Convergência de opiniões

MPF nega que haja divergência entre procuradores sobre anistia

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6 de novembro de 2008, 23h00

Os procuradores Eugênia Fávero, Marlon Alberto Weichert e Fábio Elizeu Gaspar divulgaram nota para rebater reportagem da Consultor Jurídico, que informa sobre as divergências entre os membros do Ministério Público Federal de São Paulo sobre a punição dos crimes políticos cometidos durante a ditadura militar — Clique aqui para ler.

Apesar de Fábio Elizeu Gaspar ter assinado parecer pedindo o arquivamento de ação na Justiça Federal para investigar a morte do jornalista Vladimir Herzog, os procuradores afirmam que não há diferenças de entendimento sobre a Lei da Anistia.

Em maio deste ano, Eugênia e Weichert foram dois dos seis procuradores que ajuizaram uma Ação Civil Pública contra a União e os dois ex-militares Carlos Alberto Brilhante Ustra e Audir Santos Maciel. Eles eram os comandantes do DOI-CODI de São Paulo em 1975, ano em que o jornalista foi morto. O parecer de Gaspar foi provocado por pedido dos procuradores Eugênia Augusta e Weichert, autores da ação.

Na nota, Gaspar esclarece que não diverge dos colegas sobre a Lei da Anistia. Segundo ele, o caso de Herzog não é coberto pela lei. “A razão do arquivamento reside na interpretação da questão da imprescritibilidade, que teria que ser recepcionada pela legislação brasileira, e pelo fato de o pedido de reabertura da investigação do caso Herzog, negado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, em ação semelhante proposta pelo Ministério Público Estadual, ter transitado em julgado”, afirma a nota.

O MPF explica que o arquivamento ainda não foi apreciado pela juíza Paula Mantovani Avelino, da 1ª Vara Federal de São Paulo. Lembra que é ela quem decidirá sobre o arquivamento. O pedido feito em maio pelos procuradores Eugênia e Weichert foi o primeiro de seis representações sobre os crimes praticados por agentes do Estado durante a ditadura.

“Todas as representações penais possuem o mesmo entendimento: a de que os crimes de homicídio, tortura, estupro e desaparecimentos forçados cometidos pelo regime militar contra opositores da ditadura militar são crimes contra a humanidade, conforme convenções internacionais de Direitos Humanos às quais o Brasil está vinculado”, afirma a nota.

Os procuradores lembram que a independência funcional dos membros permite que os seus integrantes tenham opiniões diferentes, desde que convictos de que estão corretos em sua atuação. “A diferença entre opiniões no Ministério Público será objeto de decisões do Poder Judiciário, a quem cabe a interpretação final da lei”, explicam.

Em outubro, a Advocacia-Geral da União emitiu parecer em outro processo contra os comandantes do DOI-CODI. A AGU defendeu que os crimes de tortura praticados durante o regime militar foram perdoados pela Lei de Anistia. A posição provocou celeuma entre os revisionistas e os defensores da anistia, com divergências inclusive dentro do governo.

Herzog, que trabalhava na TV Cultura, apareceu morto no dia 25 de outubro de 1975 na cela em que estava preso no DOI-CODI. Na época, o caso foi julgado pela Justiça Militar, que acolheu a tese de suicídio.

Em 1992, o Ministério Público de São Paulo pediu abertura de inquérito policial para apurar melhor o caso. O Tribunal de Justiça do estado, no entanto, arquivou o pedido. O trancamento foi depois confirmado pelo Superior Tribunal de Justiça com base na Lei da Anistia.

Leia a nota

Sobre a reportagem “Caso Herzog: Membros do MPF-SP divergem sobre revisão da anistia” publicada na quarta-feira (5/11) na ConJur, a procuradora da República Eugênia Fávero e o procurador regional da República Marlon Alberto Weichert, autores da representação que pediu a abertura da investigação do caso na Justiça Federal, e o procurador Fabio Elizeu Gaspar, que pediu o arquivamento do caso, esclarecem o que se segue:

1 — A independência funcional dos membros do Ministério Público Federal, garantida pela Constituição e regulamentada na lei orgânica do MPF, permite que seus integrantes tenham opiniões diferentes, desde que convictos de que estão corretos em sua atuação. É o caso de todos os procuradores citados na reportagem. A diferença entre opiniões no Ministério Público será objeto de decisões do Poder Judiciário, a quem cabe a interpretação final da lei;

2 — A representação para fins penais pedindo que procuradores da República da área criminal do MPF em São Paulo abrissem uma investigação criminal sobre a morte sob tortura do jornalista Vladimir Herzog nos porões do Doi-Codi não tem relação direta com a Ação Civil Pública proposta em maio deste ano, por Marlon, Eugênia, Sergio Suiama, Adriana da Silva Fernandes, Luciana da Costa Pinto e Luiz Fernando Gaspar Costa, que, em síntese, pede:

a) O reconhecimento do dever das Forças Armadas de revelar o nome de todas as vítimas do Doi/Codi de São Paulo (não apenas de homicídio e desaparecimento, uma vez que o órgão deteve mais de 7.000 cidadãos), circunstâncias de suas prisões e demais atos de violência que sofreram, bem como tornar públicos todos os documentos relacionados ao funcionamento do órgão;

b) A declaração de que Ustra e Maciel comandaram um centro de prisões ilegais, torturas, homicídios e desaparecimentos forçados no Doi-Codi de São Paulo;

c) Que Ustra e Maciel sejam obrigados a reembolsar à União os custos das indenizações pagas na forma da lei 9.140/95 (lei de mortos e desaparecidos políticos) às famílias das 64 vítimas daquele destacamento durante a gestão dos demandados;

d) Que ambos sejam condenados a não mais exercerem qualquer função pública;

3 — A representação pedindo a investigação do caso Herzog foi apresentada pelo procurador regional da República Marlon Alberto Weichert aos procuradores da área criminal do MPF em São Paulo, no inicio de 2008. Esta foi a primeira de seis representações a respeito de crimes praticados no período por agentes do Estado brasileiro, algumas distribuídas antes da ACP do Doi-Codi, outras depois. Em síntese, todas as representações penais possuem o mesmo entendimento: a de que os crimes de homicídio, tortura, estupro e desaparecimentos forçados cometidos pelo regime militar contra opositores da ditadura militar são crimes contra a humanidade, conforme convenções internacionais de Direitos Humanos às quais o Brasil está vinculado. Para os autores da representação, tais crimes contra a humanidade são imprescritíveis. As representações e a Ação Civil Pública possuem o entendimento que a lei de Anistia não precisa de alteração, pois ela não anistiou esses crimes;

5 — A promoção de arquivamento pedida pelo procurador da República Fabio Elizeu Gaspar ainda não foi apreciada pela juíza federal Paula Mantovani Avelino, da 1ª Vara Federal. A ela competirá arquivar a representação, ou, caso discorde da decisão ministerial, encaminhar o caso para análise do Procurador Geral da República que o submeterá ao crivo da 2ª Câmara de Coordenação e Revisão do MPF, que decidiria, então, pela manutenção do arquivamento ou designaria outro procurador para o caso;

6 — O procurador da República Fabio Elizeu Gaspar esclarece que não diverge do entendimento de Eugênia e Marlon sobre a lei da Anistia. Para ele, o assassinato de Herzog não é coberto pela lei de Anistia. A razão do arquivamento, para o procurador, reside na interpretação da questão da imprescritibilidade, que teria que ser recepcionada pela legislação brasileira, e pelo fato de o pedido de reabertura da investigação do caso Herzog, negado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, em ação semelhante proposta pelo Ministério Público Estadual, ter transitado em julgado.

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