Dia do Ministério Público

Dia do MP: promotores e procuradores ainda precisam calibrar o ego

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27 de novembro de 2008, 12h09

Dia 26 de novembro comemorou-se o dia do Ministério Público. Sem muita festa, é verdade. Mas a questão é: há o que se comemorar? Sim, respondo peremptoriamente. Como já afirmei diversas vezes, após o lobby realizado na assembléia constituinte, os membros da instituição conseguiram se desvincular do Executivo, onde serviam de advogados e, independentes, alcançaram a figura jurídica de fiscal da lei, do bom uso do erário, da gestão da coisa pública. Noutras palavras — o Ministério Público é uma instituição essencialmente republicana e democrática, na lógica contemporânea pós-ditadura.

Graças às garantias constitucionais concedidas aos membros do parquet, grandes ações foram intentadas de 1988 para cá, o poder econômico e político foi duramente questionado e a independência funcional efetivou a credibilidade inquestionável dos promotores e procuradores junto à opinião pública e publicada. Ainda que com certa demora, instituiu-se o Conselho Nacional do Ministério Público com o escopo de regular questões administrativas de âmbito nacional e apurar o que o corporativismo não alcança na esfera interna estadual e federal.

Atuando contra o poder público, afrontando interesses políticos e financeiros dos mais diversos, os cartéis, monopólios, oligopólios, latifundiários, picaretas ambientais, contrabandistas, poluidores, policiais e servidores públicos corruptos, banqueiros, e outros tantos “maganos” que até então eram intocáveis, provou o Ministério Público estar institucionalmente cumprindo com o seu papel. Os problemas de avaliação começam exatamente nesse ponto: “de que forma” e “há coerência”?

Como tudo o que é republicano, os fiscais são os primeiros a serem fiscalizados. De 1988 à atualidade, o Ministério Público deflagrou inúmeras operações internas ou conjuntas, tentando aumentar a órbita de seus próprios poderes, atuando na investigação direta de delitos de maior calibre. Sem grande sucesso, o tema é alvo de controvérsia atual no Supremo Tribunal Federal. Ainda assim, devemos reconhecer a coragem da primeira instituição a fazer frente direta ao poder aristocrático tupiniquim, esse regime de compadrio que tem a corrupção como um pressuposto.

Contudo, os promotores também são de carne e osso. A visibilidade excessiva dos membros do MP é uma mosca azul a picar este ou aquele que sonha com a carreira política. Querem fazer crer no paradigma do Eliot Ness. Sem uma quarentena razoável, não saberemos se as ações intentadas por promotores e procuradores são, na verdade, uma defesa da ordem jurídica ou se o teatro da mídia auxilia a exploração do imaginário popular a cabalar votos futuros. De outro lado, a assunção de outros cargos públicos, principalmente os ligados ao Poder Executivo, desvirtua a independência funcional, atrelando os fiscais aos fiscalizados, como pode se configurar um desvio de função com depreciação do erário. Estão aí problemas ligados à coerência.

Até dentro do próprio Ministério Público há o questionamento desses desvios de função. Em Mato Grosso, por exemplo, digladiam-se duas correntes: de um lado, o procurador Mauro Viveiros questionando o período no qual o outro procurador Scaloppe assumiu assento no Conselho Administrativo de Desenvolvimento Econômico. Não é nenhum demérito buscar a moralidade, ainda que seja em desfavor dos próprios membros da instituição, ao contrário, são qualidades adicionais que demonstram a capacidade de se auto-fiscalizar, auto-limitar. Nessa altura, resta um problema dos mais relevantes.

Quanto á forma, “como se faz”, a tática ministerial é a do medo. Isso é negativo, sob qualquer prisma. Em minha opinião, esse é o grande problema — o terror que os promotores impõem a segmentos empresariais, comunidades locais, partidos políticos, advogados e até magistrados. Solicitar prisões às dúzias com objetivo único de colher depoimentos, impedir o livre acesso de advogados aos processos ditos sigilosos, formar parcerias com magistrados num bate-bola questionável, tentar submeter delegados de polícia, notificar cidadãos a comparecerem às dependências ministeriais sem declinar as razões, pressionar atividades empresariais com ações de alto impacto, não só passam ao largo da missão institucional do Ministério Público como eclipsam os seus méritos.

No dia do Ministério Público, quem deve comemorar não são apenas os promotores ou procuradores, é a sociedade brasileira que ganhou um parceiro. Um amigo dos consumidores, dos cidadãos, dos contribuintes, das comunidades menos assistidas, dos trabalhadores. O desafio para o futuro é modular essa atuação, calibrar os egos, substituindo o medo pela justiça, o terror pelo equilíbrio, a seletividade pela generalidade, o ardor pela ponderação, a paixão fanática pelo amor compreensivo. Parabéns ao Ministério Público.

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