Defesa prévia

É inconstitucional punição disciplinar sem direito de defesa

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17 de outubro de 2008, 12h39

Dispositivos do Estatuto da Polícia Civil do estado do Amazonas, que trata da punição disciplinar antecipada do policial civil sem exercer o prévio direito de defesa, foram declarados inconstitucionais pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal. A Ação Direta de Inconstitucionalidade foi ajuizada pela Confederação Brasileira de Trabalhadores Policiais Civis (Cobrapol). Ela questionava os parágrafos 2º, 3º, 4º, 5º e 6º do artigo 43 da Lei 2.271/94.

Em síntese, a Confederação sustentou que os dispositivos da lei atacada afrontam o artigo 5º, incisos LV e LVII da Constituição Federal, ao fixarem penas de imediato, antes mesmo de o servidor apresentar qualquer defesa. Conforme a entidade, a Constituição é taxativa ao assegurar às partes de processo judicial ou administrativo, bem como aos acusados em geral, o contraditório e a ampla defesa e o estado de inocência até o trânsito em julgado da sentença.

“O diploma legislativo amazonense representa, a meu juízo, ato de direta violação a um dogma fundamental impregnado de universalidade, de transcedentalidade, de historicidade, consagrado nos mais diversos estatutos internacionais”, ressaltou o ministro Celso de Mello, relator.

Segundo ele, ninguém pode ser privado de seus direitos, nem mesmo punido, ainda que com sanções de menor gravidade, sem que tenha assegurado o direito de se defender previamente.

Celso de Mello afirmou que o caso não trata de suspensão preventiva ou cautelar, mas da própria sanção disciplinar final, com eficácia imediata. Para o ministro, nenhuma pessoa deve ser condenada sem ser previamente ouvida, mesmo no campo do direito administrativo.

Durante o voto, o relator comentou um episódio da obra “Alice no país das maravilhas”, de Lewis Carroll, em que a rainha de copas ingressa em grande salão onde estava havendo um julgamento e propõe logo a decapitação. “Primeiro a punição e depois o processo. Isso não tem sentido em face da Constituição da República”, avaliou o ministro Celso de Mello.

“Nunca é demasiado enfatizar que ninguém pode ser privado de sua liberdade, de seus bens ou de seus direitos sem o devido processo, notadamente naqueles casos em que se estabelece uma relação de polaridade conflitante entre o Estado de um lado e o indivíduo de outro”, disse, reconhecendo ser evidente a inconstitucionalidade dos preceitos contestados.

De acordo com o relator, o Estado não pode exercer a sua autoridade de maneira abusiva ou arbitrária desconsiderando, no exercício de sua atividade, a defesa plena “eis que o reconhecimento da legitimidade ético-jurídica de qualquer medida imposta pelo poder público de que resultem, como no caso, conseqüências gravosas no plano dos direitos e garantias individuais exige a fiel observância do princípio do devido processo”.

Assim, o relator acolheu o parecer, julgando procedente a ação para declarar a inconstitucionalidade dos parágrafos 2º, 3º, 4º, 5º e 6º, do artigo 43, da Lei 2.271/94, que instituiu o Estatuto do policial civil do estado do Amazonas. A decisão foi unânime.

ADI 2.120

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