Dinheiro de volta

Não incide IR sobre pagamento de férias não gozadas

Autor

  • Marco Aurélio Paganella

    é membro do escritório Fernando Nagao Cardono Alvarez Jr. & Advogados. Bacharel em Direito pela UNISA - Universidade de Santo Amaro/SP. Especialista em Direito Constitucional e em Direito Tributário pelo IICS/CEU - Instituto Internacional de Ciências Sociais/Centro de Extensão Universitária/SP.

4 de abril de 2009, 6h37

O presente artigo tem por escopo traçar algumas linhas no sentido de favorecer o entendimento do tema em tela, podendo, por conseguinte, auxiliar sobremaneira o contribuinte que, porventura, se encontra nesta situação, e que deseja e tem por direito reaver valores recolhidos indevidamente e/ou a maior perante o Fisco.

Neste sentido, segue, pois, estudo relativamente minucioso acerca do assunto, com indicação, ao final, dos possíveis caminhos a serem seguidos no intuito da recuperação do indébito.

No Capítulo IV — Das Férias Anuais, Seção I — Do Direito a Férias e sua Duração, da Consolidação das Leis Trabalhistas do Brasil (CLT), nos termos do artigo 143, é factível ao empregado a conversão de um terço, isto é, 10 dos 30 dias, de suas férias em abono pecuniário, a conferir:

“Art. 143 — É facultado ao empregado converter 1/3 (um terço) do período de férias a que tiver direito em abono pecuniário, no valor da remuneração que lhe seria devida nos dias correspondentes.”

Em diversos casos, muitos trabalhadores que trocaram este um terço de descanso pelo abono pecuniário saíram perdendo, haja vista que até então havia a incidência do Imposto de Renda (IR) sobre este valor, o que acarretou uma dupla perda, isto é, ficaram sem o período de férias e também sem o dinheiro, que ia diretamente para os cofres da Receita Federal, tendo em vista o desconto já na fonte.

Apenas os que procuraram a Justiça conseguiram reaver o valor, dado que é assente na Corte Federal (Superior Tribunal de Justiça – STJ) que se trata de verba indenizatória e não remuneratória, conforme assevera o mnistro Luiz Fux da 1ª Turma em 21/10/2008, no Agravo Regimental no Recurso Especial (AgRg no REsp) 983056/SE, publicado no DJe em 13/11/2008:

“[…] 4. É cediço na Corte que têm natureza indenizatória, a fortiori afastando a incidência do Imposto de Renda, o abono de parcela de férias não gozadas (art. 143 da CLT), bem assim as verbas advindas de licença-prêmio não gozada, mercê da inexistência de previsão legal, sendo prescindível se o correram ou não por necessidade do serviço, na forma da aplicação analógica da Súmulas 125/STJ, verbis: ‘O pagamento de férias não gozadas por necessidade do serviço não está sujeito à incidência do Imposto de Renda.’, e da Súmula 136/STJ, verbis: ‘O pagamento de licença-prêmio não gozada, por necessidade do serviço, não está sujeito ao Imposto de Renda.’

(Precedentes: REsp 706.880/CE, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJ 17.10.2005; REsp 769.817/PB, Rel. Min. Castro Meira, DJ 03.10.2005; REsp 499.552/AL, Rel. Min. Peçanha Martins, DJ 19.09.2005; REsp 320.601/DF, Rel. Min. Franciulli Netto, DJ 30.05.2005; REsp 685.332/SP, Rel. Min. Eliana Calmon, DJ 14.02.2005; AgRg no AG 625.651/RJ, Rel. Min. José Delgado, DJ 11.04.2005). […]”

É de boa nota destacar que o abono pecuniário de um terço supra mencionado (CLT – Art. 143) é diferente do também um terço remuneratório de férias determinado pelo inciso XVII, do artigo 7º, da Constituição da Republica Federativa do Brasil, a saber:

“Art. 7º — São Direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria da sua condição social:

[…]

XVII — gozo de férias anuais remuneradas com, pelo menos, um terço a mais do que o salário normal;”

Na esteira, a Lei Ordinária 10.522/02, que ‘Dispõe sobre o Cadastro Informativo dos créditos não quitados de órgãos e entidades federais e dá outras providências’, permite que, por economia e respeito à sociedade, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) se exima de prosseguir em feitos que sabidamente o resultado será contrário, evitando assim, os até então mesquinhos efeitos protelatórios tão visados e utilizados pelo governo em diversas ocasiões. Assim estatui o aludido Diploma Legal:

“Art. 19. Fica a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional autorizada a não contestar, a não interpor recurso ou a desistir do que tenha sido interposto, desde que inexista outro fundamento relevante, na hipótese de a decisão versar sobre: (Redação dada pela Lei nº 11.033, de 2004)


II — matérias que, em virtude de jurisprudência pacífica do Supremo Tribunal Federal, ou do Superior Tribunal de Justiça, sejam objeto de ato declaratório do Procurador-Geral da Fazenda Nacional, aprovado pelo Ministro de Estado da Fazenda.

§ 4º A Secretaria da Receita Federal não constituirá os créditos tributários relativos às matérias de que trata o inciso II do caput deste artigo.”

Destarte, tendo por supedâneo o Comando Normativo supra, a Fazenda Nacional emitiu um Ato Declaratório (o de nº 6, sem exclusão de outros similares e com mesmo sentido) que reconhece sobremaneira a não-incidência de IR sobre o um terço de abono pecuniário de férias não-Gozadas, como é perceptível:

“AD PGFN 6/06 – AD – Ato Declaratório PROCURADOR-GERAL DA FAZENDA NACIONAL – PGFN nº 6 de 16.11.2006

D.O.U.: 17.11.2006 Ret. DOU de 20.11.2006

(Dispõe sobre a dispensa da apresentação de contestação, e da interposição de recursos e autoriza a desistência dos já interpostos, desde que inexista outro fundamento relevante, nas ações judiciais que visem obter a declaração de que não incide imposto de renda sobre o abono pecuniário de férias de que trata o art. 143 da CLT, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452/43)

O procurador-geral da Fazenda Nacional, no uso da competência legal que lhe foi conferida, nos termos do inciso II do artigo 19, da Lei 10.522, de 19 de julho de 2002, e do artigo 5º do Decreto 2.346, de 10 de outubro de 1997, tendo em vista a aprovação do Parecer PGFN/CRJ/Nº 2140/2006, desta Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, pelo senhor ministro de Estado da Fazenda, conforme despacho publicado no DOU de 16 de novembro de 2006, declara que ficam dispensadas a apresentação de contestação, a interposição de recursos e fica autorizada a desistência dos já interpostos, desde que inexista outro fundamento relevante:

‘nas ações judiciais que visem obter a declaração de que não incide imposto de renda sobre o abono pecuniário de férias de que trata o artigo 143 da Consolidação das Leis do Trabalho — CLT, aprovada pelo Decreto-Lei 5.452, de 1º de maio de 1943’.

JURISPRUDÊNCIA: REsp nº 785474/SC, (DJ de 03.04.2006), Resp nº 815172/CE, (DJ de 23.03.2006), REsp nº 797392/PR (DJ de 03.04.2006), REsp nº 261989/AL (DJ de 13.11.2000).”

Ora, sendo assim, pelo princípio constitucional da igualdade, se para aqueles que estavam na Justiça buscando o reconhecimento deste Direito, este o veio sponte propria e erga omnes da parte dos representantes do Governo, tanto da PGFN, como da Secretaria da Receita Federal — SRF, é certo que, pela lógica, este mesmo Direito se estende também aos que não foram à Justiça, relativamente cara, no Brasil.

Para resolver este caso, basta, tão-somente, que a Pessoa Física efetue a retificação das Declarações de Pessoa Física a partir de 2006 (Declaração Retificadora), bem como, a partir de 2009, as Pessoas Jurídicas incumbidas da retenção na fonte desta cobrança, não mais o façam.

Isto porque, o próprio Código Tributário Nacional (CTN), Livro II, Capítulo IV, Seção III — Pagamento Indevido, dá guarida à Repetição de Indébito ao contribuinte no caso de Pagamento Indevido e/ou a Maior:

“Art. 165. O sujeito passivo tem direito, independentemente de prévio protesto, à restituição total ou parcial do tributo, seja qual for a modalidade do seu pagamento, ressalvado o disposto no parágrafo 4º do artigo 162, nos seguintes casos:

I — cobrança ou pagamento espontâneo de tributo indevido ou maior que o devido em face da legislação tributária aplicável, ou da natureza ou circunstâncias materiais do fato gerador efetivamente ocorrido;”

O mesmo CTN, reconhecendo o direito à restituição, estabelece o prazo, do mesmo modo que a Lei Complementar 118/05 determina a forma como deve ser interpretado esta disposição:

“‘CTN — Art. 168. O direito de pleitear a restituição extingue-se com o decurso do prazo de 5 (cinco) anos, contados:

I – nas hipóteses dos incisos I e II do artigo 165, da data da extinção do crédito tributário;’


‘LC 118/05 — Art. 3º — Para efeito de interpretação do inciso I do artigo 168 da Lei 5.172, de 25 de outubro de 1966 — Código Tributário Nacional, a extinção do crédito tributário ocorre, no caso de tributo sujeito a lançamento por homologação, no momento do pagamento antecipado de que trata o § 1o do art. 150 da referida Lei.’

‘CTN — Art. 150 — § 1º — O pagamento antecipado pelo obrigado nos termos deste artigo extingue o crédito, sob condição resolutória da ulterior homologação ao lançamento.’”

A jurisprudência do STJ corrobora este entendimento, nos termos do voto do Min. Luiz Fux da 1ª Turma em 07/10/2008, no Agravo Regimental no Recurso Especial (AgRg no REsp) 933.314/PE, publicado no DJe em 03/11/2008:

“PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA. VERBA INDENIZATÓRIA. LICENÇA PRÊMIO. NÃO-INCIDÊNCIA. SÚMULAS N.º 125, 136 E 215 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. DECLARAÇÃO RETIFICADORA. AUTO DE INFRAÇÃO. PRESCRIÇÃO PARA AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO.

1. O imposto de renda não incide em verba indenizatória, por isso é cediço na Corte que não recai referida exação:

a) no abono de parcela de férias não-gozadas (art. 143 da CLT), mercê da inexistência de previsão legal, na forma da aplicação analógica da Súmulas 125/STJ, verbis: “O pagamento de férias não gozadas por necessidade do serviço não está sujeito à incidência do Imposto de Renda.”, e da Súmula 136/STJ, verbis: “O pagamento de licença-prêmio não gozada, por necessidade do serviço, não está sujeito ao Imposto.”

b) nas férias não-gozadas, indenizadas na vigência do contrato de trabalho, bem como as licenças-prêmio convertidas em pecúnia, sendo prescindível se ocorreram ou não por necessidade do serviço, nos termos da Súmula 125/STJ.

3. O advento da LC 118/05 e suas conseqüências sobre a prescrição, do ponto de vista prático, implica dever a mesma ser contada da seguinte forma: relativamente aos pagamentos efetuados a partir da sua vigência (que ocorreu em 09.06.05), o prazo para a repetição do indébito é de cinco a contar da data do pagamento; e relativamente aos pagamentos anteriores, a prescrição obedece ao regime previsto no sistema anterior, limitada, porém, ao prazo máximo de cinco anos a contar da vigência da lei nova.

4. Consectariamente, em se tratando de pagamentos indevidos efetuados antes da entrada em vigor da LC 118/05 (09.06.2005), o prazo prescricional para o contribuinte pleitear a restituição do indébito, nos casos dos tributos sujeitos a lançamento por homologação, continua observando a cognominada tese dos cinco mais cinco, desde que, na data da vigência da novel lei complementar, sobejem, no máximo, cinco anos da contagem do lapso temporal (regra que se coaduna com o disposto no artigo 2.028, do Código Civil de 2002, segundo o qual: "Serão os da lei anterior os prazos, quando reduzidos por este Código, e se, na data de sua entrada em vigor, já houver transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada.").

5. Por outro lado, ocorrido o pagamento antecipado do tributo após a vigência da aludida norma jurídica, o dies a quo do prazo prescricional para a repetição/compensação é a data do recolhimento indevido.”

Reiterando a compreensão, segue anotação da ministra Eliana Calmon, da 2ª Turma em 04/09/2008, no Recurso Especial (REsp) 910262 / SP, publicado no DJe em 08/10/2008:

“TRIBUTÁRIO — IMPOSTO DE RENDA — ART. 43 DO CTN — VERBAS: NATUREZA INDENIZATÓRIA X NATUREZA REMUNERATÓRIA.

1. O fato gerador do imposto de renda é a aquisição de disponibilidade econômica ou jurídica decorrente de acréscimo patrimonial (art. 43 do CTN).

2. A jurisprudência desta Corte, a partir da análise do art. 43 do CTN, firmou entendimento de que estão sujeitos à tributação do imposto de renda, por não possuírem natureza indenizatória, as seguintes verbas:


a) "indenização especial" ou "gratificação" recebida pelo empregado quando da rescisão do contrato de trabalho por liberalidade do empregador;

b) verbas pagas a título de indenização por horas extras trabalhadas;

c) horas extras;

d) férias gozadas e respectivos terços constitucionais;

e) adicional noturno;

f) complementação temporária de proventos;

g) décimo-terceiro salário;

h) gratificação de produtividade;

i) verba recebida a título de renúncia à estabilidade provisória decorrente de gravidez; e

j) verba decorrente da renúncia da estabilidade sindical.

3. Diferentemente, o imposto de renda não incide sobre:

a) APIP’s (ausências permitidas por interesse particular) ou abono-assiduidade não gozados, convertidos em pecúnia;

b) licença-prêmio não-gozada, convertida em pecúnia;

c) férias não-gozadas, indenizadas na vigência do contrato de trabalho e respectivos terços constitucionais;

d) férias não-gozadas, férias proporcionais e respectivos terços constitucionais, indenizadas por ocasião da rescisão do contrato de trabalho;

e) abono pecuniário de férias;

f) juros moratórios oriundos de pagamento de verbas indenizatórias decorrentes de condenação em reclamatória trabalhista;

g) pagamento de indenização por rompimento do contrato de trabalho no período de estabilidade provisória (decorrente de imposição legal e não de liberalidade do empregador).

4. Hipótese dos autos em que se questiona a incidência do imposto de renda sobre verbas pagas espontaneamente pelo empregador e férias convertidas em pecúnia no momento da rescisão do contrato de trabalho.

5. Recurso especial parcialmente provido.”

É o parecer.

Conclusão

Destarte, tendo por supedâneo a exegese logo atrás trazida à colação, segue, pois, o resumo/síntese conclusivo:

a) a partir de 2009, a Pessoa Física está desobrigada de reter na fonte o IR devido ao trabalhador que “trocar” (sic) 10 dias de suas férias pela remuneração de 1/3 do seu salário (CLT art. 143).

b) a partir de 2006, inclusive, basta à Pessoa Física efetuar uma Declaração Retificadora para a devida restituição do pagamento indevido e/ou à maior em face à “venda” (sic) dos 10 dias de suas respectivas férias (verba indenizatória).

c) de 2005, inclusive, para trás, deverá observar o prazo prescricional, e a repetição do indébito deverá ser ajuizada Judicial e/ou Administrativamente, dependendo do caso concreto.

d) por ora, o STJ entende há a incidência do IR sobre o 1/3 constitucional (CF/88, Art. 7º, inc. XVII), o que dificulta uma demanda judicial sobre esta matéria.

No entanto, na nossa dicção, por se tratar de matéria constitucional, a palavra final dever ser dada pelo Supremo Tribunal Federal – STF, titular desta competência.

Ocorre que, reitera-se, ao incidir o IR sobre esta remuneração e com a consequente redução do vencimento, o um terço deixa de ser um terço, passando a ser 1/4, talvez, 1/5, do salário, o que seria incompatível com o Texto Magno.

Como corolário, uma demanda judicial, neste caso, somente é plausível se houver tempo e disponibilidade econômica até que a matéria chegue no STF, escolha esta que, indubitavelmente, cabe ao contribuinte optar ou não, pela sua proposição.

É o entendimento.

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    é membro do escritório Fernando, Nagao, Cardone, Alvaarez Jr. & Advogados. É bacharel em Direito pela UNISA - Universidade de Santo Amaro (SP), especialista em Direito Constitucional e em Direito Tributário pelo IICS/CEU - Instituto Internacional de Ciências Sociais/Centro de Extensão Universitária (SP)

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