Defesa do Estado

AGU quer procuradores da Fazenda sob sua administração

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4 de novembro de 2008, 11h21

Os procuradores da Fazenda Nacional têm uma missão tão importante quanto inglória: cobrar judicialmente os tributos federais que deixaram de ser pagos pelos contribuintes. São cerca de dois mil homens e mulheres encarregados de tentar recuperar R$ 600 bilhões em tributos que não foram recolhidos aos cofres públicos e, por isso, estão inscritos na Dívida Ativa da União.

De 1995 a 2006, segundo o sindicato da categoria, eles conseguiram trazer R$ 70 bilhões de volta ao erário gastando menos de R$ 1 bilhão para isso. Os procuradores da Fazenda Nacional também têm como atribuição dar assessoria jurídica ao Ministério da Fazenda.

Trata-se de uma carreira peculiar dentro da Administração Pública — e não só em razão dos números estratosféricos com que trabalham esses servidores. A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) é, hoje, o único órgão da administração federal com dupla vinculação: administrativamente, está sob o guarda-chuva do Ministério da Fazenda, assim como o Banco Central e a Receita Federal; juridicamente, está vinculado à Advocacia-Geral da União.

Mas, no que depender da vontade da AGU, essa situação não deve durar muito mais. Está em gestação um anteprojeto de lei complementar que acaba com a dupla vinculação. A AGU quer o controle administrativo do órgão assim como tem das outras duas carreiras de advogados públicos — procuradores federais e advogados da União.

Para a AGU, o fortalecimento da defesa do Estado passa por essa mudança. Já para a direção da PGFN, o órgão cumpre melhor o seu papel vinculado ao Ministério da Fazenda, como está hoje. A discussão divide a categoria da cúpula à base. Foi o que mostrou o debate promovido nesta segunda-feira (3/11), na sede da Procuradoria da União, em Brasília, pelo Sindicato dos Procuradores da Fazenda Nacional (Sinprofaz).

A defesa do fim da dupla vinculação foi feita pelo advogado-geral da União substituto, Evandro Gama. Já o procurador-geral da Fazenda Nacional, Luís Inácio Adams, defendeu a manutenção da ligação do órgão com o Ministério da Fazenda.

Para Evandro Gama, os procuradores da Fazenda têm de ser vinculados somente à AGU pelo fato de que seu trabalho, no Ministério da Fazenda, é atividade-meio. Na Advocacia da União, a atividade jurídica é atividade-fim. E, por isso, a carreira seria tratada com mais atenção em todas as questões: da orçamentária à da garantia do exercício da profissão.

“Como a AGU se preocupa exclusivamente com a atividade jurídica, dá mais atenção às especificidades da área”, afirma Gama. De acordo com o advogado-geral substituto, que é procurador da Fazenda de carreira, por estar vinculada ao Ministério da Fazenda, órgão que tem atribuições políticas, a Procuradoria da Fazenda acaba sem ter a devida atenção e isso reflete negativamente em seu aparelhamento e desempenho.

Evandro Gama sustenta que alguns números revelam como a vinculação ao Ministério da Fazenda atrapalha o desenvolvimento da PGFN. Segundo ele, só em cursos de aperfeiçoamento de pessoal, este ano, a Escola da AGU investiu R$ 4 milhões. Não foram apresentados os números da Procuradoria, mas ele garante que são muito menores.

Já para Luís Inácio Adams, o vínculo ao Ministério não atrapalha o trabalho da Procuradoria. Pelo contrário, é essencial para seu bom funcionamento. “A dupla vinculação tem razão de ser. Não somos advogados que falamos de forma burocrática nos autos. Atuamos diretamente na política tributária. Quando cobra e parcela a dívida, o procurador exerce um ato de administração tributária. Por isso, precisa estar vinculado ao cliente para compreender suas necessidades”.

Adams acredita que só a proximidade com o administrador traz ao advogado experiência e capacidade suficientes para bem argumentar e fazer o juiz compreender os fatos dos autos. O procurador-geral defende que é preciso trabalhar junto com a Administração. “Não podemos reforçar a segmentação”, diz.

O advogado-geral da União substituto, Evandro Gama, garante que o fim da vinculação não significará o afastamento dos procuradores da Administração Pública. “Você pode atender bem ao seu cliente de qualquer lugar se tiver tecnologia. Estou convencido de que a Dívida Ativa da União será mais bem cobrada e executada quando a PGFN estiver vinculada administrativamente à AGU porque não precisará disputar recursos materiais com órgãos como a Receita Federal”, afirma.

Gama afirma também que a vinculação prejudica inclusive a remuneração dos procuradores da Fazenda. Segundo ele, o pagamento de honorários para advogados públicos, antiga reivindicação da categoria, só não vingou porque o Ministério da Fazenda foi contra.

“Em uma estrutura do tamanho do Ministério da Fazenda, a PGFN não tem condições de disputar recursos e melhoria de condições de trabalho com os demais órgãos”, diz. Para Evandro Gama, “manter o sistema em vigor é fragmentar o modelo forte e operante da AGU que se vislumbra para o futuro”.

Adams rebate. “Não é no distanciamento que nós melhoraremos o serviço”. Para ele, é preciso mudar a concepção de defesa da União. “Hoje, nós fazemos gerenciamento de processos. Precisamos passar a fazer gerenciamento de resultados. E, para isso, o ambiente de integração é fundamental.”

O procurador-geral da Fazenda Nacional alerta que, nos estados, as experiências de junção das carreiras de advogados públicos sob a administração única da Procuradoria-Geral do estado não produziram bons resultados. “Em São Paulo, por exemplo, a Secretaria da Fazenda e a Procuradoria-Geral do Estado tiveram de criar um conselho para discutir as causas por conta do distanciamento que se criou entre os dois órgãos”.

O anteprojeto de lei complementar que acaba com a dupla vinculação ainda será discutido pelos advogados públicos e aperfeiçoado com sugestões antes de ser encaminhado ao Congresso Nacional. Pela mostra que se teve com o debate do Sinprofaz, terá de haver muita discussão para que a categoria chegue perto de um consenso sobre o texto.

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