Representante legítimo

Sindicato deve repassar ao Simpi imposto recolhido de empresas

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4 de setembro de 2008, 10h52

O Sindicato da Micro e Pequena Indústria do Estado de São Paulo (Simpi) é o legítimo representante da categoria que abrange empresas com até 50 empregados. A conclusão é da 2ª Vara da Justiça do Trabalho de São Paulo, que mandou o Sindicato da Indústria do Papelão no Estado de São Paulo pagar ao Simpi, com juros e correção monetária, os valores do imposto sindical referentes a 2005, 2006 e 2007, recolhidos irregularmente.

O juiz Lúcio Pereira de Souza reconheceu o Simpi como legítimo representante das empresas com até 50 empregados, com base em acordo celebrado entre o Sindicato e a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), homologado em 1994 pelo Tribunal de Justiça paulista. Com o acordo judicial, entendeu o juiz, “se abriu a possibilidade de representação da categoria relativa às micro e pequenas empresas, assim consideradas aquelas com até 50 empregados, pelo Simpi”.

O juiz trabalhista afirmou, ainda, que o Sindicato da Indústria do Papelão representa toda a categoria, mas é preciso considerar que o segmento com até 50 empregados é melhor representado por um sindicato especializado e reconhecido em acordo com a Fiesp. “O mundo moderno caminha para uma especialização cada vez maior, onde os interesses daqueles que possuem a mesma estatura econômica têm muito mais afinidade do que o ramo de atividade onde estão inscritos”, afirmou o juiz.

O Simpi representa cerca de 200 mil micro e pequenas indústrias do Estado de São Paulo, com até 50 empregados cada. Organizado com base na Constituição de 1988, o Simpi foi fundado em 1989 e filiou-se à Fiesp em 1994.

Em 2006, o Sindicato obteve a Carta Sindical do Ministério do Trabalho e Emprego. A partir de então, defende o Simpi, foi criado um clima de animosidade entre os demais sindicatos concorrentes filiados à Fiesp.

A seguir, a Fiesp rompeu um acordo judicial com o Simpi (homologado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo), que reconhecia sua legitimidade para representar as empresas de até 50 empregados e intensificou a ofensiva para desfiliar o Simpi. De acordo com o sindicado, muitas delas já foram rechaçadas pelo Tribunal Superior do Trabalho e pelo Superior Tribunal de Justiça.

Leia a decisão

SENTENÇA

Alega o reclamante que é legítimo representante das micro e pequenas indústrias do Estado de São Paulo. Desse modo, tem direito aos impostos sindicais dos anos de 2005, 2006 e 2007, em relação às empresas com até cinqüenta empregados, que foram recolhidos ao sindicato réu e por ele recebidos, que não tenham optado pela filiação sindical do réu, conforme previa os termos do acordo judicial celebrado entre autor e a FIESP perante o Tribunal de Justiça de São Paulo, competente à época dos fatos para processar e julgar aquela causa. Pede a antecipação dos efeitos da tutela.

Inconciliados.

O réu respondeu.

Encerrada a instrução processual.

Relatados.

Não estão presentes os requisitos para antecipação dos efeitos da tutela, mesmo porque a matéria discutida é deveras polêmica e merece o descortino completo da situação antes de qualquer antecipação dos efeitos da tutela. Além do mais, não há risco de prejuízo irreparável. Rejeito.

Afasto a argüição do artigo 830 da CLT, pois os documentos juntados são públicos em sua grande maioria, tendo o réu acesso ao mesmo. Além do mais, a mera argüição sobre a forma não merece ser acolhida, pois é necessária fundada dúvida de falsificação para que se afaste a validade dos referidos documentos. Por fim, destaca-se que os documentos juntados pela inicial também foram utilizados pela defesa em prol de seus argumentos, o que indica sua veracidade. Rejeito.

Antes da controvérsia direta entre as partes, mister avaliar a constitucionalidade do acordo firmado entre autor e a FIESP, pelo qual haveria direito aos impostos sindicais, em relação às empresas com até cinqüenta empregados, desde que não fizessem opção pelo sindicato da mesma atividade produtiva, neste caso, informado o sindicato autor, possibilitando-se, inclusive, associação a ambos os sindicatos. Pelos termos do acordo, poderia ainda ser tratada esta questão diretamente entre sindicato-autor e casa sindicato já filiado à FIESP, ou que a ela viesse se filiar.

Este acordo deve ser avaliado diante de dois princípios consitucionais de direito coletivo: o da autonomia de vontade (CF, art. 8º, I) e o da unicidade sindical (art. 8º, II).

Pelo primeiro, o Estado não pode fixar parâmetros para a organização sindical, sequer indicar legal ou administrativamente as categorias. Estas são formadas pela autonomia das partes interessadas e não existem como um a priori indicado pelo Estado. A única exigência admitida pela Constituição Federal é o registro no órgão competente. Mas, esta se liga ao outro princípio. Dar a publicidade necessária para que seja respeitada a unicidade sindical.

A unicidade sindical, princípio constitucional, impõe a representação por um único sindicato por categoria profissional. Todavia, como já ressaltado, considerando que a categoria é definida pela autonomia de vontade, admite-se, no modelo constitucional atual, que haja redefinição da categoria pelos interessados, criando-se verdadeira fissura na categoria originária. Como se vê, a autonomia de vontade tem um peso maior do que a unicidade sindical no modelo constitucional atual.

E se for assim, é possível o acordo judicial celebrado entre o sindicato-autor e a FIESP, por que se abriu a possibilidade de representação da categoria relativa às micro e pequenas empresas, assim consideradas aquelas com até 50 empregados, pelo SIMPI. E, nesses termos, reconheço constitucionalidade no acordo celebrado entre o SIMPI e a FIESP.

Tenho, todavia, ressalva a uma cláusula ali estabelecida. Refiro-me àquela em que se concede à empresa a opção de escolher entre o sindicato da atividade profissional e o SIMPI. Esta cláusula é inconstitucional e vou dizer porquê.

A opção admitida constitucionalmente é quanto à origem da categoria pela autonomia de vontade. Após a definição da categoria pelos interessados, entra em cena a unicidade sindical. Não se admite pluralidade de sindicato para a mesma categoria: logo, não é possível escolher o sindicato representativo depois de definida a categoria. A categoria, sim, pode ser escolhida (autonomia de vontade). Mas, assim feita, não haverá opção de sindicato: apenas um a representará.

Logo, em face do princípio da unicidade sindical, não existe opção entre o sindicato-autor e o sindicato-réu. Não. Apenas um pode representar os interesses da respectiva categoria em disputa.

O conflito entre as partes refere-se apenas à parte da categoria, a saber, àquelas empresas que possuem até 50 empregados, já que, no excedente, exsurge incontinenti a representatividade do sindicato-réu.

Na intersecção, parece-me, o interesse em disputa é melhor representado pelo sindicato-autor. O réu representa toda a categoria, incluindo as médias e pequenas empresas. Mas, o mundo moderno caminha para a especialização cada vez maior, onde os interesses daqueles que possuem a mesma estatura econômica tem muito mais afinidade do que o ramo de atividade onde estão inseridos. Imagine-se, a guisa de exemplo, um rede de supermercados que detenha 50% do mercado nacional e ao seu lado uma miríade de pequenos mercados. Ora, quando se vai negociar preços de mercadorias, por exemplo, seria impossível ao sindicato defender eqüitativamente, na mesma negociação, os interesses de todos os interessados, ao passo que seria muito mais fácil defender os da miríade de pequenos comerciantes. Por óbvio, a representação seria muito mais adequada em face do tamanho da empresa do que propriamente da atividade desempenhada. O tamanho das empresas, no atual mundo globalizado, e até mesmo com atividades econômicas distintas, mas mantida a similaridade de tamanho, ergue-se inapelavelmente como uma categoria, não há duvidas.

Desse modo, por ter sido respeitada a autonomia de vontade, abrindo-se nova categoria por vontade dos interessados, e, em face do princípio da unicidade sindical, pelas razões anteriormente expostas, reconheço que o sindicato-autor é o legítimo titular do direito ao imposto sindical dos anos de 2005, 2006 e 2007, em relação às empresas com até cinqüenta empregados, que foram recolhidos ao sindicato réu e por ele recebidos.

Procede o pedido.

Do exposto, condeno o sindicato-réu a pagar ao sindicato-autor os valores do imposto sindical dos anos de 2005, 2006 e 2007, relativo às empresas com até cinqüenta empregados, os quais foram recolhidos ao sindicato réu e por ele recebidos.

Correção monetária e juros devidos, na forma da lei.

Honorários advocatícios, em favor do sindicato-autor, os quais arbitro em 10% sobre o valor da condenação.

Custas, pelo sindicato-réu, no importe de 300,00, apuradas sobre o valor arbitrado à condenação de R$ 15.000,00.

Intimem-se.

Nada mais.

LÚCIO PEREIRA DE SOUZA

JUIZ DO TRABALHO

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