Liberdade e responsabilidade

"Fumar é muito perigoso; mas ninguém é obrigado"

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30 de agosto de 2009, 8h53

Spacca
Antônio Souza Cruz - int - SpaccaA Souza Cruz, maior fabricante de cigarros do país, pagou R$ 5,7 bilhões de impostos, em 2008. O país é o principal exportador de tabaco do mundo e tem uma das cadeias produtivas mais importantes. Segundo dados da empresa, ela gera trabalho para 40 mil famílias de produtores agrícolas e para 240 mil pessoas em empregos diretos e indiretos com logística e comercialização.

De outro lado, segundo dados da Secretaria de Saúde de São Paulo, estado que empunhou a bandeira contra o fumo em locais fechados, são gastos por ano R$ 90 milhões com o tratamento de fumantes passivos só na rede pública.

A Souza Cruz não bateu de frente com as leis antifumo que estão sendo criados Brasil afora, copiando o modelo paulista. Mas defende uma legislação mais equilibrada. Para o diretor jurídico da empresa, Antonio Rezende, é legítimo atender a uma demanda para que haja uma evolução da lei federal já existente sobre o assunto. Mas isso, entende, deve e pode ser feito sem interferir nas liberdades individuais e na livre iniciativa.

São Paulo, de fato, não inova no assunto. Em 2008, o então prefeito do Rio de Janeiro, Cesar Maia, tentou proibir o fumo em locais coletivos fechados através de um decreto. A regra não pegou nem mesmo no Tribunal de Justiça do Rio, onde há um espaço entre os andares para as pessoas fumarem.

Em entrevista à revista Consultor Jurídico, Antonio Rezende conta que  a Souza Cruz responde, hoje, a 330 ações com pedido de indenização pelos danos causados pelo cigarro a fumantes. Ele entende que o número é muito pequeno, já que há no país cerca de 20 milhões de fumantes. O número baixo de processos pode estar relacionado com a resposta que o Judiciário tem dado a esse tipo de demanda. Desde 2000, a publicidade de cigarro está proibida. E, conta Rezende, mesmo quando era permitida, não enganava os consumidores de cigarro.

Ele reconhece que a associação entre o consumo do cigarro e uma série de doenças é relevante. “O que não se pode dizer é que aquela doença apontada pelo consumidor foi exclusivamente originada do consumo de cigarro, porque as doenças são, sem exceção, multifatoriais”, diz.

Outra questão muito defendida pela empresa é sobre a escolha do fumante. “Nenhuma pessoa de boa-fé vai alegar que desconhece os riscos elevados associados ao consumo do cigarro. Se ela consome o produto e está ciente desses riscos, não há nenhum defeito nesse produto que gere obrigação de indenizar pelo fabricante”, diz.

Pela lei, é proibida a venda de cigarros a menores de 18 anos. Rezende explica que a empresa faz campanhas alertando os varejistas sobre a legislação. Também está lançando, nos programas de relacionamento, uma campanha em que o varejista que não observa a legislação perde ponto.

Antonio Rezende é formado pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro, fez pós-graduação em Direito Empresarial na Cândido Mendes, e MBA na Fundação João Cabral, em Belo Horizonte. Trabalha na Souza Cruz há 14 anos e é diretor jurídico da empresa há cinco.

Rezende é fumante. Ele afirmou que cerca de um quinto dos funcionários da Souza Cruz fumam. “Talvez a gente esteja um pouco acima da média. Mas é pouca coisa”, disse, comparando a proporção de fumantes na empresa (20%) com a proporção verificada na sociedade (10%).

Leia a entrevista

Conjur — Depois do estado de São Paulo, outros estados e municípios passaram a aprovar leis antifumo. Como o senhor avalia essas leis?
Antonio Rezende —
A preocupação da sociedade em relação à saúde é legítima. E nada mais legítimo do que a sociedade discutir esses temas. Mas tem de ser observado o limite correto desta preocupação. É importante também que haja o respeito às liberdades individuais, dos comerciários, bares, tabacarias e outros segmentos especializados. As legislações atuais, que estão em discussão ou foram aprovadas recentemente em São Paulo, Rio de Janeiro e Paraná, encontraram uma solução extrema, em que não autorizam o consumo do cigarro em varandas, tabacarias, bares que são segmentados para esse tipo de público.

Conjur — O senhor enxerga nessas iniciativas uma tentativa de o Estado impor um padrão de comportamento e interferir em espaços privados?
Antonio Rezende —
É papel do Estado regulamentar as atividades econômicas. O importante é atentar o limite da regulamentação e de intervenção do Estado na esfera privada. Esse é um princípio histórico de cidadania e de democracia. Existe ao longo do processo histórico vários exemplos em que a intervenção do Estado avançou na esfera individual. Os resultados sempre foram ruins, especialmente para as minorias. É legítimo atender a uma expectativa das pessoas de melhorar as condições onde se encontram, mas sempre procurando o equilíbrio. Não pode ultrapassar o ponto em que a determinação se transforma em imposição de conduta e abra um espaço para a intolerância. Todas essas questões têm que ser observadas. A arte de uma legislação é quando ela consegue observar adequadamente esses limites. Por outro lado, é legítimo avançar em uma legislação federal que já estava defasada. Essa iniciativa é perfeitamente compreensível e adequada, porque pretende atender aos anseios da sociedade.

Conjur — Em que sentido a legislação federal poderia avançar?
Antonio Rezende —
Poderia avançar na determinação de espaços. Por exemplo, restringir o fumo em bares pequenos, mas permiti-lo em estabelecimentos com metragem grande e onde haja, efetivamente, uma barreira físicaque impeça a transposição de fumaça e não apenas uma separação de ambientes. Sobre esse espaço, até os estados poderiam, complementarmente, fazer a regulamentação da lei federal, observando sempre esses princípios de associação comercial e de liberdade individual e a escolha do próprio varejista em escolher o tipo de público que ele quer atender. Mas os conteúdos dessas leis estaduais vão muito além disso, porque revogam o princípio de convivência que está no cerne da legislação federal. Existem caminhos melhores do que estes que, atualmente, foram escolhidos.

Conjur — Em outros países existem iniciativas de limitação de espaços?
Antonio Rezende —
Já existem em outros países bares que não tem uma metragem muito grande e que separam dias ou horários em que é permitido o consumo de produtos. As pessoas já estão previamente informadas. E as pessoas que são fumantes ou que estão acompanhando pessoas fumantes têm a opção de freqüentar esses lugares. Existe uma série de alternativas menos radicais para que haja essa convivência harmônica de fumantes e não fumantes sem correr o risco de criar uma estigmatização de fumantes. É importante sempre em uma legislação preservar a tolerância, as escolhas individuais de estilo de vida e não, através das legislações, criar ou evitar comportamentos e restringir escolhas. É sempre saudável que em um país democrático isso seja observado. Imagino que, não só em virtude de questionamentos, mas também da existência de precedentes internacionais sobre o tema, as legislações vão ser mais modeladas e serão menos radicais do que este modelo em vigor em São Paulo e, futuramente, no Rio de Janeiro.

Conjur — Essas leis são inconstitucionais?
Antonio Rezende —
Sim, tanto do ponto de vista formal quanto material, pois não respeita a livre iniciativa e a liberdade individual, além de revogar uma legislação federal que está em vigor. Essas legislações têm certos vícios que já estão sendo discutidos no Judiciário por associações de bares e restaurantes. As leis também podem criar um desequilíbrio entre bares que vão estar mais visivelmente fiscalizados e aqueles em que a fiscalização não será eficiente. Provavelmente faltou um diálogo antecedente com esses setores para formular uma legislação que fosse menos agressiva.

Conjur — Em 2008, quando era prefeito do Rio, Cesar Maia assinou um decreto que proibia o fumo em lugares fechados. Alguns restaurantes questionaram o decreto no Judiciário.
Antonio Rezende —
No caso, eram dois aspectos: a proibição foi por decreto e o decreto revogava lei federal. Já houve outros casos de legislações propostas que foram questionadas. Muitos órgãos externos de controle de legislação, como procuradoria do Estado e município, já opinaram, mostrando que, na vigência de lei federal, uma legislação de natureza local só pode ser complementar. Não é uma discussão tão nova. O que me faz supor, pela qualidade dos argumentos, que essas ações têm um aspecto bastante consistente.

Conjur — A empresa tomou alguma iniciativa contra o decreto na época?
Antonio Rezende —
A Souza Cruz entrou com uma ação no Judiciário, porque já tinha investido em exaustão. Cada andar tem uma área específica com sistema de exaustão e as pessoas só fumam nessas áreas. Ninguém fuma no elevador ou no restaurante. Em virtude da vigência da lei federal obtivemos a liminar e ganhamos no mérito da instância. O caso está em andamento.

ConJur — Recentemente, o Tribunal Superior do Trabalho entendeu que a empresa pode utilizar funcionários como provadores nos testes de qualidade dos cigarros que produz. Como que é essa discussão?
Antonio Rezende —
Essa é uma ação que pretende eliminar o nosso painel de avaliação sensorial que, nada mais é, do que um controle de qualidade feito, internamente, antes de colocarmos o produto para consumo. O Ministério Público do Trabalho entendeu que essa atividade seria ilegal na medida em que as pessoas faziam o uso do produto. As pessoas que participam desta etapa são empregados em outras atividades na empresa, já fumantes, e que ficam nesse setor por período de tempo pré estabelecido. Eles nem chegam propriamente a fumar o cigarro; tragam uma vez para avaliar o padrão de qualidade, sabor e efeito da mistura de fumos.

ConJur — Para o MPT, não há previsão legal para esse tipo de atividade?
Antonio Rezende —
A própria Constituição estabelece, no artigo 220, parágrafo 4º, sobre a legalidade da atividade da produção de fumo. O princípio da legalidade nos leva a ter tranqüilidade, porque não existe uma vedação. Ao contrário, existe uma autorização legal e assim não há como se imputar como ilegal uma atividade que é natural como o controle da qualidade. A Souza Cruz tem uma preocupação histórica com a qualidade dos produtos, com tipos de fumo de apreço do consumidor brasileiro e faz isso através de um rigoroso controle. Se ela não tivesse esse rigor, estaria desatendendo a legislação do consumidor.

ConJur — Isso foi proposto com base em algum caso de funcionário da empresa?
Antonio Rezende Essa ação foi movida pelo MPT como conseqüência de uma ação individual de um ex-empregado que foi dispensado. Ele entrou com uma ação trabalhista e fez uma série de alegações contra a empresa publicamente pela insatisfação da ruptura da relação de emprego. Com essa denúncia, o MPT apresentou a ação. Se essa ação for julgada procedente, vamos ter uma situação em que somente eu estaria sujeito a restrições, não legais, mas judiciais. Isso porque mais de dez fabricantes de cigarros no Brasil teriam a possibilidade de manter o seu controle de qualidade.

ConJur — As ações judiciais propostas por fumantes questionam a empresa por conta da publicidade ou pelo consumo do produto gerar doenças?
Antonio Rezende —
Elas são interligadas. As ações discutem publicidade e a relação do produto com doenças e, através dessa argumentação, tentam gerar a responsabilidade da empresa. Até 2000 existia a publicidade de cigarro no Brasil. Mas muitas ações judiciais desse tipo analisaram essa publicidade à luz da legislação e reconheceram que, embora a publicidade fosse atraente, não apontava características diferentes do produto. Ela apenas procurava atrair o consumidor para a marca específica. O fato de a publicidade ser atraente é natural de qualquer publicidade.

ConJur — E em relação à saúde?
Antonio Rezende —
Essa é outra questão, a que remete o consumo do produto a doenças associadas. E de fato há uma associação muito relevante entre o consumo e uma série de doenças associadas a ele. O que não se pode dizer é que aquela doença apontada pelo consumidor foi exclusivamente originada do consumo de cigarro, porque as doenças são, sem exceção, multifatoriais. São associadas a questões genéticas, a predisposições hereditárias, ao estilo de vida, a uma série de outros fatores que podem contribuir de maneira decisiva para a doença. Não existe uma relação médico-científica que possa apontar o consumo de maneira excludente, e sim há uma relevante associação. Essas matérias também são discutidas no processo. Mas, independentemente disso, as ações são principalmente julgadas num aspecto legal. Mesmo que houvesse essas comprovações causais, o fato é que isso não caracterizaria defeito do produto.

ConJur — Por que?
Antonio Rezende —
Porque defeito é quando uma pessoa tem intenção de usar um produto e ele não funciona como ela gostaria. Nenhuma pessoa de boa-fé vai alegar que desconhece os riscos elevados associados ao consumo do cigarro. Se ela consome o produto e está ciente desses riscos, não há nenhum defeito nesse produto que gere obrigação de indenizar pelo fabricante. A questão é muito mais uma questão legal do que uma questão de fato. O produto é de conhecimento público, comercializado sob uma forte regulamentação. Ao consumir o produto, a pessoa está dando a ele a destinação natural, ou seja, usufruir do produto, exercer seu estilo de vida e ter o prazer que pretende alcançar.

ConJur — E como os tribunais têm entendido isso?
Antonio Rezende —
Nos casos que já foram julgados definitivamente, os principais tribunais do país têm acolhido os argumentos da defesa. E não temos muitos processos. Hoje, são 330 processos em andamento. Considerando que há em torno de 20 milhões de consumidores, não é um numero muito elevado. E se considerar o número total de processos em andamento no Judiciário como um todo, são 40 milhões de ações em andamento, segundo dados do Conselho Nacional de Justiça. O número de ações discutindo essa questão não é tão significativo pela consistência das decisões judiciais a respeito desse tema.

Conjur — Pode-se dizer que há segurança jurídica quanto a essas ações?
Antonio Rezende — Eu acho importante o nível de convergência dessas decisões. É interessante porque são decididas da mesma forma no Rio de Janeiro, São Paulo, Ceará. Acho que as decisões mostram que há uma evolução no sentido de segurança jurídica no Brasil. Se fosse diferente, poderíamos gerar instabilidade em uma série de segmentos. Isso eu digo com bastante satisfação. Porque essa questão da segurança jurídica é a grande preocupação de todos advogados que atuam na advocacia empresarial.

ConJur — Entre as decisões que foram contrárias à empresa, é possível perceber algum ativismo do juiz?
Antonio Rezende —
Nas decisões que julgaram em contrário às nossas linhas de defesa, há uma interpretação subjetiva de algumas regras de caracterização de responsabilidade. Eu não sei dizer se o fator de convencimento dos magistrados foi em alguma linha de ativismo. Concordo que haja divergências de interpretação porque isso faz parte da natureza do Direito. Mas como empresa, e sempre procurando a segurança para a estabilidade do negócio, o que está em questão é a responsabilidade individual e não a desresponsabilização do indivíduo. Entendo que haja divergência de opinião e respeito os indivíduos, mas acho que o papel do juiz também é fazer uma decisão em conformidade com a legislação e não uma decisão que afronta a legislação, por qualquer que seja a opinião dele sobre o assunto.

ConJur — E como são as ações contra os fabricantes nos Estados Unidos?
Antonio Rezende —
Existe uma percepção equivocada de que, nos Estados Unidos, as ações de fumantes são julgadas a favor deles. Isso não é verdade. Nos Estados Unidos, ao longo de cinco décadas, houve mais de 7,5 mil ações individuais e essas ações foram julgadas improcedentes. Houve notícias de julgamentos em primeira instância ou segunda instância a favor dos fumantes, mas que foram revertidas depois em julgamentos finais. E houve um acordo entre as empresas e os estados americanos em uma discussão que tangenciava o reembolso das despesas médicas.

ConJur — Não eram ações de responsabilidade civil?
Antonio Rezende —
Essas ações foram movidas pelos estados americanos na década de 80. Existia um déficit tributário importante nos Estados Unidos. As empresas, até porque a tributação nos EUA é muito mais baixa do que no Brasil, fizeram um acordo para atender ao déficit de tributação dos estados. E eliminaram essa ação. A tributação nos EUA é, culturalmente, muito menor. Como eles não tinham a facilidade de aumentar impostos, os estados propuseram a ação e as empresas o acordo. As pessoas confundiram esse acordo com ação de responsabilidade civil. Não só nos Estados Unidos, mas em vários países, como Argentina, Irlanda e Itália, as ações foram julgadas improcedentes por diferentes razões. Essas ações tentam revogar desde Aristóteles a diferença entre liberdade individual e responsabilidade individual.

ConJur — Em que sentido?
Antonio Rezende —
A pessoa ficaria com a liberdade, mas não com a responsabilidade. Sempre seria culpa de outra pessoa: da empresa que fabrica o cigarro, da publicidade que foi feita, como se todo mundo que tivesse acesso àquela publicidade fosse fumante, o que não é verdade. Países com alto consumo de cigarro como a China, por exemplo, só recentemente teve publicidade. As pessoas na China fumam muito mais do que no Brasil. Na Rússia, há 10 anos era a mesma coisa. Fuma-se mais na Rússia do que no Brasil. E, mesmo aqui, onde a publicidade de massa não chegava porque não tinha rede elétrica, a percentagem de fumantes nas áreas rurais era maior do que nas urbanas. Essa tentativa de infantilização da pessoa para gerar uma responsabilidade não foi acolhida nessa discussão com diferentes argumentos jurídicos, mesmo em sistemas jurídicos diferentes do nosso.

Conjur — Além das leis antifumo, a indústria do tabaco enfrenta o impacto econômico de cigarros que entram no país de forma ilegal. Como está essa situação?
Antonio Rezende — No Brasil, 30% do total de cigarros comercializados está na ilegalidade, seja através de contrabando, sonegação fiscal ou pirataria de marcas. Essa é uma preocupação importante porque deixa de ser arrecadado, somente em tributos federais por ano, uma quantia em torno de R$ 1,5 bilhões. Quando se fala em restrição ao cigarro brasileiro, quanto pior for a equação entre poder aquisitivo e tributação, maior será o crescimento da informalidade. E a informalidade é um problema clássico na economia brasileira, e especialmente dramático em alguns setores. A demanda pelo consumo do produto sempre existiu e continuará existindo. Se não houver um bom equilíbrio entre regulamentação e tributação, os produtores formais serão penalizados. A Souza Cruz, com 60% do mercado no Brasil, sofre bastante com essa situação.

ConJur — E a indústria também tem uma tributação específica.
Antonio Rezende —
 O IPI dos cigarros tem uma alíquota específica e a tributação total sobre o produto é em torno de 64% e 65%. Por uma questão de não essencialidade, somos altamente tributados. Isso faz com que o Brasil tenha um dos cigarros mais caros do mundo, comparando o preço do produto em relação ao poder aquisitivo da população. Estudo da Fundação Getúlio Vargas, com mais de 40 países, apontou o cigarro no Brasil como o terceiro mais caro. E quanto maior a tributação incidente e a necessidade do produtor repassar o preço para o consumidor, maior será a distância entre o preço praticado pelo fabricante formal e o preço do contrabando. O nosso cigarro mais barato custa R$ 3 e o cigarro contrabandeado custa R$ 1,50.

ConJur — Como se dá o controle normativo da indústria do cigarro?
Antonio Rezende —
 O Brasil tem hoje uma das regulamentações mais severas em relação ao produto. É preciso apresentar análises químicas da matéria prima, da fumaça principal, de todos os ingredientes e componentes da fabricação do cigarro. Apresentamos as informações anualmente para o controle da Anvisa[Agência Nacional de Vigilância Sanitária]. Aliado a legislações federais, inclusive em relação à publicidade, a regulamentação do cigarro como um todo, desde a tributação até restrições e relacionamento com agência reguladora, o Brasil talvez tenha hoje um dos cenários regulatórios mais restritivos. E isso afeta os trabalhadores formais em relação aos mais de 30% do mercado que é ocupado por aqueles que sequer pagam impostos. Apoiamos regulamentações sensatas. Apenas alertamos sobre a necessidade de haver um equilíbrio do ponto de vista de fiscalização para o mercado como um todo e não somente uma que foque nos representantes formais do mercado.

ConJur — A fiscalização não é suficiente?
Antonio Rezende —
 Hoje, as autoridades alfandegárias e a Receita Federal já fazem um esforço extraordinário dentro das suas limitações. Somente em 2009, segundo dados da Receita Federal, foram apreendidos mais de um bilhão de cigarros na fronteira, o que equivale a pouco mais de 2% do mercado formal brasileiro. A maior parte é procedente do Paraguai. A informação que nós tivemos, de análises feitas pela Anvisa sobre esses produtos, é que era fumo de terceira qualidade, com restos de inseto, contaminado com defensivo agrícolas que são proibidos. São produtos colocados no mercado e não são fiscalizados. A solução passa por uma questão cultural no sentido de haver pressão política entre os países. A questão da fiscalização não vai ser suficiente se não houver uma discussão estrutural entre os países em relação a esse ponto.

ConJur — Essa discussão não ocorre hoje?
Antonio Rezende  Não que eu tenha conhecimento. Parece que existe uma preocupação, mas nada que tenha diminuído concretamente o problema. Claro que é difícil resolver uma questão estrutural como essa, especialmente em um curto prazo, mas uma evolução direcional é fundamental.

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