2) no Supremo, os ex-funcionários do Banco Rural descrevem qual é a importância de cada uma das quatro testemunhas para sua defesa. Apesar de justificar os motivos do arrolamento, a defesa afirma que a regra que exige isso é “evidentemente afrontosa ao constitucional direito à ampla defesa”. E diz que a oitiva é imprescindível, sob pena de cerceamento de defesa.

Kátia e Salgado sustentam ainda que é desnecessária a tradução integral dos autos do processo, ao contrário do que assinalou o ministro Barbosa. “É que, salvo melhor juízo, bastaria a tradução da denúncia, decisão de recebimento da denúncia e interrogatório dos acusados vinculados ao Banco Rural”, afirmam.

Sobre a possibilidade de a parte pagar as despesas com passagens e estadia, os ex-diretores afirmam que “impor à testemunha o deslocamento entre países constituiria ônus pessoal injustificável e constrangedor a quem deverá servir aos interesses da Justiça”.

De acordo com notícia publicada nesta segunda-feira (16/2) pelo jornal O Estado de S. Paulo, o ex-ministro da Casa Civil, José Dirceu, foi explícito em dizer que arcaria com as despesas para ouvir os as testemunhas no exterior. Na petição, os ex-diretores do Banco Rural não se manifestaram expressamente sobre essa disposição.

Leia o despacho de Joaquim Barbosa

 DESPACHO: Uma vez que foi ouvida a última testemunha arrolada pela acusação, no último dia 2 de fevereiro, terá início agora a fase de oitiva de testemunhas de defesa.

Como salientei no despacho anterior, dentre essas testemunhas, algumas residem no exterior (Estados Unidos, Bahamas, Argentina e Portugal), o que exige a extração de cartas rogatórias.

Contudo, no último dia 9 de janeiro, entrou em vigor a Lei n° 11.900/2009, que alterou o Código de Processo Penal e inseriu o art. 222-A, cujo teor é o seguinte:

“Art. 222-A. As cartas rogatórias só serão expedidas se demonstrada previamente a sua imprescindibilidade, arcando a parte requerente com os custos de envio.”

Com isto, torna-se necessária a manifestação dos réus JOSÉ MOHAMED JANENE, EMERSON ELOY PALMIERI, ROBERTO JEFFERSON, MARCOS VALÉRIO, JOSÉ DIRCEU, CARLOS ALBERTO QUAGLIA, ZILMAR FERNANDES, KÁTIA RABELLO, JOSÉ ROBERTO SALGADO e CRISTIANO DE MELO PAZ, no sentido de demonstrar a imprescindibilidade da oitiva das testemunhas por eles arroladas que residam no exterior.

Por outro lado, é importante esclarecer que, nos termos da lei recém-promulgada, os custos do envio de cada carta rogatória (no caso, seria necessário expedir quatro cartas) deverão ser arcados pelas respectivas defesas, que deverão adiantar os valores de modo a viabilizar a realização da diligência.

De acordo com informação constante dos autos (fls. 19750/19752), apenas para a tradução de três das cartas rogatórias (já que a de Portugal não precisaria ser traduzida), seria alcançado o custo de R$ 19.187.928,00 (dezenove milhões, cento e oitenta e sete mil, novecentos e vinte e oito reais). Isto porque, embora sejam feitas cópias dos documentos considerados imprescindíveis, para facilitar a apreciação dos juízes delegatários-rogados, o acesso ao inteiro teor dos autos deve ser garantido, para permitir a melhor colheita das provas, sob o crivo do contraditório. Note-se que, quanto aos juízes delegatários no Brasil, este acesso vem sendo franqueado em meio magnético, que permite o conhecimento do inteiro teor das peças desta ação penal. Já para os juízes rogados, este simples envio dos CD rom’s com cópia dos autos não seria suficiente, diante da necessidade da tradução.

Assim, tendo em vista o custo astronômico do processamento de cartas rogatórias em um processo judicial desta dimensão, determino aos réus supramencionados que, no prazo de 05 (cinco) dias:

a) informem se insistem ou não na oitiva das testemunhas com residência no exterior;

b) caso insistam, demonstrem a imprescindibilidade destas testemunhas, devendo esclarecer qual o conhecimento que elas têm dos fatos e a colaboração que poderão prestar para a instrução da presente ação penal; e

c) caso seja demonstrada sua imprescindibilidade, manifestem-se sobre eventual opção pela oitiva das testemunhas por via menos dispendiosa do que a carta rogatória, como, por exemplo, optando por sua oitiva no Brasil, através do pagamento de passagens de ida e volta para as mesmas.

Publique-se. Intime-se.

Brasília, 6 de fevereiro de 2009.

Ministro JOAQUIM BARBOSA
Relator

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!