Consultor Jurídico

Lobby atira em Instituto para acertar Gilmar Mendes

8 de outubro de 2008, 16h07

Por Redação ConJur

imprimir

O Prêmio Jabuti, que distingue o melhor da literatura brasileira, elegeu entre os vencedores deste ano, no campo jurídico, um trabalho de fôlego, escrito por Gilmar Mendes, Inocêncio Mártires Coelho e Paulo Gustavo Gonet Branco: o “Curso de Direito Constitucional”, uma obra de 1.364 páginas que o jurista e ex-governador Cláudio Lembo descreveu como o mais importante escrito sobre a Constituição vigente no país.

Os três autores fundaram, em 1997, uma arrojada escola para o ensino avançado do Direito. Nela, lecionam expoentes da magistratura, professores e craques brasileiros e internacionais do Direito como o português J.J. Canotilho, os alemães Peter Haberle e Hans Uwe Erichsen, o espanhol Francisco Fernando Segado, entre dezenas de outros papas do mundo jurídico. Trata-se do IDP, o Instituto Brasiliense de Direito Público. Não por acaso, advogados da União, integrantes do Ministério Público e juízes optam pela escola em busca de aperfeiçoamento — embora a maior parte dos alunos seja da iniciativa privada.

O estudioso Gilmar Mendes ajuda muito o ministro — agora presidente — do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes. Mas não é correspondido. Sempre que um grupo de pressão se vê contrariado em uma decisão judicial, repete-se a mesma ladainha: o ministro usa “seus poderes” para atrair alunos para o instituto e que juiz não deveria ser sócio de escola.

A revelação de que Gilmar participa do IDP pode impressionar quem não é do ramo e não leu as reportagens anteriores batendo na mesma tecla. Mas não emociona, por exemplo, o novo reitor da Universidade de Brasília (UnB) e professor de Teoria do Direito, José Geraldo de Souza Júnior. “O IDP cumpre seu papel social, regularmente, dentro do balizamento constitucional e com um projeto notável”, afirma Souza Júnior, que conhece a qualificação dos professores do Instituto, também atuantes na UnB, “perfeitamente credenciados para um projeto desse perfil”.

O ex-líder do governo petista na Câmara, Sigmaringa Seixas, vê no IDP “a mais importante contribuição cultural e acadêmica para o Direito, dos últimos anos”. Para ele, “iniciativas como essa deveriam ser estimuladas e não criticadas”. Ataques que se façam, diz, “são tentativas de retaliação sórdida contra quem tem as atitudes mais corajosas como chefe do Judiciário”.

O advogado-geral da União, José Antonio Dias Toffoli, que também já deu aulas e palestras no IDP, examina a instituição do ponto de vista do Estado. “Os cursos avançados existentes no mercado professam uma doutrina contra a União — são voltados para a iniciativa privada. Para eles, todo imposto é inconstitucional, desprezam a incumbência do poder público, têm a União como inimiga. O IDP é o único com visão publicista do Direito”, afirma o ministro.

Outro constitucionalista renomado, o ex-presidente da Câmara e presidente do PMDB, Michel Temer, considera “um acréscimo no currículo profissional e acadêmico já ter lecionado no IDP”. Sua descrição do ambiente da escola é a “do maior significado intelectual”. Para o autor da obra Elementos do Direito Constitucional, a situação do ministro Gilmar Mendes frente ao IDP “é absolutamente regular”.

Toffoli, da mesma forma que Souza Júnior e Sigmaringa Seixas, igualmente, não vê incompatibilidade entre as funções de juiz e sócio de escola. “Fosse consultado um advogado e bobagens como essa não seriam publicadas”, afirma o ex-deputado. Para o reitor, se o juiz pode dar aula na UnB e ter ações da Petrobras, pode também participar da sociedade de uma escola. “Não existe incompatibilidade alguma”, ratifica o ministro-chefe da AGU, garantindo que não existe licitação para inscrição nem contratação de curso de aperfeiçoamento. Ícone da educação brasileira, o senador Cristovam Buarque pensa da mesma forma: “Se ele é professor, ganha por dar aulas e não tem cargo de direção, não tem problema algum”.

Um dos maiores especialistas na Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Loman), o ex-presidente da Associação dos Juízes Federais e deputado pelo PCdoB, Flávio Dino, garante: “A Lei não veda, não proíbe e não há nenhum fato concreto de dilação de favorecimento a beneficiar o IDP”. Dino conhece o projeto e fala da relevância “não só para Brasília, mas para o país”, no papel complementar em relação ao que oferece a universidade. Sobre a participação do ministro na sociedade, insiste, “do ponto de vista constitucional, legal e moral não existe qualquer incompatibilidade com a função de magistrado. Na verdade, o Instituto é procurado porque é boa escola.”

Também ministro do STF, expert em Direito Público, Eros Grau sobe o tom, com eloqüência: “É uma instituição de primeiríssima linha e séria, de cujo corpo docente eu participo — como um grande número de ministros do STF e do STJ, gente que, de forma alguma, participaria de algo à margem dos mais rigorosos parâmetros éticos e legais”.

Festejado como autor e advogado, o constitucionalista Luís Roberto Barroso ressalta “a importância e seriedade do projeto assim como a qualidade do corpo docente”. Barroso enaltece a qualificação dos fundadores do IDP. “Tanto o professor Inocêncio quanto o professor Gilmar, independentemente de cargos públicos que eventualmente ocupem ou tenham ocupado são pessoas de grande credibilidade acadêmica com obras importantes. O primeiro em matéria de interpretação e o professor Gilmar em jurisdição constitucional e controle de constitucionalidade.” Barroso atua nessas duas áreas.

Quanto ao fato de Gilmar investir em educação e ser juiz, o advogado opina que “são dois espaços diferentes e jamais se viu o ministro Gilmar fazer ponte indevida entre eles”. Barroso acha importante e positivo que não se abra mão da vida acadêmica, uma vez que há um enriquecimento mútuo — “emprestar a autoridade moral do estudioso à autoridade formal do juiz só pode ser positivo”. Por fim, Barroso destaca que Gilmar já desfrutava do reconhecimento intelectual antes mesmo de se tornar Advogado-Geral da União: “Sua vida acadêmica precede sua atuação como magistrado — seria prejudicial para o país se ele tivesse de abrir mão de uma atividade para poder exercer outra”.

O Instituto

Entre as mais de 1.000 instituições de formação e aprimoramento no campo jurídico do Brasil, existem algumas ilhas de excelência. É o caso do IDP no plano do direito constitucional, da Fundação Getúlio Vargas na área do direito empresarial e da Faculdade de Direito da USP para o preparo geral do advogado militante. No momento em que o Ministério da Educação reduz o número de vagas nas escolas de direito e as próprias seções da OAB reconhecem a insuficiência da formação jurídica, é importante destacar o trabalho de algumas instituições que não somente preparam as novas gerações de advogados, magistrados, membros do Ministério Público e procuradores de entidades públicas, mas realizam um trabalho de construção e manutenção do estado de direito, garantindo ao país o cumprimento das disposições constitucionais e dando ao cidadão a segurança jurídica da qual necessita.

Fundado há onze anos, o IDP cresceu pela competência e trabalhos realizados, abrangendo não só a atividade didática mas os congressos que promove e as várias publicações que edita ou de que participa. Iniciadas as suas atividades sob a orientação de Gilmar Mendes e o ex-procurador-geral da República Inocêncio Coelho, quando o primeiro ainda estava na Casa Civil, o Instituto passou a se profissionalizar na medida em que seus fundadores assumiram novas funções.

O pensador Gilmar Mendes assumiu um papel de relevo na construção da cultura jurídica nacional vigente. Desde a época em que se colocou em primeiro lugar com a sua tese de doutorado na Alemanha a respeito do controle da constitucionalidade no direito brasileiro, até hoje quando defende as teses da sociedade aberta e da renovação do direito público no Supremo Tribunal Federal. Nesses quase vinte anos de trabalho, ele liderou a reforma do direito constitucional com a aprovação da nova legislação referente tanto as ações diretas de inconstitucionalidade (ADIs) como às declaratórias de constitucionalidade (ADC) e da Argüição de Preceito Fundamental (ADPF). Ele também reorganizou a defesa da União quando dirigiu a AGU, dando nova dimensão à defesa do Estado.

Este ano, em abril, o IDP trouxe o professor Carlos Miguel Herrera, da Université de Cergy-Pontoise (França) para falar sobre “Estado Social e Direitos Sociais”. Em maio, o tema foi “Rumos da Codificação Ambiental na Alemanha e Europa”, apresentado por Eckhart Rehbinder, professor Catedrático Emérito de Direito Público e Ambiental da Universidade de Frankfurt e Michael Kloepfer, Catedrático de Direito Público, Financeiro e Ambiental na Universidade Humboldt de Berlim. A Alexander Graser, Catedrático de Direito Público na Hertie School of Governance (Berlim) coube palestrar sobre “Igualdade e Direito e Políticas Públicas”. Robert Cottrol, da George Washington University tratou do “Antidiscriminatório e Ações Afirmativas nos EUA”, enquanto Bernd Schulte, Doutor e Pesquisador do Corpo Permanente do Instituto Max-Planck de Direito Social Estrangeiro e Internacionald e Munique tratou do “Direito Antidiscriminatório e Ações Afirmativas na União Européia e Alemanha” e Ockert Dupper, Doutor por Harvard e Professor de Direito da Segurança Social e Direito do Trabalho em Stellenbush, Africa do Sul, bem como professor visitante em Munique do “Direito Antidiscriminatório e Ações Afirmativas na África do Sul”.