Tráfico de drogas

Fraude bilateral não impede a caracterização do estelionato

Autor

  • Ravênia Márcia de Oliveira Leite

    Ravênia Márcia de Oliveira Leite é delegada de Polícia Civil em Minas Gerais bacharel em Direito e Administração pela Universidade Federal de Uberlândia pós-graduada em Direito Público pela Universidade Potiguar e em Direito Penal pela Universidade Gama Filho.

18 de novembro de 2008, 14h09

Conforme doutrina pátria, nas lições do professor Dílio Procópio Drummond de Alvarenga, da Universidade Federal de Juiz de Fora, que ensina que a “torpeza bilateral (utriusque turpido), configura-se naquela situação em que ambos os sujeitos do delito têm interesses ilícitos. Exemplos: alguém compra uma falsa máquina de fabricar moedas, julgando-a verdadeira, ao ser enganado mediante manobras ardilosas (conto da guitarra); outro alguém, iludido por algum artifício empregado e mediante pagamento da alta quantia, contrata um falso pistoleiro para matar um seu inimigo, o que, a final, não é concretizado; um determinado empregado, que levava consigo certo numerário para entregá-lo a seu patrão, adquire com ele, após ser induzido a erro, um bilhete de loteria falsamente premiado. Pergunta-se: qual a solução jurídica para as três hipóteses, considerando o ilícito interesse de todos os envolvidos?”

Continua o ilustre delegado de Polícia aposentado e docente, “apesar das opiniões em contrário, até mesmo de Hungria, para quem o direito não deve preocupar-se com questões à margem do direito, penso que cada pessoa deve responder segundo a tipificação de sua conduta e o dano criminal que tiver produzido (…). Assim, a resposta será muito fácil se se considerar que o dano criminal, nas três situações, só ocorreu por obra dos estelionatários. Um episódio de torpeza bilateral, que merece alusão, é a compra e venda de uma falsa jóia paga por meio de moeda falsificada (http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=9276).

A jurisprudência dos tribunais superiores os quais já decidiram que “fraude bilateral não impede a caracterização do estelionato. O tipo penal não exige a boa-fé da vítima, razão pela qual o STF (RT 622/387) tem entendido caracterizado o estelionato mesmo na hipótese de torpeza bilateral, ou seja quando também a vítima está de má-fé na realização do negócio. Presentes as elementares do tipo, o estelionato estará caracterizado mesmo que a vítima estivesse de má-fé no negócio. Há estelionato mesmo quando a fraude é praticada no jogo de azar, quando se retira do jogador, por fraude, a possibilidade de ganhar (STF). O que faz descaracterizar o ilícito é a fraude destinada a frustrar pagamento de negócio não tutelado pela lei, como, p. ex., no cheque falso entregue em razão de prostituição ou de jogo de azar. É o que entende Mirabete e como tem julgado o TACrSP. É imprescindível que o meio fraudulento empregado pelo agente seja idôneo, apto a enganar a vítima. Do contrário, estaríamos diante de um crime impossível. A fraude grosseira entendida como meio inidôneo, mas há súmula do STJ no seguinte sentido: “Súm 73. A utilização de papel-moeda grosseiramente falsificado configura, em tese, o crime de estelionato, da competência da Justiça Estadual” (http://www.intelligentiajuridica.com.br/old-nov2001/artigo4.html).

O crime de estelionato, por tratar-se de crime material, consuma-se no momento e local em que o agente obtém a vantagem ilícita em prejuízo alheio.

Heleno C. Fragoso, M. Noronha, Júlio F. Mirabete, sumidades no Direito Penal Pátrio defendem que a torpeza bilateral não descaracteriza o delito de estelionato pelos seguintes argumentos: “a) o fato é típico, pois não se pode ignorar a má-fé do agente que empregou a fraude e obteve a vantagem, nem o fato de a vítima ter sido enganada e sofrido o prejuízo; b) a reparação do dano na esfera civil é matéria que interessa apenas a vítima, mas a punição do estelionatário visa proteger toda a sociedade.”

A jurisprudência na matéria é farta, admitindo-se que a torpeza bilateral não descaracteriza o crime de estelionato. Senão vejamos:

“Pratica estelionato quem assina cartão de crédito, que sabe não lhe pertencer, logrando efetuar compras em loja” (TACrSP, RJDTACr 15/83).

A utilização de papel-moeda grosseiramente falsificado configura, em tese, o crime de estelionato, da competência da Justiça Estadual”(STJ, Súmula 73; STJ, CComp 6.895, 14.3.94, p. 4468, in RBCCr 6/233).

“A simples mentira, mesmo verbal, mas que leve a vítima a erro, pode configurar ”(STF, RTJ 100/598; (TACrSP, julgados 70/311; TJSC, RT 541/429).

“Pratica estelionato o agente que, fazendo uso de folha de cheque cedida por um amigo, adquire veículo da vítima, sendo o pagamento sustado pelo correntista, que não havia autorizado o preenchimento da cártula naquele valor” (TACrSP, RT 776/604).

Manter curso de teologia, sem autorização do Conselho Federal de Educação, oferecendo-o ao público como se fosse de nível superior. Alunos são mantidos em erro (TRF da 1ª R., RT 768/700)

Estelionato. Não Impede a sua configuração a Conduta Ilicita ou imoral da vítima (Torpeza Bilateral). Emissao de cheque, sem fundos, em pagamento de divida de jogo pode constituir crime de estelionato. O artigo 1477 do código civil, embora disponha que as dividas de jogo não obrigam a pagamento, todavia acrescenta: "mas não se podera recobrar a quantia que voluntariamente se pagou". assim, embora o cheque seja dado prosolvendo e não pro soluto, força, força e reconhecer que, se o réu tivesse provisao de fundos, o cheque teria sido recebido e o réu não teria ação para recobrar a respectiva importancia. logo, não há negar que, na espécie, a emissao do cheque sem fundos importou para a vítima um dano patrimonial (STF – HC 33.015).

Por todo o exposto, em caso de crime de tráfico de sustâncias entorpecentes, onde o Laudo de Constatação acostado ao Inquérito Policial, não foi capaz de identificar a sustância como proscrita pelo sistema jurídico brasileiro, verificamos outro caso de torpeza bilateral, onde o traficante sabedor que era de que a venda que empreendia não era de droga, mais sim, de qualquer outra substâncias lícita (por exemplo, venda de comprimindo, supostamente, ecstasy, de onde o laudo pericial verifica não passar de analgésico) à pessoa que compra a substância com o fito de fazer o consumo pessoal da mesma, configura-se, conforme amplamente declinado aqui, com base na doutrina e jurisprudência, o crime de estelionato pelo suposto traficante, com base na tese da torpeza bilateral, a qual, conforme declinou-se, não impede a configuração do crime de estelionato.

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    Ravênia Márcia de Oliveira Leite é delegada de Polícia Civil em Minas Gerais, bacharel em Administração pela Universidade Federal de Uberlândia, pós-graduada em Direito Público pela Universidade Potiguar e pós-graduanda em Direito Penal pela Universidade Gama Filho.

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