À espera de direitos

Nem todos princípios da Constituição não foram implantados

Autor

  • Ives Gandra da Silva Martins

    é professor emérito das universidades Mackenzie Unip Unifieo UniFMU do Ciee/O Estado de S. Paulo das Escolas de Comando e Estado-Maior do Exército (Eceme) Superior de Guerra (ESG) e da Magistratura do Tribunal Regional Federal da 1ª Região professor honorário das Universidades Austral (Argentina) San Martin de Porres (Peru) e Vasili Goldis (Romênia) doutor honoris causa das Universidades de Craiova (Romênia) e das PUCs PR e RS catedrático da Universidade do Minho (Portugal) presidente do Conselho Superior de Direito da Fecomercio-SP ex-presidente da Academia Paulista de Letras (APL) e do Instituto dos Advogados de São Paulo (Iasp).

11 de outubro de 2008, 0h00

No último dia 5 de outubro, comemorou a Constituição Brasileira 20 anos. Apesar das 62 emendas aprovadas neste período, mostrou-se um texto estável no que diz respeito aos direitos fundamentais e suscetível de alterações na formatação da Federação.

Em 1992, escrevera artigo alertando para o tamanho da Federação criada, em que o alargamento dos três Poderes, a potencialidade de criação de novos municípios, a elevação da partilha do IPI e do Imposto de Renda e a criação de novos Estados instituíram um Estado maior do que o PIB, que exigiria um constante aumento da carga tributária para sustentá-lo.

Infelizmente, minhas previsões revelaram-se corretas e o suceder de tristes recordes da Receita Federal, que retira da sociedade cada vez mais tributos para não devolvê-los em serviços públicos dignos, está a demonstrar que, efetivamente, a Federação brasileira é maior do que o PIB. Os governos são maiores que a sociedade. E os tributos do povo são quase todos consumidos por políticos e burocratas que empalmaram o poder.

Direitos assegurados no texto supremo têm sido pisoteados, como o direito de defesa, o direito à inviolabilidade da vida em qualquer estágio, o direito à saúde e à educação, que consomem pouco, muito pouco do orçamento, quase todo destinado à sustentar a esclerosada máquina pública.

De qualquer forma, a Constituição resiste até o presente, nada obstante os 1.600 projetos de emenda constitucional que tramitam pelo Congresso Nacional (1200 na Câmara e 4000 no Senado). E só este fato é de se louvar, num país que já teve seis Constituições (1824, 1891, 1934, 1936, 1946 e 1967) e que conheceu no período republicano alterações constantes — golpes de Estados, ditaduras, atentados e uma permanente instabilidade política.

O mérito destes 20 anos é que, apesar de ter permitido um excessivo custo político e burocrático sobre o povo, com as estruturas públicas constantemente alargadas em função dos humores dos detentores do poder para acomodar aliados e amigos, o certo é que tem resistido.

Norberto Bobbio na “Era dos Direitos” afirmava que o Século XX permitiu a descoberta para toda a humanidade de uma gama enorme de direitos. Afirmava, todavia, que o grande desafio para o Século XXI consistiria em ofertar a garantia necessária para que estes direitos pudessem ser exercidos pela sociedade.

No que diz respeito a sua enunciação, a Constituição Brasileira encontra-se entre os melhores textos do mundo, apesar da teimosia de todos os governos em desrespeitá-la, pontual ou globalmente, quando seu interesse está em jogo.

A luta pelo exercício da cidadania é fazer com que tais direitos venham a ser garantidos no século XXI. De qualquer forma, a vivência da democracia no Brasil, sob o império da Constituição de 1988, é incomensuravelmente superior à da Venezuela , dominada por um histriônico tiranete , que impôs uma simulação de lei suprema, ou à da Bolívia, conduzida por seu desastrado presidente, que luta para impingir uma melancólica carta máxima em seu país, ou ainda de Corrêa no Equador. Este estágio de sub-desenvolvimento governamental, felizmente, está ultrapassado.

Na comemoração dos 20 anos desta Constituição, que teve como relator o prezado amigo Bernardo Cabral e como presidente o saudoso amigo Ulisses Guimarães, devem, todos os cidadãos, saudar sua permanência e esperar que se consiga colocar em prática muitos dos princípios e direitos lá enunciados, infelizmente, ainda dependentes de implantação.

[Artigo publicado no Jornal do Brasil no dia 7 de outubro]

Autores

  • é advogado tributarista, professor emérito das Universidades Mackenzie e UniFMU e da Escola de Comando e Estado Maior do Exército, é presidente do Conselho de Estudos Jurídicos da Federação do Comércio do Estado de São Paulo, do Centro de Extensão Universitária e da Academia Paulista de Letras.

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