Segunda Leitura

Segunda Leitura: Especializaçaõ é requisito de eficiência na Justiça

Autor

  • Vladimir Passos de Freitas

    é professor de Direito no PPGD (mestrado/doutorado) da Pontifícia Universidade Católica do Paraná pós-doutor pela FSP/USP mestre e doutor em Direito pela UFPR desembargador federal aposentado ex-presidente do Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Foi secretário Nacional de Justiça promotor de Justiça em SP e PR e presidente da International Association for Courts Administration (Iaca) da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) e do Instituto Brasileiro de Administração do Sistema Judiciário (Ibrajus).

7 de setembro de 2008, 11h19

Vladimir Passos de Freitas 2 - por SpaccaSpacca" data-GUID="vladimir_passos_freitas1.jpeg">No quebra-cabeças das discussões sobre a eficiência na Justiça, muitas são as críticas e poucas, as soluções. No entanto, há que se reconhecer que a simples existência do debate já é um avanço. E também que os tribunais estão mais abertos à discussão e buscando medidas de aprimorar seus serviços.

Pois bem, no mosaico de idéias — algumas oportunas, outras nem tanto — surge a especialização de Turmas, Câmaras ou Varas como um ferramenta indispensável à qualidade e agilidade dos julgamentos. E, ao contrário do que se pensa, não se está aí a contar novidade alguma. Nos tempos do Império, já existiam as Varas dos Feitos da Coroa, ascendentes diretas das atuais Varas da Fazenda Pública. À época do Tribunal da Relação do RJ (1751-1808), existiam juízos criminais (Direito e Justiça no Brasil Colonial, Arno e Maria José Wehling, ed. Renovar, p. 561).

Proclamada a República, os estados-membros ganharam autonomia para reger suas Justiças. No Paraná, em 1896, criou-se o 1° Distrito Criminal; em 1919, o Juízo de Órfãos; em 1920, a Vara Cível e do Comércio; em 1925, a Vara de Menores; em 1944, a Vara dos Feitos da Fazenda; em 1952, a Vara de Família; e em 1953, a Vara de Falências. Este é apenas um exemplo e, por certo, deu-se o mesmo nos demais estados. Assim se evoluiu até o início dos anos 90, com poucas alterações, como Varas de Acidentes do Trabalho e Registros Públicos.

A Constituição de 1988 trouxe consigo a explosão da litigiosidade. E aquelas Varas especializadas passaram a ser insuficientes para uma efetiva prestação jurisdicional. Novos temas passaram a fazer parte da Justiça especializada. O TRF da 4ª Região, que sempre foi pioneiro, em 12 de agosto de 1993 aprovou a instalação de cinco Varas Previdenciárias em Porto Alegre e duas em Curitiba e, em 19 de fevereiro de 1997, implantou duas Turmas Previdenciárias. É possível dizer que a partir daí nasceu o Direito Previdenciário no Brasil, ainda que existissem alguns livros que tiveram o mérito do pioneirismo. A partir da especialização, depois praticada no Rio de Janeiro, Belo Horizonte e São Paulo, criou-se farta doutrina, rica jurisprudência e até cursos de mestrado (p. ex. PUC/SP).

Outros temas mereceram especialização. Em 2001 o TRF-4 implantou em Curitiba a primeira Vara especializada em ações do SFH. No Rio de Janeiro, implantaram-se Varas Empresarias. Em Porto Alegre, Vara especializada em cartões de crédito (20ª da Justiça Estadual) e Varas Tributárias (duas na Justiça Federal). Na Justiça Federal de alguns estados, Varas de Crimes Contra a Ordem Econômica rompem com uma tradição de impunidade. Na Comarca de São Paulo, criou-se Vara de crimes de violência doméstica contra a mulher. Varas Federais Ambientais são realidade nas três capitais do sul do país e na Justiça Estadual em Cuiabá, Manaus e Belém (JEC). A Câmara Especial do Meio Ambiente é o maior sucesso do TJ-SP. Câmara especializada em crimes de prefeitos julga bem e rápido no TJ-RS. No TJ-PR, há Câmara de Contratos Bancários e outras tantas especializações.

Mas é pouco. Pouquíssimo para o tamanho do Brasil. Quase nada para a quantidade de TJs e TRFs (32). A omissão revela um descaso no atendimento do princípio da eficiência (CF, art. 37) e para o apelo à especialização que leis modernas vêm fazendo (p. ex., Estatuto do Idoso, art. 70 e Lei Maria da Penha, art. 14). E também para a vontade de grupos sociais, que constantemente reivindicam juízos especializados (p. ex., Estado de SP, 31.8.2008, B4, Executivos sugerem varas de arbitragem).

A iniciativa da especialização não depende do CNJ, do STJ ou do STF. Nem de lei (salvo eventual previsão em Constituição Estadual). É medida da competência de cada TJ ou TRF, porque possuem autonomia administrativa (CF, art. 99). O Regimento Interno dirá, dentro do tribunal, a quem cabe decidir a respeito. Por exemplo, no TRF-4, ao Conselho de Administração (R.I., Art. 20. XIV). Ao TJ-RS, ao Conselho da Magistratura (R.I., art. 8º, VI, “a”). Em um TJ pequeno, poderá ser ao Plenário. Em outros poderá ser a Corte Especial.

E por que são poucos os casos? Por várias razões: a) medo do novo; b) resistência dos juízes das Varas; c) receio de que uma Vara especializada fique com poucos processos (isto pode ser facilmente corrigido através da semi-especialização, ou seja, a Vara é a única competente em certa matéria, mas recebe uma competência residual); d) o juiz ficará com muito poder e poderá exercê-lo inadequadamente (crítica improcedente, pois um mau juiz será mau em qualquer Vara).

Em suma, especializar é uma via adequada para uma melhor prestação jurisdicional. Varas do SFH, ambientais, tributárias (não apenas de execuções fiscais), administrativas, de litígios bancários, previdenciárias (onde não há), de locação e condomínios, de lavagem de dinheiro, de cartões de crédito, de acidentes de trânsito (cível e criminal) e outras tantas, conforme a realidade local, constituem caminho seguro para a agilidade da Justiça e a segurança jurídica.

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