Gilmar na Alemanha

Presidente do STF fala sobre sistema de cotas em visita à Alemanha

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19 de novembro de 2008, 20h01

O modelo de cota para minorias não deve levar em conta somente a raça ou a cor da pele do indivíduo, mas sim a sua situação cultural, econômica e social. A afirmação foi feita pelo presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Gilmar Mendes, em palestra aos estudantes de Direito da Universidade Humboldt, de Berlim.

Para ilustrar sua posição, o presidente do STF citou Caiio Prado Junior em seu livro Formação do Brasil Contemporâneo : “a classificação étnica do indivíduo se faz no Brasil muito mais pela sua posição social; e a raça, pelo menos nas classes superiores, é mais função daquela posição que dos caracteres somáticos”.

O ministro disse ainda que o Brasil caminha para a adoção de um modelo próprio de ações afirmativas de inclusão social, levando em conta as peculiaridades culturais e sociais da sociedade brasileira, que impedem o acesso do indivíduo a bens fundamentais, como a educação e o emprego.

Ele destacou que em muitos países o preconceito sempre foi uma questão étnica e no Brasil o problema vem da posição ou o status cultural, social e econômico do indivíduo.

Ainda falando sobre preconceito, o ministro destacou um caso em que liberdade de expressão se relacionava com uma conduta anti-semita. O STF apreciou, em setembro de 2003, a condenação de um escritor e sócio de uma editora por delito de ter publicado obras com conteúdo de discriminação contra judeus. “Nesse contexto, ganha relevância a discussão a respeito da medida de liberdade de expressão permitida constitucionalmente, sem que isso possa levar à intolerância e ao racismo, em prejuízo da dignidade humana, do regime democrático, enfim, dos valores inerentes a uma sociedade pluralista.”

Dentro deste contexto, Gilmar lembrou o 11 de setembro e disse: “a tolerância nas sociedades multiculturais é o cerne das questões a que este século nos convidou a enfrentar em tema de liberdade e igualdade”.

Durante a palestra, Gilmar falou que a liminar deste século XXI é repensar a liberdade e igualdade segundo o valor fundamental da fraternidade. “Com isso quero dizer que a fraternidade pode constituir a chave por meio da qual podemos abrir várias portas para a solução dos principais problemas hoje vividos pela humanidade em tema de liberdade e igualdade”.

Gilmar falou ainda do papel do Judiciário: “À esfera da política cabe a formulação de políticas públicas, cumprindo ao Poder Judiciário o papel de guardião da Constituição e dos direitos fundamentais, como obstáculos intransponíveis à deliberação política. Esse é um grande desafio para a jurisdição constitucional: conciliar a proteção dos direitos fundamentais e da democracia”.

Cruzeiro do Sul

Em sua viagem à Alemanha, o ministro também participou da Reunião Anual da Associação Luso-Alemã de Jurista. Durante o evento, entregou ao professor alemão Erik Jayme a comenda da Ordem Nacional do Cruzeiro do Sul, a mais alta condecoração brasileira concedida a personalidades estrangeiras pelo presidente da República

Jayme é professor emérito da Universidade de Heidelberg, ex-diretor do Instituto de Direito Internacional Econômico e Privado e doutor honoris causa por cinco universidades, entre elas as de Coimbra e a Federal do Rio Grande do Sul. “Um dos maiores juristas do nosso tempo e representante internacionalmente reconhecido do direito internacional privado”, elogiou o ministro.

A visita à Alemanha também serviu para reflexões: “não devemos, porém, cair na tentação da onipotência e da onipresença desta Corte em todas as questões de interesse da sociedade. À esfera da política cabe a formulação de políticas públicas, cumprindo o Poder Judiciário, nessa seara, o papel de guardião da Constituição e dos direitos fundamentais, como obstáculos intransponíveis à deliberação política. Esse é um grande desafio para a jurisdição constitucional: conciliar a proteção dos direitos fundamentais e da democracia.

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