Quebra de contrato

Retenção de bem em negócio desfeito não é crime

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7 de agosto de 2009, 2h13

O deputado federal Fernando Lúcio Giacobo (PR-PR) teve suspensa, nesta quinta-feira (6/8), a análise de denúncia que o acusa de apropriação indébita de um carro retido por ele após desfeita uma negociação de compra e venda. Como a denúncia foi recebida em 1998 e o crime de apropriação tem pena máxima de quatro anos, sua prescrição teria ocorrido oito anos depois, em 2006, não sendo mais possível aplicar pena, conforme o voto do relator, ministro Carlos Britto, do Supremo Tribunal Federal.

O Plenário da corte, que julgou o processo, não fez a proclamação do resultado porque houve empate de votos entre duas correntes distintas — embora todos reconheçam que Giacobo não será punido. Carlos Britto (relator), Joaquim Barbosa (revisor), Cármen Lúcia e Ricardo Lewandowski entenderam que, ao reter o veículo após seu antigo dono desistir do negócio, o deputado cometeu crime de apropriação indébita, embora não possa ser condenado por conta da prescrição.

O ministro Joaquim Barbosa afirmou que as partes se comprometeram a devolver os respectivos veículos e desfazer o negócio, o que teria sido cumprido apenas pela vítima. O deputado, por sua vez, teria negociado o automóvel Golf com outro cliente e o carro teve de ser recuperado mediante apreensão. Isso mostraria a má-fé do deputado no negócio, na visão do relator. “A má-fé acompanhada da subjetividade negativa transforma simples ilícito civil em crime”, disse Carlos Britto, citando a doutrina do jurista Nelson Hungria.

Já os ministros Cezar Peluso, Celso de Mello, Gilmar Mendes e Marco Aurélio acreditam que não houve sequer a existência de crime, uma vez que se trata de uma questão contratual e, portanto, de Direito Civil. Segundo essa visão, Giacobo seria declarado inocente independentemente da prescrição.

Os quatro concordaram com o argumento da defesa de que, onde a norma civil é capaz de solucionar por si só o problema, ele não se torna um ilícito penal, tese conhecida como princípio da fragmentariedade do Direito Penal. O ministro Celso de Mello julgou a ação improcedente por absoluta ausência de tipicidade penal.

O ministro Peluso também entendeu que a denúncia é inepta por falta de justa causa. “É pura inexecução contratual”, disse. Ele lembrou que a apropriação indébita acontece quando a pessoa que recebe o bem tem obrigação de devolver, regra que não é válida para transações comerciais, pois quem adquire o bem não tem a obrigação de retê-lo para o caso de desistência do negócio. “Meu receio é que a Corte fixe um precedente que vai botar na cadeia pelo menos um terço da população brasileira”, disse Peluso.

Como três ministros estavam ausentes ao julgamento — Ellen Gracie, Menezes Direito e Eros Grau —, os ministros decidiram aguardar mais votos para declarar o motivo do aquivamento do processo: por prescrição do crime ou por inexistência do crime.

O caso
O deuputado federal — que tem foro para julgamento no Supremo — vendeu um carro BMW a um cliente de sua concessionária. O cliente deu seu carro Golf como entrada no negócio e assumiu notas promissórias para completar o pagamento. No entanto, passado algum tempo, quis desfazer o negócio porque não gostou do estado do carro. Para desfazer o negócio e devolver o Golf, Giacobo exigiu o pagamento de mais R$ 3 mil.

O ministro Carlos Britto criticou o comportamento da defesa do deputado no decorrer da ação. “A defesa se empenhou muito em retardar a marcha processual”, relatou. Ele citou trecho de um depoimento de testemunha que justificou sua falta em audiência designada para data anterior dizendo que o advogado informara que ele não precisaria se apresentar em juízo. Com informações da Assessoria de Imprensa do STF.

AP 480

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