Satiagraha e Chacal

Justiça não pode liberar dados sigilosos do Opportunity à CPI

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12 de setembro de 2008, 19h58

A Justiça Federal de São Paulo está proibida de repassar dados sigilosos do Banco Opportunity, investigado nas operações Satiagraha e Chacal, para a CPI dos Grampos. Mas pode decidir se repassa outros dados que não estão cobertos pelo sigilo. O entendimento é do ministro Cezar Peluso, do Supremo Tribunal Federal. A ordem é impedir que a Justiça Federal paulista continue mandando dados sigilosos do banqueiro Daniel Dantas à CPI. Segundo reportagem do jornal Folha de S. Paulo, a CPI já informou que vai pedir outros tipos de informações.

“O que não podem os juízos, sob pena de insulto à liminar e à sua extensão decididas aqui [STF], é autorizar acesso aos dados dos discos rígidos do Banco Opportunity, seja mediante acesso direto aos HDs, seja por via de acesso aos volumes dos autos em que tais dados estejam transcritos ou reproduzidos, no todo ou em parte, porque, em qualquer dessas hipóteses, se dissolveria o sigilo dos dados bancários”, fundamentou o ministro.

Na decisão, Peluso também deu um pito na CPI. Disse que os dados bancários só podem ser partilhados por quem tem autorização legal e interesse jurídico em obtê-los, o que não parece ser o caso da CPI, que não investiga assuntos bancários. “Não é necessário reiterar ofícios que são do pleno conhecimento da CPI”, advertiu o ministro.

Os dados solicitados pela CPI tratam da Operação Chacal, que investigou suposta espionagem da Kroll contra a Telecom Itália a mando de Daniel Dantas e também da Satiagraha, na qual o banqueiro, o ex-prefeito da capital paulista, Celso Pitta, e o investidor Naji Nahas foram presos sob acusação de crimes financeiros e corrupção.

No primeiro pedido do Opportunity, Peluso disse que as CPIs não têm poder sobre processos que correm sob segredo de Justiça, como é o caso das ações envolvendo a Operação Chacal. Segundo ele, “as CPIs carecem, ex autoritate propri, de poder jurídico para requisitar, revogar, cassar, impor, compartilhar ou, de qualquer outro modo, quebrar sigilo legal e constitucionalmente imposto a processo judiciário”. Esta é uma competência privativa do Judiciário, afirmou o ministro.

O jornal Folha de S.Paulo publicou, nesta sexta-feira (12/9), que depois da negativa do Supremo, a CPI resolveu solicitar informações das duas operações à Justiça Federal. De acordo com o texto, a comissão pretende encaminhar pedido sobre questões específicas para evitar que as informações não sejam repassadas à Câmara.

“O presidente [da CPI] Marcelo Itagiba vai encaminhar os pedidos de informações. Não vamos pedir dados sigilosos, mas coisas específicas. O objetivo não é pedir o conteúdo integral das informações das operações, mas algumas questões”, afirmou o deputado Gustavo Fruet (PSDB-PR).

Operadoras

A CPI também vai pedir às empresas telefônicas que reapresentem os dados encaminhados à comissão com informações sobre as ligações que foram monitoradas pela PF nas operações. Gustavo Fruet disse que muitos dados estão “embolados”, o que dificulta o manuseio das informações pelos parlamentares.

“Em alguns casos, não é possível identificar a origem dos pedidos de grampos, a sua renovação. Não foram separadas as autorizações das renovações, não é possível identificar o que foi telefone fixo do celular”, afirmou o deputado.

Na Satiagraha, a PF obteve autorização para monitorar pelo menos 54,7 mil horas linhas telefônicas em nome de pessoas e empresas investigadas na operação. Diante do universo de dados, os deputados querem organizar detalhes sobre as escutas para aprofundar as investigações.

Leia a decisão do ministro Peluso

EXTENSÃO NA MEDIDA CAUTELAR NO MANDADO DE SEGURANÇA 27.496-4 DISTRITO FEDERAL

RELATOR: MIN. CEZAR PELUSO

REQUERENTE(S): BANCO OPPORTUNITY S/A E OUTRO(A/S)

ADVOGADO(A/S): ALBERTO PAVIE RIBEIRO E OUTRO(A/S)

REQUERIDO(A/S): COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUÉRITO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS — CPI DAS ESCUTAS TELEFÔNICAS CLANDESTINAS

DECISÃO: 1. Alegam os impetrantes, em suma, que, não obstante tenha sido estendida a eficácia da liminar para que a autoridade tida por coatora se abstenha de examinar e copiar os dados extraídos dos discos rígidos do Banco Opportunity e para que o não permitisse o juízo da 6ª Vara Criminal Federal, a mesma Comissão aprovou, talvez por equívoco, dois requerimentos para ter acesso aos dados sigilosos das operações policiais denominadas “Chacal” e “Satiagraha”. Tais deliberações, além de destituídas de fundamentação, afrontariam a liminar e a extensão deferidas neste processo.

Têm razão, em parte, os impetrantes. Há, deveras, abstraída a alegação de falta de fundamentação dos requerimentos agora atacados – que lhes macularia de nulidade a aprovação -, risco fundado de que, com eventual acesso aos dados dos inquéritos ou dos processos oriundos daquelas duas operações policiais, em trâmite perante os juízos da 5ª e da 6ª Vara Criminais Federais de São Paulo, se viole o sigilo dos dados bancários de terceiros, objeto de transcrição ou reprodução em ambos os autos, violando, ao mesmo tempo, a liminar e a extensão concedidas para o proteger. Isso é coisa que, de tão óbvia, escusa fundamentação mais alongada.

Não podem, entretanto, nesta via, ser ouvidos quanto a interdição de quebra do segredo de justiça de que se revestem aqueles processos, sob jurisdição imediata dos juízos da 5ª e 6ª Vara, porque não é esse o objeto do pedido de segurança, formalmente restrito à garantia de resguardo dos dados constantes dos discos rígidos do Banco Opportunity. Noutras palavras, como as deliberações se concretizaram em requerimentos formulados a esses dois juízos para que permitam acesso dos membros indicados da CPI aos autos de causas sob segredo de justiça – donde estar em jogo outra questão jurídica, embora não menos grave -, cabe a ambos esses juízos, em primeira mão, decidir sobre os requerimentos e, em caso de eventual ofensa a direito dos impetrantes, devem estes aviar o remédio processual adequado, perante o tribunal competente.

O que não podem os juízos, sob pena de insulto à liminar e à sua extensão decididas aqui, é autorizar acesso aos dados dos discos rígidos do Banco Opportunity, seja mediante acesso direto aos HDs, seja por via de acesso aos volumes dos autos em que tais dados estejam transcritos ou reproduzidos, no todo ou em parte, porque, em qualquer dessas hipóteses, se dissolveria o sigilo dos dados bancários, os quais só podem partilhados nos termos dos arts. 1º e 4º da Lei Complementar nº 105/2001, por quem tenha autorização legal e interesse jurídico em obtê-lo – o que não parece ser o caso da Comissão, que não investiga assuntos bancários!

Não é mister reiterar ofícios que são do pleno conhecimento da CPI!

2. Do exposto, estendo a liminar, para determinar que: a) a Comissão Parlamentar de Inquérito se abstenha de analisar e copiar os dados constantes dos discos rígidos do Banco Opportunity, seja mediante acesso direto aos HDs, seja mediante vista dos autos em que tais dados tenham sido, no todo ou em parte, transcritos ou reproduzidos, ou que, na hipótese de já o ter tido, que lhes acautele e guarde as cópias, mantendo-lhes o sigilo, sob responsabilidade pessoal do Presidente e do Relator, até decisão em contrário neste processo; b) que os juízos da 5ª e da 6ª Varas Criminais Federais de São Paulo não permitam o acesso da Comissão aos mesmos dados, assim por via direta aos HDs, como por vista dos autos em que estejam, no todo ou em parte, transcritos ou reproduzidos, nem lhe forneçam cópias.

Expeçam-se ofícios e telex, com as necessárias comunicações, solicitando-se ainda, no dirigido à Comissão, informações a respeito da petição de fls. 438-451.

Decorrido o prazo, com ou sem informações, encaminhem-se os autos ao Procurador-Geral da República, com urgência.

Publique-se.

Brasília, 8 de setembro de 2008.

Ministro CEZAR PELUSO

Relator

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