Ordem na defesa

MP não pode falar depois de defesa preliminar

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19 de abril de 2009, 21h57

O Ministério Público não pode se manifestar depois da defesa preliminar do denunciado. A opinião é do próprio Ministério Público. Em parecer enviado ao Superior Tribunal de Justiça, a subprocuradora-geral da República Deborah Macedo Duprat de Britto Pereira opina que seja retirada da denúncia contra o ex-reitor da Universidade de Brasília (UnB), Timothy Mulholland, a manifestação do Ministério Público Federal feita depois da defesa prévia ao recebimento da denúncia.

A discussão está nas mãos da 5ª Turma do STJ. Mulholland foi denunciado pelo MPF por crime de peculato (duas vezes) e formação de quadrilha. Os advogados do ex-reitor ofereceram a defesa preliminar e depositaram garantias em juízo. O juiz, então, notificou o Ministério Público para se manifestar sobre a resposta da defesa.

Em pedido de Habeas Corpus, a defesa do ex-reitor afirma que a manifestação do MP, nestes casos, é inconstitucional e fere o devido processo legal. O ministro Arnaldo Esteves, relator do caso no STJ, indeferiu pedido de liminar para suspender o curso da denúncia. Com o parecer do MP, o mérito já pode ser julgado.

No parecer (clique aqui para ler a íntegra), a subprocuradora revela a sensibilidade com a obediência às regras do processo que muitas vezes falta a alguns de seus colegas. Deborah escreve que a “não observância ao devido processo legal, na forma como previsto em diploma legal, constitui ofensa a preceito que veicula norma de direito fundamental, e, portanto, a nulidade que daí decorre jamais pode ser tida como meramente relativa”. E completa: “O desrespeito a direito fundamental tem por nota prejuízo ínsito e impossibilidade de convalidação”.

Com essas e outras observações, a subprocuradora recomenda que o STJ determine o desentranhamento da manifestação do Ministério Público, feita depois da defesa preliminar, do processo contra o hoje professor da UnB. A recomendação vai ao encontro da alegação dos advogados do professor, segundo os quais “ao falar por último nos autos, o Ministério Público ignorou a lógica processual penal que resguarda a possibilidade de a defesa por último se manifestar”.

Palavra final

A questão gira em torno do artigo 514 do Código de Processo Penal. De acordo com o dispositivo, “nos crimes afiançáveis, estando a denúncia ou queixa em devida forma, o juiz mandará autuá-la e ordenará a notificação do acusado, para responder por escrito, dentro do prazo de quinze dias”. Ou seja, antes de decidir se recebe a denúncia, o juiz permite a manifestação do denunciado. Advogados reclamam que, na prática, essa defesa prévia está ajudando o MP a corrigir falhas nas denúncias. O que fere o direito à ampla defesa.

Timothy Mulholland recorreu ao STJ porque em primeira e segunda instância os juízes consideraram que a réplica do Ministério Público não afronta a garantia da ampla defesa. Para o juiz de primeiro grau, o pronunciamento do MP “após a fase do art. 514 do CPP, mas antes de analisada a denúncia já oferecida, não enseja prejuízo aos denunciados, a quem, igualmente, já se garantiu amplo exercício do direito de defesa”. O entendimento foi mantido pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região.

No pedido ao STJ, os advogados apontam para a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, no sentido de que a defesa tem o direito de, sempre, usar a palavra por último — e elencam votos dos ministros Marco Aurélio e Menezes Direito para corroborar a tese. Sustentam, ainda, que não é necessário demonstrar o prejuízo da parte nos casos de nulidade absoluta, como na ofensa ao devido processo legal.

Os advogados Frederico Donati Barbosa, Aldo de Campos Costa, Marcelo Turbay Freiria, Conrado Donati Antunes e Mayra Cotta Cardozo de Souza assinam o pedido de Habeas Corpus que tramita na 5ª Turma do STJ. A defesa pede o desentranhamento da manifestação do Ministério Público ou que o denunciado possa responder à réplica do MP.

Dinheiro acadêmico

Timothy Mulholland renunciou ao cargo de reitor da UnB depois de começar a ser investigado por mau uso de dinheiro da Fundação de Empreendimentos Científicos e Tecnológicos (Finatec). O ex-reitor é acusado de comprar mobiliário de luxo com recursos da fundação para o seu apartamento funcional.

Na semana passada, o juiz federal Marcus Vinicius Reis Bastos, da 12ª Vara do Distrito Federal, rejeitou uma das denúncias por peculato apresentada pelo Ministério Público contra Mulholland (clique aqui para ler mais). O juiz afirmou que não foram apresentadas as “circunstâncias” do crime de peculato. “É que, a par de afirmar o desvio dos cofres públicos, não expõe as circunstâncias pelas quais teria sido perpretado o crime. A inicial acusatória silenciou acerca de quanto, quando, onde, como e em beneficio de quem os valores foram irregularmente empregados ”, escreveu.

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