Ação Civil Pública

Controle judicial da adequação do autor coletivo

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2 de agosto de 2009, 9h48

Nos países de common law, em especial, nos Estados Unidos, o controle judicial da adequação do autor coletivo é realizado como requisito de admissibilidade da class action. Já nos países de civil law, como o Brasil, uma figura mítica chamada legislador determina a priori quem tem a legitimidade ativa em determinada ação coletiva.

Sem entrar no debate de que algumas peculiaridades poderiam levar a incompatibilidade entre os sistemas de civil law e common law, parece que não existe nenhuma incompatibilidade entre as duas famílias nesse caso. Assim, não haveria nenhum inconveniente que o juiz, diante do caso concreto, pudesse controlar a adequação do autor coletivo que foi legitimado pelo legislador.

Antes de avançar no desenvolvimento deste ensaio, impende fazer uma observação pertinente, homenageando a contribuição jurídico-doutrinária de Gidi, que com seu espírito vanguardista foi um dos primeiros a elaborar vasta obra que trata da matéria, objeto principal deste trabalho, e sem o intuito de ferir egos, acompanho opinião de Watanabe (2007, p. 845) ao comentar sobre a verificação da representação adequada no direito pátrio, afirmando que “a primazia dessa idéia cabe a Antonio Gidi”.

Exatamente Gidi (2002, p.68) propôs o controle judicial da adequação do autor coletivo de lege lata (2) no sistema jurídico brasileiro, além de ter sido autor de um dos anteprojetos do Código de Processo Civil Coletivo e co-relator do Código Modelo de Processos Coletivos do Instituto Ibero-Americano de Direito Processual, que colocam nas mãos autorizadas do magistrado a verificação da adequada representação.

O objetivo do controle judicial da adequação do autor coletivo é minimizar o risco de colusão, ou seja, acordo entre os litigantes visando enganar o juiz em detrimento de um terceiro. Estimulando através da adequada representação, uma conduta vigorosa pelo representante e pelo advogado na tutela dos interesses do grupo.

Esta preocupação em evitar a colusão entre os litigantes era percebida desde os romanos, conforme ensina Scialoja (apud GIDI, 2008, p. 90) “o direito romano demonstrou enorme interesse em controlar a qualidade do representante em ações populares, excluindo, por exemplo, as pessoas sem integridade”. O autor popular deveria possuir reputação ilibada assim como cabia ao magistrado a responsabilidade de verificar quem entre os autores apresentados era o mais apto e adequado, continua o autor:

[…] o magistrado escolhe, entre os diversos cidadãos que propuseram a demanda popular, o mais idôneo […] Essa escolha da pessoa mais idônea, feita pelo juiz, é de grande importância, e acreditamos que tenha sido um erro (não sabemos até que ponto evitável) da nossa legislação, o não levar em conta esse importante momento nas ações populares.

Como a primeira ação popular fazia coisa julgada vinculante a todos os cidadãos, o grave risco de colusão deveria ser evitado:

[…] a escolha preventiva entre os autores é um elemento importantíssimo para evitar tal perigo. Quando os cidadãos mais íntegros perceberem que a ação popular foi proposta por uma pessoa suspeita, proporão a sua própria ação. O magistrado excluirá o cidadão suspeito e escolherá o melhor cidadão. Naturalmente, na escolha da pessoa mais idônea, o magistrado levava em consideração todos os elementos que podiam melhor garantir o exercício da ação de interesse comum. Se, entre os autores disponíveis, houvessem aqueles cujos interesses privados haviam sido levados pelo mesmo ato que deu lugar à ação popular, cumulando a qualidade de autor privado com a de autor cidadão, esses eram preferidos.

Verifica-se, portanto, não existir nenhuma incompatibilidade do controle judicial da representação adequada com a vetusta tradição romano-germânica.

Contudo, encontramos na doutrina brasileira (3) respeitadas vozes que não aceitam o controle judicial da representação adequada. São vários os argumentos levantados. Destacamos os mais recorrentes, como o que defende que dada a seleção prévia do legislador, a presunção de adequação seria juris et de jure, ou seja, irrefutável em direito, e por conta disso, não caberia o controle judicial pois já haveria sido realizado o controle prévio pelo legislador e portanto, a legitimação coletiva seria ope legis (4), não comportando aferição ope judicis (5) como seria realizado nas class actions norte-americanas.


Em primeiro lugar, percebe-se que essa diferenciação entre legitimidade ope legis e ope judicis está sendo utilizada de forma indiscriminada por vários autores e via de consequência comparando-a de forma equivocada no que toca a prática das class actions norte-americanas.

No direito norte-americano assim como no direito brasileiro, é através da lei escrita e não o juiz, que determina quem tem e quem não tem legitimidade para propor uma ação coletiva. É, portanto, incorreto afirmar que nas class actions norte-americanas o juiz “escolhe” o autor da demanda ou que a legitimidade nasce por uma escolha judicial.

O autor da class action é aquele que a propõe e o juiz não poderá mudá-lo, a menos que não seja membro típico do grupo ou adequado, como determina a lei escrita. É a própria Rule 23 (a) das Federal Rules of Civil Procedure que determina, por escrito, que o legitimado deve ser um membro típico do grupo e que deverá representar adequadamente os interesses do grupo, conforme o texto legal abaixo:

Um ou mais membros de um grupo podem demandar […] como representantes de todos, apenas se […] os pedidos ou defesas dos representantes são típicos dos pedidos ou defesas do grupo e […] os representantes protegerão justa e adequadamente os interesses do grupo.

Trata-se de simples subsunção dos fatos à norma escrita, perfeitamente de acordo com a tradição romano-germânica. Não se trata nem mesmo de construção jurisprudencial. O juiz não cria nada, cumpre o que está escrito na lei.

Nesse passo, diante das razões dos que advogam a impossibilidade do controle judicial da adequação do autor coletivo, bastaria que o autor coletivo fosse um dos legitimados pelo artigo 82, do Código do Consumidor ou do artigo 5º, da Lei de Ação Civil Pública, para que ele possa livremente representar “adequadamente” os interesses do grupo em juízo.

Seja permitida discordância, haja vista representar no mínimo um sofisma a afirmação de que em todos os conflitos que versem sobre direitos de grupo ao serem levados ao judiciário, por qualquer legitimado, este seja presumidamente, vigoroso, preparado, apto e adequado para representar os interesses do grupo, pelos simples fato de fazer parte de uma categoria de pessoas (associação, Ministério Público, etc.) previamente escolhidos por um legislador.

É oportuna a lição do mestre Couture (2008, p. 53):

O juiz não pode ser um signo matemático porque é um homem; o juiz não pode ser a boca que pronuncia as palavras da lei, porque a lei não tem a possibilidade material de pronunciar todas as palavras do direito; a lei procede com base em certas simplificações esquemáticas, e a vida apresenta, diariamente, problemas que não puderam entrar na imaginação do legislador […] (sem grifo no original).

A ideia de que o constituinte ou legislador, ao criar o rol de legitimados, selecionaram previamente “representantes adequados”, proibindo qualquer controle judicial sobre a atuação desses legitimados não se sustenta à luz dos princípios constitucionais, em especial, do devido processo legal. Ademais, a Constituição Federal precisa ser respeitada por todas as leis, é a supremacia da constituição enquanto fundamento de validade de todas as leis que garante essa primazia.

O constituinte ou legislador apenas fizeram uma seleção ampla e in abstrato daquelas entidades que poderiam, em tese, representar os direitos de grupo em juízo. Além do que, se os representantes escolhidos pelo legislador fossem realmente adequados, não haveria razão para a lei prever a coisa julgada secundum eventum litis, in utilibus e secundum eventum probationis. O receio de vincular os membros do grupo em sentenças desfavoráveis deriva da hesitação do legislador brasileiro com sua própria seleção de legitimados.

Faz-se necessário o crivo do magistrado nos presumidos “representantes adequados” escolhidos previamente pelo legislador, que avaliará in concreto a adequação.

Um outro argumento contra o controle judicial da representação adequada, e um dos mais utilizados é de que a coisa julgada nas ações coletivas seria apenas para beneficiar os membros do grupo e não prejudicá-los. A chamada coisa julgada secundum eventum litis e in utilibus. Segundo Gidi (2008, p. 93) é inevitável na leitura de grande parte dos autores nacionais, identificar a expressão “as sentenças coletivas beneficiam, mas nunca prejudicam e se a sentença coletiva não pode nunca prejudicar o grupo não existiria necessidade de controlar judicialmente a adequação do autor coletivo”.


É um equívoco a posição acima esposada, afirmando que sentença coletiva faz coisa julgada secundum eventum litis e se forma apenas no caso de procedência da demanda coletiva, para beneficiar os membros do grupo (in utilibus). A sentença de improcedência em ações coletivas se for dada com material probatório robusto e suficiente, faz coisa julgada coletiva material, vinculando o grupo e impedindo a propositura da mesma demanda coletiva, ou seja, poderá sim prejudicar o grupo.

Com efeito, Gidi (2008, p. 93) explica que:

[…] A coisa julgada coletiva se forma, portanto, pro et contra, independentemente do resultado do processo ter sido favorável ou contrário ao grupo titular do direito de grupo. É verdade que os membros individuais do grupo não serão atingidos pela coisa julgada coletiva e estarão livres para propor demandas individuais para proteção dos seus direitos individuais. Todavia, a mesma demanda coletiva em tutela do mesmo direito difuso, coletivo ou individual homogêneo não poderá ser reproposta por nenhum dos legitimados. Portanto, o que é secundum eventum litis não é a formação da coisa julgada coletiva, mas sua extensão à esfera jurídica individual dos membros do grupo titular do direito. Essa, sim, só ocorre para beneficiar (in utilibus), em caso de procedência da demanda coletiva […]

Ainda destacando a imprecisão de tal pensamento, destaca-se o fato de que a coisa julgada sempre se formará, independentemente do resultado da demanda ser de procedência ou de improcedência. A coisa julgada nas ações coletivas se forma pro et contra.

A grande diferença verificada de acordo com o “evento da lide”, não é a formação ou não da coisa julgada, mas o rol de pessoas por ela atingidas. Portanto, o que é secundum eventum litis não é a formação da coisa julgada, mas a sua extensão erga omnes ou ultra partes à esfera jurídica individual de terceiros prejudicados pela conduta considerada ilícita na ação coletiva, o que chamamos de extensão in utilibus da coisa julgada. Arremata Gidi (2008, p. 289):

Portanto, a sentença coletiva desfavorável ao grupo faz coisa julgada pro et contra, vinculando o grupo titular da pretensão deduzida em juízo. A via coletiva estará definitivamente preclusa e nenhum dos co-legitimados poderá propor a mesma demanda coletiva em tutela do mesmo direito de grupo, seja ele difuso, coletivo ou individual homogêneo. Essa importante realidade é tratada de maneira evasiva ou ambígua por muitos autores que enfrentam o tema.

Outrossim, o Código de Defesa do Consumidor no artigo 103, parágrafos 1º e 2º, expressa que coisa julgada nos processos coletivos em tutela de direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos poderá beneficiar, mas jamais prejudicar os direitos individuais dos membros do grupo. Nada mais que isso.

Então, listamos as três possibilidades que o CDC disciplina:

1) Em caso de improcedência após a instrução robusta e suficiente, a sentença coletiva fará coisa julgada para atingir o grupo titular do direito transindividual e impedir que qualquer legitimado do art. 82 reproponha o mesmo processo coletivo pleiteando a mesma tutela para o mesmo direito através do mesmo pedido, invocando a mesma causa de pedir. Demandas individuais, em defesa dos correspondentes direitos individuais, entretanto, continuam podendo ser propostas.

2) Em caso de improcedência após instrução insuficiente, por falta de provas, a sentença coletiva não fará coisa julgada material e, como o grupo titular do direito material não estará vinculado, o mesmo processo coletivo poderá ser reproposto por qualquer legitimado coletivo, desde que apresentando nova prova.

3) Em caso de procedência do pedido, a sentença coletiva fará coisa julgada erga omnes ou ultra partes para tutelar o bem jurídico, atingindo o grupo titular do direito de grupo, e atingindo também, somente para beneficiar, in utilibus, a esfera individual de todos os membros do grupo que sejam titulares dos correspondentes direitos individuais homogêneos, que poderão propor demandas individuais de liquidação e execução dos danos individuais.

A par disso, considera-se então, que os direitos de grupo estarão atingidos pela preclusão em caso de improcedência e a mesma demanda coletiva em tutela do mesmo direito (difuso, coletivo stricto sensu ou individual homogêneo) não poderá ser reproposta. Portanto, a coisa julgada se forma pro et contra, independentemente do resultado da demanda, para atingir os direitos essencialmente coletivos e a pretensão coletiva dos direitos individuais homogêneos.


A coisa julgada coletiva beneficia todos os membros do grupo em caso de procedência, mas não os prejudica em suas esferas jurídicas individuais, em caso de improcedência (6). Logo, em caso de improcedência do processo coletivo, cada membro do grupo poderá propor sua demanda individual em tutela do seu pretenso direito individual, mas o direito do grupo estará precluído definitivamente pela coisa julgada coletiva.

Identifica-se nesse argumento que nega a possibilidade do controle judicial da adequada representação, através da falsa ideia de que “as sentenças coletivas beneficiam, mas nunca prejudicam”, um grande obstáculo para a compreensão do verdadeiro impacto da coisa julgada coletiva no direito brasileiro e a importância de conceber instrumentos aptos a promover uma sentença coletiva que seja a mais adequada possível para tutelar os direitos dos grupos.

Outro argumento contrário ao controle judicial do autor coletivo reside na ideia defendida por Almeida (2007, p. 115) que “no sistema brasileiro existem meios próprios para o controle dos abusos e das distorções, tais como a condenação por litigância de má-fé prevista nos artigos 15 a 18 do CPC”.

Não parece apropriada a afirmação, tendo em vista que tais dispositivos são utilizados para a proteção do réu e não do grupo que se apresenta representado em juízo, além do mais, um autor coletivo pode perder um processo coletivo por desídia, incompetência ou colusão e não por má-fé. Corroborando a defesa do controle judicial da adequação do autor coletivo, temos que quando uma demanda coletiva é julgada improcedente, de nada serve para o grupo a possibilidade de condenação do representante em litigância de má-fé, pois o processo coletivo está perdido, a coisa julgada vincula o grupo e a sua repropositura na forma coletiva é impossível, ainda que a coisa julgada coletiva não vincule os direitos individuais dos membros do grupo.

Por fim, outro argumento encontrado na doutrina pátria defende que seria desnecessário o controle judicial da representação adequada, pois a participação do Ministério Público nas ações coletivas é obrigatória, no papel de custos legis. Essa teoria não contradiz o fato de que o Ministério Público está em melhores condições de controlar a adequação do autor coletivo e o magistrado de decidir sobre essa verificação ministerial.

Contudo, nem sempre se vislumbra eficiente a participação do órgão ministerial, como fiscal da lei, se ao constatar a falta de aptidão do autor coletivo em determinado caso concreto, não puder interferir alertando o magistrado sobre essa constatação e consequentemente requerer a extinção do processo coletivo sem julgamento do mérito. O que demonstra claramente neste caso, a impotência do parquet e a fragilidade dos argumentos genéricos sem a substancia prática.

Gidi (2002, p. 64) explica que diante do caso supradescrito, ao constatar a inadequação do representante em uma ação coletiva concreta, só restaria ao Ministério Público “substituir o autor coletivo e assumir o controle do litígio, ainda que não esteja preparado para fazê-lo e ainda que considere o momento inadequado”, o que não seria coerente com a defesa da adequada representação.

Proveitosa a afirmação do autor, pois de nada adiantaria admitir outro legitimado que não estivesse adequadamente preparado para o prosseguimento do processo coletivo, é correto admitir, que a substituição do legitimado deve sempre perseguir a adequação e aptidão para a defesa dos interesses do grupo representado. Por isso, defende o autor que seria mais simples admitir a possibilidade do Ministério Público demonstrar ao juiz a inadequação e requerer a extinção do processo sem julgamento do mérito, ficando suspensa a solução judicial até que outro legitimado encontre-se preparado para propor a mesma ação coletiva.

Entretanto, convém ressaltar que o Ministério Público desenvolve um serviço essencial na garantia de direitos e um dos pilares da Justiça brasileira, porém, mesmo que regada de boa-fé, boa vontade e com presunção de competência é bem verdade que o parquet, em certos casos, pode ser um representante inadequado e nesses casos, só o magistrado poderia controlar sua atuação, objetivando o efetivo e eficaz processamento do feito.


Antes de prosseguir na defesa da possibilidade do controle judicial da adequação do autor coletivo, urge pontuar alguns aspectos do itinerário legislativo brasileiro. O Projeto de Lei 3.034/84, chamado de Projeto Bierrenbach, contemplava de maneira expressa o controle judicial do autor coletivo, porém, o projeto executivo que deu origem a Lei da Ação Civil Pública retirou do texto a referência expressa do controle. O fato de que o texto aprovado da Lei da Ação Civil Pública não ter contemplado expressamente o controle, deu margem para alguns juristas defenderem que diante da rejeição tal controle judicial estaria proibido no Brasil. Como se verá a seguir não encontramos nenhuma barreira legal no ordenamento nacional que impossibilite a sua aplicação, ao contrário, é através de princípios constitucionais que ele não só é admitido como desejável.

Didier Jr. e Zaneti Jr. (2008, p. 231) além de admitirem o controle judicial da adequação do autor coletivo, indicam as fases para o seu processamento:
A análise da legitimação coletiva e por consequência, da representação adequada, dar-se-ia em duas fases. Primeiramente, verifica-se se há autorização legal para que determinado ente possa substituir os titulares coletivos do direito afirmado e conduzir o processo coletivo. A seguir, o juiz faz o controle in concreto da adequação da legitimidade para aferir, sempre motivadamente, se estão presentes os elementos que assegurem a representatividade adequada dos direitos em tela. (grifos no original).

Oportuna a explicação de Gidi (1995, p. 238):

Não são poucos os critérios através dos quais o representante deve ser avaliado pela corte para aferir a sua adequada representação. Mas, sem dúvida, a adequação na representação envolve muito mais uma questão de capacidade e habilidade por parte do pretendente do que uma questão de interesse pessoal em fazê-lo.

Em defesa da tese aqui defendida, Watanabe (2007, p. 845) ao comentar o Código do Consumidor preconizou, “quer-me parecer que o sistema brasileiro, embora não o afirme expressamente, não é avesso ao controle da ‘representatividade adequada’ pelo juiz, em cada caso concreto”.

Continua o autor corroborando a defesa:

Seguro indício da possibilidade de se adotar essa opção são um dispositivo do próprio Código de Defesa do Consumidor, bem como a postura da jurisprudência brasileira em tema de legitimação do Ministério Público às ações em defesa dos chamados direitos individuais homogêneos.

Nesse contexto, seguimos a exposição trazendo a contribuição de Lenza (2008, p. 188):

Verificado o preenchimento dos requisitos legais (o parâmetro é da lei, mas a aferição no caso concreto é do juiz), o magistrado deverá (e não poderá) dispensar o requisito da pré-constituição anua. Isso não significa que a dispensa, no caso especifico, opere, indistintamente, ope iudicis, já que os parâmetros estão previstos na lei. Por outro lado, mesmo que preenchidos os aludidos requisitos, infere-se do sistema a real possibilidade de o magistrado negar seguimento à ação em razão da inexistência de adequacy of representation. Isso porque, se é possível reconhecer representatividade adequada nas hipóteses de associação que não preencha o requisito da pré-constituição anua, no mesmo sentido, seguindo a coerência que decorre do sistema, poder-se-á declarar a falta de capacidade de representação da classe para situações em que o autor coletivo, muito embora se enquadre nos requisitos legais, mostra-se inidôneo para o ajuizamento da ação. (grifos no original).

A contribuição que mais substancia a necessidade do controle judicial da adequação do autor coletivo, é a defendida por Gidi (1995, p. 238) em relação as class actions estadudinenses e reafirmada em sua obra posterior, onde Gidi (2002, p.68) preconiza que:

Apesar de não estar expressamente previsto em lei, o juiz brasileiro não somente pode, como tem o dever de avaliar a adequada representação dos interesses do grupo em juízo. Se o juiz detectar a eventual inadequação do representante, em qualquer momento do processo, deverá proporcionar prazo e oportunidade para que o autor inadequado seja substituído por outro adequado. Caso contrário, o processo deve ser extinto sem julgamento do mérito. Se o juiz, inadvertidamente, atingir o mérito da causa, a sentença coletiva não fará coisa julgada material e a mesma ação coletiva poderá ser proposta por qualquer legitimado. (sem grifos no original).


Continua explicando o autor:

Não se trata aqui de um caso de ‘sucessão processual’ no sentido tradicional, uma vez que esta é proibida no ordenamento brasileiro na ausência de expressa previsão legal. Esse é mais um exemplo em que as categorias tradicionais do processo não se aplicam ao direito processual coletivo. De acordo com o art. 5º, § 3º, da LACP, qualquer legitimado pode assumir o processo se o autor original desistir ou abandonar a ação coletiva. Por analogia, aplica-se esse dispositivo nos casos em que o juiz considere o autor da ação coletiva um inadequado representante dos interesses do grupo.

A partir dessas premissas, destacamos que a maior justificativa para o controle judicial da adequação do autor coletivo do autor coletivo é o princípio constitucional do devido processo legal. Este princípio-fundamento, ou cláusula principiológica, como quer Freire (2008, p. 47) “irradia-se para a disciplina de todas as modalidades de processo, jurisdicional, legislativo, administrativo e negocial”, como um modelo normativo de inegável inspiração pós-positivista (7).

O princípio do due process of law, consagrado na Constituição Federal brasileira, perfez um longo caminho teórico-evolutivo até configurar-se dupla proteção aos cidadãos, atuando tanto no aspecto substancial, como no aspecto formal.

Em seu aspecto formal, o devido processo legal significa o conjunto de garantias de ordem constitucional e processual, que de um lado asseguram as partes o exercício de suas faculdades e poderes processuais e, de outro, legitimam a própria função jurisdicional.

Já no seu aspecto substancial, refere-se à maneira pela qual a lei, o regulamento, o ato administrativo ou a decisão judicial, são aplicados, de maneira a otimizar a busca de uma opção hermenêutica, legítima, efetiva e eficaz.

Dantas (2007, p. 164) um dos grandes constitucionalistas do Brasil, completa afirmando, “a expressão devido processo legal encerra vasto conteúdo, não se conformando somente com a regularidade formal do processo; reclama também para sua plena eficácia e efetiva realização da justiça, por meio de outras garantias a ela relacionadas”

Portanto, pode-se dizer que o princípio constitucional do devido processo legal funciona como padrão de legitimidade de uma opção interpretativa, já que esse mesmo princípio, em suas acepções formal e substancial, encerra valores capazes de conferir força de convencimento às decisões jurídicas.

Verificou-se que a concretização do devido processo legal não poderia circunscrever-se a mera previsão abstrata das garantias constitucionais do processo (isonomia, contraditório, ampla defesa, previsão do juiz natural, inafastabilidade da jurisdição, publicidade dos atos processuais, motivação das decisões judiciais, duplo grau de jurisdição, proibição do uso de prova ilícita e duração razoável), sendo imprescindível o desenvolvimento da acepção substancial, mediante o uso hermenêutico da ponderação principiológica e da aplicação razoável e proporcional dos direitos fundamentais dos cidadãos.

Gidi (2002, p.69) observou muito bem ao expressar:

[…] o Código do Consumidor e a Ação Civil Pública se inserem em um contexto maior, que é a Constituição brasileira e o devido processo legal. Portanto, em verdade, pouco importa que a lei infraconstitucional brasileira não preveja expressamente que o juiz deva controlar a adequação do representante. Não se trata aqui de uma questão meramente processual, mas constitucional.

Por outras palavras, há de se fazer valer a supremacia da constituição, como lei maior e fundamento de validade de outras normas, e ainda, admitir que o processo obrigatoriamente deve reconstruir-se sob o enfoque constitucional.

Zaneti Jr. (2007, p. 6) em uma obra louvável, sobre o modelo constitucional do processo civil brasileiro, destaca essa tendência:

[…] o estudo das relações entre o processo e a Constituição revela-se como o caminho que deverá permitir o reconhecimento no processo, não somente de um instrumento de justiça, mas também um instrumento de liberdade. […] a superação dos paradigmas do processo civil ‘moderno’, de um processo técnico individual e privado para um processo compreendido como fenômeno de poder, social e coletivo; a conseqüente valorização das tutelas diferenciadas; a necessidade de abertura para a adequação do processo em seu curso; a efetividade como corolário do acesso à justiça; e o devido processo legal substancial são como formas de controle do‘correto’ exercício do ‘poder’ de julgar […] (sem grifos no original).


A defesa da necessidade do controle judicial do autor coletivo, centrada no princípio do devido processo legal, substancia-se também na contribuição de Moreira (2008, p. 18), ao destacar em sua obra “O neoconstitucionalismo e a invasão da Constituição” o momento de superar o debate positivistas versus jusnaturalistas, onde ponto referencial deve ser a Constituição, e sua base principiológica, assevera o autor que “passamos de um direito em que as normas ditam o que fazer para um direito em que os princípios indicam o que se pode fazer”.

É nesse sentido que Almeida (8) (2007, p. 38) trata do neoconstitucionalismo:

O neoconstitucionalismo propõe, assim, a superação do paradigma do direito meramente reprodutor da realidade para um direito capaz de transformar a sociedade, nos termos do modelo constitucional previsto na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (arts. 1º, 3º, 5º, 6º, etc.). Esta superação deve ser realizada a partir do Estado Democrático de Direito, de forma a proporcionar o surgimento e a implementação de ordenamentos jurídicos constitucionalizados.

Em relação a importância que a aplicação do princípio constitucional tem em um ordenamento jurídico, é necessário trazer a colação entendimento de Alexy (2008, p. 90-114)

Princípios [constitucionais] são normas que ordenam que algo seja realizado na maior medida do possível dentro das possibilidades jurídicas e fáticas existentes. Princípios são, por conseguinte, mandamentos de otimização, caracterizados por poderem ser satisfeitos em graus variados e pelo fato de que a medida devida de sua satisfação não depende somente das possibilidades fáticas, mas também das possibilidades jurídicas. […] Princípios podem se referir tanto a direitos individuais quanto a direitos coletivos.

Zaneti Jr. (2009, p. 137) corroborando a idéia acima, asseverou:

A constitucionalização representa a virada do paradigma racional e político do direito processual. O processo deixa de ser um ramo do direito estudado sobre premissas rigorosamente lógicas e técnicas (fase conceitualista) e assume o claro viés de direito fundamental. Isto implica sua inserção no quadro histórico, teórico, filosófico e jurídico do neoconstitucionalismo. A fase metodológica adequada para lidar com as premissas do processo neste marco constitucionalizado é o formalismo valorativo [representando a totalidade formal do processo, faculdades e deveres dos sujeitos processuais, coordenação de sua atividade, ordenação de procedimento e organização], destarte, os valores e opções políticas da Constituição Federal atuam como forma de controle do legislador e do juiz no processo, adequando também o comportamento das partes ao Estado Democrático Constitucional. (sem grifo no original).

Bedaque (2006, p.15-53) ao comentar o papel do juiz no processo observou:

A ciência processual no Brasil encontra-se na fase de sua evolução que autorizada doutrina identifica como instrumentalista. É a conscientização de que a importância do processo está em seus resultados. […] A necessidade de o juiz assumir a efetiva posição de condutor do processo, com ampla participação no contraditório desenvolvido pelas partes, corresponde à tendência unânime da moderna ciência processual. Amplia-se dessa forma, a noção de contraditório, para incluir também a efetiva atuação do juiz no desenvolvimento da relação processual. (sem grifo no original).

É possível identificar feixes distorcidos do controle da adequação do autor coletivo no plano jurisprudencial, com no caso da exigência de pertinência temática dos legitimados para propositura de ações no controle concentrado de constitucionalidade. A suprema corte, vem exigindo que os chamados legitimados relativos do art. 103, IV, V e IX, da Constituição Federal preencham tal requisito, que não se encontra expressa na legislação pátria.

Entende-se, que no caso acima não se trata de controle judicial da adequação do autor coletivo, mas sim, uma exigência discriminatória tendo em vista não se verificar a pertinência temática dos outros legitimados, considerados legitimados universais e “presumidamente aptos”.


A exigência da pertinência temática (9)é duramente criticada por Almeida (2003, p. 252) “a restrição é descabida porque distingue onde a CF não distinguiu, sendo o processo de ADIn de natureza objetiva, não há que se perquirir de pertinência temática para o seu ajuizamento”. Correta a afirmação do autor, tendo em vista que nesse caso o processo assume caráter objetivo, cujos figurantes não ostentam a condição de partes interessadas na defesa de direitos individuais ou coletivos (específicos), somente estão voltados à proteção da ordem jurídica.

Sem embargo do exposto, diferentemente da pertinência temática exigida em sede de ações coletivas, onde o autor coletivo seja por exemplo uma associação de moradores, cujo objeto da ação seja diametralmente diverso de sua finalidade estatutária (10), nesse caso, através do controle judicial da representação adequada deve o magistrado perquirir a referida pertinência.

Além de tudo que já foi exposto, não se pode olvidar que o princípio do acesso à justiça liga-se essencialmente ao direito a uma ordem jurídica justa e ao princípio do devido processo legal, representando no transcurso de sua evolução histórica, um processo capaz de tutelar com efetividade e eficácia o direito material pleiteado.

Vale ressaltar, exemplo advindo da praxis forense, que continua demonstrando a necessidade do controle judicial da adequação do autor coletivo, em Godinho (2005, p. 613):

A Constituição e o Estatuto do Idoso autorizam que os idosos tenham acesso gratuito ao transporte coletivo urbano, bastando que seja comprovada a idade. As empresas de ônibus urbanos da cidade do Rio de Janeiro resolveram impor aos idosos um prévio cadastro para pudessem usufruir do beneficio e negam acesso aos coletivos a quem não estiver cadastrado, sendo que tal cadastro foi suspenso pelas próprias empresas. Afora a bizarrice da suspensão do cadastro e da manutenção da exigência de um cartão que simplesmente não era emitido sem o prévio cadastro, o certo é que a exigência de um cartão especial (denominado de ‘rio card’) adquirido a partir desse mesmo cadastro é claramente inconstitucional. Mesmo assim, o Estado do Rio de Janeiro ajuizou ação coletiva visando regulamentar a expedição do cartão para o acesso aos coletivos e a determinar o imediato reinício do cadastramento. Ou seja: ao invés de combater o comportamento abusivo das empresas, O Estado, na condição de legitimado ativo, utilizou uma ação coletiva para coonestar a prática das empresas, referendando, por via oblíqua, a lesão aos direito dos idosos […] (sem grifos no original).

Ademais, conforme ensina Gidi (2002, p.70):

Através desse novo devido processo legal, os direitos de ser citado, de ser ouvido e de apresentar defesa em juízo são substituídos por um direito de ser citado, ouvido e defendido através de um representante. Mas não através de um representante qualquer: o grupo deve ser representado em juízo por um representante adequado. Não somente no direito americano, portanto, mas também no direito brasileiro, não há de se falar em ‘representante inadequado’. Trata-se de uma contradição em termos. Todo representante é, por definição, adequado. Caso contrário não houve representação legítima. […] A adequação legítima convalida a atividade do representante. […] Essa adequação deve ser submetida a um rigoroso controle judicial.

Uma passagem dos escritos traduzidos de Couture (2008, p. 67), solidifica a defesa que se expôs até aqui, destacando o papel do juiz no processo, pois “o processo coloca em movimento o magistrado, que deve dizer o direito, sua função não é somente interpretar a lei , mas também adaptar à lei e às regras de direito as questões não previstas pelo legislador”.

Cappelletti e Garth (2002, p. 50) em clássica obra “Acesso à justiça”, preconizavam que:

[…] a proteção de tais interesses tornou necessária uma transformação do papel do juiz e de conceitos básicos como a ‘citação’ e o ‘direito de ser ouvido’. Uma vez que nem todos os titulares de um direito difuso podem comparecer a juízo – por exemplo, todos os interessados na manutenção da qualidade do ar, numa determinada região – é preciso que haja um ‘representante adequado’ para agir em beneficio da coletividade, mesmo que os membros dela não sejam ‘citados’ individualmente. Da mesma forma, para ser efetiva, a decisão deve obrigar a todos os membros do grupo, ainda que nem todos tenham tido a oportunidade de ser ouvido. Dessa maneira, outra opção tradicional, a da coisa julgada, precisa ser modificada, de modo a permitir a proteção judicial efetiva dos interesses difusos. […] (sem grifo no original).


Benjamin (1995, p. 6-7) explica que o acesso à justiça é muito mais que o simples acesso ao judiciário e justificativa asseverando:

No que tange ao seu campo de aplicação, a expressão acesso à justiça dá ensejo a três enfoques básicos. Em sentido restrito, refere-se apenas acesso à tutela jurisdicional, ou seja, à composição de litígios pela via judicial. Insere-se e opera, por princípio, no universo do processo. Já em sentido mais amplo, embora ainda insuficiente, quer significar acesso à tutela de direitos ou interesses violados, através de mecanismos jurídicos variados, judiciais ou não. Num e noutro caso, os instrumentos de acesso à justiça podem ter natureza preventiva, regressiva ou reparatória. Finalmente, numa acepção integral, é acesso ao Direito, vale dizer, a uma ordem jurídica justa (= inimiga dos desequilíbrios e destituída de presunção de igualdade), conhecida (= social e individualmente reconhecida) e implementável (= efetiva), contemplando e combinando, a um só tempo, um rol apropriado de direitos, acesso aos tribunais, acesso a mecanismos alternativos (principalmente os preventivos), estando os sujeitos titulares plenamente conscientes de seus direitos e habilitados, material e psicologicamente a exercê-los, mediante a superação das barreiras objetivas e subjetivas […]; é nessa última acepção dilatada que acesso à justiça significa acesso ao poder.

Assim, Cappelletti e Garth (2002, p. 12) não deixam dúvidas quanto a função social contida na adequada representação em face aos direitos de grupo:

O acesso à justiça pode, portanto ser encarado como requisito fundamental – o mais básico dos direitos humanos – de um sistema jurídico moderno e igualitário que pretenda garantir, e não apenas proclamar os direitos de todos […] Os juristas precisam, agora, reconhecer que as técnicas processuais servem a funções sociais. (sem grifo no original).

Já quase finalizando esse ensaio, convém lembrar a lição de Bobbio (1999, p. 63): “descendo do plano ideal ao plano real, uma coisa é falar dos direitos do homem, direitos sempre novos e cada vez mais extensos e justificá-los com argumentos convincentes, outra coisa é garantir-lhes uma proteção efetiva”.

Cumpre destacar, que há verdadeira necessidade do controle judicial do autor coletivo para que a decisão jurisdicional prolatada seja eficaz, assegure efetivamente aos integrantes do grupo que o representante esteja em um grau de transmitir no processo toda amplitude dos direitos em jogo, e principalmente, seja produzida por meio de um processo que a torne legítima com as regras aplicáveis a esse processamento, interpretadas sob a luz constitucional do acesso à justiça e do devido processo legal.

Assim, o juiz tem o dever de verificar, no caso concreto, se o grupo está adequadamente representado, para que possa produzir um provimento jurisdicional justo e efetivo. Devemos lembrar a lição pertinente de Nery Jr. (2008, p. 179) “como o processo civil é ciência instrumental, as afirmações da doutrina têm de ter consequências de ordem prática, sob pena de se classificarem como meras questões acadêmicas”.

Neste contexto, justifica-se a necessidade do controle judicial da adequação do autor coletivo, como sendo não só instrumento de justiça, obrigatório no Estado Democrático de Direito, mas também um instrumento de liberdade que através da efetividade processual, enquanto corolário do acesso à justiça e do devido processo legal em sua concepção pós-positivista, chancelam sem a necessidade de mudanças legislativas o controle judicial.

Ser contra o controle judicial da representação adequada significa ser a favor da possibilidade de uma representação inadequada dos direitos de grupo em demandas coletivas, o que é injusto, incoerente e inaceitável frente à Lei Máxima do país.

Referências

2. A expressão latina de lege lata significa da lei criada, enquanto que de lege ferenda refere-se a uma lei a ser criada.
3. Autores que demonstram opinião contrária ao controle judicial da adequação do autor coletivo do autor coletivo: Almeida (2003, p. 528); Lengruber da Silva (2004, p. 184); Santos (2008, p. 101); Shimura (2006, p. 53); Leal (1998, p. 211); Vigliar (2005, p. 67); Maciel Júnior (2006, p. 188); Venturi (2007, p. 224) e Nery Jr. (2007, p. 1.040). Enquanto que a doutrina brasileira que defende o controle, partiu das proposições de Gidi (1995, p. 238) e (2002, p. 68) e são encontradas em: Watanabe (2007, p. 845); Didier Jr.; Zaneti Jr. (2008, p. 231); Spalding (2006, p. 192); Carvalho Neto (2008, p. 75); Lenza (2007, p. 188); Castro Mendes (2006, p. 288); Rocha (2007, p. 143); Mancuso (2007, p. 430); Godinho (2005, p. 613). Encontramos ainda, Mazzilli (2002, p. 235) que admite o controle judicial apenas para associações, sindicatos, fundações e entidades da administração pública indireta, porém, é terminantemente contra sujeição do Ministério Público ao controle judicial da representação adequada. Essa posição permite uma crítica imediata, tendo em vista a idéia estar ligada muito mais a uma posição corporativista de que “o MP não pode se submeter ao Judiciário” do que uma posição doutrinária. Situação interessante encontra-se nos escritos de Grinover (1999, 2007), que se dizia contra, exaltando as dificuldades de se admitir tal controle no ordenamento brasileiro, contudo, em artigo publicado na Rivista di diritto procesuale (apud ROCHA, 2007, p. 143) e na atualização da obra em que comenta o CDC na edição de 2007, admite que o controle da adeguata rappresentativitá pelo juiz não seria contrário ao ordenamento jurídico brasileiro, expressando coincidentemente que “a aferição pelo juiz brasileiro, não é proibida, mas antes é recomendada pelo sistema, de lege lata”.
4. A expressão latina ope legis significa por força de lei.
5. A expressão latina ope judicis significa por força judicial ou do juiz.
6. Outro equívoco reproduzido na doutrina pátria é a afirmação de que a coisa julgada coletiva, em sentença de improcedência proferida após prova robusta e suficiente, atinge os legitimados para propor a demanda coletiva. Ensina Gidi (2008, p. 297) que “Os legitimados coletivos, não sendo titulares da pretensão de direito material, mas meros “porta-vozes”, não podem ser atingidos pela coisa julgada, pois são meros instrumentos para a realização do direito”. Como exemplo pode-se destacar uma demanda individual julgada improcedente, proposta por um menor de 16 anos, absolutamente incapaz, representado pelo pai. Nesse caso, quem perde o direito e, via de conseqüência, quem é atingido pela coisa julgada é o menor de 16 anos, o suposto titular do direito. O pai não é atingido pela coisa julgada, não perde nenhum direito (assim como o outro representante, o advogado, também não perde nada). Se o pai propuser a mesma demanda novamente, em tutela do mesmo direito do filho, ela será extinta devido à coisa julgada, não porque o pai tenha sido atingido por ela, mas porque o menor o foi.
7. A concepção de “Pós-positivismo” deve ser entendida como sendo o encontro da norma com a ética, introduzindo no ordenamento jurídico as idéias de justiça e legitimidade, materializadas em princípios.
8. Mesmo diante das idéias neoconstitucionais, o autor supracitado não aceita o controle judicial da representação adequada, pois acredita ser inconstitucional e incompatível com o ordenamento jurídico brasileiro, acreditando que o controle da adequação já teria sido feito pelo legislador. Com a devida vênia discorda-se frontalmente desses argumentos, conforme fundamentação exposta ao longo desse estudo.
9. A pertinência temática em uma análise semântica significa o núcleo estável que concentra os traços distintivos de certo grupo. São traços nítidos e constantes, que, examinados revelam-se exclusivos em seu conjunto. Transportando para o nosso assunto, a pertinência temática representa o vínculo que deve ter o legitimado com o os interesses do grupo que representa, em outras palavras, o nexo material entre os fins institucionais do legitimado ativo e a tutela pretendida na ação coletiva.
10. TRF – 2ª Região (3ª. Turma) AC 159.652/RJ – Rel. Des. José Neiva (DJU 02.03.2005, p. 100): Ilegitimidade da Associação de Moradores e Amigos do Jardim Botânico – Inadequação entre o objeto e a finalidade estatutária da associação […] Ausência de representatividade adequada do grupamento substituído processualmente, pela associação […] diante da não ocorrência de congruência entre o objeto pretendido e os fins estatutários da entidade […] sendo imprescindível o requisito da pertinência temática […]

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