Direito adquirido

Emenda não pode contrariar cláusula pétrea da Constituição

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7 de novembro de 2008, 23h00

O poder constituinte de reforma não pode contrariar cláusula pétrea. Essa foi a tese vencedora no Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo, que mandou o chefe do Ministério Público suspender o desconto de gratificações nos salários dos procuradores Antonio de Pádua Bertone Pereira e Magino Alves Barbosa, que recebiam vencimentos superiores ao teto salarial estabelecido pela Emenda Constitucional 45, a chamada Reforma do Judiciário. Para os desembargadores, a emenda não pode contrariar cláusula pétrea da constituição.

Bertone e Mágino compõem o grupo de membros dos Ministérios Públicos que ganham acima do teto fixado pela Constituição para o funcionalismo público, segundo levantamento do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP).O primeiro ocupa hoje o cargo de corregedor-geral do Ministério Público paulista e recebe salários de R$ 55 mil. O segundo, com vencimentos de R$ 45 mil, é secretário-executivo da 1ª e da 2ª Procuradoria de Justiça, com atribuições em matérias criminais.

Os dois ingressaram com mandado de segurança contra decisão do procurador-geral de justiça que, a partir de 6 de agosto do ano passado, passou a descontar nos holerites a gratificação de representação de gabinete já incorporada ao salário e o adicional dessa gratificação. A gratificação e o adicional foram acrescidos por decisão judicial transitada em julgado.

A defesa de Bertone e Mágino reclamou que seus clientes se viram privados da vantagem em dinheiro, legalmente incorporada há mais de cinco anos aos vencimentos. Segundo a defesa, por conta do ato ilegal do chefe do Ministério Público os procuradores de justiça sofreram “substancial redução” de salários. “Violou-se, assim, a coisa julgada e o direito líquido e certo dos impetrantes de preservarem sua situação jurídica subjetiva definitivamente constituída a partir da incorporação de tais vantagens”, afirmou o advogado João Lopes Guimarães.

O procurador-geral de justiça rebateu com o artigo 17 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) que estabelece que vencimentos, vantagens e adicionais que sejam recebidos em desacordo com a Constituição deverão ser imediatamente reduzidos, não se admitindo invocação de direito adquirido.

O Órgão Especial do TJ paulista entendeu, por votação unânime, que o artigo do ADCT é norma exaurida, que já cumpriu e esgotou seus efeitos, sendo sua natureza transitória e não permanente. O colegiado decidiu conceder a segurança pelo não cabimento da aplicação do desconto. A tese foi sustentada pelo desembargador Munhoz Soares.

Quando proposta na 5ª Vara da Fazenda Pública, a ação foi estimada em R$ 200 mil. Hoje, o valor da execução é contestado pela Fazenda Pública Estadual perante o juiz Valter Alexandre Mena, da 3ª Vara da Fazenda Pública. Além de Bertone e Mágino integram o recurso do governo paulista os procuradores de justiça Ruy Sérgio Rebello Pinho, Carlos Alberto de Campos, João Antonio Bastos Garreta Prats, João Costa Gomes e Otacílio Garms e Filho, além do promotor de justiça Mario Coimbra.

A sentença judicial de primeira instância é de outubro de 1995. Bertone e Mágino reclamaram à justiça incorporação de 100% da gratificação que recebiam quando estavam a serviço do Palácio dos Bandeirantes, no governo de Luiz Antonio Fleury Filho (1991-1994). O juiz Ricardo Rebello Pinho, na 5ª Vara da Fazenda, julgou procedente a ação e decretou o reconhecimento do caráter alimentar do crédito. Em 1997, por votação unânime, a 7ª Câmara do Direito Público do Tribunal de Justiça confirmou a decisão.

Os descontos nos vencimentos dos dois procuradores passaram a ser feitos depois de decisão do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) que determinou a aplicação de cortes nos salários que não se encaixam na nova regra de teto remuneratório. O CNMP mandou retirar dos holerites as gratificações, pagas a título de complementação constitucional e parcela de irredutibilidade, inclusive aquelas asseguradas por decisão judicial.

A decisão do CNMP manteve apenas as verbas de caráter adicional por tempo de serviço, desde que congeladas, o aumento de 20% sobre a remuneração da aposentadoria e a sexta parte — parcela equivalente a um sexto do salário, incorporada depois de 20 anos de serviço.

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