Expurgos inflacionários

Febraban diz que STF deve barrar ações sobre planos

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21 de outubro de 2008, 8h56

A Federação Brasileira de Bancos (Febraban) pode recorrer ao Supremo Tribunal Federal para derrubar todas as ações de correntistas que cobram perdas das cadernetas de poupança causadas pelos planos econômicos. Os bancos tomarão a medida se o governo não entrar com uma Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental para defender a posição da Febraban. A Advocacia-Geral da União já anunciou, no entanto, que deve entrar com a ação em breve.

Com uma decisão do Supremo, a Justiça deve pacificar entendimento sobre as ações que cobram perdas ocorridas durante os planos Bresser (87), Verão (89), Collor (90) e Collor II (91). São milhares de processos que tramitam tanto na Justiça Estadual quanto na Federal. Os bancos podem perder até R$ 100 bilhões caso seja dado razão aos correntistas. Centenas de advogados já se especializaram na questão.

O gerente jurídico da Febraban, Antônio Carlos de Toledo Negrão, acredita que pelo menos seis ministros do STF votarão a favor dos bancos. Para ele, quatro decisões tomadas pelo tribunal desde 2000 — uma ADI, uma ADPF e dois Recursos Extraordinários — confirmam essa tendência.

O advogado diz que essas decisões reforçam a tese de que não existe direito adquirido em regime jurídico. “O Estado tem o poder de regular o regime monetário do país. Isso tem que ser preservado. Os princípios do direito adquirido e o ato jurídico perfeito não podem contrariar esse poder do Estado regular o regime monetário”, argumenta Negrão.

O economista-chefe da Febraban, Rubens Sardenberg, explica que os bancos fizeram apenas o que o governo determinava nesses planos. Se os correntistas ganharem, os bancos cobrarão os R$ 100 bilhões do Estado. Ele lembra que os bancos não ficaram com esse dinheiro na época dos planos. Além disso, 45% das ações são contra bancos públicos, em especial a Caixa Econômica Federal.

“No fim, é uma coisa injustiça para sociedade, porque os bancos irão atrás de seu direito e o Estado vai ter que ressarcir. Quem vai ganhar são os poucos que foram espertos”, diz o economista. O argumento é completado com o fato de que uma decisão contra as instituições financeiras pode agravar a confiança da economia em um momento de crise mundial.

Se resolverem levar o caso ao STF, será por meio de ADPF assinada pela Confederação Nacional do Sistema Financeiro (Consif). Os bancos só vão agir se a AGU nada fizer. O advogado-geral da União, José Antonio Dias Toffoli, já declarou publicamente que a AGU ajuizará uma ação sobre a questão. Para Toffoli, as ações dos correntistas devem ser julgadas improcedentes. No entanto, o assunto é politicamente delicado porque o governo pode passar a imagem que protege apenas os banqueiros. O prazo prescricional para ações contra o Plano Bresser acaba em janeiro do ano que vem.

Os precedentes

Em 2005, o Supremo julgou o Recurso Extraordinário 141.190 que considerou constitucional a tablita do Plano Bresser. Os ministros consideraram que a aplicação da tablita em negócio jurídico feito antes da vigência do Decreto-lei 2.342/87 não ofende o princípio do ato jurídico perfeito.

Segundo eles, o decreto apenas abrangeu os efeitos dos contratos que se projetaram além da data de vigência da norma, fazendo com que esses contratos estivessem sujeitos à incidência da tablita. Para os ministros, a questão é a defesa da economia, em que o Estado pode intervir para manutenção do equilíbrio dos contratos firmados no período.

No Recurso Extraordinário 226.855, os ministros entenderam que também são indevidas as correções monetárias dos saldos do FGTS com base nos índices dos planos Bresser, Collor e Collor II. No ano passado, na ADI 608, o Supremo considerou constitucional as normas que estabeleceram o fator de deflação referente ao Plano Collor II.

Nessas decisões, prevaleceu o entendimento de que não há direito adquirido em relação ao regime legal monetário, já que as normas são aplicáveis de imediato, segundo entende a Febraban. O Supremo ainda debate a questão dos processos que versam sobre a regra de conversão do Cruzeiro Real para a URV (Unidade Real de Valor), instituída na fase de implantação do Plano Real, entre julho e agosto de 1994. A ADPF 77, que trata do assunto, espera voto-vista do ministro Cezar Peluso para ser julgada.

Manifesto do Idec

Ao saber que a AGU preparava uma ação contra os correntistas, o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor lançou um manifesto para repudiar a idéia. Para o instituto, a ação representa “uma violação à Constituição Federal, porque o não pagamento da correção monetária implica em descumprimento do direito adquirido dos poupadores”. No dia 29 de outubro, o instituto promove uma manifestação pública contra a possibilidade do STF paralisar as ações.

A mobilização da Febraban e do governo fez com que os advogados Alexandre Berthe Pinto e Danilo Gonçalves Montemurro preparassem um estudo sobre a questão. O relatório será enviado à OAB de São Paulo (clique aqui para ler).

Eles afirmam que o STF e o STJ já têm entendimento pacificado de que as instituições financeiras são as únicas responsáveis pela correção dos expurgos. Para embasar o argumento, os advogados lembram que o Decreto-Lei 2.284/86 determinava que as cadernetas renderiam o equivalente ao IPC. Esse decreto vigorou até 15 de janeiro daquele ano, quando o Plano Verão foi editado.

“O entendimento jurisprudencial está tão solidificado que não são raros os julgamentos em que o banco é penalizado com multa por litigância de má-fé por entrar com recursos apenas para protelar o pagamento”, diz Berthe Pinto. Para o advogado, é inapropriado que o governo entre no caso, já que, se os bancos tivessem cumprido a lei, nenhuma ação existiria.

“Talvez fosse mais honesto com os poupadores que os bancos ao invés de entrar com uma ação para tentar modificar o que a Justiça já decidiu em milhares de processos, tentassem fazer acordos”, diz o advogado.

Em maio deste ano, a 2ª Câmara Especial Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul já determinou que os clientes do Banco Itaú recebessem as diferenças da baixa correção monetária da caderneta de poupança durante os planos econômicos. Em São Paulo e Minas Gerais, a Justiça também tem posições nesse sentido.

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