Excesso legislativo

Não é necessário fazer novas leis, apenas cumprir as existentes

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24 de setembro de 2008, 0h00

Os trabalhadores do direito enfrentam problemas diários, posto que, no Brasil, toda vez que surge algum problema de ordem nacional e que cause algum tipo de comoção social, sempre explorado pela imprensa, surge alguém com a idéia de propor um projeto de lei para tratar da questão, sempre acreditando que tudo se resolve com mais uma lei.

O que se percebe é que as leis não surgem após um tempo de reflexão e para atender questões pensadas, mas são leis casuísticas que atingem diretamente um problema momentâneo, não regulando na essência questões que precisam ser reguladas.

Na maioria dos casos as leis casuísticas só servem para complicar o nosso sistema jurídico, que já não é fácil de ser compreendido.

Agora, uma nova situação está na ordem do dia, qual seja, elaboração de leis que tratem de assuntos que já estão legislados, que são as leis desnecessárias.

Bastaria mera observação, correta interpretação da norma já existente e sua verdadeira aplicação pelos poderes constituídos, ao invés de criação de nova norma.

Recentemente tivemos grandes discussões e a imprensa noticiou com enorme destaque a sanção da lei que trata da chamada guarda compartilhada. Este é um exemplo claro de lei desnecessária, tendo em vista que esta situação já está inserida no nosso sistema jurídico, e os juízes a aplicam diariamente.

Guarda compartilhada significa que os pais, quando da separação judicial, ou mesmo em situação de não serem casados, exercem o direito de guarda dos filhos menores em conjunto, isto é, alguns dias da semana os filhos ficam com o pai e outros com a mãe.

Como expresso em linhas acima os juízes de todas as comarcas do Brasil, já decidiam pela guarda compartilhada. Em regra a guarda compartilhada surgia de um acordo das partes, que pensando no bem estar dos filhos, cada qual, cedia um tanto nas suas vontades e o juiz homologava o acordo.

No caso de guarda de filhos o que é importante é o bem estar destas crianças, e o acordo dos pais é fundamental para isso. Assim, com lei ou sem lei, a guarda compartilhada é uma realidade que sempre foi e é observada pelo Judiciário.

Neste tema não se pode olvidar da ação importantíssima de muitos advogados, que conversam entre si e com os clientes, e em seguida propõem o acordo da guarda compartilhada.

Não obstante surgiu a lei 11.698/2008 que alterou o Código Civil, para em seu artigo 1583 expressar que por guarda compartilhada compreende-se a responsabilização conjunta e o exercício de direitos e deveres do pai e da mãe que não vivam sob o mesmo teto, concernentes ao poder familiar dos filhos comuns, na verdade não trouxe alteração e muito menos novidade. Em última análise, cabe ao juiz decidir pela guarda compartilhada, como sempre ocorreu. Um tema de real importância.

Outro exemplo de lei desnecessária foi a aprovação pela Câmara dos Deputados do projeto da chamada “nova lei da adoção”, que conforme noticia a imprensa nacional, permite que o adotado tenha acesso ao processo de adoção para saber sua origem.

Basta ler o Estatuto da Criança e do Adolescente para constatar que não há proibição do adotado ter acesso aos autos, para isto, basta justificar o motivo.

Consta no artigo 47, parágrafo 3º do Estatuto que nenhuma observação sobre a origem poderá constar das certidões de registro, o que está correto. As certidões, em regra, são utilizadas em estabelecimentos públicos e privados, dos mais diversos, para comprovação apenas da identificação jurídica da pessoa.

Por sua vez, o parágrafo 4º estabelece que a autoridade judiciária poderá fornecer certidão para a salva guarda de direitos. Assim, qualquer adotado, maior de idade ou por seu representante legal, quando menor, poderá requerer certidão de inteiro teor dos autos da adoção.

Com acesso aos autos o adotado vai ter conhecimento da sua origem biológica, isto é, de sua família natural.

O que não se admite pelo Estatuto, e não vai se admitir com a nova lei, é que estranhos tenham acesso aos autos para saber informações que não lhes dizem respeito. Ao contrário, resta evidente a violação ao direito sagrado da intimidade, devidamente positivado na Constituição Federal.

O mesmo projeto de lei, expressa a imprensa, vem permitir a adoção por homossexual, o que é mais uma vez, totalmente desnecessário, porque não há nenhuma proibição pelo Estatuto de adoção por homossexuais.

Consta do artigo 42, do ECA que podem adotar os maiores de vinte um anos de idade (dezoito pelo Código Civil, diante da capacidade), independente de estado civil.

A única exigência objetiva quanto à pessoa é a idade. Se é casado, solteiro, viúvo, homossexual ou não, é questão que deve ser apreciada em cada situação concreta.

Não há, repito, nenhuma proibição a homossexual adotar alguém.

Mais uma vez um projeto de lei vem tratar de tema que não precisa ser regulamentado.

Nestes dias surge, novamente, a idéia de reforma do Judiciário com o fim de agilizar a Justiça. Entre as novas idéias, temos a proposta de limitação de atuação das Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs) para que só possam tratar de assuntos determinados, que se atenham a um caso específico, concreto. É bom lembrar que estas comissões não têm qualquer relação com o Judiciário, mas sim com o Poder Legislativo.

Outra vez, não há que se falar em necessidade de criação de lei para tratar do assunto. Basta a leitura da Constituição Federal em seu artigo 58, parágrafo 3º para verificar que CPI só pode ser instaurada pela Câmara dos Deputados ou Senado Federal, em conjunto ou separadamente, para apuração de fato determinado.

Se o Texto Maior já faz a afirmação, e mencionada norma é de eficácia plena, sendo, portanto, desnecessária lei regulamentadora, não haveria necessidade alguma de uma norma de hierarquia inferior expressar o que já está previsto.

Hoje, qualquer CPI que seja instaurada para apuração de fato que não seja determinado, atenta contra a regra que permite sua formação. Portanto, seria inconstitucional a instauração de CPI para apuração de questões genéricas.

Estes são exemplos clássicos de leis desnecessárias.

O Brasil e a sua população não precisam mais da enxurrada de leis, precisam sim que a

Constituição Federal e as leis existentes sejam verdadeiramente cumpridas.

O excesso de leis causa uma enorme balburdia no sistema jurídico e por conseqüência insegurança a toda população.

Não obstante entendimentos diversos, bem fundamentados, nosso pensamento é o aqui exposto, por isto cumpram-se as leis existentes e vamos verificar o que ocorre.

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