Questões bancárias

Análise de recursos repetidos de questões bancárias é concluída

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23 de outubro de 2008, 11h05

Após duas horas de intenso debate, a 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça encerrou a análise do recurso ajuizado pelo Unibanco contra uma consumidora gaúcha no qual se discutiram temas relativos a contratos bancários. O Recurso Especial em julgamento foi levado à Seção, com base na Lei 11.672/2008, a Lei dos Recursos Repetitivos, que entrou em vigor em agosto deste ano.

O julgamento teve início no dia 8 deste mês e havia sido interrompido por pedido de vista do ministro Luís Felipe Salomão. Nesta primeira parte do julgamento, a 2ª Seção decidiu que somente seriam apreciados sob a ótica da nova Lei os temas que, no caso concreto, pudessem ser conhecidos pelo Tribunal.

Antes de o ministro Luís Felipe Salomão manifestar seu posicionamento, a ministra Nancy Andrighi, relatora do caso, inovou seu voto quando à questão do cabimento da comissão de permanência. Ela entendeu que seria possível conhecer do recurso quanto a este ponto, uma vez que o dissídio jurisprudencial era notório. Mas negou o recurso do banco. No entanto, a maioria da Seção considerou que este ponto não deveria ser conhecido, pois não houve apontamento de norma legal violada, nem a comparação com julgados de outros tribunais.

No caso em questão, a consumidora comprou uma moto e financiou parte do valor em 36 parcelas de R$ 249. Ao perceber que não conseguiria arcar com as prestações, ela entrou com uma ação revisional do contrato de financiamento. A ação chegou ao STJ por iniciativa do banco, inconformado com alguns pontos decididos pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul.

Juros remuneratórios

Ficou mantida a jurisprudência atual do STJ, no sentido da não limitação dos juros remuneratórios, a não ser em casos específicos, em que comprovada a abusividade, o que deve ficar a juízo das instâncias ordinárias, que avaliam caso a caso. No caso concreto, a Seção acolheu o Recurso Especial do banco, uma vez que os juros cobrados estavam abaixo da taxa média de mercado.

Caracterização da mora

Os ministros acompanharam o voto da relatora, que segue o entendimento já pacificado da Segunda Seção. Caso tenham sido exigidos encargos abusivos na contratação (os chamados encargos do período da normalidade), a mora está descaracterizada. Por outro lado, o simples ajuizamento de ação revisional ou a mera constatação de que foram exigidos encargos moratórios abusivos, não afastam a caracterização da mora.

Quanto aos cadastros de inadimplentes, a inscrição do nome do devedor só está vedada se, cumulativamente: a) houver interposição de ação revisional; b) as alegações do devedor se fundarem na aparência do bom direito e na jurisprudência do STJ ou do STF; c) for depositada a parcela incontroversa do débito.

Reconhecimento de ofício

A ministra Nancy Andrighi reconheceu a atuação “de ofício” dos tribunais locais em casos que, pelo Código de Defesa do Consumidor, as cláusulas do contrato bancário forem consideradas abusivas.

Foi acompanhada neste ponto pelo ministro Luís Felipe Salomão. Os demais ministros também divergiram da relatora neste ponto. Sustentaram que, em ações envolvendo contratos bancários, não podem juízes e tribunais conhecer a abusividade de cláusulas sem que haja pedido expresso do consumidor.

Capitalização de juros

A Seção acompanhou o entendimento da relatora neste ponto e não conheceu do recurso, uma vez que a capitalização dos juros não estava pactuada no contrato.

Os temas relativos à capitalização dos juros e à comissão de permanência não puderam ser abordados sob a ótica da Lei dos Recursos Repetitivos, uma vez que a Seção decidiu que somente seriam apreciados os pontos que, no caso concreto, superassem o juízo de admissibilidade. Assim, outros processos que contenham tais temas deverão ser discutidos em outra oportunidade.

Opinião de especialista

O advogado Carlos André Magalhães, especialista em Direito empresarial, afirmou à revista Consultor Jurídico, que praticamente todas as teses defendidas pelos juristas especializados em Direito do Consumidor no setor financeiro foram rejeitadas.

“Embora duas questões não tenham sido analisadas por motivos formais, tudo leva a crer que a incidência da comissão de permanência (taxa cobrada para correção) e a capitalização de juros seguirão a tendência atual do STJ, favorável à argumentação jurídica do segmento de crédito”, disse ele.

Ele explicou também que do ponto de vista processual, os consumidores sofreram derrota em sua pretensão de ver examinada a abusividade das cláusulas. “Com o resultado final favorável à concessão de crédito, o natural — não fosse a grave crise internacional — seria a redução do spread bancário cobrado nas operações, alimentado em boa parte pelo índice de inadimplência.”

O especialista observou que os pontos não apreciados pelo STJ, em decorrência de questões processuais, continuarão a abarrotar o Tribunal porque vão alimentar controvérsia nos tribunais locais e regionais (cobrança de comissão de permanência e capitalização de juros) e decerto voltarão à deliberação da Corte.

REsp 1.061.530

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