Ato prolongado

Extorsão após o roubo é crime continuado, e não novo crime

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20 de novembro de 2008, 16h32

A 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça reconheceu a existência de crime continuado em caso de roubo seguido de extorsão. Por isso, negou recurso do Ministério Público contra acórdão do Tribunal de Justiça paulista, que havia aplicado o princípio da continuação delitiva para reduzir a pena de dois condenados.

Na segunda instância, os desembargadores entenderam que o crime de extorsão praticado pelos condenados foi um prolongamento do roubo que já se desenrolava, não se caracterizando como crime separado. Assim, os réus Mário Fortunato da Silva e Arnildo da Silva Marques, condenados a nove anos, nove meses e 18 dias de reclusão e 42 dias-multa, tiveram suas penas reduzidas para oito anos, três meses e 16 dias de reclusão em regime inicial fechado e 34 dias-multa.

O Ministério Público recorreu ao STJ, alegando existir divergência jurisprudencial quanto à caracterização de concurso material na hipótese em que, após crime de roubo, o agente obriga a vítima a fornecer cartão bancário e respectiva senha. De acordo com o processo, depois de praticar dois assaltos à mão armada, a dupla exigiu a entrega dos cartões bancários e respectivas senhas de uma das vítimas e a levou até um caixa eletrônico para sacar o dinheiro de sua conta-corrente.

Citando várias doutrinas e autores — Manoel Pedro Pimentel, Celso Delmanto, Basileu Garcia, Paulo José da Costa Júnior, Paulo de Souza Queiroz, Heleno Cláudio Fragoso e César Roberto —, a relatora do processo, desembargadora convocada Jane Silva, votou pelo reconhecimento do crime continuado.

“Entendo que assiste razão à parcela da doutrina no que se refere à possibilidade da continuação delitiva entre o crime de roubo e extorsão, porquanto, não obstante conheça a orientação contrária, aceito como correto o entendimento dos que acham que tais crimes são da mesma espécie, porquanto praticados contra o patrimônio.”

Em seu voto, Jane Silva também destacou que, ao se referir aos crimes em continuação delitiva, o legislador não fala em crimes idênticos ou não, mas em crimes da mesma espécie, além de prever a possibilidade de serem as penas iguais ou mais graves. Para ela, os crimes relatados nos autos são graves e devem ser punidos com rigor, “mas não se pode negar que foram nas condições do artigo 71 do Código Penal e, assim, devem ser tidos em continuação delitiva”.

Segundo a relatora, o atual regime adotado em relação à continuação delitiva pelo Estatuto Penal eliminou séria divergência doutrinária e jurisprudencial para autorizar o seu reconhecimento, mesmo em se tratando de crimes que atingem bens personalíssimos e vítimas diversas, bastando que estejam presentes os requisitos objetivos previstos no seu artigo 71, que tem o seguinte teor:

“Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e, pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devem os subseqüentes ser havidos como continuação do primeiro, aplica-se-lhe a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada, em qualquer caso, de um sexto a dois terços.”

De acordo com Jane Silva, o roubo é crime complexo, pois consiste em uma subtração de coisa mediante violência ou grave ameaça; e a extorsão envolve exatamente os mesmos bens jurídicos, tendo por única diferença a exigência de participação ativa da vítima. “São, portanto, crimes da mesma espécie, o que nos faz concluir pela adequação da aplicação da continuidade delitiva nesta hipótese”, disse a desembargadora convocada.

REsp 103.168-3

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