Litigiosidade na sociedade

Não há como administrar corrida dos cidadãos aos tribunais

Autor

  • Domingos Fernando Refinetti

    é advogado sócio do escritório WZ Advogados e membro da OAB da International Bar Association da Turnaround Management Association do Brasil e do IBR (Instituto Brasileiro de Estudos de Recuperação de Empresas).

27 de setembro de 2008, 0h00

O conceito de litigiosidade não é novo, mas foi-me reavivado pela leitura de um livro interessantíssimo, de autoria de James Marshall e de tradução do professo Cretella Jr, Espadas e Símbolos.

O direito seria, nada mais, do que o símbolo da força física subterrânea, um aviso de que, se não for seguido, algo de desagradável vai acontecer. E, quanto mais civilizados os povos, com mais facilidade e vontade aceitam esse símbolo, tornando sempre menos necessário o recurso ao direito, a essa força.

De outro lado, e complementarmente, se, em determinada civilização, houver crescente dificuldade e má vontade em aceitar esse símbolo e, portanto, o recurso ao direito for, também crescentemente, cada vez mais intenso, dar-se-á um fenômeno similar ao da corrida contra o caixa dos bancos.

Assim como um banco não poderá enfrentar uma corrida, de seus depositantes, contra o seu caixa, a Justiça não tem como administrar uma corrida, dos cidadãos, contra os seus Tribunais.

O banco pode tentar aumentar o número de funcionários e de guichês, assim como a Justiça pode tentar adotar medidas emergências para o atendimento dos cidadãos, mas a quebra do banco é inevitável, pela falta de confiança que a corrida instaurou, assim como o caos judiciário também será inelutável.

Os brasileiros, como conseqüência dessa percepção de que nada de desagradável ocorrerá contra quem viola interesses e direitos alheios e coletivos, contra quem despreza a lei, a ordem pública e, até mesmo, contra quem atenta contra a soberania estatal, são levados a recorrer, cada vez mais, aos Tribunais, sejam eles de que natureza forem e em que instância estiverem, porquanto as leis tendem a não mais serem cumpridas espontaneamente.

Curiosa, mas não surpreendentemente, o Estado, em todos os seus níveis e sob todas as suas formas, inclusive policiescamente, também atua dessa forma, em claro sinal de reiterado “contempt of court”, ademais do péssimo exemplo que deixa em seu rastro.

Logo e sucintamente, seria o caso de questionar se meras atitudes episódicas e casuísticas, na base da tentativa e erro, no sentido de dar mais celeridade e credibilidade à prestação jurisdicional, trarão algum resultado, além de, muito provavelmente, exacerbarem esse sensação e esse sentimento, absolutamente desastrosos para o país, de que, aqui, não somente não se cumpre a lei, como não parece possível, a ninguém, fazê-la cumprir.

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