Depoimento à distância

CCJ do Senado aprova uso de videoconferência em interrogatórios

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12 de novembro de 2008, 16h54

O projeto que permite o uso de videoconferência em interrogatórios foi aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado, nesta quarta-feira (12), conforme informação da Agência Brasil.

Se aprovado o projeto, que ainda deve ser votado na Câmara dos Deputados, o juiz poderá escolher quando usar o método. Com a tecnologia, ele poderá ouvir as testemunhas sem que elas precisem ir até o tribunal ou fórum. Exemplos de casos em que a videoconferência pode ser usada é de réu preso que cujo deslocamento representa risco à segurança pública, e de réu doente, impossibilitado de se locomover.

O senador Aloizio Mercadante (PT-SP) acredita que este método “barateia, agiliza e facilita o processo". Para ele “o juiz decide se usa ou não [o método], basta fundamentar o pedido".

Direito de defesa

Recentemente o Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade de lei do estado de São Paulo que permitia a videoconferência. Mas os ministros não julgaram o mérito da questão. Apenas consideraram que o estado não tem competência para legislar sobre matéria de processo.

Apenas os ministros Marco Aurélio e Carlos Britto emitiram opinião de mérito e rejeitaram a novidade. Se posicionaram contra a distância entre o réu e o juiz durante o interrogatório. “O acesso à jurisdição é acesso ao juiz natural, que não é virtual”, disse Britto. Para ele, o procedimento fere o direito à ampla defesa do acusado. “Se o transporte do prisioneiro é custoso ao Estado, isso é um problema da segurança pública”, afirmou o ministro, que chegou a rejeitar o argumento da invasão de competência da lei, mas mudou seu voto, acompanhando a maioria.

Marco Aurélio acrescentou ainda que, nos casos em que o transporte do detido seja custoso ao Estado ou perigoso à população, o Código de Processo Penal já prevê a possibilidade de o juiz ir até o presídio, desde que haja segurança adequada. Para o ministro, a prática dá tratamento desigual entre réus já detidos, que seriam obrigados a responder à distância, e os que respondem em liberdade, que poderiam comparecer em juízo. “É uma forma moderna, mas que maltrata o direito de defesa, e será observada somente em relação aos menos afortunados”, afirmou.

Leia o projeto de lei:

PROJETO DE LEI DO SENADO Nº DE 2007

Altera dispositivos do Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal, para prever a realização excepcional de interrogatório do acusado preso por videoconferência.

 

O CONGRESSO NACIONAL decreta:

Art. 1o. Esta Lei altera os artigos 185, 203, 212 e 222 do Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal.

Art. 2o. O Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal, passa a viger com a seguinte redação:

 

Art. 185. ……………………………………………………………………….

§ 1º. O interrogatório do acusado preso será realizado no estabelecimento prisional em que estiver recolhido, em sala própria, desde que estejam garantidas a segurança do juiz e auxiliares, a presença do defensor e a publicidade do ato.

§ 2º. O juiz, de ofício ou a pedido do Ministério Público ou da defesa, poderá determinar a realização de interrogatório por meio de videoconferência ou outro recurso tecnológico de presença virtual, em tempo real, sempre que haja motivo devidamente fundamentado acerca de segurança pública, manutenção de ordem pública ou garantia da aplicação da lei penal e instrução criminal, e desde que sejam assegurados canais telefônicos reservados para comunicação entre o defensor que permanecer no presídio e os advogados presentes nas salas de audiência dos fóruns, e entre estes e o preso.

§ 3º. Em qualquer caso, antes da realização do interrogatório, o juiz assegurará o direito de entrevista reservada do acusado com seu defensor.

§ 4º. A sala reservada no estabelecimento prisional para a realização dos atos processuais à distância será fiscalizada por membros do Ministério Público, da Magistratura, serventuários da justiça e pela Ordem dos Advogados do Brasil.


§ 5º. Será requisitada a apresentação em juízo do acusado preso, nas hipóteses em que o interrogatório não se realizar na forma prevista nos §§ 1º e 2º deste artigo.¿ (NR)

Art. 203. ……………………………………………………………………

Parágrafo único. A realização de oitiva de testemunha presa poderá ser realizada por meio de videoconferência ou outro recurso tecnológico de presença virtual, em tempo real, observado o disposto no § 2º do art. 185 deste Código¿. (NR)

Art. 212 ……………………………………………………………………………

Parágrafo único. . O acusado poderá, mediante determinação judicial, acompanhar a oitiva de testemunha, por meio de videoconferência ou outro recurso tecnológico de presença virtual, permitida a presença de defensor¿. (NR)

Art. 222. A testemunha que morar fora da jurisdição do juiz será inquirida pelo juiz do lugar de sua residência, expedindo-se, para esse fim, carta precatória, com prazo razoável.

§ 1º. As partes serão intimadas da expedição da carta precatória.

§ 2º. A expedição da precatória não suspenderá a instrução criminal, inclusive a audiência de instrução e julgamento, no rito ordinário ou sumário, devendo ser juntada aos autos antes das alegações finais e julgamento.

§ 3º. Caso demonstrado manifesto prejuízo, a parte poderá requerer que a audiência de instrução e julgamento seja realizada após a devolução da precatória.

§ 4º. As cartas rogatórias só serão expedidas se demonstrada a sua imprescindibilidade e não suspenderão a instrução, arcando a parte requerente com os custos.

§ 5º Findo o prazo marcado para a carta rogatória, poderá realizar-se o julgamento, mas, a todo tempo, poderá ser devolvida, sendo imediatamente juntada aos autos.

§ 6º Na hipótese prevista no caput, a oitiva de testemunha poderá ser realizada por meio de videoconferência ou outro recurso tecnológico de presença virtual, em tempo real, permitida a presença de defensor.¿(NR)

 

Art. 3o. Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

 

JUSTIFICAÇÃO

Não busco com esse projeto reintroduzir a discussão sobre a importância e possibilidade do uso da tecnologia de videoconferência em favor da economia aos erários estaduais face aos elevados gastos com transportes de presos para audiências. Foi essa tônica do debate no Congresso Nacional durante a discussão de projetos que tratam da matéria, e ainda seguem sua tramitação.

Busco, portanto, apresentar projeto cuja redação compatibilize o entendimento do Supremo Tribunal Federal (revisando posição do Superior Tribunal de Justiça), com a inquestionável necessidade da introdução do moderno mecanismo de audiências por meio por meio de videoconferência ou outro recurso tecnológico de presença virtual, em tempo real.

O Superior Tribunal de Justiça entendia que, não havendo prejuízos ao processo, o interrogatório poderia proceder por meio de videoconferência, conforme ementa de decisão abaixo transcrita:

PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. NULIDADE. INTERROGATÓRIO. VIDEOCONFERÊNCIA. DEVIDO PROCESSO LEGAL. PREJUÍZO NÃO DEMOSTRADO.

O interrogatório realizado por videoconferência, em tempo real, não viola o princípio do devido processo legal e seus consectários. Para que seja declarada nulidade do ato, mister a demonstração do prejuízo nos termos do art. 563 do Código de Processo Penal. Ordem DENEGADA. (HC 34020/SP; Relator Ministro Paulo Medina; 6ª Turma; Data do Julgamento: 15/09/2005; DJ 03/10/2005, p. 334).

RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. INTERROGATÓRIO REALIZADO POR MEIO DE SISTEMA DE VÍDEOCONFERÊNCIA OU TELEAUDIÊNCIA EM REAL TIME. CERCEAMENTO DE DEFESA. NULIDADE, PARA CUJO RECONHECIMENTO FAZ-SE NECESSÁRIA A OCORRÊNCIA DE EFETIVO PREJUÍZO, NÃO DEMONSTRADO, NO CASO.


Recurso desprovido. (RHC 15558/SP; Relator Ministro José Arnaldo da Fonseca; 5ª Turma; Data do Julgamento: 14/09/2004; DJ 11/10/2004, p. 351).

Posteriormente, em decisão de agosto de 2007, o Supremo Tribunal Federal, ao julgar o Habeas Corpus 88.914-0, oriundo do Estado de São Paulo, sob a relatoria do Ministro Cezar Peluso, decidiu por unanimidade que a realização de audiência criminal através de videoconferência é ilegal, por ausência de uma Lei Federal que regule a matéria, e que é inconstitucional em razão da ofensa ao devido processo legal e limitação do exercício da ampla defesa.

Todavia, o voto do Eminente Relator Ministro Cezar Peluso indica, no seu ver, quais seriam as características de uma futura lei em sintonia com a Constituição Federal:

Não fujo à realidade para reconhecer que, por política criminal, diversos países ¿ Itália, França, Espanha, só para citar alguns ¿ adotam o uso da videoconferência ¿ sistema de comunicação interativo que transmite simultaneamente imagem, som e dados, em tempo real, permitindo que um mesmo ato seja realizado em lugares distintos ¿ na práxis judicial. É certo, todavia, que, aí, o uso desse meio é previsto em lei, segundo circunstâncias limitadas e decisão devidamente fundamentada, em cujas razões não entra a comodidade do juízo. Ainda assim, o uso da videoconferência é considerado ¿mal necessário¿, devendo empregado com extrema cautela e rigorosa análise dos requisitos legais que o autorizam. (grifo nosso).

 

Em linhas gerais, a videoconferência pode ser uma exceção, uma possibilidade, não a regra. Parece-me mais adequado, que a regra geral seja a realização de interrogatório no estabelecimento prisional, com o deslocamento do magistrado. E que, o interrogatório por meio videoconferência seja efetivado apenas excepcionalmente. Para isso, é necessário, primeiro, que o uso da videoconferência esteja condicionado à existência de justificativa, devidamente fundamentada pelo Juiz, com vistas a garantir segurança pública, manutenção de ordem pública ou garantia da aplicação da lei penal e instrução criminal, e desde que sejam assegurados canais telefônicos reservados para comunicação entre o defensor que permanecer no presídio e os advogados presentes nas salas de audiência dos fóruns, e entre estes e o preso.

Além do interrogatório do acusado preso, o projeto sugere a ampliação da utilização da videoconferência no caso de oitiva de testemunha presa, e, também, a criação de regra que possibilita, mediante autorização do juiz, que acusado preso acompanhe a oitiva de testemunha por meio de videoconferência.

Há na proposta, ainda, o esclarecimento de que será admitida a presença de defensor no estabelecimento prisional durante a realização do interrogatório do acusado preso ou oitiva de testemunha presa à distância.

São as razões pelas quais julgo fundamental a aprovação de norma que autorize a realização de videoconferências em interrogatórios, desde que observado o balizamento imposto pela Constituição Federal, traduzido na excepcionalidade do uso deste novo instrumento.

Por essas razões, submeto à apreciação das Casas Legislativas a presente proposição, por se tratar de inegável avanço na legislação penal do país.

Sala das Sessões,

 

Senador ALOIZIO MERCADANTE

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