A indústria do grampo

Entrevista: David Rechulski, advogado

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16 de novembro de 2008, 9h55

David Rechulski - por SpaccaSpacca" data-GUID="david_rechulski.jpeg">Interceptações não são um problema apenas para os milhões de brasileiros que têm telefone (e que, na opinião do ministro da Justiça Tarso Genro, devem se acostumar com a idéia de que podem estar sendo grampeados). Para as 17 operadoras de telefonia que atuam no país, o grampo é uma inesgotável fonte de dores de cabeça. Afinal, cabe a elas implementar as ordens judiciais de interceptações.

Mesmo que originadas de pedido do Ministério Público ou da polícia e assinadas por um juiz, nem sempre essas ordens são legais. E este é o primeiro dilema que enfrentam as operadoras diante da questão: “Mesmo correndo o risco de serem acusadas de desobediência à Justiça, elas tomam todo o cuidado para não serem responsabilizadas por atender um pedido ilegal da Justiça”, diz David Rechulski, advogado criminalista que atua para operadoras de telefonia.

Rechulski acabou falando em nome de todas as operadoras ao ingressar com pedido de Mandado de Segurança no Supremo Tribunal Federal para impedir que as teles fossem obrigadas a transferir segredo de justiça de que eram guardiãs à CPI das Escutas Telefônicas Clandestinas, da Câmara dos Deputados, sem autorização prévia do STF. Foi a oportunidade para o Supremo reafirmar que CPI não tem poder para quebrar o sigilo judicial que protege as ordens cumpridas pelas telefônicas.

O advogado reconhece que a interceptação acabou se transformando em uma ferramenta fundamental em determinado tipo de investigação, como é o caso do crime organizado e do crime financeiro. Mas faz ressalvas legais: só pode ser usada depois que se esgotaram todas as outras formas legais de apuração dos fatos; e deve ser aplicada na estrita forma da lei.

Com a regulamentação do procedimento de grampo a partir de 1996, com a sanção da Lei 9.296, as operadoras foram compelidas a se estruturar para atender à demanda das novas obrigações. Criaram então um setor eufemística e genericamente batizado de “Grupo de Relacionamento com Órgãos do Poder Público”. A montagem desse departamento exigiu investimento em tecnologia, treinamento e seleção de pessoal. “São funcionários de absoluta confiabilidade e credibilidade”.

É ali que são processadas as ordens judiciais de interceptações telefônicas. Surpreendentemente, quem trabalha no setor não são engenheiros, necessariamente, mas prioritariamente bacharéis em Direito. “Não se trata de uma função tecnológica. A operacionalização do grampo consiste em inserir no sistema de operação os dados da determinação judicial. Quem faz isso precisa ter capacidade para entender as determinações do Judiciário e para tomar as medidas com absoluta fidelidade ao conteúdo do mandado”, explica Rechulski.

A segurança dessas pessoas é a mais nova preocupação das operadoras, depois que o Conselho Nacional de Justiça baixou resolução determinando que sejam identificados os funcionários que fazem as interceptações. “É uma situação comprometedora em termos de segurança dessas pessoas”, afirma Rechulski.

O grampo gera ainda um ônus na planilha de custos das telefônicas. Mas elas não reclamam. O item pode ser comparado à cláusula do contrato de concessão que obriga a operadora a instalar uma antena de telefonia numa pequena cidade com um movimento de ligações tão baixo que não cobre o investimento.

Desde 1996, o volume de ordens judiciais para que fossem procedidas interceptações vinha num crescendo até desembocar nas cerca de 400 mil autorizações judiciais contabilizadas pela CPI do Grampos em 2007. Nem um especialista na matéria como Rechulski é capaz de dizer exatamente o que significa esse número. “Os dados e os critérios variam de empresa para empresa”, diz ele. O fato é que depois do escândalo da Operação Satiagraha, o número de ordens de interceptação caiu. Na opinião do advogado, os juízes estão mais rigorosos para atender aos pedidos da polícia e do MP.

David Rechulski formou-se na FMU em 1989 e fez pós-graduação em Processo Penal e em Direito Penal Econômico pela Universidade de Coimbra. Desde os tempos da faculdade, ele atua em sua área de especialização. Segundo o advogado, o Direito Penal Econômico vem crescendo, principalmente depois de 1990. “Começaram a entrar em vigor leis que alcançavam os administradores das empresas, como o Código do Consumidor; Crimes Contra a Ordem Econômica; Crimes contra o Meio Ambiente; e Crimes Financeiros, entre outros”, afirma o advogado. Participaram da entrevista, feita na redação da Consultor Jurídico, as jornalistas Aline Pinheiro e Gláucia Milício.

Leia a entrevista

ConJur — Há excesso de escutas?

David Rechulski — Até à Operação Satiagraha, da Polícia Federal, que teve toda essa repercussão com a prisão de Daniel Dantas, vinha ocorrendo um excessivo uso desse instrumento de investigação. Na verdade, a interceptação telefônica deve ser usada quando não se tem outros elementos para apurar os fatos criminosos. O último recurso é lançar mão da intimidade de um cidadão em busca de provas. O caso da Satiagraha ganhou repercussão porque ocorreram excessos notórios e isso provocou um posicionamento firme por parte do Supremo. Serviu como exemplo de que os fins são importantes, mas deve se preservar os meios adequados para se chegar a eles. A operação trouxe freios para um trem desgovernado


ConJur — Nas investigações da polícia, primeiro se grampeia e depois se investiga?

David Rechulski — A escuta é usada como um instrumento de investigação quase que “obrigatório” nas investigações que envolvem crimes financeiros, tráfico de entorpecentes e formação de quadrilha. Mas deve ser obedecida a Lei 9.296/96.

ConJur — Qual é o papel das operadoras nessa matéria?

David Rechulski — Ao receber ordem específica de juiz criminal em processo que apura crime apenado com reclusão, a operadora tem que dar andamento ao pedido. É obrigação das operadoras dispor de todos os meios tecnológicos necessários para a instrumentalização das interceptações judiciais.

ConJur — E quando a ordem não segue o que diz a lei?

David Rechulski — A operadora deve informar, por ofício fundamentado ao juiz, que não há como se dar cumprimento àquela ordem uma vez que ela se choca com os preceitos da Lei 9.296/96. Há juízes que entendem a questão, mas outros ficam desconfortáveis diante dessa postura e adotam medidas, como a de determinar instauração de inquérito por desobediência. Às vezes, há até ameaça de constrangimento maior, como busca e apreensão. Existe realmente uma pressão muito forte quando uma autoridade não tem a sua ordem prontamente atendida.

ConJur — A interferência do STF no caso Daniel Dantas reduziu o número de pedidos?

David Rechulski — Parece que os juízes fizeram uma reflexão depois de toda a discussão em torno do tema. E passaram a se posicionar de forma menos liberal em relação à quebra de sigilo telefônico.

ConJur — Este site noticiou que a queda no número de grampos foi de 30%.

David Rechulski — É uma estimativa.

ConJur — Qual é a proporção de ordens judiciais que não atendem os requisitos da 9.296?

David Rechulski — É uma parcela mínima. Realmente são poucas exceções dentro de um universo de milhares de ordens.

ConJur — Por exemplo?

David Rechulski — Recebemos uma determinação de interceptação telefônica de um juiz da Vara da Infância e da Juventude. A lei é clara quando coloca como pré-requisito a necessidade de que o crime em apuração deve ser apenado com reclusão. O menor não é apenado com reclusão, mas com medida sócio-educativa. Como a Lei 9.296 é de 1996 e o Estatuto da Criança e do Adolescente é de 1990, fica evidente, que se o legislador ordinário quisesse, ele teria instituído como requisito essa possibilidade. Se o legislador, que veio depois conhecendo o que já tinha antes, não textualizou isso, é porque ele não queria que fosse dessa forma.

ConJur — A operadora pode ser responsabilizada se cumprir ordem ilegal?

David Rechulski — Se cumprir uma ordem manifestamente ilegal pode ser atribuída responsabilidade a quem, dentro da operadora, determinou o cumprimento dessa ordem. Existe dentro de cada operadora um departamento específico para atender os ofícios recebidos das autoridades públicas, seja para fornecimento de dados cadastrais, seja para interceptação telefônica. O nome do departamento varia em cada operadora, mas é algo como “grupo de relacionamento com órgãos do poder público”.

ConJur — Qual é o tamanho desse departamento?

David Rechulski — É um departamento muito estruturado. Exige investimento em tecnologia, treinamento e seleção de pessoal. São funcionários de absoluta confiabilidade e credibilidade. O sistema de acesso tem uma chave biométrica, além da codificação sistêmica com login e senha. Cada acesso que você faz, fica registrado quem foi o funcionário que o fez.

ConJur — Quando começaram a surgir esses departamentos?

David Rechulski — A partir de 1996, quando foi regulamentada a matéria. As empresas tiveram naturalmente que se estruturar para poder cumprir o que lhes cabia no âmbito da lei. Desde então, cresceram muito. O custo para as operadoras é altíssimo.

ConJur — Quanto é isso em números?

David Rechulski — É muito alto. Dá para imaginar só pelo número de cerca de 400 mil mandados cumpridos no ano passado. Cada mandado judicial não se refere necessariamente a apenas um único número telefônico. Alguns têm vários números.

ConJur — Esse número da CPI representa a quantidade de mandados?

David Rechulski — Não existe um regramento impositivo do poder público para fazer estatística dessas informações por parte das operadoras. Cada um trabalha de acordo com os seus critérios. Dessa forma, não dá para saber se a conta trata de novas interceptações ou de renovações das anteriores. O que se afirma é que o número de interceptações é ainda maior.

ConJur — Como é que as operadoras enxergam os custos das interceptações que elas são obrigadas a fazer?


David Rechulski — Acredito que seja visto como parte do ônus de investimento e de concessão do negócio. Como acontece com a instalação de antenas nas pequenas cidades, que não bancam o custo da infra-instrutura.

ConJur — Até que ponto vai a preocupação das operadoras com a observância da lei?

David Rechulski — O Mandado de Segurança ajuizado em agosto no Supremo contra o pedido da CPI dos Grampos demonstra isso. As operadoras têm uma preocupação coletiva de atuar estritamente dentro do âmbito legal. Por isso, as 17 operadoras de telefonia do país figuraram como impetrantes nesse mandado.

ConJur — Como é feita a escuta dentro da operadora?

David Rechulski — Quando recebe a ordem judicial determinando a interceptação de um terminal, a operadora cria um sinal paralelo que é direcionado para o telefone apontado pela autoridade policial. Esse terminal, que recebe o sinal paralelo, nunca fica na operadora, é sempre na polícia.

ConJur — Quem fica responsável pela operacionalização da interceptação?

David Rechulski — Essa é uma das grandes controvérsias levantadas pela resolução do CNJ sobre controle de interceptações. A resolução determina que as operadoras devem informar o nome da pessoa física que faz a operacionalização da interceptação. É uma situação comprometedora em termos de segurança. Brinco dizendo que até o carrasco, desde a idade média, usa capuz. Você vai tirar o capuz da pessoa que instrumentaliza uma ferramenta de combate ao crime organizado. Certamente, isso vai ser revisto pelo CNJ.

ConJur — O que pretende o CNJ com essa exigência?

David Rechulski — A preocupação do CNJ é ter um controle para apurar eventuais vazamentos de informação. É possível checar isso com o login e a senha do funcionário responsável. Se a operadora for oficiada, ela informa quem deu cumprimento à ordem. O risco não é só para o funcionário, mas para a própria ferramenta de investigação. É como a situação do gerente de banco que tem a família feita de refém para abrir o cofre.

ConJur — Esse funcionário ouve as conversas?

David Rechulski — Não, isso é impossível. Ele apenas programa sistemicamente o desvio das ligações para um terminal indicado na ordem. É impossível para as operadoras conhecer o conteúdo das conversas.

ConJur — Qual é a formação desses funcionários? São engenheiros?

David Rechulski — São pessoas com nível universitário, geralmente com formação em Direito. Não são necessariamente engenheiros porque não desempenham uma função eminentemente tecnológica. A operacionalização do grampo consiste em inserir os dados da determinação judicial. Precisa ter capacidade para entender às determinações do Judiciário e para tomar as medidas com segurança.

ConJur — Recentemente o deputado Marcelo Itagiba (PMDB-RJ), presidente da CPI dos Grampos, afirmou que havia funcionários das operadoras que faziam grampo ilegal dentro das próprias empresas. Como as operadoras lidam com isso?

David Rechulski — Existe muito folclore em cima dessa história de grampos. É óbvio que em qualquer âmbito da atividade humana, pode haver pessoas que não ajam adequadamente. A operadora é a primeira interessada em que quem fizer grampo ilegal seja processado e preso.

ConJur — A operadora tem como checar se um número de telefone foi ilegalmente incluído na lista que está na ordem?

David Rechulski — Isso foge da incumbência das operadoras. O oficial de cartório que lavra um mandado de interceptação telefônica tem fé pública. Seria desobediência deixar de atender solicitação de interceptação oriunda de uma vara criminal, com a fundamentação de que está sendo apurado um crime apenado com reclusão. É o princípio da confiança. Mas essa questão parece ser uma das preocupações da própria CPI.

ConJur — Como a operadora controla isso?

David Rechulski — Quem tem que controlar isso são os tribunais, as corregedorias e o CNJ. Dentro da operadora, existe um sistema de acesso biométrico e controles restritos. Não é qualquer funcionário que tem acesso. A operadora deve colocar todos os mecanismos sistêmicos, todas as barreiras para tornar aquele sistema o mais inexpugnável possível.

ConJur — Como o senhor avalia o trabalho da CPI das Interceptações Telefônicas Clandestinas?

David Rechulski — É um trabalho fundamental para o aperfeiçoamento no uso desse instrumento de investigação criminal. Se a CPI busca apurar eventuais violações e excessos, deve estar norteada para que não haja nenhum excesso. É um principio.

ConJur — Qual é sua opinião sobre o projeto que muda a lei das escutas?

David Rechulski — É um projeto importante e que tem pontos positivos. Mas, era preciso contemplar mais a casuística concreta. As operadoras deveriam ser mais ouvidas para o projeto, porque só quem sabe o que acontece é quem está do lado de lá. Talvez o projeto pudesse trazer mais garantias. E tem essa questão da identificação do funcionário. Se as empresas tivessem sido consultadas, os autores teriam mais conhecimento operacional.


ConJur — É verdadeira a história de que o juiz da Operação Satiagraha determinou o oferecimento de senha para a Polícia Federal ter acesso irrestrito ao histórico de ligações de todos os assinantes. Existe essa possibilidade?

David Rechulski — Não existe uma senha que o policial digita e acessa os dados do telefone de qualquer pessoa. É lenda. O juiz dá uma autorização judicial para que o policial tenha acesso apenas às chamadas recebidas e efetuadas por aquele terminal.

ConJur — O Guardião grampeia automaticamente telefone de quem liga para o investigado?

David Rechulski — Não. O Guardião é um receptor. Funciona como se fosse uma central telefônica com capacidade de receber uma quantidade de interceptações significativas. Ele não faz mágica. Não existe essa idéia de que ele reconhece as palavras de significado dúbio e começa a grampear. É um sistema reconhecido, de qualidade e efetividade. Tanto é que as policias civis também estão começando a usar.

ConJur — Quem faz mais grampo: a PF ou as polícias civis?

David Rechulski — A polícia estadual faz mais, porque o âmbito de crimes de competência da Polícia Civil é muito maior do que o da Polícia Federal.

ConJur — Se as escutas fossem proibidas, as investigações teriam os mesmos resultados?

David Rechulski — Dificilmente. É uma ferramenta importante, que deve ser utilizada, mas nos termos da lei. A partir do momento em que você tem uma lei impondo um determinado procedimento, o juiz é escravo daquele procedimento e o Ministério Público, como fiscal da lei, deve fiscalizar o estrito cumprimento dos parâmetros.

ConJur — A portabilidade numérica muda alguma coisa na questão do grampo?

David Rechulski — No momento em que a Anatel regulou a portabilidade, ela deveria ter regulado também os procedimentos para essa situação. A pessoa está sob interceptação e ela transfere o telefone para outra operadora. Aviso a outra empresa? Afinal, como destinatário da ordem, sou guardião do seu sigilo. Você tem que consultar o juiz e avisar que o cliente saiu da operadora. Por isso, deveria ter um pré-regramento contemplando as possibilidades. No fundo, o objeto da interceptação é a comunicação telefônica da pessoa.

ConJur — É comum a pessoa trocar o número de telefone diversas vezes para não ser grampeada.

David Rechulski — Nesse sentido, existem algumas regras. É por isso que tem muito juiz também que pede interceptação do número do aparelho do telefone. Não adianta o interceptado trocar de chip.

ConJur — O senhor sustenta que há uma diferença entre privacidade e intimidade. Qual é?

David Rechulski — A vida privada é como uma célula mater. Dentro dessa célula, há o núcleo que seria a intimidade. Entre a membrana que reveste o núcleo da célula e a membrana da própria célula, há um espaço onde está a privacidade (como um círculo dentro de outro). Minha tese é que a Lei 9.296/96 regula o âmbito mais profundo da vida privada, que é a intimidade. Por isso é preciso de um regramento específico, por imposição constitucional, para essas questões de interceptação telefônica e de comunicações. O legislador considerou que a comunicação entre duas pessoas é algo extremamente íntimo. Nela, a pessoa se permite falar sobre qualquer particularidade da sua vida privada. Agora, os registros dessa comunicação não têm o mesmo peso da própria comunicação. Um extrato mostrando que alguém ligou para outro em tal horário e dia não está na mesma esfera de “invasividade” por parte do Estado que o conteúdo dessa conversa. Fazendo uma analogia, intimidade é o que acontece no quarto do casal e privacidade o que acontece no apartamento em geral.

ConJur — Qual é a importância dessa diferença?

David Rechulski — Esses conceitos têm que ser separados porque ainda está havendo muito confusão na interpretação do que são os dados mencionados no inciso XII do artigo 5º da Constituição. Por um bom tempo se entendeu que os dados nele referidos eram os cadastrais. Depois, passou-se a entender que eram os dados de registro referentes à própria comunicação telefônica, tais como número, horário e duração da chamada. Entendo que em um artigo que fala sobre a inviolabilidade de meios de comunicação, mencionando expressamente correspondência, comunicação telegráfica e telefônica, o vocábulo em questão só pode se referir à “comunicação de dados”. Se o legislador desejasse que os dados fossem os referentes à própria comunicação telefônica, eles estariam mencionados no inciso XII de forma seqüencial, assim: “…as comunicações telefônicas e respectivos dados”, o que não ocorre, já que o vocábulo “dados” antecede o termo “comunicações telefônicas”. A própria lógica demonstra que a interpretação do mencionado inciso não está correta. É preciso existir a comunicação para serem gerados os dados de seu registro e não o contrário. Por isso, esses dados que são mencionados no inciso XII são fluxo de dados de comunicação e não dados de registros de comunicação.

ConJur — Com essa interpretação, o que muda?

David Rechulski — Entendo que os extratos telefônicos com datas, horários, números e duração das chamadas recebidas e efetuadas por um determinado usuário possam ser informadas mediante simples determinação judicial,sem necessidade de se seguir as demais premissa estatuídas na lei 9296/96, porque isso implica em violação de privacidade, que está alocada em um âmbito de proteção distinto do da intimidade.

ConJur — Ocorrem outras confusões entre privacidade de intimidade? Por exemplo?

David Rechulski — Sim. Uma ordem judicial solicitando que a instituição bancária informe quanto determinado correntista possuí em sua conta, é violação de sua privacidade. Saber como ganhou tais recursos e como o gastou, quando, onde, com quem, etc, é uma questão de intimidade, mas que é tratada como privacidade. É impressionante que faz 20 anos que promulgaram a Constituição, e ainda haja entendimentos conflitantes sobre o tema.

Texto alterado às 21h para correção de informações e ajuste de texto

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