Imposto rural

Cobrança da contribuição sindical rural via Ação Monitória

Autor

  • Luís Marcelo Algarve

    é professor universitário assessor de desembargador do TJ-RS mestre em Direito pelo Uniritter especialista em Direito Processual Civil pela Academia Brasileira de Direito Processual Civil e em Direito Público pela Fundação Escola Superior do Ministério Público e bacharel em Direito pela Universidade de Passo Fundo.

17 de setembro de 2008, 0h00

A ação monitória, prevista expressamente nos artigos 1102-A a 1102-C do Código de Processo Civil, consiste em uma advertência direcionada ao devedor, a fim de que este pague ou entregue algo ao credor. Nos termos da lei, ela “compete a quem pretender, com base em prova escrita sem eficácia de título executivo, pagamento de soma em dinheiro, entrega de coisa fungível ou de determinado bem móvel”. Por isso, a demanda monitória visa, em análise sintética, a expedição de mandado de pagamento ou de entrega de coisa, liminarmente.

A ação monitória é ação de conhecimento, condenatória e tramita sob procedimento especial de cognição sumária, embora a oposição dos embargos monitórios pelo réu inaugure o procedimento comum ordinário de ampla e profunda cognição (parágrafo 2º do artigo 1102-C do CPC).

Por sua vez, a contribuição sindical rural possui caráter tributário, sendo estatuída em lei, cujo pagamento é obrigatório, independentemente de associação (artigos 578 e seguintes da Consolidação das Leis do Trabalho e artigo 149 da Constituição Federal). Decorre a cobrança da contribuição sindical rural de uma delegação do Poder Público à Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (artigo 587 da CLT, decreto-lei 1.166/71, lei 8.022/90 e lei 8.847/94).

Os contribuintes da contribuição sindical rural são todos aqueles que participam de uma determinada categoria econômica ou profissional, ou de uma profissão liberal, em favor do sindicato representativo da mesma categoria ou profissão ou, inexistindo este, na conformidade do disposto no artigo 591. O fato gerador de enquadramento específico de cada contribuinte está disposto no artigo 1º do decreto-lei 1.166/71.

A controvérsia processual que existe a respeito da cobrança da contribuição sindical rural, via ação monitória, gira em torno do conceito de “prova escrita sem eficácia de título executivo”.

Qual seria a prova escrita necessária e suficiente para embasar a ação monitória que vindica a contribuição sindical? Isso sem nunca descuidar que a confederação, ao cobrar o imposto sindical, exerce função delegada pelo poder público federal.

Analisando todo o arcabouço legislativo que disciplina o presente tema, parece que o requisito da prova escrita hábil a instruir a inicial monitória, in casu, estará preenchido desde que juntados a cópia das guias anuais de recolhimento emitidas ao contribuinte dos respectivos exercícios devidos, o demonstrativo de constituição do crédito tributário, bem como os editais publicados nos jornais de maior circulação.

Em uma apreciação atenta dos artigos 578 e seguintes da CLT, é possível vislumbrar que os documentos acima referidos são os únicos previstos e exigidos em lei para o processamento da demanda monitória. Vejamos.

O artigo 583, parágrafo 1º, c/c o artigo 587, ambos da CLT, referem que o recolhimento da contribuição sindical dos empregadores obedecerá ao sistema de guias. Logo, a guia de recolhimento é documento exigido em lei e a sua juntada com a inicial monitória é fundamental para a formação do conceito de prova escrita.

Os artigos 580 e 581 da CLT c/c os artigos 147 e 149 do CTN apresentam, respectivamente, a necessidade e a modalidade da constituição do cálculo da contribuição sindical rural. Portanto, o demonstrativo de constituição do crédito tributário é outro documento essencial à formação da prova escrita.

Finalmente, o artigo 605 da CLT dispõe sobre o documento que, derradeiramente, configura o conceito de prova escrita na ação monitória que cobra a contribuição sindical rural, qual seja, o edital concernente ao recolhimento do imposto sindical.

Desse modo, adstrito aos requisitos da ação monitória e, principalmente, adstrito ao princípio da legalidade, a prova escrita liminar, sem eficácia executiva, estabelecida pela lei para a cobrança da contribuição sindical rural é formada pela juntada com a inicial monitória dos seguintes documentos:

(a) cópias da guias anuais de recolhimento emitidas ao contribuinte dos respectivos exercícios devidos (artigos 583, parágrafo 1º, c/c o artigo 587, ambos da CLT)

(b) o demonstrativo de constituição do crédito tributário (artigos 580 e 581 da CLT c/c os artigos 147 e 149 do CTN)

(c) os editais publicados nos jornais de maior circulação (artigos 605 da CLT)

É preciso referir, ainda, inclusive para assentar o caráter “público” da cobrança, que a Confederação é a arrecadadora do tributo e responsável pelo repasse dessa verba a todos os legitimados do artigo 589 da CLT, sendo um deles o Ministério do Trabalho e Emprego, daí a razão da delegação e a natureza “pública” da cobrança.

Disso resulta que a delegação atribuída à CNA possui presunção de legitimidade no seu aspecto material, devidamente retratada nas guias de recolhimento da contribuição sindical e no demonstrativo de constituição do crédito tributário.

As informações constantes nas guias emanam de uma delegação pública conferida pela União e possuem presunção de veracidade no seu aspecto processual-tributário, o que possibilita a cobrança pela via monitória (o procedimento injuncional monitório exige verossimilhança na alegação do autor e nos documentos por ele oferecidos para o prosseguimento da ação – não confundir verossimilhança com certeza).

As informações aportam nas guias através de declaração prestada anualmente pelo contribuinte através do ITR. O cadastro que a confederação utiliza para cobrar a contribuição sindical rural, repassado pela secretaria da Receita Federal diante do pagamento anual do ITR, é meramente declarativo (artigo 147 e 149 do CTN), isto é, o conteúdo das informações constantes da declaração do ITR é fornecido pelo próprio contribuinte, responsabilizando-se esse por todas as informações contidas no documento, inclusive é o contribuinte responsável por informar eventuais alterações ocorridas no imóvel.

Conforme o artigo 6º da lei 9.393/96, “O contribuinte ou o seu sucessor comunicará ao órgão local da Secretaria da Receita Federal (SRF), por meio do Documento de Informação e Atualização Cadastral do ITR – DIAC, as informações cadastrais correspondentes a cada imóvel, bem como qualquer alteração ocorrida, na forma estabelecida pela Secretaria da Receita Federal”.

Ainda, determina o artigo 8º da lei 9.393/96 que “O contribuinte do ITR entregará, obrigatoriamente, em cada ano, o Documento de Informação e Apuração do ITR – DIAT, correspondente a cada imóvel, observadas data e condições fixadas pela Secretaria da Receita Federal”.

Parece claro que a inclusão do contribuinte no sistema de incidência do imposto sindical, cobrado pela confederação a que está ele vinculado, ocorre porque assim declarou, pois a pretensão da entidade delegada é orientada única e exclusivamente pelas informações por ele declaradas.

A presunção de veracidade acima mencionada, espécie do gênero fé-pública – fé pública é um termo jurídico que denota um crédito que deve ser dado aos documentos emitidos por autoridades públicas, ou por privados por ela delegados, no exercício de suas funções e que gozam da presunção de que tais documentos são verdadeiros –, funciona da seguinte forma na ação monitória que cobra a contribuição sindicial rural:

A confederação recebe, da Receita Federal, as informações prestadas pelo contribuinte através da declaração do Imposto Sobre Propriedade Territorial Rural.

Em seguida, a confederação lança essas informações nas guias de recolhimento da contribuição sindical rural e no demonstrativo de cálculo, tornando exigível a cobrança já prevista em lei, inclusive no tocante à data de pagamento, conforme artigos 578 e seguintes da CLT.

Os documentos que acompanham a demanda monitória, quais sejam, as guias de recolhimento, o demonstrativo de constituição do crédito tributário e o edital de convocação geral, possuem presunção de veracidade em virtude da delegação do poder público para a cobrança da contribuição sindical rural. Essa presunção de veracidade, que decorre de lei, admite prova em contrário, pois passível de impugnação judicial pelo contribuinte.

Proposta a ação monitória, nos moldes dos artigos 1.102-A e seguintes do CPC c/c a Instrução Normativa 27 do colendo TST, a oportunidade, na demanda monitória, para o contribuinte demonstrar que os dados do lançamento tributário são inverídicos ou insubsistentes ocorre no oferecimento dos embargos monitórios pelo réu da ação injuntiva.

Nos embargos monitórios, de ampla e plena cognição, pois a sua oposição inaugura o procedimento comum ordinário, conforme o parágrafo 2º do artigo 1.102-C do CPC, tem o contribuinte a oportunidade de produzir prova em sentido contrário, isto é, tem a oportunidade o embargante de tornar inverossível a presunção de veracidade que sustentou a atuação da Confederação no início do processo, sendo do contribuinte o ônus para tal, exclusivamente, conforme dispõe a legislação processual tributária e as regras do Código de Processo Civil em matéria que trata da presunção de veracidade juris tantum (artigo 334, IV, do CPC).

Jurisprudencialmente, o Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, o Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região, o Superior Tribunal de Justiça e o Tribunal Superior do Trabalho já decidiram que as guias, o demonstrativo e os editais de convocação são suficientes para instruir a demanda monitória .

Portanto, o manejo da ação monitória, visando a cobrança do imposto sindicial, com base nas guias anuais de recolhimento emitidas ao contribuinte dos respectivos exercícios devidos, no demonstrativo de constituição do crédito tributário e nos editais publicados nos jornais de maior circulação, reflete o exercício constitucional do direito de ação e a sua aceitação concretiza o direito fundamental à tutela jurisdicional.

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