Restrição ao Estadão

HC não serve para locomoção virtual em sites

Autor

10 de agosto de 2009, 17h44

A proibição imposta pela Justiça do Distrito Federal ao jornal O Estado de S. Paulo de veicular reportagens sobre investigações da Polícia Federal envolvendo o filho do senador José Sarney (PMDB-AP), Fernando Sarney, gerou um pedido incomum ao Supremo Tribunal Federal. Em um Habeas Corpus, o advogado Miguel Arcanjo César Guerrieri alegou que a restrição criada pelo desembargador Dácio Vieira, do TJ-DF, o impedia de se locomover livremente pelos sites de informação. O ministro Celso de Mello, relator do caso, negou o pedido na sexta-feira (7/8). “Como se sabe, a ação de ‘habeas corpus’ destina-se, unicamente, a amparar a imediata liberdade de locomoção física das pessoas”, disse o ministro no despacho.

O autor do pedido alegou que a liminar concedida por Dácio Vieira foi uma “censura geral e irrestrita”. Vieira concedeu uma decisão no dia 31 de julho impedindo o jornal de publicar reportagens sobre a Operação Boi Barrica da Polícia Federal, que corre sob segredo de Justiça. Motivo da liminar: as conversas telefônicas grampeadas entre Fernando Sarney e seu pai foram vazadas à imprensa. A multa por descumprimento da decisão é de R$ 150 mil por reportagem. Entidades condenaram a atitude do desembargador e viram “censura prévia” em sua decisão.

Segundo Guerrieri, a restrição justificaria o Habeas Corpus diante do abuso de poder. “O paciente deseja apenas a sua liberdade de locomoção pelos sítios informativos, sem nenhuma restrição”, diz o pedido.

Para o ministro Celso de Mello, porém, o HC só cabe quando uma ação estatal cause “ofensa, atual ou iminente, à liberdade de locomoção física”, o que não se confunde com a navegação pela internet. Além disso, segundo o ministro, o Supremo não é a corte originária correta para julgar o ato do desembargador, que deveria ser contestado no Superior Tribunal de Justiça, imediatamente superior ao TJ-DFT na hierarquia judicial.

O pedido também coloca na posição de autoridade coatora o presidente do Supremo, ministro Gilmar Mendes. O motivo alegado é que ele “é o guardião maior da Constituição”. Celso de Mello rejeitou o argumento. “Inexiste qualquer ato concreto que, imputável ao excelentíssimo senhor ministro-presidente desta Suprema Corte, guarde relação de pertinência com o processo em que proferida a decisão emanada do senhor desembargador Dácio Vieira”, disse.

O ministro Gilmar Mendes e o ministro da Justiça, Tarso Genro, já afirmaram que não é possível dizer que há censura na decisão do desembargador Dácio Vieira. "Claro que não há censura. Trata-se de uma decisão judicial, que ainda é um ato monocrático do juiz e precisa ser analisado mediante recurso", afirmou o presidente do Supremo ao jornal Folha de S.Paulo. Para Tarso Genro, também não se pode falar em censura. "Não acho que seja censura. É uma decisão que juridicamente não se sustenta. O que está sendo obstado ali seria, segundo o despacho, a divulgação de fatos que podem ser inverídicos", afirmou o ministro.

O caso ainda deve chegar por outros caminhos — além dos recursos das próprias partes envolvidas — ao presidente do Supremo. O líder do PSDB no Senado, Arthur Virgílio (AM), afirmou que entraria no dia 3 de agosto com uma reclamação no Conselho Nacional de Justiça contra o desembargador Dácio Vieira. Gilmar Mendes também é presidente do CNJ. Para Virgílio, o desembargador deveria ter se declarado impedido de decidir a ação devido a sua ligação com Sarney e com o ex-diretor-geral do Senado, Agaciel Maia. “Ele arranjou uma confusão da grossa. Ele poderia ter se declarado impedido, passar ao largo disso, mas devido a essa relação tão antiga já foi assinando qualquer ilegalidade”, disse o senador ao site G1.

Medida Cautelar em Habeas Corpus 100.231-9

Clique aqui para ler a decisão.

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!