Leis de ocasião

Oscilações do legislador protegem sonegador, diz procuradora

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27 de setembro de 2008, 0h00

As constantes mudanças não apenas nas leis, mas nas interpretações dos tribunais, favoreceram o sonegador no que se refere à esfera penal. Do modo como as leis vêm sendo aplicadas e entendidas, a pena não atinge seu fim. A conclusão é da procuradora da República Silvana Góes, no I Congresso Brasileiro de Estudos Fiscais, promovido pela Procuradoria Regional da República da 2ª Região, no Rio de Janeiro.

Silvana Góes explica que a partir da Constituição de 1988, que completa 20 anos, houve uma indefinição da política criminal. Por um lado, voltou-se a reafirmar os direitos fundamentais. Por outro, já alguns anos antes, a tendência foi de expandir o Direito Penal. Com isso, afirma a procuradora, o país precisou compatibilizar o Direito Penal mais contido e, ao mesmo tempo, dialogar com o resto do mundo, que vivia a expansão dessa esfera penal.

A procuradora observa que, até 1965, havia punição para contrabando e descaminho. Também existiam previsões para falsificação de documentos. Com a Lei 4.729/65, ficou previsto o crime de sonegação fiscal. “As penas ficaram mais brandas do que as previstas para falsificação de documentos”.

Em 1990, a sonegação virou “caso de polícia”. A Lei 8.137/90 previu penas mais rigorosas. Para a procuradora, apesar de mais rígida, a lei dificultou a punição, já que não se exigia provar apenas a atitude, mas o resultado obtido pelo crime. Além disso, o artigo 14 previa o benefício da extinção da punibilidade em caso de pagamento do tributo antes da apresentação da denúncia. A procuradora conta que, em 1991, o benefício foi revogado.

Com a Lei Orgânica do Ministério Público (Lei Complementar 75/93), aumentaram as denúncias, já que, segundo Silvana, houve a profissionalização da fiscalização com aproximação da Receita Federal e do MPF.

Em 1995, explica a procuradora, o benefício da extinção de punibilidade foi restabelecido para os casos de não-parcelamento da dívida. Já em 2000, o parcelamento também foi admitido como causa da extinção da punibilidade até o recebimento da denúncia. Em 2003, o sonegador passou a não ser punido caso quitasse a dívida em qualquer momento. Silvana Góes contou que, recentemente, soube que um sonegador conseguiu escapar da pena mesmo depois de a ação ter transitado em julgado. Quando um procurador entrou com a execução da pena, o sonegador pagou a dívida e conseguiu a extinção da punição.

Via administrativa

Para a procuradora, a Lei 9.430, de 1996, trouxe entraves à atuação do Ministério Público, ao estabelecer que a representação fiscal só poderia ser encaminhada para o MP depois da decisão final na esfera administrativa. Silvana Góes citou o Habeas Corpus 81.611, julgado pelo Supremo Tribunal Federal. Segundo ela, o STF abriu precedente ao afirmar que não há justa causa para Ação Penal enquanto a via administrativa não for exaurida.

“O Brasil ainda não resolveu se o Direito Penal deve ou não se ocupar da sonegação fiscal”, afirmou. Silvana Góes observou que, de fato, há uma grande diferença entre matar e não pagar imposto. Também disse do desconforto de falar sobre punição depois de ouvir sobre a carga tributária elevada existente no país. Ela lembrou que o Direito Penal também serve para a formação das pessoas, tendo um caráter pedagógico. Mas, acredita, do modo como vem sendo aplicado quanto à sonegação fiscal, não tem surtido efeito desejado. Para ela, seria mais “proveitoso” entender a sonegação dentro dos quadros da fé pública, como falsificação de documentos.

Organizado pelo procurador da República Luís Cesar Souza de Queiroz, o congresso contou, ainda, com a participação do professor de Direito Financeiro da Uerj Ricardo Lobo Torres, do desembargador do Tribunal Regional Federal da 2ª Região Alberto Nogueira, do presidente da Firjan, Eduardo Eugênio Gouvêa Vieira, entre outros especialistas.

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