Tráfego urbano

Dano material pode e deve ser indenizado pela Administração

Autor

  • Rubens Naves

    é sócio do escritório Rubens Naves Santos Jr. e Hesketh Associados professor licenciado da PUC-SP conselheiro consultivo e presidente da Fundação Abrinq pelos Direitos da Criança e do Adolescente (2002-2006)

26 de novembro de 2008, 23h00

A Prefeitura de São Paulo levou 14 horas para liberar o trânsito na Marginal Tietê depois que uma carreta com 40 toneladas de açúcar tombou na pista expressa, no último dia 30 de outubro. Um acidente desta proporção provocou um verdadeiro caos no já insuportável trânsito da região metropolitana. Milhares de pessoas foram prejudicadas. A lentidão na Marginal, que tem 24 km, chegou a 22 km, sendo que no trânsito normal é de cerca de 10 km. No total da cidade, chegou a 139 km. Este episódio serviu para atestar a falta de habilidade do nosso Poder Público, que tem por obrigação fazer o tráfego de veículos fluir, evitando desgaste e prejuízos de seus motoristas e cidadãos.

A CET (Companhia de Engenharia de Tráfego) demonstrou inabilidade e descaso ao alegar que a demorada liberação foi provocada porque não é sua função tirar a carga da pista. Ora, ainda que essa responsabilidade fosse do particular, era dever da Companhia tomar todas as providências para que isso ocorresse, efetivamente, com a maior brevidade possível. Afinal, é o mínimo que se pode esperar de uma instituição que tem por missão “prover mobilidade com segurança no trânsito” da Capital. A função da CET não é apenas a de distribuir multas.

O cidadão paulistano, que é refém do excesso de veículos cotidiano, agora também sabe que nossos engenheiros de tráfego, que têm por obrigação garantir o melhor andamento de nossos veículos, não têm um plano de emergência para catástrofes.

Por conta deste grave acidente, milhares de pessoas, de diferentes profissões, tiveram prejuízos. Reuniões com hora marcada foram perdidas, cargas perecíveis que precisavam de pronta entrega foram perdidas, entre outros problemas. Caso consigam provar essas perdas, os usuários podem entrar com ações indenizatórias.

O dano material pode e deve ser indenizado pela Administração Pública de São Paulo. A grande dificuldade para o cidadão prejudicado, contudo, é conseguir comprovar na Justiça o nexo de causalidade entre a omissão da Prefeitura, de um lado, e o aumento desproporcional do trânsito e os prejuízos que isso efetivamente lhe causou, de outro. O desafio é grande, mas, se superado, pode sim gerar direito à percepção de indenização, eis que a Administração responde, independentemente de culpa ou dolo, pelos danos por ela acarretados, podendo depois ressarcir-se desses gastos junto aos agentes públicos que se omitiram no cumprimento de seus deveres legais.

Não se está aqui, evidentemente, a sugerir a criação de uma “indústria de indenizações” em relação ao grave problema do trânsito em nossa cidade. Este apenas vai ser solucionado com políticas públicas bem planejadas, implementadas e monitoradas. No entanto, não se pode desprezar o papel estratégico que ações indenizatórias bem formuladas podem exercer em termos de pressionar o Estado a avançar nesse campo. O que não mais se admite é que nossos administradores coloquem a culpa na fatalidade.

O exemplo do ocorrido em relação às enchentes ilustra bem essa idéia: diante de ações indenizatórias movidas contra o Estado, nossos tribunais deixaram de aceitar a defesa de que se tratava de uma “força da natureza” e, ao reconhecer a responsabilidade pelos danos causados, forçaram e continuam forçando nossos administradores a canalizarem adequadamente os córregos da Capital, por exemplo. Milhares de pessoas não podem ser reféns desse tipo de situação caótica.

Vale ressaltar que garantir o bem-estar do cidadão é um dos pilares que sustentam a atividade dos administradores públicos. E a omissão num momento de caos não é uma decisão razoável, demonstrando certo desrespeito ao cidadão que paga seus impostos em dia. É necessário estar preparado, ter uma engenharia que nos amenize os problemas em caso de acidentes nas nossas principais vias.

* Rubens Naves é conselheiro fundador da Transparência Brasil, conselheiro e ex-presidente da Fundação Abrinq, professor licenciado da PUC-SP e sócio titular do escritório Rubens Naves, Santos Jr. e Hesketh Advogados Associados – [email protected]

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    é sócio do escritório Rubens Naves, Santos Jr. e Hesketh Associados, professor licenciado da PUC-SP, conselheiro consultivo e presidente da Fundação Abrinq pelos Direitos da Criança e do Adolescente (2002-2006)

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