Judiciário Paulista

Seção Criminal do TJ-SP não faz distribuição imediata das ações

Autor

5 de novembro de 2008, 20h27

O Judiciário paulista mandou arquivar representação que exigia a distribuição imediata de recursos para os julgadores da Seção Criminal do Tribunal de Justiça. A decisão foi tomada nesta quarta-feira (5/11) por votação unânime do Órgão Especial do TJ. O colegiado entendeu que a distribuição imediata causaria desequilíbrio entre as partes em conflito: acusação e defesa. Cabe recurso ao Conselho Nacional de Justiça.

A representação é assinada pela procuradora de Justiça Valderez Deusdedit Abud. Ela pediu o cumprimento, pela Seção Criminal do TJ paulista, de resolução do próprio colegiado que determina a imediata distribuição dos processos aos integrantes da segunda instância. A Seção Criminal, no entanto, por norma regimental, manda colher parecer do Ministério Público antes de distribuir as ações.

Valderez considera essa rotina de distribuição de feitos “vetusta” e diz que ela contraria resolução do Órgão Especial, Regimento Interno do TJ e a Constituição Federal que, após a Reforma do Judiciário, determinou que a distribuição de processos seja imediata, em todos os graus de jurisdição.

“Mais do que ofensiva a uma prerrogativa funcional dos membros do Ministério Público e a um ato normativo expedido pelo próprio Tribunal de Justiça de São Paulo, a prática atual da Seção Criminal contraria a lei fundamental da República, especialmente na parte que proíbe categoricamente o represamento dos processos”, afirmou Valderez.

Segundo ela, a retenção de autos não é admissível, seja na forma tradicional, seja no que a procuradora chamou de versões alternativas, que, na opinião de Valderez, embaraçam a fixação imediata e o conhecimento público do órgão fracionário competente e do magistrado que vai atuar como relator no processo. No final da representação, a procuradora acenou que, se a sua procuração não fosse, poderia recorrei ao CNJ.

A cúpula do Tribunal de Justiça não gostou do tom da representação considerado por eles ameaçador e indelicado. O Órgão Especial disse que, além do desequilíbrio entre defesa e acusação, a medida iria aumentar ainda mais o represamento de processos.

O presidente do TJ, desembargador Vallim Bellocchi, chegou a defender o envio da representação ao procurador-geral de Justiça. Foi acompanhado pelo desembargador Ivan Sartori, mas logo a proposta foi derrubada com as manifestações de Celso Limongi, Penteado Navarro, Walter Guilherme e Mário Devienne Ferraz.

Limongi alegou que atender o pedido da representação significa que o Ministério Público vai privilegiar a acusação que terá mais informações que a defesa. Penteado Navarro foi além e defendeu o não acolhimento da representação porque, segundo ele, os procuradores de Justiça saberão quem é o relator do processo e, com isso, poderão fazer ingerências junto a este. “Os desembargadores não aceitam um policiamento deste tipo”, afirmou Navarro.

“Não há razão para distribuição prévia”, defendeu o desembargador Walter Guilherme, que chegou ao Judiciário pelo quinto constitucional do Ministério Público. Para ele, com a medida, o MP pretende influenciar o relator a decidir sobre determinada matéria.

O ataque mais duro foi dirigido pelo desembargador Devienne Ferraz. Segundo ele, o Ministério Público tem levado de 30 a 40 dias para dar um parecer em casos urgentes como pedidos de Habeas Corpus com réus presos. “É lamentável que a procuradora não tenha a mesma preocupação com os recursos que estão represados no Ministério Público”, afirmou. De acordo com o desembargador, cerca de 14 mil processos estão parados na rua Riachuelo, sede do Ministério Público, aguardando parecer de um procurador de Justiça.

Leia a Representação da procuradora

Excelentíssimo Presidente do Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo

Valderez Deusdedit Abbud, Procuradora de Justiça, com atuação perante a Seção Criminal desse Egrégio Tribunal de Justiça e gabinete na rua Riachuelo, nº 115, sala nº 233, nesta Capital, vem, respeitosamente, formular a presente representação, pelos motivos que passa a expor:

1. Lei nº 8.625, de 12.2.1993 diz ser prerrogativa dos membros do Ministério Público “ter vista dos autos após distribuição às Turmas ou Câmaras” (art. 41, inciso III). Apesar disso, durante muitos anos prevaleceu nessa E. Corte a norma regimental que mandava colher o parecer do Ministério Público antes da distribuição dos processos, prática na qual sua Seção Criminal persevera, ao contrário, aliás, das demais.

2.Ocorre que essa vetusta rotina tem contra si, não apenas a Resolução nº 204/2005, do E. Órgão Especial — que regula a distribuição de processos no Tribunal de Justiça de São Paulo e determina que “todos os feitos entrados serão imediatamente distribuídos aos Desembargadores e Juízes Substitutos em Segundo Grau em exercício” (art. 1º, caput) —, mas, sobretudo, a Constituição Federal, cujo artigo 93, XV, incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004, é claríssimo, ao dispor que “a distribuição de processos será imediata, em todos os graus de jurisdição”, e, evidentemente, revogou todas as disposições em contrário, como é o caso do artigo 387, caput, do Regimento Interno desse E. Tribunal.

3. Portanto, mais do que ofensiva a uma prerrogativa funcional dos membros do Ministério Público e a um ato normativo expedido pelo próprio Tribunal de Justiça de São Paulo, a prática atual da Seção Criminal contraria a Lei Fundamental da República, especialmente na parte em que proíbe categoricamente o represamento dos processos. A retenção de autos não é admissível, seja na forma tradicional, seja em versões alternativas, que embaracem a fixação imediata e o conhecimento público do órgão fracionário competente e do Magistrado que atuará como relator. Aliás, é a distribuição que diz, concretamente, “o que pertence ao trabalho de cada juiz” (Cf. PONTES DE MIRANDA, Comentários ao Código de Processo Civil, t. III, 2ª ed, Rio: Forense, 1974, p. 355 e 357) e nesse trabalho se incluem os atos de impulso dos feitos criminais (inclusive sua remessa ao Ministério Público, para a apresentação de parecer). Daí a pertinência da pronta adoção de medidas por essa E. Presidência, tendentes a “fazer executar” a resolução do Órgão Especial (RITJSP, art. 217, XXVII), se necessário por meio de recomendação ao DD. Presidente da Seção Criminal, o que se compreende na chefia suprema da Magistratura do Estado (RITJSP, artigo 217, caput) e na defesa da autoridade do próprio Órgão Especial.

4.A signatária registra sua certeza de que essa E. Presidência, atenta à Constituição Federal e fiel às melhores tradições da Corte, adotará as medidas adequadas, o que tornará prescindível a elevação desse assunto ao Egrégio Conselho Nacional de Justiça, órgão de controle nacional ao qual se atribuiu a competência para, quando necessário, recomendar as providências administrativas cabíveis e pertinentes ao exato cumprimento da lei e da Constituição, no interior do Poder Judiciário (Constituição Federal, art. 103-B, § 4º, incisos I e II)

5.Por todo o exposto, requer a adoção das providências cabíveis, para que a Seção Criminal desse Egrégio Tribunal de Justiça passe a cumprir, fielmente, a Resolução nº 204/2005 do E. Órgão Especial e altere, com isso, a praxe contrária à Constituição Federal (art. 93, XV) e à Lei Orgânica Nacional do Ministério Público (art. 41, inciso III).

Nestes termos,

p. deferimento.

São Paulo, 22 de setembro de 2008.

Valderez Deusdedit Abbud

Procuradora de Justiça

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!