Prisão e tortura

Obama mantém a política de segurança de Bush

Autor

27 de agosto de 2009, 15h54

Para o presidente George W. Bush, os atentados de 11 de setembro foram um ato de guerra e um desafio ao seu sistema de inteligência. A reação, portanto, foi com ferramentas de guerra, sem observância da legislação processual. O objetivo das prisões, interrogatórios e torturas, sem que o réu tivesse sido denunciado ou processado, era coletar dados de inteligência para impedir novos ataques. O presidente Barack Obama, apesar de seu discurso, decidiu manter essa política, segundo o advogado norte-americano Joseph Margulies.

O advogado, durante palestra no 15º Seminário Internacional do IBCCrim, em São Paulo, deixou claro que a sua posição é parcial, já que defende muitos presos de Guantánamo, desde os atentados de 2001. No entanto, mostra a visão de quem acompanha de perto a situação desses estrangeiros acusados de terrorismo.
A orientação de Obama, segundo ele, continua sendo a de que se trata de um desafio de inteligência e de guerra, em que a legislação do país, aplicada aos seus cidadãos, não serve. As informações coletadas não serão usadas para o julgamento dos acusados, mas para a segurança do país. Por isso, o uso prisões fora dos Estados Unidos, onde não haverá advogados e nem tribunais.

A chegada de Obama e das decisões tomadas logo no início do seu governo passaram, para o mundo, a impressão de que os abusos seriam coibidos e que as práticas de detenção seriam transformadas, no sentido de proteção aos direitos humanos e respeito aos direitos dos cidadãos, independentemente do crime e da nacionalidade do acusado.

Ledo engano, segundo Margulies, que é além de advogado professor da Northwestern University Law School, em Chicago. Ele reconhece que, hoje, a Casa Branca mudou a sua posição, quando deixa de tomar decisões unilaterais, sem ouvir o Congresso, como fez Bush. Esse é um avanço, na opinião do advogado.
O fato de o presidente Obama ter decidido fechar as prisões secretas da CIA, os chamados black sites, na Polônia, na Lituânia, na Tailândia, foi um ato simbólico. “Ele fechou os black sites, mas eles já estavam vazios, porque a CIA já tinha deixado claro que não queria administrar as prisões. O que queriam era interrogar, não prender”, afirma.

Segundo Joseph, apesar de determinar o fechamento das prisões secretas, Obama permitiu que a CIA prendesse e interrogasse suspeitos por tempo indeterminado. “Obama ordenou que todos os interrogadores usassem o manual militar de campo, que foi escrito durante o governo Bush. Ele endossou esse documento sem qualquer modificação”, disse e acrescentou que um anexo confidencial deste manual permite que o Departamento de Defesa faça o que estava sendo feito em Guantánamo.

Uma decisão importante de Obama foi determinar o fim do programa de interrogação reforçada, em que abusos, como o chamado waterboarding, eram cometidos contra os acusados de terrorismo. No waterboarding, o preso é vendado, imobilizado e água é despejada no seu rosto, para dar uma sensação de que está se afogando. Com isso, Obama reconheceu que esse tipo de método de interrogação é tortura, o que Bush não reconheceu, mas no final de seu mandato preferiu que os seus agentes deixassem de usá-la.

Logo, a força simbólica do ato de Obama foi mais forte do que o seu resultado prático, como conclui Margulies. Ele conta que um de seus clientes, Abu Zubaida, acusado de ser um dos líderes da Al Qaeda, foi submetido ao waterboarding por 83 vezes. Outro detento de Guantánamo, segundo o advogado, foi ameaçado com uma furadeira elétrica e de ter sua família sequestrada e violentada.

O fechamento de Guantánamo, para janeiro de 2010, foi também uma decisão representativa. “Mas não vivemos em um mundo de feitos simbólicos. Pararam de usar Guantánamo, e estão mandando os presos para a Base Aérea de Bragram, no Afeganistão. Maior que Guantánamo”, ressalta.

Outra crítica feita pelo professor à posição de Obama é em relação à permissão do uso de prisão preventiva, sem denúncia ou processo judicial. O Congresso vai analisar esta proposta. No governo Bush, essa prática era corriqueira, mas não havia proposta para torná-la legal.

Segundo Joseph Margulies, como nunca aconteceu, o governo está perdendo a maior parte dos Habeas Corpus na Suprema Corte. Das 35 decisões, 29 foram em favor dos réus.

Ilusões coletivas
Dizer que é contra a política usada por George W. Bush e usar símbolos e palavras que atinjam os valores do povo americano foi a fórmula usada por Barack Obama, de acordo com o advogado Joseph Margulies, para causar a ilusão de que a sua gestão é diferente. “As pessoas não conseguem avaliar este debate de forma inteligente. Não sabem o que é verdade e o que não é, porque não têm informações. Não sabem se as pessoas detidas são ou não terroristas”, diz.

Gestos simbólicos vindos de alguém em quem acreditam é uma forma de fazer com que a população aceite e aprove as políticas implementadas, na opinião do norte-americano. “Vocês não sabem como palavras como liberdade, justiça, igualdade, dignidade são poderosas. São clichês repetidos por todas as crianças nos Estados Unidos. Imaginem a reação da população quando Obama as utiliza em seus discursos.”

O resultado, de acordo com a sua análise, é que passos modestos passam a ser vistas como uma verdadeira reforma e a impressão de que os abusos do passado, de fato, ficaram no passado.
 

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!